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Copyright © 2021 – Sonia Maria Bufarah Tommasi e Lúcia Fernanda Misse Soares

Vinnie Graciano
Alexandre Bufarah Tommasi e Fabio Valle

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Tommasi, Sonia Maria Bufarah


7 Faces do Feminino [livro eletrônico]: Mitologia grega : Psicologia analítica :
Arteterapia / Sonia Maria Bufarah Tommasi, Lúcia Fernanda Misse Soares. - São Paulo:
Ed. das Autoras, 2021.
PDF

ISBN 978-65-00-26446-3

1. Artes 2. Arteterapia 3. Feminilidade (Psicologia) 4. Mitologia grega


5. Psicologia analítica 6. Psicoterapia 7. Terapia artística

I. Soares, Lúcia Fernanda Misse. II. Título.

Maria Alice Ferreira – Bibliotecária – CRB-8/7964


21-72277 CDD-150.1954

Índices para catálogo sistemático:


1. Psicologia analítica 150.1954
Ao Feminino Sagrado
Em cada capítulo, por meio de uma per-
sonagem mitológica, encontra-se um aspecto femi-

-
dados podem ainda ser compreendidos do ponto de
vista da anima, revelando aspectos da psique mascu-
lina. A obra sugere atividades práticas com temática
mitológica em arteterapia e educação, além da leitu-
ra de obras de arte inspiradas no mito apresentado.
Demonstra como a mitologia e as artes se aliam no

e profundas do ser humano.


• Narrativa do Mito 21
• Leitura simbólica 22
• 37
• Possibilidades criativas do mito 53

• Narrativa do Mito 55
• Leitura simbólica 58
• 70
• Possibilidades criativas do mito 81

• Narrativa do mito 84
• 85
• Leitura simbólica 87
• 100
• Possibilidades criativas do mito 106

• Narrativa do mito 110


• Leitura simbólica 112
• 127
• Possibilidades criativas do mito 133
• Narrativa do Mito 136
• 141
• Leitura simbólica 143
• 167
• Possibilidades criativas do mito 175

• Narrativa do mito 178


• Leitura simbólica 180
• 214
• Possibilidades criativas do mito 224

• Narrativa do mito 228


• Leitura simbólica 231
• 253
• Possibilidades criativas do mito 264
No vazio do hoje se projeta o abismo do amanhã. Ao evitar o mítico

e determinada em suas verdades comprovadas, recusa aceitar as suas


raízes profundas no imaginário do ontem. Não percebe que sua capaci-
dade criativa de pesquisa, provém de energias dinâmicas do cosmos, que
é intemporal, invisível, intangível, mas que se manifesta com todo o seu
vigor, por meio de imagens.
Tais imagens são encontradas no corpo humano, na estrutura dos

psique, e que são visivelmente encontradas nos rastros da história da


-

Neste momento histórico, na grande escuridão da vida, o ser hu-


mano, grita por um sentido. Uma pequena chama indica o caminho: siga
as imagens e encontrará a trilha que o levará aos deuses.

necessidades do ego, a não ser nas mentes do fundamentalista;

energias dinâmicas dos cosmos e a psicodinâmica do indivíduo.

Mas, a grande maioria prefere continuar vivendo de acordo com os


-
É cada vez mais estreito o caminho da jornada da alma.
Quando Jung se deparou com problemas insolúveis apresentados
por seus pacientes, buscou novos caminhos, estudou outras culturas,
seus mitos e crenças, para não violar a natureza humana.

A dessacralização de nossa época tão profana é devida ao nosso

-
-

autônomos. (JUNG, 1992, p.49).

Nunca foi tão crucial dar liberdade de expressão ao mundo imagi-


nário e simbólico, para se permitir algum equilíbrio do espírito e confor-
to à alma.

-
lha entre o modelo médico, lindo e útil como ele é, e o modelo
eclesiástico, constritivo como ela havia se tornado. Alguém ti-
nha de entrar nessas profundezas em busca da alma, rastrear os
deuses até seu esconderijo antigo. Freud e Jung, e os outros que
os seguiram, tomaram esse passo em direção ao abismo interno
-
cisavam disso, mas eles tinham de tomar essa iniciativa para
poder salvar a eles próprios. A relevância cada vez menor da
mitologia tribal os levou a procurar pela fonte de todos os mi-

Na busca por compreender os fenômenos da natureza, que tanto


o impactava, o ser humano criou deuses, mitos e ritos. Ao estremecer
diante dos movimentos da natureza, buscou sentido para a própria exis-

interior. E é ali, em sua interioridade, que viveu e ainda vive, grandes ex-
-
temente intangível, mas que se manifesta no sentir, no sonhar e no criar.
A compreensão humana vislumbra apenas uma pequena parte de
todo este vasto mundo interior, dinâmico e interativo, que se manifesta
tanto no plano pessoal quanto coletivo.

