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“No momento em que define quais são os fatos que serão noticiados
e qual o destaque que cada um receberá, o jornalismo aplica critérios
de seleção e de hierarquização que estão longe de ser objetivos
(como queria a teoria dos valores-notícia, hoje desacreditada). Mas
esses critérios passam a transitar socialmente como universais
exatamente porque ganham a visibilidade concedida pela mídia.
Quando o jornalismo transforma um fato em notícia, faz que ele
receba atenção pública e o torna importante por isso. Quando aplica
sua própria regra e decide “dar voz aos dois lados”, está
determinando quais lados da controvérsia são os relevantes. Ao
exercer sua função de cão de guarda e denunciar as transgressões
de funcionários públicos, transforma em fato aquilo que é um
julgamento moral de valor e, assim, contribui para fixar uma
determinada fronteira entre certo e errado. As escolhas do jornalismo,
portanto, incidem sobre o mundo social e ajudam a moldá-lo”. (p.121)
“Um fator cuja importância no golpe ainda está por ser plenamente
desvendada é a influência dos interesses estadunidenses. É certo
que fundações privadas estrangeiras financiaram grupos de destaque
na mobilização pelo impeachment (ver capítulo 3). Além disso, muitos
dos operadores da Lava Jato participaram de programas de
cooperação com os organismos repressivos dos Estados Unidos. É
certo também que Washington se desagradou da política externa do
governo Lula, que concedia maior atenção para as relações Sul-Sul e,
em especial, para um bloco de “emergentes” com Rússia, China, Índia
e África do Sul, com potencial para desafiar a hegemonia
estadunidense. O toque nacionalista que tingiu políticas de
investimento em infraestrutura ou de exploração do petróleo, sem
falar no estímulo à criação de “campeãs nacionais” capazes de
concorrer no mercado global (nos moldes coreanos), era outro ponto
de discórdia. O episódio da espionagem sobre a presidente Dilma
Rousseff revelou que o governo estadunidense agia em favor dos
interesses econômicos que se sentiam ameaçados por decisões
brasileiras. Por fim, cabe lembrar que figuras de proa do governo
golpista, a começar pelos dois ocupantes do ministério das Relações
Exteriores, José Serra e Aloysio Nunes Ferreira, tinham ligações
fortes com os EUA e assumiam um discurso claramente entreguista”.
(p.165)