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COMARCA DE TRÊS PASSOS

2ª VARA
Av. Júlio de Castilhos, 210
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Processo nº: 075/1.14.0000201-4 (CNJ:.0000316-


35.2014.8.21.0075)
Natureza: Indenizatória
Autor: Thiago Antonio Zarth Reis
Réu: Marco Antonio Reis
Juiz Prolator: Juíza de Direito - Dra. Vivian Feliciano
Data: 06/02/2017

Vistos e examinados os autos.


I – Relatório (artigo 489, inciso I, do Código de Processo
Civil de 2015)
THIAGO ANTONIO ZARTH REIS ajuizou a denominada
ação de indenização por danos morais por abandono afetivo com pedido
de alimentos em face de MARCO ANTONIO REIS, ambos qualificados,
aduzindo, em suma, que a genitora do demandante teve um
relacionamento com o demandado que culminou na sua concepção. A
filiação foi reconhecida através de ação de investigação de paternidade.
A partir daí, o demandado participou da vida do filho, até que, em certa
idade, conheceu outra mulher, quando, abandonou o demandante.
Referiu que o demandado não cumpriu com o dever de pai, pois sempre
foi tratado com indiferença e quem deveria lhe dar suporte material e
emocional nunca quis manter convívio. Entretanto, com relação aos
outros dois filhos, tem ele comportamento totalmente diverso, causando-
lhe, com isso, danos morais. Ao cabo, postulou a condenação do
demandado ao pagamento de indenização por abandono afetivo,
sugerindo valor não inferior a cem salários mínimos. Requereu, ainda, a
fixação de pensão alimentícia, inclusive de forma provisória. Pediu a
concessão de gratuidade. Juntou documentos (fls. 12/18).
Recebida a inicial, foi deferida gratuidade judiciária e
indeferido o pedido de fixação de alimentos provisórios (fl. 19).
Citado (fl. 24 verso), o demandado apresentou
contestação (fls. 26/39), arguindo, em preliminar, prescrição da
pretensão de reparação civil. No mérito, discorreu sobre o
reconhecimento de paternidade e sustentou não ter havido abandono
material, pois alcançou recursos ao autor em diversas oportunidades, não
tendo dispensado maiores cuidados porque os familiares da genitora o
impediam de visitá-lo, de modo que não se há de falar em abandono
afetivo e material e, por consequência, em indenização por danos morais.
Quanto aos alimentos, sustentou serem indevidos, pois o autor completou
a maioridade e possui emprego fixo. Requereu que, acolhida a preliminar,

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o processo seja julgado extinto ou improcedentes os pedidos. Acostou
documentos (fls. 40/50).
Houve réplica (fls. 52/54).
Com vista dos autos, o Ministério Público deixou de
intervir (fls. 58/59).
O demandante juntou aos autos laudo psicológico nas fls.
125/127.
Instrução nas fls. 145/147.
Juntados os documentos relativos ao julgamento da ação
de alimentos proposta pelo demandante em face do demandado (fls.
149/176).
As partes apresentaram memoriais (fls. 178/181, pelo
demandante; 182/190, pelo demandado).
Vieram, então, os autos conclusos para sentença.
É o relatório.
Passo às razões de decidir.
II – Fundamentação (artigo 489, inciso II, do Código de
Processo Civil de 2015)
O procedimento transcorreu regularmente, não havendo
nulidades a serem decretadas.
A preliminar de prescrição da pretensão de reparação civil
merece acolhida.
Os documentos de fls. 14/15 revelam que o autor nasceu
em 28/11/1988, completando a maioridade na data de 28/11/2006,
conforme o artigo 5º, do Código Civil de 2002. Em razão da dúvida acerca
da paternidade, colhido exame de DNA no dia 15/04/1995, restou
confirmado que o seu pai biológico efetivamente é o demandado (fls.
149/176).
O prazo para a reparação civil, previsto no artigo 206, §
3º, inciso V, do Código Civil é de 03 anos.
Ao contrário do que entende o autor, o prazo
prescricional começou a correr a partir da data em que completou dezoito
anos, ou seja, em 28/11/2006. Assim, quando ajuizou a presente ação,
aos 24/01/2014, a pretensão já estava fulminada pela prescrição desde
28/11/2009.
Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça e do Tribunal de Justiça do RS:

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RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO ESPECIAL. APRECIAÇÃO,
EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL, DE MATÉRIA
CONSTITUCIONAL. INVIABILIDADE.
COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS, POR ABANDONO
AFETIVO E ALEGADAS OFENSAS. DECISÃO QUE JULGA
ANTECIPADAMENTE O FEITO PARA, SEM EMISSÃO DE JUÍZO
ACERCA DO SEU CABIMENTO, RECONHECER A PRESCRIÇÃO.
PATERNIDADE CONHECIDA PELO AUTOR, QUE AJUIZOU A AÇÃO
COM 51 ANOS DE IDADE, DESDE A SUA INFÂNCIA. FLUÊNCIA
DO PRAZO PRESCRICIONAL A CONTAR DA MAIORIDADE,
QUANDO CESSOU O PODER FAMILIAR DO RÉU.
1. Embora seja dever de todo magistrado velar a Constituição,
para que se evite supressão de competência do egrégio STF,
não se admite apreciação, em sede de recurso especial, de
matéria constitucional.
2. Os direitos subjetivos estão sujeitos à violações, e quando
verificadas, nasce para o titular do direito subjetivo a
faculdade (poder) de exigir de outrem uma ação ou omissão
(prestação positiva ou negativa), poder este tradicionalmente
nomeado de pretensão.
3. A ação de investigação de paternidade é imprescritível,
tratando-se de direito personalíssimo, e a sentença que
reconhece o vínculo tem caráter declaratório, visando acertar
a relação jurídica da paternidade do filho, sem constituir para
o autor nenhum direito novo, não podendo o seu efeito
retrooperante alcançar os efeitos passados das situações de
direito.
4. O autor nasceu no ano de 1957 e, como afirma que desde a
infância tinha conhecimento de que o réu era seu pai, à luz do
disposto nos artigos 9º, 168, 177 e 392, III, do Código Civil de
1916, o prazo prescricional vintenário, previsto no Código
anterior para as ações pessoais, fluiu a partir de quando o autor
atingiu a maioridade e extinguiu-se assim o "pátrio poder".
Todavia, tendo a ação sido ajuizada somente em outubro de
2008, impõe-se reconhecer operada a prescrição, o que
inviabiliza a apreciação da pretensão quanto a compensação
por danos morais.
5. Recurso especial não provido.
(REsp 1.298.576/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
QUARTA TURMA, julgado em 21/08/2012, DJe 06/09/2012)

INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. ABANDONO AFETIVO.


MAIORIDADE. PRESCRIÇÃO. 1. Se a ação de indenização por
dano moral decorrente de abandono afetivo foi proposta após o
decurso do prazo de três anos de vigência do Código Civil de
2002, é imperioso reconhecer a prescrição da ação. Inteligência
do art. 206, §3º, inc. V, do CCB/2002. 2. O novo Código Civil
estabeleceu a redução do prazo prescricional para as ações de
reparação civil, tendo incidência a regra de transição posta no
art. 2.028 do CCB/2002. 3. O pedido de reparação civil por dano

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moral, em razão do abandono afetivo, nada tem a ver com
direito de personalidade, com direitos fundamentais ou com
qualquer garantia constitucional, constituindo mera pretensão
indenizatória, com caráter econômico, estando sujeita ao lapso
prescricional. Recurso desprovido.
(Apelação Cível nº 70056484413, Sétima Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Rel.: Des. Sérgio Fernando de
Vasconcellos Chaves).

INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. ABANDONO AFETIVO.


MAIORIDADE. PRESCRIÇÃO.
1. Não obstante o direito pela busca da verdade ser
imprescritível, o mesmo não se pode dizer em relação aos
direitos que dela decorrem. Ademais, muito embora o artigo
2028, do novo Código Civil tenha recepcionado regra de
transição prescricional, ainda assim, tem-se por prescrito o
direito de pleitear verba indenizatória por abandono afetivo. 2.
O pedido de reparação civil por dano moral, em razão do
abandono afetivo, nada tem a ver com direito de personalidade,
com direitos fundamentais ou com qualquer garantia
constitucional, constituindo mera pretensão indenizatória, com
caráter econômico, estando sujeita ao lapso prescricional.
RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível nº 70040615510,
Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Rel. Dr.
Roberto Carvalho Fraga).