-
nas de maneira vaga, parcial, estreita, obliqua, mas também insinua que
algo permanece despercebido”. Dando assim a ideia de mistério, algo

o mistério, algo que não está claramente revelado, por ser muito mais
amplo do que aparenta.
-

p XIX).
Cada personagem revela muitas histórias; seu caminhar pela nar-

-
dos psíquicos, ativando complexos, estimulando a formação de símbo-
los. A narrativa, também, pode atuar sobre o inconsciente, dinamizan-

simbólicos.
As imagens e os símbolos sugeridos pelo mito são carregados de

de transportar energia que, quando carregada, tem o poder de evocar

resposta nos tira da zona de conforto, do lugar comum, evoca a ação


psicodinâmica.

o século XIX não podia nem mesmo pressentir: o símbolo, o mito, a ima-
-
-los, mutilá-los, degrada-los, mas que jamais poderemos extirpa-los”.
-
pondem a uma necessidade, revelar as mais secretas modalidades do ser.
Não é necessário conhecer mitologia para se viver um tema mí-
tico, a mitologia faz parte do inconsciente coletivo e se manifesta nos
devaneios, nos sonhos e nos processos criativos. Eliade (1996) considera

monstros, deuses, deusas, demônios, fadas, heróis, entre outros, eles au-

são, por suas próprias estruturas, multivalentes [...] captam a realidade


profunda das coisas [...] e consequentemente não poderia ser expressa
por conceitos” (ELIADE, 1996, p.11). Não se pode reduzir a imagem a um
único sentido, ou encerrá-la em sua terminologia concreta.
A mitologia de qualquer época ou cultura contém estórias sobre
aspectos da vida que toda pessoa precisa reconhecer, elaborar e integrar.
Por meio da narrativa mítica, estabelece-se um diálogo entre o incons-

revelem a sabedoria acumulada pela humanidade durante toda a sua


evolução.
Na arte e no material psicológico que se manifesta em sonhos e
fantasias, surgem temas característicos de mitos e antigos rituais reli-
giosos, numa linguagem simbólica que não se consegue mais compreen-

coletivo, entretanto, mostram um constante movimento de renovação,

mitológicos podem ser interpretadas como imagens arquetípicas; são


que constituem as estruturas básicas da
psique.

qual for o plano no qual elas se desenrolam: biológico, psicológico, es-


as estruturas psíquicas e se expressa por meio dos símbolos, os quais,

A sensibilidade mítica é ativada ao se fazer contato com o profun-

ou até mesmo uma parte de nós mesmos. Tudo pode se transformar em


mito a partir do momento em que entra em contato com o ego e o força
a uma reformulação de sentido.

Um mito narra os acontecimentos que se sucederam -


pio, ou seja, no começo, em um instante primordial e atempo-
ral, num lapso de tempo sagrado. Esse tempo mítico ou sagrado
é qualitativamente diferente do tempo profano, da contínua e
-
diana e dessacralizada. (ELIADE, 1996, p.53).

Por isso, as socieda-

realizadas em locais, dias, horários ou períodos pré-estabelecidos, por


exemplo, na mata à noite, em torno de uma fogueira, em determinada
época do ano.

ruptura do Tempo e do mundo que o cerca; ele realiza uma abertura para
o Grande Tempo, para o Tempo Sagrado” (ELIADE, 1996, p.55).

-
no, o momento certo ou supremo, de natureza qualitativa, que também
pode ser considerado o tempo de deus, a eternidade. , é fugaz, é
o melhor instante em que se abraça a felicidade e se distancia do caos.
o tempo sequencial, passado, presente, futuro, é a medida linear
de um movimento ou período cronológico; tempo que pode ser medido,

pertencem ao Grande Tempo, por isso são atemporais, atuam em


todos os seres humanos e se manifestam em qualquer cultura.
e destrói. Este é o tempo profano, histórico e linear, ao qual Eliade

renovação.

tornam, por instantes, contemporâneos do acontecimento mítico; saem


do tempo profano e distanciam-se da rotina cotidiana, reunindo-se no
tempo primordial, na eternidade tangível e recuperável (ELIADE, s/d).
Esse mergulho no tempo sagrado e indestrutível é de suma im-
portância e deve ser realizado periodicamente, pois no tempo comum,
vive-se a transitoriedade. Tudo se desgasta e desaparece, mas para haver
renovação, é preciso se reintegrar à unidade primordial, origem de tudo.
Apesar da dessacralização do mundo atual, o ser humano sente a
necessidade de religar-se às fontes primordiais. Mitos, contos de fada e
as grandes obras literárias podem ajudar a restabelecer a conexão com
os níveis mais profundos da psique humana. Substituindo a narrativa
oral das culturas antigas pela leitura dos mitos, pode-se conseguir uma

de viver histórias diferentes da sua.


-
que neles se encontram conteúdos psicológicos representados de modo
simbólico. Na prática clínica, educacional e ou organizacional observa-

-
nâmica. A mitologia aborda um determinado tema de forma alegórica,
não como fato real. Por meio da narrativa de um mito é possível abordar
sutilmente temas complexos ou delicados, sem se referir diretamente
ao caso, mas de modo indireto, projetado nas personagens. Permite as-
sim um distanciamento que possibilita explorar esse conteúdo de di-
-

Além de seu eixo central, no mito existem vários caminhos ou


-

do herói reúne dois mitologemas: o herói e a busca, cada um dos quais


-

As escolhas realizadas pelo herói/heroína, em cada um de nós, re-

histórica.

