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APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO

Coordenadas gerais:

1. Ante a entrada em vigor de uma lei nova (LN), e surgindo a necessidade de


determinar a sua aplicação no tempo, o primeiro passo é aferir da existência de
Direito transitório:

 Direito transitório (conjunto de disposições normativas contidas na LN que


regulam a sua aplicação no tempo).

Formal – o direito transitório diz-se formal quando o legislador se limita a


escolher, de entre as leis potencialmente aplicáveis, aquela ou aquelas que
devem regular uma determinada situação jurídica.

Material - o direito transitório diz-se material quando de tais disposições


normativas resulta a não aplicação nem da LN nem da LA, mas a aplicação de
uma disciplina própria – uma 3ª solução.

Existindo direito transitório, o problema da aplicação da LN no tempo resolve-se


observando essas disposições normativas, já que lei especial prevalece sobre lei geral.

2. Não existindo direito transitório, temos que recorrer aos artigos 12.º e 13.º do CC.
Como é que aplicamos a LN à luz do artigo 12.º CC? Em princípio, aplicamos a LN
sem eficácia retroactiva (excepto se for outro o sentido específico da lei).

3. Todavia, o princípio da não retroatividade da LN não basta; é necessário saber como


aplicamos a LN não retroativamente: a todas as situações jurídicas já constituídas, a
todos os factos jurídicos, só a factos e situações jurídicas novas, a situações jurídicas
presentes que tenham origem em factos passados, etc.? Para resolver este problema
temos que começar por saber se a LN regula factos ou efeitos de factos.

4. Admitem-se excepções ao princípio geral da irretroatividade (art. 12º/1 CC). Os graus


de retroatividade admitidos no nosso ordenamento jurídico são os seguintes:

 Retroatividade Extrema – lei nova é aplicada aos factos ocorridos antes da sua
entrada em vigor, sem quaisquer limites, sem respeitar o caso julgado; não há
suscetibilidade de recurso ordinário;
 Retroatividade Quase Extrema – limite à aplicação da lei nova aos factos
ocorridos antes da sua entrada em vigor é o caso julgado. Por conseguinte, a
lei nova também se aplica às situações que se constituíram e extinguiram ao
abrigo de uma lei antiga.
 Retroatividade Agravada – lei nova só respeita, dos efeitos produzidos antes
da sua entrada em vigor, os que tiveram um título que lhes dê especial
reconhecimento – retroatividade das leis interpretativas do art. 13º CC.
 Retroatividade Ordinária – lei nova respeita os efeitos já produzidos pelos
factos que se destina a regular. Art. 12º/1/2ª parte.

Esquema:

Tipo de realidade jurídica


Aspecto temporal da
cuja regulação no tempo se Lei aplicável (LA ou LN)
realidade jurídica
quer saber:

Art.º 12.º/2 1.ª parte:

 LA continua a regular os
Instantâneos – ocorrem num factos passados
único momento singular (ex. (Sobrevigência da LA).
celebração de um contrato de
CV).
 LN regulará os factos
novos (Aplicação
Imediata da LN)

FACTOS JURÍDICOS
Factos c/ relevância jurídica

Continuados / Complexos de Art.º 12.º/2 1.ª parte:


produção sucessiva – a sua
completude exige a verificação  Aplicação da LN a factos
de um conjunto de acções iniciados no passado, mas
materiais e/ou jurídicas que se que se encontram em
prolongam no tempo; facto formação (Aplicação
iniciado mas não consumado Imediata da LN)
na vigência da LA (ex:
usucapião)
(Nota: um facto continuado só
se torna um facto passado
quando ocorrer o último
momento da sua verificação)

Art.º 12.º/2 1.ª parte:

 Aplicação da LA a efeitos
Instantâneos – a alteração já produzidos
introduzida na ordem jurídica (Sobrevigência da LA).
produz-se num momento
singular (ex: efeito translativo
da propriedade)  Aplicação da LN aos
efeitos que se produzam
sob a sua vigência
(Aplicação Imediata da
LN).

Continuados – perduram no
tempo: situações jurídicas -
EFEITOS JURÍDICOS
na letra do artigo 12.º/2,
Consequência associada à
“relações jurídicas” (ex:
verificação de determinado
efeitos do contrato de
facto jurídico (para todo o
arrendamento):
efeito jurídico há um facto
subjacente) (ex: usufruto)
Se:

i. A LN abstrair dos factos


que lhes deram origem Art.º 12.º/2 2.ª parte:
Aplicação da LN às relações
(abstracção do título
jurídicas já constituídas – a
modelador) efeitos presentes e futuros que
tenham origem em factos
 Efeito não se encontra passados (Aplicação Imediata
modelado pelo facto da LN).
que lhe deu origem;
 Legislador não revalora
facto;
 Lei atende à situação,
seja qual for o facto
que a tiver originado;
ii. LN não abstrai dos Art.º 12.º/2 1.ª parte:
factos que lhes deram
origem (não abstracção  Aplicação da LN
do título modelador) apenas às relações
jurídicas que venham a
 Efeito é moldado pelo ser constituídas por
facto que lhe deu factos novos
origem. Legislador (Aplicação imediata da
“mexe” (revalora) LN)
facto.
 Aplicação da LA às
 Lei regula efeitos com relações jurídicas já
expressão de uma constituídas ao tempo
valoração dos factos da sua entrada em vigor
que lhe deram origem (Sobrevigência da LA)

5. Leis interpretativas (art. 13.º CC):

 Criação de uma nova lei que tem como finalidade interpretar uma lei anterior.

 A lei nova vai produzir os seus efeitos a partir do momento em que a lei
interpretativa entra em vigor (retroatividade agravada).

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