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SOB ANÁLISE DE DUAS TEORIAS LITERÁRIAS


Objetivos
Entender a crítica psicanalítica da literatura.
Entender o tema "sonhos" na obra "Floresta é o
nome do mundo"
Entender a crítica ecológica da literatura.
Entender a descrição da obra "Floresta é o nome
do mundo"
t i c a L i t e r á ri
r í a
C
PRIMEIRAMENTE, VAMOS ESCLARECER QUE
CRÍTICA LITERÁRIA É UMA ATIVIDADE
INTELECTUAL, REFLEXIVA, USANDO RACIOCÍNIO
LÓGICO-FORMAL DE ACORDO COM A NATUREZA
DO FENÔMENO QUE ESTUDA, NO CASO, A OBRA
DE ARTE DA LINGUAGEM.
A crítica até o início
do século XX
Do final do século XIX até o início do século XX, a crítica literária era,
em sua maioria, de cunho histórico, sociológico e biográfico,
encarando a obra literária de fora, de sua periferia, na sua moldura
histórica, no ambiente que a cerca, nas causas externas e elementos
exteriores.
A obra literária era vista como uma instituição social, um
documento de uma raça, uma época, uma sociedade, uma
personalidade.
A crítica após o início
do século XX

O movimento moderno da teoria crítica inclina-se na obra em si


para analisá-la em seus elementos intrínsecos, precisamente os que
lhe comunicam especificidade artística. É a crítica intrínseca,
egocêntrica, operocêntrica, verdadeiramente estética, literária ou

poética.
A crítica após o início
do século XX

Do egocentrismo surge, como consequência natural, o sentimento


de missão, de dever poético em relação aos outros homens, em cujo
coração se pode ler o bem e o mal, além das aparências.
Crítica psicanalítica

“O DESEJO DOS
PERSONAGENS É O DESEJO
DO LEITOR”
JEAN BELLAMIN
Crítica psicanalítica
A CRÍTICA PSICANALÍTICA É DE
ORIENTAÇÃO INTERPRETATIVA, PORTANTO
DE CUNHO HERMENÊUTICO E
FENOMENOLÓGICO, ISTO É, PROCURA-SE
CAPTAR UM SENTIDO IRREDUTÍVEL ÀS
INTENÇÕES REVELADAS PELO AUTOR, PARA
SE CHEGAR A UMA ESSÊNCIA ÚNICA DE
COMPREENSÃO DA OBRA LITERÁRIA.

HER·ME·NÊU·TI·CA
(GREGO HERMÊNEUTIKÊ)
SUBSTANTIVO FEMININO
1. INTERPRETAÇÃO DO SENTIDO DAS PALAVRAS.

"HERMENÊUTICA", IN DICIONÁRIO PRIBERAM DA LÍNGUA PORTUGUESA [EM LINHA],


2008-2021, HTTPS://DICIONARIO.PRIBERAM.ORG/HERMEN%C3%AAUTICA
[CONSULTADO EM 21-03-2023].
Como a psicanálise e a
literatura se encontram como
ciências?

1
Freud, apesar de hesitar, aproveitou para a sua teoria a área da
criação artística, haja vista seus estudos sobre Édipo o Rei, de
Sófocles, e Hamlet, de Shakespeare, em sua obra " "Interpretação
dos sonhos", publicada em 1900.

2 A ferramenta mais importante da psicanálise é a linguagem, seu


traço comum com a literatura

3
Ambas têm como fundamento a subjetividade, até quando
transmitem uma ocorrência de amplo valor social.
Inconsciente e o sonho

Para Freud a análise sistemática do sonho é o


caminho que leva ao inconsciente.
Nesse sentido, para acessar ao inconsciente é
preciso comparar o conteúdo manifesto do
sonho, ou seja, a narrativa que dele se faz, ao
conteúdo latente, ou seja, ao que é oculto e que é
aquele obtido através das associações.
Interpretação psicanalítica
O enigma - Todo discurso é enigmático, já que propõe a

articulação de processos entre significações inconscientes e

conscientes.

A detecção - Não é fácil definir o conjunto de regras que rege essa

detecção. O analista (ou o "detetive") deverá recolher índices

desconhecidos, despercebidos ou negligenciados e organizá-los

para encontrar uma solução convincente e eficaz, reconstruindo

uma história visando a uma verdade.