Aliás, o ser humano conhece vários ritmos temporários, e não


somente o tempo histórico, ou seja, seu próprio tempo, a con-
temporaneidade histórica. Basta ele escutar uma bela música,
ou apaixonar-se, ou rezar, pra sair do presente histórico e rein-
tegrar o presente eterno do amor e da religião. Basta ele abrir
um romance ou assistir a um espetáculo dramático para en-
contrar outro ritmo temporal, o que poderíamos chamar tempo
adquirido. (ELIADE, 1996, p.29).

-
tas possibilidades de existir e se entregar aos ritmos do universo, voar

tempo, será um ser humano diferente. Pode ser que ocorra a conscienti-

A natureza serviu de fonte de inspiração para a maioria das histó-

-
nar a um poder maior, que está muito além da compreensão humana.
Por isso, não existe nem uma civilização, cultura, ou sociedade sem mi-
tos e deuses.
-
bo, com seus triunfos e desastres. Agem como ferramentas criativas que
-
-

aspectos da vida e da natureza. Procuram dar um sentido de pertenci-


mento ao indivíduo, como parte de um grupo e de toda humanidade.
A civilização dos gregos antigos se estendeu por um longo período

-
cia), arquitetura, medicina, farmácia entre outras.

-
res encontraram uma cultura estabelecida desde 2.600 a. C., cujo ponto
central era a ilha de Creta. Na cidade de Cnossos, foi encontrado um rico
palácio datado de 2.200 a. C., que pode ter pertencido ao Rei Minos, líder
-

religiosas contrastantes com as minoicas e eram culturas patriarcais.


Algumas crenças e divindades foram assimiladas, porém, transforma-

aos gregos. Cada cidade-estado cultuava seus próprios deuses locais. Ao


lado dos antigos deuses outros cultos se misturavam. A religião grega

desde os tempos arcaicos até a alta antiguidade.

C. com a invenção do alfabeto grego da forma que o conhecemos atu-

inspiram obras de arte, literatura e cinema até os dias de hoje.

-
gos gregos Ésquilo (524-456 a. C), Sófocles (496-406 a. C.) e Eurípides
teatral mais antigo. As histórias dramáticas e trágicas, derivadas das

heróis mitológicos. Esses espetáculos teatrais se diferenciam dos mitos

-
róis, heroínas, deuses, deusas, titãs, centauros, ninfas, nereidas, quime-
ra, sátiros, Górgonas, entre outros seres, que habitavam o mundo ima-

seres humanos, tinham poderes extraordinários. As Ninfas eram seres


femininos que habitavam os campos e bosques, protegendo a natureza

tronco humano em dorso de cavalo. As Sereias, mulheres jovens e belas,


que atraiam os marinheiros com seu canto sedutor, tinham asas e cor-
pos de aves, só mais tarde passaram a ser representadas em parte como
peixes. As Nereidas eram belas jovens que habitavam as profundezas do
Mar Egeu. As Górgonas, monstros terríveis, com cabelos de serpentes,

cabeça de touro em corpo de homem, devorava os jovens que lhe eram


oferecidos em sacrifício. A Quimera, mistura de leão e cabra, soltava
fogo pelas ventas e só foi derrotada, com ajuda de Pégaso, o cavalo alado.
Estes seres mitológicos, estranhos e ao mesmo tempo familiares,
habitam a psique humana e, além dos mitos, surgem nos contos, nos

Segundo Eliade (1996, p.172) estudar a história de um simbolismo

parte os estilos culturais”.


Além do enredo, dos personagens e dos fantásticos seres mitoló-
gicos, o mito é repleto de símbolos e expressa em linguagem simbólica,
conteúdos que perduram através dos tempos e que ainda contém sua
-
cobertos espontaneamente, os símbolos, os mitos, e os ritos, revelam
sempre uma situação limite do homem, e não apenas uma situação his-
tórica. Por situação limite entendemos aquela que o homem descobre

São as imagens e símbolos que conservam as culturas abertas;


a partir de qualquer cultura, tanto a australiana como a ate-
-
ladas graças aos símbolos que sustentam essas culturas [...] Se
as imagens não fossem ao mesmo tempo uma abertura para o
transcendente, acabaríamos por sufocar qualquer cultura [...]
as imagens constituem aberturas para um mundo trans-histó-
rico. (ELIADE, 1996, p. 174).

Mito não é mentira ou fantasia sem sentido. As estórias da mito-

porém, revestidos por uma roupagem por vezes enigmática, incompre-


-
cado simbólico de um mito, ainda assim, o envolvimento com a estória
proporciona uma alteração emocional que é capaz de tocar instâncias

mas essa é a forma de comunicação do inconsciente.


Convém enfatizar que não há uma única interpretação correta.
-
-
-
tos pertinentes a todo ser humano. Mas um mito também faz sentido
para uma comunidade, uma época ou para toda a humanidade. Pode

que está no inconsciente tanto pessoal como coletivo. Mitos conden-

para a cura da alma.


