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FACULDADE DE GESTÃO DE RECURSOS FLORESTAIS E

FAUNÍSTICOS
Disciplina de Direito de Energia: Gás e Petróleo
Mestrado em Direito Administrativo

DIREITO FUNDAMENTAL SOCIAL E ACESSO A ENERGIA


ELECTRICA

Clesia Baptista Jauado Wailesse Adriano

Lichinga, 01 de Março

Lichinga, Maio 2023


Índice
1. RESUMO: ............................................................................................................................ 3
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 4
CAITULO I: Marco teórico .......................................................................................................... 5
2. Electrificação Rural/direito fundamentais ........................................................................ 6
2.1. Conceitos gerais da electrificação rural Conceito ............................................................. 6
2.2. Impacto da eletrificação rural ........................................................................................ 7
2.3. Electrificação rural e o desenvolvimento ...................................................................... 8
Desflorestação ............................................................................................................................... 9
CAPITULO II. FUNDAMENTOS PARA INCLUSÃO DO ACESSO À ENERGIA
ELÉTRICA NO ROL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS .................................... 10
2.4. Cláusula aberta dos direitos fundamentais ................................................................. 10
2.5. Princípio da dignidade de pessoa humana .................................................................. 10
2.6. Mínimo Existencial ou mínimo essencial a existência digna...................................... 11
CAPITULO II: Políticas da Electrificação em Moçambique ...................................................... 13
2.7. Papel do Governo .......................................................................................................... 13
2.8. A Importância do FUNAE ............................................................................................ 13
2.9. Electrificação de distritos e postos administrativos através de grupos geradores .. 14
2.10. Criação de pequenas centrais mini-hídricas ........................................................... 14
2.11. Prioridades e Desafios ............................................................................................... 14
2.12. Os três principais grupos alvos são: ........................................................................ 15
2.13. Quanto a competência: artigo, 4 n 2, do Decreto n.º 93/2021 de 10 de Dezembro.
17
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................ 18
4. Referencia Bibliografia ..................................................................................................... 19

2
1. RESUMO:

O presente trabalho aborda aspectos doutrinários que conduzem ao entendimento do


acesso à energia eléctrica como direito fundamental social, tais como dignidade da
pessoa humana, mínimo existencial e abertura constitucional a direitos não tipificados.
A temática demonstra relevância dentro de um quadro de evolução das demandas
sociais, de modo a aumentar o grau de exigência dos direitos mínimos para que se
viva com dignidade. Desse modo, após a abordagem dos fundamentos para que se
inclua o acesso à energia eléctrica no rol dos direitos fundamentais sociais
moçambicanos, passa-se a análise sob uma perspectiva prática, por meio de
jurisprudências do Superior Tribunal de Justiça. Para, por fim, concluir pela
existência de um direito fundamental social não tipificado, o acesso à energia eléctrica,
contudo, direito esse sem efectividade.
Em suma, a Energia assume um papel decisivo no desenvolvimento de qualquer
sociedade. Na verdade, a prosperidade humana sempre esteve intimamente ligada à
capacidade de aprovisionamento e aproveitamento da energia, pelo que, o uso
amplamente disseminado de energia é a razão fundamental para centenas de milhares de
pessoas gozarem um alto padrão de vida.

Palavras-chave: acesso à energia eléctrica; dignidade da pessoa humana; mínimo


desflorestamento; direitos fundamentais.