O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Davidson

“Não tinham agressividade intraespecífica, ou seja, eram presas fáceis. Não


revidavam. Com toda a certeza não massacravam duzentos homens em
um ataque. Era loucura. O silêncio, o sutil fedor do incêndio sob a luz
daquele entardecer longo e quente, os rostos verde-pálido com olhos
inertes que o observavam, aquilo tudo não significava nada, era um sonho
ruim e louco, um pesadelo.”

“Ele não tinha sonhado nada daquilo. E eles não podiam simplesmente
desaparecer. Estavam lá, escondidos.”

“As mãos de Davidson agora estavam firmes, seu corpo parecia


apaziguado, e ele sabia que não estava preso em nenhum sonho.”
Para Davidson o sonho
é...
... a fuga da realidade, é aquilo que a mente busca
negar como verdade ou fato por confrontar as crenças
do indivíduo. Portanto sonhar é.....
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Selver

"[...] Selver: eles sonham?


— Como crianças, durante o sono.
— Eles não são treinados?
— Não. Às vezes, falam de seus sonhos, os curandeiros tentam usá-los para
cura, mas nenhum deles é treinado ou tem alguma habilidade para sonhar.
Lyubov, que me ensinava, me entendeu quando lhe mostrei como sonhar, e
mesmo assim, ele chamou o tempo do mundo de “real” e o tempo do sonho
de “irreal”, como se essa fosse a diferença entre eles."
.
.”
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Selver

Os sonhos estão ligados à consciência e ao subconsciente.


Selver descreve os yumanos como insanos porque são
capazes de sonhar apenas durante o sono. Ele diz isso
porque sabe que o nível inconsciente da mente assume o
controle quando alguém está sonhando. Mas como os
yumanos podem acessar seu inconsciente apenas durante o
sono, isso limita a quantidade de controle que eles têm sobre
suas mentes. Isso os rouba do que os Athsheans consideram
uma mente equilibrada e os leva à insanidade..
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Selver

“Por um tempo, ninguém falou. Por fim, Coro Mena disse:


— O que você nos conta é muito sombrio e só piora. Você é um
Sonhador da sua Casa?
— Era. Não existe mais a Casa de Eshreth.
— É tudo a mesma coisa; nós falamos juntos a Antiga Língua. Entre os
salgueiros de Asta, quando falou comigo pela primeira vez, você me
chamou de Lorde Sonhador. É o que sou. Você sonha, Selver?
— Agora, quase nunca — Selver respondeu, obediente ao catecismo,
curvando o rosto febril e cheio de cicatrizes.
— Acordado?
— Acordado..”
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Selver — Sonha bem, Selver?
— Nada bem.
— Você segura o sonho com as mãos?
— Sim.
— Você tece e molda, conduz e é conduzido, começa e termina
conforme sua vontade?
— Às vezes, nem sempre.
— Você pode caminhar pela estrada percorrida por seu sonho?
— Às vezes. Às vezes tenho medo.
— Quem não tem? Não é totalmente ruim, Selver.
— Não, é totalmente ruim — disse Selver —, não sobrou nada de bom.
— E começou a tremer.”
.
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Selver

"Os Athsheanos são capazes de acessar seus sonhos


mesmo quando estão acordados. Também de levar a
racionalidade do tempo do mundo para o tempo dos
sonhos. Até certo ponto, eles podem controlar seus sonhos
porque os usam como telas nas quais testam teorias e
cursos de ação. Os mais habilidosos entre eles - como
Selver - são capazes de interpretar sonhos em nome do
resto de seu povo. No entanto, é a interpretação dos
sonhos de Selver que o leva à ideia de matar.”
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Selver

"Quando um Grande Sonhador, seu irmão, contou a ela


que Selver era um deus, um transformador, uma ponte
entre realidades, ela acreditou e agiu.