A mitologia grega foi profundamente estudada por Jung porque
esta continua atuante e proporciona imagens adequadas para repre-
sentar as inúmeras facetas psíquicas. Constitui uma fonte inesgotá-
vel de símbolos de culturas matriarcais e patriarcais que antecederam
aos símbolos religiosos judaico-cristãos. A cultura greco-romana deu

histórico, cultural e linguístico da civilização ocidental, expressando


conteúdos do inconsciente individual e coletivo.

tem se voltado para a cultura grega em busca das origens, pois quando
a visão de mundo que dá coesão a um período cultural se fragmenta, a

-
pensação psicológica, não a uma época histórica ou fantasia utópica,
mas a uma paisagem interior, ao reino imaginal, onde estão os deuses
enquanto imagens arquetípicas. Para a psicologia profunda, os temas e
personagens da mitologia representam uma realidade viva, que existe

à mitologia, não apenas para aprender sobre o passado, mas também


para compreender o presente.
Esta obra enfoca alguns personagens femininos da mitologia
grega. Elabora uma possível leitura simbólica dos mitos relacionados,
estabelecendo uma correlação com a psicodinâmica e as formas de pro-

demonstrar como cada mito tem sua representação na arte de dife-


rentes épocas, para isso, algumas obras são reproduzidas e indicadas

abordado.
Cada um dos mitos narrados trata de personagens que represen-
tam aspectos do feminino ou fases do desenvolvimento da personali-
-
cos e os conceitos da Psicologia Analítica. Assim começamos a trajetó-
ria do desenvolvimento feminino a partir do momento em que a psique

-
ção nos mistérios da vida, morte e renascimento, por meio da narrativa
do mito do rapto de Perséfone.

idealizadas da mulher na psique masculina.

com os heróis míticos retratados nas grandes epopeias. Cassandra, a

sobre a insanidade mental, o conceito de normalidade e patologia, a


-
mas atuais.
-
pois de muitas aventuras. Representa um ideal masculino, o último es-
tágio do processo de aprimoramento em busca do resgate da anima,
a representante do feminino no mundo interior masculino e também
o ápice da capacidade de relacionamento com a mulher na realidade
externa. Nessa jornada o herói se depara com outras personagens re-
presentativas de aspectos de si mesmo, que deve confrontar ou aceitar
para evoluir rumo à totalidade.

humanas que pertencem a toda humanidade, apenas variando a forma


como se apresentam de acordo com a época e a cultura.
A imagem arquetípica feminina em sua polaridade negativa se
-
atual, em busca do resgate do feminino reprimido, certamente irá con-
frontar, elaborar e incorporar essas forças obscuras das profundezas
inconscientes.

metáfora do desenvolvimento feminino, mas que também simboliza

encontra o amor.
Drão,

Uma semente de ilusão


Tem que morrer pra germinar
Plantar n’algum lugar
Ressuscitar no chão
Nossa semeadura
Quem poderá fazer,
Aquele amor morrer
Nossa caminha dura.
Dura caminhada,
Pela estrada escura.

Gilberto Gil

se abriu diante dela e das profundezas surgiu uma carruagem puxada


-
râneo, que a apanhou e a levou para o abismo rapidamente. Perséfone
lutou e gritou chamando por Zeus, mas não recebeu ajuda.
-
contrá-la. Procurou durante nove dias e nove noites, por terra e por mar.
-
vem para ser a sua noiva com a aprovação de Zeus. Furiosa, a deusa disse

sobre a terra até que Perséfone fosse devolvida.


Disfarçada como uma velha, Deméter vagou pelas cidades e cam-
pos, sem ser reconhecida. Por causa de seu sofrimento, naquele ano,
nenhuma semente brotou. Seu luto provocou destruição sobre a terra.
A fome ameaçou a humanidade e os deuses não receberam oferendas

-
da ao mundo superior onde sua mãe a esperava.
-
da e perguntou se havia comido alguma coisa no mundo subterrâneo.
Perséfone admitiu ter partilhado uma romã com o marido e por isso de-
veria voltar para ele. Um terço do ano ela passa no reino dos mortos,
época em que tudo seca e morre na natureza. Mas todos os anos, quando
Perséfone retorna, traz de volta a primavera e sua mãe cobre a terra de

(1997, p.180) extraída do


a. C.).

A palavra Deméter se origina de , mãe-terra, onde era


o antigo nome de (Gaia) ou Geia e
145).
Na mitologia grega, Deméter é a deusa da terra cultivada, da ferti-
lidade do solo e da fartura de alimentos. Quando seu culto foi introduzi-

deriva a palavra cereal. A senhora dos grãos, a grande mãe que nutre e
alimenta, é uma antiga divindade agrícola, das colheitas e do trigo, do
qual se faz o pão, base da alimentação humana.

chamavam Proserpina, a divindade que representava a graça, a leveza, a

cabeças e seis braços que seguram tochas. Possui as chaves do mundo


inferior; o chicote, por ser condutora das almas e um punhal, símbolo de
seu poder (MCLEAN, 1992, p.81).
-
de de deusas, cada uma representando uma parte de um ciclo natural.
Deméter é a deusa da vegetação que cresce acima do solo e dos frutos
da terra. A deusa representa o instinto maternal, exercido não apenas na
gravidez e na maternidade, mas também na nutrição física, psicológica e
-
de a tudo que está nas profundezas da terra e a toda atividade no mundo
interior, o inconsciente. Perséfone é a mediadora entre esses dois níveis
e pertence a ambos os domínios.
-
nicas, constitui um importante tema mitológico. Está associado ao ciclo
da morte, à descida ao mundo subterrâneo e ao renascimento da vida”
(CAMPBELL, 1997, p.180).
-

entre os dois mundos (MCLEAN, 1992, p. 77).