3
1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho esta subordinar ao tema, acesso à energia eléctrica como direito
fundamental, o nosso país possui uma matriz energética que lhe confere uma posição
importante no mercado energético regional e global. é o casa do Carvão Mineral, a
Energia Eléctrica, o Gás Natural e Petróleo, correspondem a fontes renováveis e não
renováveis de recursos energéticos abundantes e em quantidades comercializáveis
internacionalmente, estimadas em cerca de 200 tcf em reservas de Gás Natural entre
2010 a 2014. O valor destes recursos é altamente lucrativo e transmite uma percepção
de poder do Estado, pela capacidade de influência que estes recursos podem jogar na
região e no mundo. Contudo, Moçambique continua dependente energético de outros
Estados da região e do Mundo.1 O acesso à energia eléctrica pode constituir-se em
direito fundamental social dada à conjuntura actual da sociedade moçambicana.
De salientar que estudo tem por objectivo delimitar as bases que conduzem ou não a
inserção e avaliação do acesso à energia eléctrica como um direito fundamental
social aos moçambicanos. Para tal Utilizou-se o método de abordagem dedutivo, de
modo a levantar premissas básicas que conduzem a conclusão única ou seja,
fundamentos que conduzem a interpretação sobre a necessidade ou não de inclusão do
acesso à energia eléctrica no rol dos direitos fundamentais. utilizou-se da pesquisa
bibliográfica, para o fim de dar fundamentos para o que se pretende enfrentar e
análise jurisprudencial, ao passo em que se buscou aproximar o debate a realidade
fáctica, bem como analisar qual o panorama actual sobre o tema em alusão.
A Energia é uma fonte básica e uma componente de todos os processos produtivos. e é
essencial para o desenvolvimento da nossa pátria amada. As fontes de energia
melhorada podem contribuir de forma signicatica o nível de bem-estar, aumentar o
padrão de vida e libertar as pessoas da escuridão e do isolamento. A ONU estima que
desde o ano 2012, existem 1.4 biliões de pessoas no mundo inteiro que carecem de
acesso a energia eléctrica, cerca de 85% das quais nas zonas rurais, enquanto 2.7
biliões de pessoas usam formas tradicionais de combustíveis de biomassa para
aquecimento e iluminação e a sua própria energia metabólica para tarefas mecânicas.
Em muitas regiões, é difícil encontrar biomassa lenhosa e as pessoas tendem a usar
biomassa de qualidade pobre.

1
Zeca et al 2016, p. 161, Hoffmann e Martins 2012, p. 1

4
CAITULO I: Marco teórico

O Direito da Energia emergiu na Europa, no final do Século XIX, a partir de um


problema que hoje os juristas chamam de colisão de preceitos fundamentais. Naquele
contexto histórico de liberalismo político e econômico, a propriedade privada era
entendida como uma garantia fundamental. Mas ao mesmo tempo e sob o pano de fundo
de um deslumbre diante dos avanços tecnológicos da ciência positivista –, a energia
elétrica encontrou uma rápida absorção na economia. Sob um clima de otimismo
tecnológico, o problema que se colocava em termos jurídicos era, então, o de como
satisfazer o direito à livre iniciativa dos empreendimentos de eletricidade e a demanda
crescente de energia elétrica se, ao mesmo tempo, a satisfação dessa demanda exigia a
violação do direito de propriedade para a passagem de linhas de transmissão de energia?
Do final do Século XIX até a primeira década do Século XX, todos os esforços da teoria
jurídica foram concentrados no sentido de estabelecer as condições legais sob as quais a
violação do direito de propriedade privada, pela passagem das linhas de transmissão de
energia elétrica, não caracterizaria uma violação. 2 . Esse mesmo esforço da teoria
jurídica aparece também em Mocambique no início do Século XX .3

O objetivo do Direito da Energia, é o de justificar procedimentos legais que legitimam


exceções à propriedade privada, à liberdade individual e à inviolabilidade do domicílio.
Daí o interesse generalizado dessa doutrina em afirmar a natureza jurídica de direito
público das instalações elétricas, para conectá-la ao interesse público que logo se
sobrepõe ao particular. Decorrência dessa construção são as servidões de passagem
como meios de instrumentalização jurídica da necessidade de restringir direitos de
propriedade para a passagem de redes de energia; as concessões públicas para o
exercício da livre iniciativa em empreendimentos de energia elétrica; bem como
questões ligadas a tarifas e tributos sobre a energia, contratos de compra e venda,
responsabilidade civil por danos decorrentes de eletrocussão, além de discussões sobre a
natureza jurídica da energia elétrica para fins de tipificação penal do furto. Toda
discussão da doutrina jurídica, aqui, ressalta, na forma da necessidade de se
assegurarem os direitos à propriedade privada, à liberdade, à inviolabilidade do
domicílio e etc., as condições jurídicas para excepcionar esses direitos.

2
Istel & Lémonon, 1914, p. 261
3
Mendonça, 1939, p. 5; Valladão, 1904, p. 5

5
2. Electrificação Rural/direito fundamentais

2.1.Conceitos gerais da electrificação rural Conceito

A electrificação rural é o conjunto de actividades concebidas para proporcionar energia


eléctrica a habitantes de zonas com características específicas, incluindo nos seus
recursos pequenas cargas de energia e a criação de oportunidades específicas nestas
áreas. O método de fornecimento de energia eléctrica a estas zonas varia e pode incluir
geradores isolados que servem a consumidores colectivos ou individuais. Contudo, a
variação destes métodos é dependente das circunstâncias locais e do grau de saturação
do fornecimento da electricidade.4
A electrificação das zonas rurais nos países em desenvolvimento é complexa e requer
uma grande quantidade de competências e equipamentos específicos. Os objectivos, o
planeamento, a realização e a operação de projectos de electrificação rural não podem
ser separados de problemas como a pobreza, as preocupações de degradação ambiental,
o desenvolvimento rural e as necessidades de energia em geral (Zomers 2001).