Como a presente ação de indenização por danos morais


decorrentes de abandono afetivo foi proposta em 24/01/2014, portanto
após o decurso de lapso de tempo muito superior ao prazo legal de três
anos contados da data em que o demandante atingiu a maioridade civil
(28/11/2006), é imperioso reconhecer a prescrição da pretensão deduzida
na inicial, consoante expressa previsão do artigo 206, § 3º, inciso V, do
Código Civil.
No tocante aos alimentos, verifico que a pensão
alimentícia foi fixada no dia 02 de junho de 1993, no equivalente a 20%
dos rendimentos líquidos do demandado, conforme cópia da sentença
proferida nos autos da ação de investigação de paternidade cumulada
com alimentos (Processo nº 12.643.166/90, fls. 153/161). Na ocasião,
contava o beneficiário com 6 anos de idade (fl. 15). Atualmente, está com
28 anos.
A maioridade do alimentando, por si só, não autoriza a
cessação da obrigação alimentar, visto que, se evidenciada a
necessidade, prevalece a obrigação de prestar alimentos.
Entretanto, quando o filho atinge a maioridade, muda o
fundamento da obrigação alimentar, que passa do dever de sustento para

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com os filhos menores (art. 1.566, inciso IV, CC), na qual a necessidade é
presumida, para a obrigação existente entre parentes (art. 1.694 e
seguintes do CC), na qual não há presunção de necessidade.
A respeito, cito o escólio de Maria Berenice Dias1:

“O implemento da capacidade civil, aos 18 anos (CC 5º),


ainda que enseje o fim do poder familiar, não leva à extinção
automática do encargo alimentar. Persiste a obrigação pelos
laços de parentesco derivados da relação paterno-filial. A
matéria está sumulada pelo STJ. (…) Descabido extinguir a
obrigação decorrente do poder familiar e impor ao filho que
intente nova demanda para buscar alimentos tendo por
fundamento o vínculo de parentesco. Nesse ínterim, não terá
meios de prover a própria sobrevivência.
A jurisprudência, atentando às dificuldades atuais da
sociedade, em que há necessidade cada vez maior de
qualificação para a inserção no mercado de trabalho, de há
muito vem dilatando o período de vigência dos alimentos.
Exige tão só que o filho esteja estudando. Aliás, a própria lei
estende o pensionamento às necessidades de educação (CC
1.694).”

Porém, tal obrigação não é presumida, cabendo ao


interessado, alimentando, comprovar a necessidade de ajuda do genitor –
ônus do qual, entretanto, não se desincumbiu. E se é o autor maior de
idade e encontra-se apto ao trabalho, o que se espera é que possa prover
o próprio sustento.
Veja-se que, nesse contexto, onde nenhum
acontecimento extraordinário está sequer a justificar a continuidade da
obrigação de prestar alimentos, não se pode falar em majoração ou
revisão de alimentos.
Sucede que, conforme alhures assinalado, o demandado
já foi condenado ao pagamento de prestação alimentícia, de modo que
não há que se falar em nova condenação. Sendo assim, considerando
que, até o momento, não se tem notícia de eventual ação de exoneração
de alimentos e o implemento da capacidade civil, aos 18 anos, não leva à
extinção automática do encargo alimentar, compete ao demandante
buscar o cumprimento da sentença/decisão interlocutória que fixou os
alimentos, consoante o disposto no artigo 528, § 8.º, do Código de
Processo Civil.

1 DIAS, Maria Berenice; Manual de direito das famílias. 8ª ed. rev. e atual. - São
Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2011, pág. 534.

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Desse modo, resta dizer que a pretensão para haver
prestações alimentares deve ser buscada na via adequada, com
observância do prazo prescricional previsto no §2º do art. 206 do Código
Civil, razão pela qual merece ser julgado improcedente o pedido de
alimentos.
III – Dispositivo (artigo 489, inciso III, do Código de
Processo Civil de 2015)
Isso posto, pronuncio a prescrição e JULGO EXTINTA a
pretensão indenizatória movida por THIAGO ANTONIO ZARTH REIS contra
MARCO ANTONIO REIS, com fundamento no artigo 487, inciso II, do
Código de Processo Civil. Outrossim, JULGO IMPROCEDENTE o pedido de
alimentos, forte no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas
processuais e honorários advocatícios, que arbitro em R$ 1.000,00 (um
mil reais), de acordo com as operadoras do artigo 85, § 2.°, do Código de
Processo Civil, ficando suspensa a exigibilidade de tais verbas enquanto
perdurar a gratuidade.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado sem modificações, arquive-se
com baixa.
Três Passos/RS, 06 de fevereiro de 2017.

Vivian Feliciano,
Juíza de Direito

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