Perséfone, ao passar uma parte do ano no reino dos mortos e a

principalmente, dos grãos que permanecem enterrados no solo durante


-

A deusa Core é uma representação do novo grão, a colheita do ano, en-


quanto que sua mãe pode ser considerada como semente da safra ante-
-

narciso.
Core simboliza o grão que penetra na terra para depois germinar.
A semente representa tudo que está em estado latente, as possibilida-
-
gia com o desenvolvimento humano, simboliza o potencial criativo a ser
realizado.

Na Grécia antiga desenvolveu-se um importante culto à fertilida-


de da terra e às deusas que a representam. Essa prática evoluiu e incor-

e renascimento.
A palavra vem do grego ou perfeição, e de ,
morte. Em geral os mistérios eram fúnebres, representando a morte e

partir da semente colocada no interior da terra, passou a ser um fenôme-


no compreendido, não apenas como renovação da vida vegetativa, mas
como renascimento e possibilidade de retorno das almas dos mortos ao

-
ria recebido a revelação de mistérios e transmitido aos inicia-

imortalidade da alma e na metempsicose, isto é, a transmigra-

-
ponsabilidade é individual e quem não conseguir reparar seus
erros nesta vida, pagará por suas faltas no além e nas outras

vida se renova pela morte, do mesmo modo como é preciso que a semen-
te morra para que os grãos possam nascer. A semente enterrada no solo
para renascer sugere uma comparação com o destino humano e repre-
senta a concepção de que a morte pode ser apenas uma transformação e

-
lizadas para traduzir uma mensagem espiritual”.

até a conversão do Império romano em Império Cristão. Nada se sabe


sobre os rituais, os melhores indícios se encontram na arte expressa em
cerâmica e esculturas, que transmitem uma pequena compreensão des-
tes rituais e das formas que podiam assumir.

o é pela primeira vez” (CAMPBELL, 1997, p.28). Se o iniciado souber o

inesperado.

das quais se guardava sigilo absoluto, pois a profanação era punida com

banquetes e a dramatização do rapto de Perséfone. Depois de uma pu-

os participantes carregavam tochas, representando a peregrinação de


Deméter à procura de Core. No santuário realizavam-se ritos de inicia-

mistérios. Deméter representando o pão, Dionísio o vinho.

deuses, pois se acreditava que, após a morte, seriam concedidos bene-


-

-
-
cos campos férteis e essas características podem ter dado origem a mui-

tinha uma estória e estava relacionada a rituais agrícolas. Diversos mitos

assim como Core, o grão de trigo que morre e renasce todo ano (FRAZER,
1982).
-

nos antigos mistérios, pode-se vivenciar esse mito como uma represen-
tação simbólica do estabelecimento de uma relação saudável entre a

Como os iniciados, podemos trabalhar com o simbolismo da se-


mente como representação do eu consciente, mergulhado em
sono profundo no inconsciente, no eterno ciclo de adormecer
e despertar, como a planta que cresce no limiar de dois reinos,
entre o mundo superior e o mundo inferior, consciente e in-

para fora, do interior para o exterior, como base do relaciona-


mento entre esses dois planos (MCLEAN, 1992, p.72).

Afrodite. Em Roma era hábito das mulheres casadas enfeitarem seus


-
dotes e sacerdotisas de Deméter eram coroados com ramos dessa árvore,
mas não podiam comer do fruto, que era símbolo da fecundidade e tinha
a faculdade de fazer com que a alma mergulhasse no cárcere do corpo.
Pela cor vermelha de sua polpa, a romã simboliza o amor, o sangue,
ao mesmo tempo, vida e morte. Por ser um fruto com muitas semen-
tes, está relacionada à fecundidade e, por esse motivo, foi consagrada a
-

Ao comer as sementes de romã, Perséfone quebrou o jejum, que


era a grande lei do reino de

Compartilhar alimento é um ato de vinculação, por meio do qual

1999).
Perséfone, ao comer a romã, assumiu o papel de amante (Afrodite)
associada simbolicamente à alimentação, à sexualidade e à repressão.

constitui o arquétipo materno. A deusa Deméter tem o poder de gerar,


nutrir e cuidar como provedora de alimento e fonte de vida. Deméter é

ainda está ligada à mãe, que a tem como modelo e precisa da sua pro-
teção e acolhimento. Core simboliza a mulher que não descobriu nem
desenvolveu plenamente suas capacidades. Como a semente, representa
o potencial que ainda não se manifestou e precisa ser cultivado para se
desenvolver.
No plano psicológico Deméter representa a relação com o cor-

o momento certo de agir, pois a natureza tem seus ciclos. Como todo
arquétipo tem polaridades opostas, a grande mãe que nutre e protege
também pode ser devoradora e destrutiva. A proteção é fundamental,
mas além do tempo necessário leva à paralisação do desenvolvimento.

na senhora do reino dos mortos. Essa dualidade pode representar a ca-


pacidade que esse padrão arquetípico tem de proporcionar às mulheres
a possibilidade de transitar entre dois mundos: o real, baseado na cons-

serve como guia no reino das sombras. Perséfone governa o mundo inte-
rior e simboliza o potencial criativo, a intuição e o contato com aspectos
mais profundos e sutis. Relaciona-se a imagem da deusa, à mulher que
busca o desenvolvimento por meio de um aprofundamento na própria
realidade externa e o mundo interior.