Os direitos fundamentais constituem-se como tais ao passo que são positivados na


ordem vigente, ressaltando que a positivação jurídico-constitucional não dissolve nem
consome quer o momento de jusnaturalização quer as raízes fundamentantes
dos direitos fundamentais (dignidade humana, fraternidade, igualdade, liberdade).5
O autor salienta ainda que, direitos fundamentais dá-se na medida em que são
inseridos no texto constitucional, pois apenas desse modo esses direitos possuem a
positivação que possibilita com que sua violação ou negligência possuam
consequências jurídicas, deixando de serem, como denomina o autor, meras
expectativas ou aspirações de direitos. Para o autor
a positivação dos direitos fundamentais significa a
incorporação na ordem jurídica positiva dos direitos
considerados naturais e inalienáveis do indivíduo. Não basta
uma qualquer positivação. É necessário assinalar-lhes a
dimensão de direitos fundamentais colocados no lugar
cimeiro das fontes do direito: as normas constitucionais.6

4
Zomers, 2001.
5
CANOTILHO, 2003, p. 378
6
CANOTILHO, 2003, p. 377-378)

6
Os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou
seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas
liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez
por todas”.7
Esse tópico irá dedicar-se ao estudo dos direitos fundamentais sociais, que como já
narrado anteriormente pertence aos chamados direitos de segunda geração, ou seja,
aqueles surgidos com o fracasso do Estado Liberal e advento do Estado Social, e
Englobam direitos económicos, sociais e culturais, ou seja, são direitos que visam
proporcionar o bem comum entre os cidadãos por meio da intervenção efectiva do
Estado.8
Concordo com a interpretação de Bonavides, entende-se que a incorporação de novos
direitos aos direitos fundamentais, não excluem os anteriores, mas os complementam
de forma a garantir a própria efectividade dos direitos anteriores. Ou seja, não
apenas expressam os novos padrões sociais com suas novas demandas, mas surgem de
forma a auxiliar na promoção da igualdade real, emergem como auxiliares a
materialização dos velhos direitos fundamentais. Sendo assim, podemos compreender
que:

A importância funcional dos direitos sociais básicos,


consiste pois em realizar a igualdade na Sociedade
igualdade niveladora, volvida para situações humanas
concretas operada na esfera fáctica propriamente dita e não
em regiões abstractas ou formais de Direito.9
2.2.Impacto da electrificação rural
Um dos principais objectivos da electrificação rural passa pela busca do
desenvolvimento económico com vista ao crescimento da produção agrícola, devendo
ser avaliada de forma diferente e por razões de natureza puramente social. Os objectivos
sociais da electrificação rural são dirigidos para a melhoria das condições de vida da
população rural, incluindo a criação de condições adequadas para a educação e saúde. 10
O impacto da electrificação rural ultrapassa as fronteiras físicas locais, proporcionando
benefícios de carácter social e ambiental, altera hábitos locais, melhora a condição de

7
Norberto Bobbio (2004, p. 05)
8
Bonavides, 1998, p. 343
9
BONAVIDES, 1998, p. 343
10
Zomers 2001,

7
vida das populações, impulsiona a indústria e dinamiza o comércio local. Com a
chegada da electricidade junto das comunidades rurais provoca consideráveis
modificações permitindo que a população tenha acesso a serviços sociais básicos, tais
como, fornecimento de água potável, saneamento, educação e sistemas de comunicação,
implicando uma modernização das zonas rurais e levando a um aumento substancial da
melhoria da vida das populações. 11
Contudo a electrificação substitui as fontes de energia primitivas, proporcionado a
preparação de alimentos através de fogões eléctricos e reduz drasticamente o uso de
biomassas para confecção de alimentos. Por um lado os habitantes passam a ter tempos
livres para descanso abdicando de actividades fisicamente mais dispendiosa. Deste
modo são relegadas as actividades duras provocadoras de grande dispêndio de força e
de tempo. Por outro lado com o surgimento de água potável pode-se desenvolver o
sistema de bombeamento de água impulsionada pela electricidade.

