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Baptista Machado- Resumos

Graus de retroatividade:
1. Grau máximo:
Total retroatividade da LN- a LN não respeita as situações definitivamente
decididas por sentença transitada em julgado ou por qualquer outro título equivalente
(sentença arbitral homologada, transação, etc.) ou aquelas causas em que o direito de
ação havia já caducado. A LN não respeita sequer as causas finitas ou semelhantes.
O desrespeito pelo caso julgado anterior poderá ser inconstitucional, na medida em
que viola o princípio da separação de poderes (art.114º, CRP).

2. Grau “médio”:
A LN respeita as causas finitas mas não respeita (tem caráter retroativo) quanto
aos efeitos jurídicos já produzidos no passado não cobertos ou consolidados por
um título equivalente- art.13º,n.º1, CC

3. Grau normal:
A LN não atinge, ficam ressalvados, os efeitos de direito já produzidos antes da
sua entrada em vigor- art.12º,n.º1 2ªa parte, CC

O art.12º,n.º1, 1ª parte, CC comporta o princípio da não retroatividade da LN: a lei só


dispõe para o futuro, quando não lhe seja atribuída eficácia retroativa pelo legislador
(presumindo-se os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular).
No ordenamento jurídico português o princípio da não retroatividade não assume
foros de princípio constitucional a não ser no Direito Penal. Isto significa que o
legislador ordinário não está constitucionalmente impedido de conferir retroatividade
às leis, salvo se através da retroatividade vier a violar direitos fundamentais
constitucionalmente tutelados ou qualquer outro princípio ou garantia constitucional
(art.18º,n.º3; art.103º,n.º3; art.32º,n.º9).
Assim sendo, a LN pode ter eficácia retroativa (2ª parte do mesmo artigo): as leis
interpretativas têm, em regra, caráter retroativo (art.13º,n.º1, CC), ainda com a
exceção no DP e a possibilidade de retroatividade in mitius.

O que é uma lei retroativa?


A doutrina do facto passado é a predominante e mais aceite:
Em princípio, uma LN só se aplicaria a factos futuros (art.12º,n.º1, 1ª parte) mas uma
lei pode ser retroativa como consta na 2ª parte e no art.13º CC.
Uma LN é retroativa se se aplicar a factos passados ocorridos ou a efeitos já produzidos
antes do seu início de vigência.

A LN é retroativa se se reportar a factos constitutivos (modificativos ou extintivos)


passados, anteriores ao seu início de vigência.

Para o professor Baptista Machado a teoria do facto passado devia ser formulada nos
seguintes termos:
A LN não se aplica a factos constitutivos (modificativos ou extintivos) verificados antes
do seu IV; a LN será retroativa sempre que se aplique a factos passados anteriores ao
seu IV por ela definidos como factos constitutivos, modificativos ou extintivos de SJ.
À constituição das situações jurídicas (requisitos de validade substancial e formal,
factos constitutivos) aplica-se a lei do momento em que essa constituição se verifica;
ao conteúdo das situações jurídicas que subsistam à data do início de vigência da LN
aplica-se imediatamente esta lei.
Isto implica que a LN não se aplique a factos constitutivos (modificativos e extintivos)
verificados antes do seu início de vigência- no sentido de que será retroativa sempre
que tal acontecer.
Lei aplicável às situações jurídicas contratuais (“estatuto do contrato”):
Os contratos estão submetidos, em princípio, à lei vigente no momento da sua
conclusão, sendo a lei competente para os reger até à extinção da relação contratual.
Neste caso, haveria um contraste com o princípio da aplicação imediata da LN a
relações em curso: a contratos que se concluíram ao abrigo da LA e que se prolongam
para o início da vigência da LN, aplicar-se-ia a LA.

Doutrina tradicional:
Mediante o surgimento de uma LN, aplica-se a LA (sem se falar em sobrevigência) pois
se se aplicasse a LN estava-se a atentar contra o princípio da autonomia privada: as
partes concluíram o contrato segundo as suas vontades e o legislador não deve
posteriormente intervir e anular o que elas pretendiam com a celebração do contrato.
Estaria a afetar-se a segurança jurídica.
A legislação posterior, a LN que incidisse sobre um contrato, devia ter natureza
supletiva ou interpretativa.