-
minina para o alto e para baixo. Elas juntam o mais velho e
o mais novo, o mais forte e o mais fraco e ampliam assim a
-
paço rumo a um pressentimento de uma personalidade maior
e mais abrangente e, além disso, participa do acontecer eterno.

da criança) participa, por um lado, da psique materna e, por

em si sua mãe; toda mulher se alarga na mãe, para trás e na

insegurança no que diz respeito ao tempo: como mãe, vive-

laços resulta um sentimento da extensão da vida, através

convicção imediatas de estar fora do tempo dá-nos o sentido


de

sendo que seu fluxo (da vida) deve fluir através de cada um.
Todos os obstáculos desnecessários são afastados do caminho,
mas este é o próprio fluxo da vida. Cada indivíduo, porém, é
ao mesmo tempo liberto de seu isolamento e devolvido à sua
inteireza. Toda preocupação cultural com arquétipos tem, em
última análise, este objetivo e resultado (JUNG, 2000, vol. IX/1
§316).

tornar perigosa. Surge a necessidade da separação para que haja uma


A relação de Deméter e Perséfone pode simbolizar uma simbiose

mãe arquetípica tende a procurar manter perto de si tudo que ela cria.

mulher independente e emancipada. Um complexo materno que pode

sobre a mãe. Tudo que se relaciona com a maternidade, afetividade e

incapaz de ser como a mãe que tanto admira. A mãe, por sua vez, reforça

mãe, negando-se a si mesma.

-
car deprimida quando não precisa mais exercer a função materna.

numa velha andrajosa e passou vários dias, sentada numa pedra, sem se
mover. Neste momento ela descobre a Anciã, a mulher sábia que existe

-
-a sobre a terra inteira para que seja sentida por todos como esterilidade

Ao projetar sobre a terra sua dor, demonstra também sua raiva por
não ser mais fértil. Muitas mulheres, quando estão na fase da menopau-

ciclo se encerra para outro surgir. A mulher se prepara para ser avó.
A deusa sofreu uma grande perda e entrou em estado depressivo.
Como reação a uma perda ou outra situação traumática, pode-se obser-
falta de motivação. Esse estado, porém, é transitório e a pessoa reage
tentando sair dessa condição. Assim também ocorre com Deméter, que

quadro patológico quando houver predisposição para desenvolver o


distúrbio. A depressão patológica é caracterizada por um intenso sen-
timento de desamparo, com pensamentos mórbidos, ideias de culpa e

desenvolver sintomas somáticos.

que indivíduos passíveis de desenvolver um distúrbio depressivo sofre-

a noção de que alguma característica pessoal negativa foi responsável

meio de uma conduta adequada, procurando corresponder ao que dele é


esperado. Ao experimentar uma perda real ou fantasiosa, responde com
atitudes de submissão.

se sentem dignos e temem o próprio progresso porque isso ativa o medo


infantil de perda do amor. Na infância, a ameaça da perda do amor foi
associada ao desejo de se tornar independente e assim, o modo como

rejeição por meio de um comportamento submisso (STEINBERG, 1992,


p.146).
Pessoas com propensão à depressão, segundo essa autora, tiveram
pais exigentes, que não aceitavam outras formas de pensar e agir. Assim
a criança, provavelmente, aprendeu a se preocupar em satisfazer o adul-
to. Desenvolveu uma orientação dirigida para o outro e o medo das suas
-
rapto planejado e permitido pelo próprio pai, Zeus, com a ajuda de Gaia,
a jovem pode ser separada da mãe e se tornar uma mulher independente.
Gaia (a velha sábia) conhece os ciclos da vida, conhece as dores

avernal e a trazer consigo archotes. Acessos, outro tema importante nos

(2000, vol. IX/1) extremamente atraente para os homens. Ela parece ne-

necessita ser arrebatada. Para que ela possa experimentar a relação com
o sexo oposto, ela precisa ser raptada simbolicamente, como no mito,
-
namento, nesse caso, devem partir do companheiro. É a oportunidade
para o homem fazer o papel de herói salvador e manifestar o forte im-

simbolicamente representado no ato do noivo carregar a noiva no colo


para atravessar a porta de entrada da nova casa, com objetivo de atrair
boa sorte, costume ainda praticado atualmente.