Em suma, com energia eléctrica criam-se condições para o melhoramento da saúde de


vida da população com a construção de postos de saúde locais equipadas com
tecnologias necessárias; o nível de analfabetismo é colmatado com a construção de
novas escolas de ensino nocturno passando a população disponível a dedicar-se
exclusivamente ao trabalho do campo e domestico durante o dia. Assim como, combate
os fenómenos de migração êxodo-rural diminuindo a saída da população jovem destas
zonas para cidade mantendo assim uma força de trabalho importante nas zonas rurais.
Os habitantes passam a ter acesso a informação actualizada através do uso da televisão
e da rádio, a distância física entre as famílias torna-se reduzida com o acesso aos
serviços telefónicos, inicialmente não residências, com a instalação de telefones
públicos em locais estratégicos.

2.3.Electrificação rural e o desenvolvimento


Proporcionar acesso a serviços energéticos não implica por si só, o desenvolvimento
económico. Estudos mostram que o impacto da electrificação rural sobre o
desenvolvimento económico é muitas vezes fraco, e, ainda salienta que electrificação
não inicia o desenvolvimento, mas melhora o desenvolvimento já existente na
comunidade.12

11
Oliveira 2000
12
Para Ahlborg (2012),

8
Para tal, é necessário colocar a questão da relação causal entre o consumo da
electricidade e o crescimento económico desta comunidade, ou seja, é o consumo de
electricidade que estimula o crescimento económico ou é este que estimula o consumo
de electricidade? Vários estudos empíricos chegaram à conclusão de que o consumo de
electricidade provoca crescimento económico, embora esta relação causal não seja
consistente em todos os países.13
Na minha visão periférica, A energia eléctrica é essencial
ara o desenvolvimento da comunidade, sem recursos
energéticos suficientes e adequados, os países em
desenvolvimento não são capazes de promover o
desenvolvimento social e económico que são cruciais
para o crescimento sustentado.

2.4.Desflorestação
Com a electrificação das zonas rurais baseada em fontes de energias renováveis serve
também como um mecanismo de protecção das florestas e contribui directa e
indirectamente na luta contra a poluição ambiental. Sendo assim, podemos afirmar que
existe uma relação de eficiência e eficácia entre o desenvolvimento dos projectos de
desenvolvimento rural e o impacto positivo que a mesma tem sobre o meio ambiente.
A desflorestação é uma preocupação ambiental. Na realidade a perda de florestas
contribui para a fragmentação ou destruição de habitat sendo, assim, é um factor
importante na extinção de espécies. Muitas vezes degrada a qualidade da água, e é uma
das formas visíveis da mudança ambiental.14

13
Eggoh, 2011
14
Environmental Trends, 2012

9
CAPITULO II. FUNDAMENTOS PARA INCLUSÃO DO ACESSO À
ENERGIA ELÉTRICA NO ROL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS
2.5.Cláusula aberta dos direitos fundamentais

Como definição inicial se pode apontar a cláusula de abertura constitucional como


um instituto que permite a inclusão de directos fundamentais não tipificados ao rol de
direitos a serem tutelados pela CRM. Desse modo, tal instituto, permite que direitos
fundamentais tenham o tratamento ou tutela adequada por parte do Estado, mesma
tutela prestada aos direitos fundamentais já positivados, mesmo quando não
estiverem expressos no texto constitucional. Tal possibilidade emerge por meio do
artigo 42º, § 43º da Constituição Moçambicana, que dispõe no seguinte sentido:
Os direitos fundamentais consagrados na constituição não excluem quaisquer outros
constantes das leis.15

2.6.Princípio da dignidade de pessoa humana

Em um primeiro lugar vale ressaltar que este estudo dedica-se aqui ao estudo da
composição e da vinculação deste princípio com o texto constitucional pátrio. De tal
sorte, Jorge Miranda ensina que a unidade valorativa do sistema constitucional
Português como do Moçambicano, repousa na dignidade da pessoa humana, ou seja,
na concepção que faz da pessoa fundamento e fim da sociedade e do Estado.16
No contexto Moçambicano, o legislador constituinte deixou claro o
comprometimento do Estado Democrático de Direito com tal princípio em assegurar
o exercício dos direitos sociais e individuais de forma igualitária evidenciou o
compromisso do Estado com a dignidade da pessoa humana, haja vista a íntima
relação que guarda tal princípio com o exercício desses direitos. Porém, esse
compromisso inicial seria insuficiente, ou ineficaz, se não houvesse dispositivos no
corpo do texto constitucional explicitando sobre como se daria esta protecção
constitucional a tal princípio, conforme já tratado anteriormente sobre a
importância da positivação dos direitos para que se revistam de eficácia jurídica.17