Professor Baptista Machado:


O estatuto do contrato é determinado em face da lei vigente ao tempo da conclusão
do mesmo contrato, portanto aplicar-se-ia a LA.
No entanto, se pode concluir que aos contratos se aplica sempre a LA, sendo possível
admitir a aplicação da LN a um contrato concluído ao abrigo da LA e que se prolongou
para o início de vigência da LN.
Assim sendo, a LN só pode reger os efeitos futuros do contrato quando não se reporte
ao facto da conclusão do contrato: ao dispor sobre o facto de validade do contrato
entende-se que a LN só visa factos novos, aplicando-se a LA (art.12º,n.º2, 1ª parte, CC).
Em que casos então se aplica a LN em matéria contratual?
À partida matéria contratual é sempre LA, exceto em contratos de matrimónio (menos
na parte do regime de bens),em contratos de arrendamento e contratos de trabalho

A LN tem disposições quanto ao conteúdo do contrato (e não à validade) que


conflituam com as cláusulas do contrato celebrado na vigência da LA, podendo aplicar-
se a LN quando:
• Se modifica o estatuto das pessoas e dos bens;
• Definem-se princípios estruturadores da ordem social e económica;
• O legislador procura defender os direitos das pessoas e tutelar a parte mais fraca
no contrato*, devendo expressá-lo se for essa a sua intenção.

*Contratos em que se verifique um grande desequilíbrio entre as partes, em que uma parte impõe cláusulas à outra,
limitando-se a outra a aceitar como contratos realizados com fornecedores de bens essenciais
Retroatividade in mitius:
A retroatividade in mitius é sempre inspirada na ideia de favorecer os interesses dos
particulares, quando um tal favor não ponha em causa a segurança jurídica, ou seja,
não afetando aquele interesse que o princípio da não retroatividade pretende tutelar.
No Direito Penal vigora o princípio da retroatividade in mitius: aplicam-se
retroativamente as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido (art.29º,n.º4,
CRP e art.4º, CP).
Este princípio pode também ser alargado a outros domínios

O que é que acontece aos atos nulos ou anuláveis praticados na vigência


da LA depois de uma LN entrar em vigor aligeirar requisitos de validade
formal ou substancial?

Lei confirmativa e retroatividade in mitius expressa:


Se a LN dispuser que se consideram válidos os atos jurídicos nulos e anuláveis que,
praticados na vigência da LA, preenchem os requisitos de validade determinados pela
LN que os irá confirmar

E se a lei não conter uma disposição confirmativa dos atos anteriores?


Doutrina clássica:
A LN pode ser menos exigente quanto aos requisitos de validade formal ou substancial
de um ato jurídico do que a LA, mas só visa factos novos- sobrevigência da LA,
art.12º,n.º2, 1ª parte, CC.

Baptista Machado:
Há retroatividade in mitius tácita quando a LN for mais favorável aos interesses do
particular sem prejuízo do interesse de uma contraparte ou de terceiros
MTS:
Se o ato jurídico não estiver a produzir quaisquer efeitos no momento da entrada em
vigor da LN, há que aplicar o disposto no art.12º,n.º2, 1ª parte, CC não se verifica
qualquer retroatividade in mitius da LN.
No entanto, se o ato jurídico (inválido na vigência da LA) estiver a produzir efeitos no
momento do IV da LN , há que entender que esta lei produz um efeito confirmativo do
ato inválido e verifica-se uma retroatividade in mitius da LN.
Retroconexão:
A LN regula factos presentes ponderando factos passados, usando como elementos de
previsão factos passados
O seu âmbito de aplicação reporta-se a factos anteriores antes do IV da LN, abstraindo
do título constitutivo, com o objetivo de definir o presente

Factos pressupostos:
A LN atende a factos passados sem que se possa falar em retroatividade da lei, ou seja,
pode atender a factos que são pressupostos da constituição de situações jurídicas: são
factos anteriores a um facto constitutivo, modificativo ou extintivo a verificar-se no
período de vigência da LN.
Estes podem ser impeditivos, não permitindo a constituição de uma nova SJ pois é
inválida, ou desimpeditivos, permitindo a constituição e validade da SJ.
Um facto pressuposto é, assim, um facto que é usado pela lei como ponto de referência
para definir o regime jurídico de uma situação que durante a sua vigência é criada;
consideram-se os factos passados para se determinar a validade de factos
constitutivos, modificativos ou extintivos presentes.

Na retroconexão a LN atende a factos pressupostos do passado que auxiliam na


determinação do regime dos factos constitutivos do presente, que essa LN visa regular.

Exs: impedimentos patrimoniais, causas de indignidade sucessória, inibição do poder


paternal
Pode ser total quando o facto ou efeito que serve de previsão da LN já se verificou
totalmente no passado antes do seu IV
Ou
Pode ser parcial quando a previsão da LN engloba quer factos ou efeitos verificados na
vigência da LA, quer factos ou efeitos que se verificaram na vigência da LN.