-
cado, um sequestro, uma posse, uma violação” (NEUMANN, 1990, p.53).
Neumann (1990, p.54) considera que o casamento é sempre um
mistério de morte. Como há uma relação primordial de identidade entre

-
-
muito mais antigas, remanescentes do matriarcado, como aquelas que
narram a descida de uma donzela e seu vínculo com o rei do mundo
-
turada e levada até o mundo subterrâneo. A jornada fazia parte de um
rito divino. A mulher seria naturalmente conduzida ao mundo subter-
râneo. Apesar de ter medo, ela deveria ir ao encontro de seu noivo. Ao
empreender a descida, ela seria transformada, atingiria o conhecimen-

anseio por encontrar o Amado do mundo subterrâneo passou a ser nos


mitos mais recentes um desejo e uma captura” (ESTES, 1999, p.306).
Simbolicamente, o rapto de Core pode ser compreendido como
uma iniciação, um rito de morte para o renascimento numa nova fase
de vida.

-
senta simbolicamente uma fase do desenvolvimento em que o ego femi-
nino permanece preso ao inconsciente materno e ao

materno impede qualquer encontro individual e completo entre homem


e mulher. A alienação em relação ao masculino e a hostilidade em rela-
ção aos homens podem impossibilitar a relação com o próprio elemento

com o homem apenas sexual, como no mito das Amazonas, mantendo


a união com o grupo feminino e se relacionando com o masculino como
algo estranho, necessário apenas para procriação ou satisfação sexual,
sem envolvimento afetivo.

-
mento, como as núpcias da morte, é um arquétipo central dos mistérios
femininos. Não é por mero acaso, que o símbolo central da virgindade
-
-
-
riosa. Tornar-se mulher e mãe e nessa transição chegar às profundezas

da vida real.

numa nova etapa do desenvolvimento feminino. Neumann (2000, p. 19)

um arquétipo é constelado e experimentado como algo numinoso e in-

-
mente cria novas formas de adaptação ao arquétipo que conduz ao de-

arrebatador transpessoal, que ela não vivencia pessoalmente na rela-


ção com um homem concreto, nem projeta nele. Na mitologia esse es-
tágio é representado pela virgem que é dominada por um deus que se
transforma em animal, nuvem ou vento, chuva de ouro, representando
forças inconscientes e conteúdos transpessoais, cuja energia excede a

personalidade da qual se apodera”.


-
tico da morte-matrimônio, no qual a energia masculina se manifesta na

reino. A imagem arquetípica do Masculino como monstro está presente

na aceitação da situação de arrebatamento, ao deixar-se dominar, a mu-


lher vence o medo e sua ansiedade é transformada no prazer do orgas-
mo”. (NEUMANN, 2000, p 22).
Quando ocorre uma demora ou regressão no desenvolvimento da

-
ceiro também pode fazer esse papel, quando a mulher projeta nele as
próprias qualidades masculinas arquetípicas interiores de autonomia e

arquetípico para prepará-la para o encontro com o homem real e para


o próprio desenvolvimento. Na mitologia esse processo corresponde à
fase da batalha entre o herói e o monstro devorador, ou seja, entre o ego
e as forças regressivas.
No processo de individuação feminino, segundo Neumann (2000,

mulher se retira de seu relacionamento com um parceiro externo e vol-


ta-se para si mesma, vivencia o lado masculino arquetípico da sua pró-

de transformação leva a uma confrontação com a divindade masculina

criança divina e o encontro com o Self. Emerge a imagem da união dos


-
talidade da psique.

Filho de Crono e Reia, irmão de Zeus e Poseidon, como seus ir-


-

assumiu a soberania do mundo subterrâneo. Seu reino estava localizado

provocando medo, mas tem um ponto fraco em sua liderança


aterrorizante, apenas teme seu irmão Poseidon, porque este,
ao sacudir a terra, pode fazer o solo se abrir e revelar aos olhos
de todos os mortais e imortais sua morada horripilante, aonde

-
que a ele pertence toda a riqueza inexaurível que há nas entranhas da
-
presentado com os cornos da abundância.
No mundo clássico, o plantio se fazia no outono e a colheita du-
rante a primavera; os frutos da colheita, os cereais, eram armazenados
em silos, depósitos subterrâneos, no auge do verão, para serem replan-

comunidade se encontravam nas profundezas do mundo subterrâneo,


-
nais (CAMPBELL, 1997).
-
nunciado por medo de lhe excitar a cólera. Raramente era representado
usando um capacete que o tornava invisível. Seu mundo é a obscurida-
de, pois o deus nunca viveu na luz, assim como o planeta que tem seu
nome, Plutão, é o mais distante e não recebe a luz do Sol (GUTTMAN;

-
-
-
tuais. Na morte, perda ou separação, por meio da dor e da tristeza, pode
ocorrer uma profunda transformação emocional e o renascimento para
uma nova vida.

-
do ao caso da mulher que só pode ser criativa e se expressar, com a per-

para que ela possa exercer seu trabalho ou sua arte. Ele os considera um
tipo de distração, para que ela não se deprima, mas a prioridade é exer-
cer a função de esposa e o cuidado da família. Quando essa mulher sobe
ao reino da luz e encontra suas companheiras, pode brilhar e criar vida.
Entretanto, exerce suas atividades, sempre atenta ao relógio, pois no ho-
rário marcado, o marido volta para busca-la e ela deve entrar novamente

-
-
pecto negativo de Perséfone é a depressão, esse pode ser um transtorno
psíquico característico desse tipo feminino.
Por outro lado, a imagem da deusa do mundo subterrâneo pode
representar a mulher mediadora entre a realidade cotidiana e a dimen-

nos mistérios da vida, aquela que experimentou em si mesma aquilo que


ensina. Perséfone é a médium, a religiosa, a sacerdotisa, a terapeuta, a
-
des opostas.