O legislador incluiu, ainda, no art. 40º da CRM, inseriu em nossa carta magna um
conjunto razoável de direitos que circundam directamente a órbita do direito à

15
Vede o artigo 42 a 43 da CRM.
16
MIRANDA, 2000, p.180
17
Vide o art, 3 da CRM.

10
dignidade, como a protecção à vida, expressa pelo art. 40º, o direito à integridade
física, psíquica e moral, vedação às penas de morte, perpétuas ou cruéis.18 É diante
desse contexto que emerge a necessidade de discriminar quais os direitos que se
constituem em direitos mínimos para assegurar uma vida digna, surgindo o conceito do
chamado mínimo existencial. Sobre tal conceito destinar-se-á o tópico a seguir, com
vista às implicações relevantes de suas definições para a efectividade do princípio da
dignidade da pessoa humana.

2.7. Mínimo Existencial ou mínimo essencial a existência digna

Sobre a necessidade de discriminação do que se constitui em direitos mínimos, é


necessário fazê-lo levando em consideração o panorama actual da sociedade
Moçambicana. Ou seja, a definição do que se constitui em mínimo existencial deve
ser balizada dentro das demandas sociais de nossa época, considerando que a constante
evolução tecnológica e social requer uma permanente actualização das demandas
sociais para uma vida digna, conforme já abordado sobre a historicidade dos direitos
fundamentais.
Desse modo, indispensável tecer algumas observações prévias sobre a inclusão da
energia eléctrica no rol de direitos indispensáveis para a vida do homem pós-moderno.
De tal modo, inegável que a vida contemporânea oferece diversos aparelhos
electrónicos que se tornam indispensáveis para uma vida com um mínimo de conforto
e em alguns casos com um mínimo de dignidade, é o caso, por exemplo, do
chuveiro eléctrico; das lâmpadas eléctricas para os estudantes, e da geladeira para
aqueles que precisam guardar seus remédios em temperaturas baixas.
Diferentemente do que a priori pode parecer, o uso desses equipamentos não se
constituem em luxo há bastante tempo, ou ainda, em aparelhos que possam ser
dispensados sem afronta a dignidade da pessoa humana.
Para elucidar tal situação se pode pensar em uma família, cujos filhos necessitam
fazer os deveres escolares e sua casa não possui energia eléctrica para ligar uma
lâmpada, ou ainda, em um dia de inverno não possuir meios de ligar um chuveiro
eléctrico, ou não possuir meios de ligar o refrigerador para guardar os alimentos.
Nessa senda, cabe a análise do que podemos chamar de mínimo existencial. Contudo,
a definição do que se constitui em mínimo existencial deve ser balizada, como já

18
VIEIRA, 2006

11
suscitado, dentro do contexto social de nossa época, considerando que a constante
evolução tecnológica e social requer uma permanente actualização. Assim, no
contexto global atual deve-se compreender que o direito ao mínimo existencial
não pode ser reducionista, cabendo-lhe garantir apenas um mínimo dos mínimos
deve, pelo contrário, ser amplo o suficiente para 2009), abarcar todas as necessidades
básicas, ou seja, assegurar também os meios para que as necessidades básicas sejam
satisfeitas.19
O direito ao mínimo existencial, em síntese, é o núcleo
essencial dos direitos fundamentais ancorados nos princípios
da dignidade da pessoa humana e do Estado Democrático de
Direito e na busca pela felicidade. Após a reserva do
mínimo existencial, que garante a igualdade de chances, é
que se iniciam a acção da cidadania reivindicatória e o
exercício da democracia deliberativa, aptos a assegurar os
direitos sociais prestacionais em sua extensão máxima, sob a
concessão do legislador e sem o controle contra-maioritário
do judiciário.
Assim, ocorre que todas as necessidades básicas do ser humano para manter-se de
forma digna devem ser percebidas como mínimas, devem ser livres da intervenção do
Estado na via dos tributos, e exigem ainda uma prestação positiva do Estado para sua
manutenção.
Para Ana Paula Barcelos o chamado mínimo existencial, formado pelas condições
materiais básicas para a existência, corresponde a uma fracção nuclear da dignidade da
pessoa humana à qual se deve reconhecer a eficácia jurídica positiva ou simétrica.20

É diante dessa conjuntura narrada que nos surge a necessidade de incluir o acesso à
energia eléctrica como um direito a ser assegurado para a manutenção de uma vida
digna. Pois tal direito é de vinculação directa com a concretização de outros direitos
fundamentais já positivados, (como por ex. vida digna, saúde, educação e outros),
constituindo -se, desse modo, em parte integrante de um mínimo existencial para a
efetivação da vida digna.