A retroconexão conduz à aplicação da lei existente no momento da verificação dos


factos constitutivos:
Aplicação imediata da LN para o professor Miguel Teixeira de Sousa (art.12º,n.º1, 1ª
parte)
Aplicação imediata da LN para o professor Baptista Machado (art. 12º,n.º2, 2ª parte
CC)

NOTA: estes factos não podem ter um valor constitutivo; não está em causa a
validade ou os efeitos do facto passado está sim a definição da amplitude de um
efeito presente
Leis interpretativas

A lei interpretativa é aquela que realiza a interpretação autêntica de um ato


normativo, o que pressupõe o caráter interpretativo (não inovatório) daquela lei.
Segundo o art.13º,n.º1, CC a lei interpretativa integra-se na lei interpretada, ou seja,
ficciona-se que o significado estabelecido pela lei interpretativa coincide com o único
significado que a lei interpretada sempre comportou→ a lei interpretativa é uma lei
retroativa

No entanto, nos casos em que esteja excluída a retroatividade não pode haver lei
interpretativa retroativa.
A retroatividade da lei interpretativa não atinge todos os efeitos e factos passados
antes do seu IV, art.13º,n.º1, CC.

A lei pode ser qualificada pelo legislador como interpretativa e vir a verificar-se que,
afinal, ela tem um conteúdo inovador. Nesta hipótese, a lei é falsamente interpretativa
(lei inovadora), onde para o professor Baptista Machado há um disfarce da
retroatividade da LN.
No entanto, salvo questões de inconstitucionalidade, deve-lhe ser atribuída a
retroatividade estabelecida no art.13º,n.º1, CC.

Lei verdadeiramente interpretativa:


Leis que sobre pontos ou questões em que as regras anteriores são incertas ou
controversas, vêm consagrar uma solução que os tribunais poderiam ter adotado.
A solução da LN interpretativa tem que se situar dentro dos quadros da controvérsia e
procurar resolvê-la, de modo a que o intérprete pudesse chegar à solução sem
ultrapassar os limites normalmente impostos à interpretação e aplicação da lei.
Critério supletivo especial

O art.297º CC só é aplicável aos prazos que estejam em curso no momento da entrada


em vigor da LN. A LN pode estabelecer um prazo mais curto ou mais longo.
Os prazos podem ser fixados por lei, pelos tribunais ou qualquer outra autoridade
(n.º3)

Diminuição do prazo→ se a LN estabelecer um prazo mais curto que a LA


(297º,n.º1, CC):
➢ A LN é imediatamente aplicável aos prazos que já estiverem em curso e conta-
se o prazo a partir do IV da LN;
➢ Sobrevigência da LA se faltar menos tempo para o prazo se completar do que o
fixado pela LN.
Em conclusão: aplica-se o prazo mais curto

Duas hipóteses, MTS:


Se a aplicação imediata do prazo mais curto criar um desequilíbrio entre as partes, no
sentido de que uma é beneficiada em detrimento da outra, aplica-se o art.297º,n.º1,
CC.
Por outro lado, se a aplicação imediata do prazo mais curto não originar nenhum
desequilíbrio entre as partes, porque qualquer uma delas beneficia com o prazo mais
curto, a solução é a aplicação imediata da LN segundo o art.12º,n.º1,1ª parte, CC.
Baptista Machado:
Se a LN vem encurtar um prazo em certos casos deve contar-se um novo prazo a partir
do IV da LN, com a ressalva da parte final do art.297º,n.º1, CC.

A LN altera o prazo a partir do qual se começa a contar:


Se o referido momento inicial for antecipado pela LN aplica-se o art.297º,n.º1
Se o momento inicial for postcipado aplica-se o art.297º,n.º2

Aumento do prazo→ a LN fixa um prazo mais longo do que o definido pela LA


(297º,n.º2, CC):
Aplicação imediata da LN aos prazos em curso (12º,n.º1,1ª parte), computando-se o
tempo já decorrido desde o início da contagem do prazo; retroconexão parcial

Restrições
MTS:
O art. 297/1 e 2 CC não é aplicável aos prazos definidos pelas partes ou quando estas
não tenham estipulado quaisquer prazos e tenham aceite os prazos legais supletivos
(ex: 453/1 e 929/1 CC). Aí aplica-se a LA: o conteúdo das situações decorrentes de
negócios jurídicos não abstrai do respetivo título constitutivo, sendo aplicável o
art.12º, n.º2, 2ª parte, CC (sobrevigência da LA).

Baptista Machado:
Se a LN estabelecer pela primeira vez um prazo este só deve ser contado a partir do
seu IV.
O art.297º CC só se aplica a factos constitutivos, excluindo-se os factos pressupostos e
as presunções legais

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