Ele é o [...] filho do incêndio da floresta, o irmão dos


assassinados. Ele é aquele que não renasce. Agora vão,
todos vocês, vão para a Casa."
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Lyubov

"Selver é um deus. Foi o que a velhinha verde falou, como se todo


mundo soubesse,[...]“Selver sha’ab.” O que sha’ab queria dizer?
Muitas palavras da Língua das Mulheres, [...] essas palavras, em
geral, não apenas tinham duas sílabas, mas também duas faces.
Eram moedas, cara e coroa. Sha’ab significava deus, ou entidade
espiritual, ou ser poderoso; também significava algo bem diferente,
mas Lyubov não conseguia lembrar o quê. A essa altura de suas
reflexões, estava em casa, em seu bangalô, e só teve que procurar
no dicionário que ele e Selver compilaram durante quatro meses
de trabalho exaustivo, mas harmonioso. Óbvio: sha’ab , tradutor.."
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Lyubov

"Se um deus fosse um tradutor, o que ele traduzia? [...] Será que um
sha’ab era quem traduzia a linguagem do sonho e da filosofia, a
Língua dos Homens, para um dialeto cotidiano? Mas todos os
Sonhadores poderiam fazer isso. Talvez, então, ele fosse alguém que
podia traduzir para a vida desperta a experiência fundamental da
visão: aquela que servia de elo entre as duas realidades, consideradas
iguais pelos athsheanos, o tempo do sonho e o tempo do mundo,
cujas conexões, embora vitais, eram obscuras. Um elo: alguém que
pudesse expressar em voz alta as percepções do subconsciente.
“Falar” aquela língua é agir. Fazer algo novo. Transformar ou ser
radicalmente transformado, desde a raiz. Pois a raiz é o sonho.".
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Lyubov

"E o tradutor é o deus. Selver trouxera uma nova palavra para a


linguagem de seu povo. Ele tinha realizado uma nova ação. A
palavra, a ação, assassinato. Somente um deus poderia
conduzir um recém-chegado tão notável quanto a morte na
travessia da ponte entre os mundos.."
Intertextualidade em
"Floresta é o nome do
mundo"
Acredita-se que os grupos aborígenes chegaram na Austrália
entre 65 mil a 45 mil anos atrás. As fontes para compreender esses
grupos são apenas os vestígios materiais e a oralidade dos grupos,
e o encontro com os colonizadores ingleses no final do século
XVIII em diante. É válido salientar, que foram os colonizadores
que construíram os aborígenes como um povo primitivo, pois
limitaram a descrevê-los a partir de seus padrões e não tentaram
compreendê-los.
Intertextualidade em
"Floresta é o nome do
mundo"
Os aborígenes têm um sistema complexo de compreender o tempo e as
relações humanas, que ficou denominado O Tempo do Sonho (Dreamtime),
Alcheringa na língua Aranda, onde presente e passado estão juntos,
acumulados no conhecimento ancestral e a existência está situada no sonho,
que precede o nascimento e sucede a morte, desta forma os aborígenes tem
dificuldades de compreender conceitos como Progresso e o tempo linear
teleológico (Passado-Presente-Futuro). Por meio dos sonhos os aborígenes
conseguem se comunicar e compreender a sua existência, pois dão sentido
aos sinais apresentados nos sonhos da comunidade, estabelecendo assim os
valores e as leis da sociedade aborígene.
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Selver

— Olhe, capitão Davidson — disse o creechie naquela voz baixa


e calma que deixava Davidson zonzo e nauseado. — Nós dois
somos deuses, você e eu. Você é um deus louco e não tenho
certeza se também sou ou não. Mas nós somos deuses. Nunca
haverá, na floresta, outro encontro como este de agora, entre
nós. Trazemos dádivas um para o outro, como os deuses
fazem. Você me deu uma dádiva: matar a espécie de alguém,
assassinar. Agora, fazendo o melhor que posso, dou-lhe a
dádiva do meu povo, que é não matar. Acho que cada um de
nós considera a dádiva do outro pesada
demais. No entanto, você deve carregá-la sozinho.
a m i n h o d o f
c LEVA AO NOVO COMEÇO i m
O

Após o fim de conflito e o indício de que os


humanos da Terra cumpririam sua parte,
Selver e o capitão Gosse conversam
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Selver

— Nenhum. Eles irão contar isso a você — disse Selver, indicando,


com um movimento de cabeça, o coronel e Gosse. — Quero dizer,
entre seu próprio povo. Athsheanos matando athsheanos. Selver
ficou calado. Ele olhou para cima, para Lepennon, para aquele
rosto estranho, branco como a máscara do Espírito do Freixo, que
mudou ao encontrar seu olhar.
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Foco em Selver