19
TORRES, 2009
20
BARCELLOS, 2008, p.278

12
CAPITULO II: Políticas da Electrificação em Moçambique
2.8.Papel do Governo
O Governo Moçambicano está empenhada em expandir o acesso à electricidade a todo
povo Moçambicano, e pretende atrair a participação do sector privado na electrificação
rural através de energias renováveis. Os operadores privados são estimulados a fazer
investimentos para o desenvolvimento de um mercado de energia renovável, que irá
contribuir para melhorias em sectores produtivos e sociais e na qualidade de vida das
comunidades rurais.21
Para tal, o governo Moçambicano deve definir políticas e estratégias para o sector de
energia, trabalhando e obtendo fundos junto dos seus parceiros internacionais. Para a
execução e avaliação do cumprimento dos seus planos estratégicos no sector de energia,
o governo converge as suas políticas com os planos estratégicos de algumas entidades a
si subordinadas, destacar a importância fundamental do FUNAE – Fundo Nacional de
Energia. A mesma surge como o maior parceiro nacional do governo na execução de
certas políticas no sector das energias, integrando a electrificação rural no seu plano
estratégico desta entidade.
2.9.A Importância do FUNAE, criado pelo Decreto n .º 24/97, de 22 de Julho
A FUNAE tem sido o um dos mais importantes parceiros do governo na promoção das
políticas energéticas, especialmente a electrificação rural, procurando aumentar o acesso
aos serviços de energia, promovendo a qualidade de vida das populações. As áreas de
actuação da FUNAE centram – se nos seguintes aspectos:
➢ Electrificação dos distritos, postos administrativos, escolas e postos de saúde
através sistemas fotovoltaicos;
➢ Electrificação de distritos e postos administrativos através de grupos geradores,
reabilitação e extensão da rede;
➢ Construção de bombas de combustíveis nos distritos e postos administrativos;
Construção de pequenas centrais mini ou micro hídricas;
➢ Promoção de uso de tecnologias de biomassa nos seguintes domínios. Como é o
caso de:
✓ Fogões e Fornos melhorados
✓ Plataformas multifuncionais
✓ Substituição de combustíveis
✓ Demonstração de tecnologias de biomassa

21
MEM (2011).

13
De salientar que, Governo implementou também Política no Sector de Eléctrico a saber:
➢ Aumentar o acesso da população à energia limpa e moderna.
➢ Expandir a cobertura da rede eléctrica nacional.
➢ Melhorar a eficiência do sector energético.
➢ Promover a participação do sector privado na área de energia
➢ Aumentar a disponibilidade de energia eléctrica a preços competitivos, para o
desenvolvimento industrial.
➢ Expandir as infra-estruturas energéticas para maximizar os benefícios
decorrentes da cooperação no âmbito da SAPP.
➢ Promover práticas ambientalmente sustentáveis.22

2.10. Electrificação de distritos e postos administrativos através de grupos


geradores
Este sistema, adicionado a reabilitação e extensão de rede tem impactos a níveis
económicos e sociais para a população através da criação de condições para iluminação,
conservação de alimentos, funcionamentos de vários electrodomésticos, e outros tipos
de equipamentos e máquinas. Estes projectos dinamizam a economia local, promovendo
um mercado de bens essências motivados pela existência da electricidade nestas zonas,
flexibilizando novas formas de comércio.

2.11. Criação de pequenas centrais mini-hídricas


Há uma necessidade incentivar a construção e de reabilitação das pequenas centrais
hidroeléctricas com o objectivo de aumentar a electrificação nas zonas rurais a fim de
melhorar o nível de vida das populações.
2.12. Prioridades e Desafios
➢ Promover o desenvolvimento das infra-estruturas de transporte de energia,
incluindo a interligação com os países vizinhos, para estimular investimentos na
produção e na indústria de consumo energético intensivo;
➢ Garantir um Quadro Legal moderno e assegurar a sua actualização constante
para responder às exigências de cada momento;
➢ Assegurar uma capacidade institucional para melhorar cada vez mais a eficiência
do sector;

22
Vide o artigo , 5 da lei 21/97 de 1 de outubro

14
➢ Assegurar o funcionamento pleno do Conselho Nacional de Electricidade, com
entidade reguladora do sector eléctrico, por forma a responder com eficácia às
exigências dos diferentes intervenientes.
➢ Identificar possíveis mudanças que propiciem uma maior participação privada
no fornecimento de energia eléctrica;
➢ Identificar mudanças necessárias no processo de contratação em vigor em
Moçambique, de modo a permitir a rápida implementação dos projectos de
geração de electricidade, em particular para abordar crise energética mantendo,
no entanto, os altos níveis de conduta e de boa governação;
➢ Identificar alterações no processo de atribuição de concessão para o
fornecimento de energia eléctrica (geração, transmissão, distribuição,
comercialização, incluindo importação e exportação de energia eléctrica)
necessárias para acelerar uma rápida implementação dos mesmos;
Perante esta situação, novos estudos mostram que as famílias sem acesso à electricidade
atingem níveis de educação mais baixos, enfrentam maiores riscos de saúde respiratória
devido aos fogos de cozinha doméstica, e têm um potencial de rendimentos limitado
devido à baixa produtividade económica em comparação com as famílias com
electricidade. Para pôr fim a esta divisão rural ou urbana é o de electrificar todas as
casas das famílias moçambicanas de acordo com a meta de 2030 estabelecida pelo
nosso Governo, ara tal, são necessários investimentos estratégicos dentro e fora da rede,
reforma legal ou regulamentar, investimento privado em larga escala e uma estratégia
clara fora da rede. Para fazer face a este desafio, a USAID, através do Projecto SPEED
e Power Africa, e em coordenação com outros parceiros de desenvolvimento,
disponibilizou apoio financeiro ao GRM destinado às visitas técnicas aos locais pelos
funcionários e assistência técnica para a elaboração da Lei da Electricidade
recentemente aprovada. Espera-se que esta nova lei acelere o acesso das famílias
moçambicanas à energia, em grande parte através da melhoria do ambiente favorável ao
investimento do sector privado na produção de energia. Isto significa que Albertina
poderá armazenar mais produtos na sua loja e obter mais rendimentos para a sua
família, enquanto contribui para uma melhor nutrição para a sua comunidade.

2.13. Os três principais grupos alvos são:


➢ Panificadores do sector de energia e gestores de projectos com conhecimento ou
antecedentes na área de tecnologia, que reconhecem a necessidade da

15
abordagem das questões do Género no seu trabalho e interessados em saber
como proceder neste sentido;
➢ Planificadores do desenvolvimento no geral e particularmente especialistas de
Género, que reconhecem que a Energia pode ser uma componente básica no
processo de desenvolvimento, mas que não têm, a certeza sobre como integrá-la
noutros aspectos do seu trabalho;
➢ Pontos Focais do Género – Há cada vez mais organizações que designam
indivíduos para assumirem responsabilidade pela integração de aspectos de
Género nas suas organizações. Este manual apresenta ideias e orientação sobre
como é que um ponto focal pode atingir os seus objectivos.

2.14. Visão, Missão e Princípios da Estratégia


Visão
Assegurar a disponibilidade de energia a nível nacional para responder aos desafios do
desenvolvimento socioeconómico sustentável.
Missão
Criar condições para aumentar o acesso a formas de energia diversificadas, de modo
sustentável, contribuindo para o bem-estar da população e o desenvolvimento
socioeconómico do País.
Princípios
A Estratégia define as linhas de orientação política e medidas de maior relevância para a
área da energia, tendo como princípios:

➢ O aumento sustentado do acesso à electricidade e aos combustíveis;


➢ O uso sustentável da biomassa lenhosa;
➢ A disseminação das energias novas e renováveis;
➢ A diversificação da matriz energética;
➢ O estímulo da produção sustentável de bio-combustíveis com base em
recursos energéticos locais para substituição dos combustíveis importados;
➢ A planificação integrada das iniciativas energéticas com os programas de
desenvolvimento de outros sectores;
➢ O desenvolvimento sustentável e preservação do meio ambiente;
➢ A adopção de regimes tarifários que reflictam custos reais, incluindo os da