— Às vezes um deus vem — disse Selver. — Ele traz uma maneira


nova de fazer alguma coisa, ou algo novo a ser feito. Um novo
tipo de canto ou um novo tipo de morte. Ele traz essa coisa
atravessando a ponte entre o tempo dos sonhos e o tempo do
mundo. Quando faz isso, está feito. Não se pode pegar as coisas
que existem no mundo e tentar levá-las de volta para o sonho,
retê-las ali dentro com muros e fingimentos. Isso é loucura. O que
é, é. Não adianta, agora, fingir que não sabemos como matar uns
aos outros..
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UMA TEORIA ECOCENTRICA
O sonho em "Floresta é o
nome do mundo"
Mais do que a pessoa que o escreve e a sua intenção, o que importa num estudo
ecocrítico é sobretudo o lugar e o contexto da escrita, por onde ele passa. É o que
diz Peter Barry, no seu Beginning Theory – An Introduction to Literary and Cultural
Theory:
Para o ecocrítico, a natureza realmente existe lá fora, além de nós mesmos, não
precisando ser ironizada como um conceito encerrado em aspas, mas realmente
presente como uma “entidade” que nos afeta, e que podemos afetar, talvez
fatalmente, se nós a maltratamos. A natureza, então, não é redutível a um conceito
que concebemos como parte de nossa prática cultural.
(2009: 252)
OIKO

TERRA É O NOME DO MUNDO

Para além disso, se atendermos mais de perto à etimologia da palavra “eco”, ela
remete-nos para o de “casa”, do grego “oikos”, e encontramos a essência deste
novo paradigma dos estudos literários – é sobretudo da relação do homem com o
seu meio, seja qual for o tipo de relação estabelecida, que se deixa entrever a partir
de uma perspectiva ecocêntrica no texto literário.
Como os atsheanos veem
o mundo...
"Quando matam uma árvore, talvez
pensem que ela viverá de novo!"

"A palavra athsheana para mundo também é


a palavra para floresta."

"Pode-se dizer que, como a floresta em que


vivem, alcançaram um estado de apogeu."
Como os atsheanos veem
o mundo
"Mas, para os athsheanos, o solo, o
chão, a terra, não era o lugar ao qual
os mortos retornavam e pelo qual os
vivos viviam; a substância de seu
mundo não era a terra, mas a
floresta. O homem terrano era barro,
pó vermelho. O homem athsheano era
ramo e raiz. Eles não entalhavam
imagens de si mesmos em pedra,
apenas em madeira."
Como os terráqueos
veem o mundo...
"Porque aquele mundo, Novo Taiti, era
totalmente feito para homens.
Organizando e limpando, derrubando a
florestas sombrias para a plantação de
grãos, eliminando a escuridão, a
selvageria e a ignorância primitivas,
aquilo seria um paraíso, um verdadeiro
Éden. Um mundo melhor do que a Terra
devastada."

"A Terra precisa de madeira, precisa demais


Nós encontramos madeira em Novo Taiti.
Portanto... somos lenhadores."
Como os terráqueos
veem o mundo...
"Aquela parecia uma cidade grande, ao menos depois
de três meses na floresta; tinha ruas de verdade,
edifícios de verdade, e aquilo existia desde que a
colônia começara, havia quatro anos."

"Mas quando chegaram ali, não havia nada. Árvores.


Um amontoado, emaranhado e embolado de árvores,
interminável, insignificante. Um rio vagaroso coroado
e sufocado por árvores, algumas tocas de creechies
escondidas entre a vegetação, alguns veados-
vermelhos, macacos peludos, pássaros. E árvores.
Raízes, caules, galhos, ramos, folhas acima da
cabeça, sob os pés, sobre o rosto e os olhos, folhas
que não acabavam nunca em árvores que não
acabavam nunca."
Referências:
MARQUES, Ricardo.Ecocrítica, 2022. E-DICIONÁRIO DE
TERMOS LITERÁRIOS. Disponívem em:
<https://edtl.fcsh.unl.pt/encyclopedia/ecocritica> Acesso
em 23 de março de 2023.

DACORSO, S. T. DE M. E. Psicanálise e crítica literária.


Estudos de Psicanálise, n. 33, p. 147–154, 1 jul. 2010.

FRANCO. Arnaldo Junior. Operadores de leitura da


narrativa. Teoria literária: abordagens hi:stóricas e
tendências contemporâneas / Thomas Ronnaci, Lúcia
Osana Zolin. 3. ed. rev. e amplo Maringà : Eduem, 7009.
406 p.p;. 206-2016.

LE, U. K. Floresta é o nome do mundo. [s.l: s.n.].

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