16
mitigação de efeitos ambientais adversos;23
2.15. Quanto a competência: artigo, 4 n 2, do Decreto n.º 93/2021 de 10 de
Dezembro.
Compete à entidade responsável pela implementação de actividades de electrificação
nas zonas fora da rede:
a) Promover e implementar o desenvolvimento de empreendimentos e soluções de
aproveitamento de energia que contribuem para o aumento do acesso à energia nas
zonas fora da rede;
b) Construir infra-estruturas para o fornecimento de energia eléctrica nas zonas fora da
rede, focadas nas actividades para fins sociais; e
c) Recolher e sistematizar os dados, para o cadastro energético, relacionados com as
zonas fora da rede e zonas rurais, incluindo os serviços energéticos.
Ao abrigo do nº 1 do artigo 160º da Constituição da República, passando o Ministério
de Energias foram atribuídas competências na área da energia eléctrica: assegurar a
electrificação rural, no domínio das energias renováveis, aproveitamento dos recursos
hídricos, dos recursos renováveis e não renováveis, e nos combustíveis, gás natural e
produtos petrolíferos.24

23
Vide, Resolução n.º 24/2000, de 3 de Outubro
24
Vide o nº 1 do artigo 160º da Constituição da República

17
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo baseia-se no estudo de caso sobre a electrificação rural em
Moçambique, e o mesmo pretende responder as questões como “ Se valerá à pena
investir em projectos de electrificação rural em no nosso país? Quais os resultados que
se verificarão com o impacto da electrificação nas zonas rurais? Quais serão os
impactos que possam advir no processo de desflorestação?
No caso de Moçambique:
Como podemos observar o número de famílias com acesso a electricidade embora 99%
dos distritos já têm redes eléctricas e fontes de energias instaladas ainda, verifica-se
que mais de 80% ainda não tem acesso energia eléctrica no mundo.
O elevado nível de pobreza acompanhada com as elevadas taxas de analfabetismo, é
um entrave para o desenvolvimento no tangem ao projectos de electrificação das zonas
rurais por parte de privados que pretendem, naturalmente, o retorno do seu
investimento. Nestes casos o governo tem de assumir o risco e procurar subsidiar estes
projectos.
De salientar que, a importância do papel das autoridades e do estabelecimento das
parcerias são determinantes para sucesso dos projectos da electrificação rural. o
governo desempenha uma função importante no quadro institucional nos processos de
electrificação rural. Indica que a necessidade de reformas para que os governos,
consumidores, as autoridades responsáveis pela electrificação rural e os órgãos
reguladores tenham uma maior responsabilidade no sector das energias para assegurar e
facilitar a electrificação rural. Para que as instituições funcionem de forma eficaz no
alargamento do acesso a electricidade é necessário a atribuição de funções e definição
de responsabilidades claras, tanto no desenvolvimento e na implementação das
políticas, reconhece ainda que quanto maior for o numero de instituições intervenientes
maior a possibilidade de acesso a electricidade nas zonas rurais.25
Electrificação rural é um processo que tem de ser acompanhado com outras mediadas.
O sucesso da electrificação das zonas rurais não depende unicamente das políticas de
electrificação, são necessário para um conjunto de medidas complementares nas áreas
relacionadas com a electrificação e com as comunidades locais.

25
Haanyika (2005)

18
4. Referencia Bibliografia
1. ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgilio
Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008.
2. BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais
princípio da dignidade da pessoa humana. 2ª ed.. Rio de Janeiro: Renovar, 2008
3. BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro:
Campus, 2004.
4. BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo:
Malheiros, 1998.
5. CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição.
7.ed. Coimbra: Almedina, 2003.
6. CORDEIRO, Karine da Silva. Direitos fundamentais sociais: dignidade da
pessoa humana e mínimo existencial, o papel do poder judiciário. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2012.
7. MIRANDA, Jorge. Manual de direito Constitucional. Tomo IV. 3ª ed.
Coimbra: Coimbra editorara. 2000.
8. ZECA, E. et al. Moçambique: recursos energéticos e política internacional.
Escolar Editora. p. 160-167, 2016
9. Haanyika, C.M; Energy Consultant; Rural Eletrification Policy and
Institutions in a Reforming Power Sector; Resources for Infraestructure
Development and Energy Studies; Suite 3/1, Buungano House, Plot 1311, Lubu
Road, Longcres, P.O Box 31661, Lusaka, Zambia; October 2005.

Legislação
Resolução n.º 24/2000, de 3 de Outubro
Webgrafia
www.ecoprogresso.pt/glossarioI.asp
www.worldbank.org
www.iea.org ; www.worldenergy.org/ ; www.worldenergyoutlook.org
www.institutocarbonobrasil.org.br/

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