As seguintes obras ilustram como o mito foi representado por meio


-
te a emoção provocada pela narrativa mítica. Desse modo a mensagem
chega ao receptor por outra via, não passa antes pela razão, mas des-
perta sentimentos, facilita o envolvimento emocional, atingindo-o em
profundidade. É de conhecimento geral que uma obra de arte é capaz
Figura 1. Niccolo Dell’abbate, O Rapto de Proserpina, 1570. Óleo sobre tela, 196 x 215
cm. Museu do Louvre, Paris.

-
tória da arte, principalmente no Renascimento. Entre as obras que re-
tratam o mito está o quadro do pintor italiano, Niccolo Dell’abbate, O

do pintor Giovanni Dell’Abbate, frequentou a escola de Júlio Romain, na

Foi denominado de Renascimento, Renascença ou Renascentismo,


o período da história da Europa entre os meados do século XIV e o
fim do século XVI. Caracterizado pela transição do feudalismo para

economia, política e religião. Mas, este período ficou mais conhecido

fundamenta-se em conceitos da Antiguidade Clássica, destacando-se


a cultura greco-romana. Era tida em alta consideração a bibliografia e
relíquias desta época.
Nos séculos XIV e XV, artistas da Europa setentrional, como Itália,
inspirados na arte clássica, buscavam retratar o mundo de forma mais
real e naturalista. Para pintar o corpo humano estudavam a anatomia
-

óleo, dando especial atenção aos detalhes minuciosos. A arte do norte da


Europa foi transformada pela tinta a óleo. A pintura de painéis era feita
até então com tempera a ovo, trabalho lento e com pinceladas pequenas.
Com a inovação de usar a tinta a óleo, ampliaram-se as possibilidades
dentro da pintura. Com as camadas transparentes da veladura, as cores

-
ra, que parecia de carne e osso. As vestes ganharam movimento natural,

muito esmero e relevância, geralmente trazendo conteúdos simbólicos


ligados ao tema principal. As esculturas em mármore parecem leves e
sugerem movimentos, as dobras das roupas dão ideia de maciez e leveza.
As obras em tamanho natural parecem estar vivas. Muitos artistas reto-
maram os temas mitológicos da Grécia antiga.
-

ideais, assim as obras apresentam imagens realistas, que exploram a be-


leza das formas do corpo humano e da paisagem.
Na pintura de Niccolo Dell’abbate, (1570) há
vários níveis de perspectiva. As nuvens carregadas ao fundo, a escuridão

e ninfas, rompendo a paz e a harmonia em que se encontravam junto à

leve, em tom de vermelho vivo brilhante, o deus corre com Perséfone em


Ao se observar a pintura, o olhar recai imediatamente sobre o teci-

brilhante, centrifugo, é diurno, macho, tônico, incita à ação, é irredutí-


vel. A cena revela uma imagem de ardor e de beleza, de força impulsiva

demarcado o lugar de batalha ou da dialética, entre o céu o e o inferno.


No Barroco há várias obras que representam o tema, como a es-
cultura em mármore branco, (1621-1622) de Gean

italiano executou uma de suas obras primas, caracterizada pela drama-


ticidade da cena, o naturalismo das formas e a impressão de movimento.

em Roma e se expandiu por toda a Europa, destacando-se mais nos paí-

decorado com ornamentos dourados, às vezes de ouro puro.


A arte barroca se estendeu para a moda e a música. Na música

Claudio Monteverdi (sec. XVII) até a morte de Johann Sebastian Bach

, apresentando o barroco e a música em harmonia.


-
de do Alto Renascimento, mas conservou elementos do Maneirismo, a
intensa emoção e o senso de movimento, dentro de um estilo novo e
dinâmico.
Gean Lorenzo Bernini (1598-1680) foi o principal artista de Roma.
Seus edifícios, fontes e esculturas transformaram a paisagem da cidade.
Suas obras expressam profundos sentimentos religiosos. Representante
máximo da arte barroca destacou-se por suas esculturas, como arquiteto
e pintor.
A escultura (1621-1622) parece estar viva,
-
sesperada, luta empurrando sua cabeça. Dos olhos de Perséfone correm
lágrimas; de sua boca entreaberta, quase dá para ouvir um grito de dor.

-
dos e a beleza das mãos, que expressam os gestos de posse e de repúdio,
perfeitos dentro do movimento da cena. No chão, a seu lado, está o cão

dentro de si e lhe dá vida no mármore frio. Incomparável.

Figura 2. Luca Giordano, O rapto de Proserpina, 1684-1686. Afresco do Palácio Médici


Riccardi, Florença.

No século XVII, Luca Giordano (1632-1705) retratou

pintor italiano era reconhecido entre seus colegas por sua agilidade em
pintar e imitar o estilo de outros pintores, porém, sem fazer cópias. Suas
obras estão em Nápoles, Florença, Madrid e Roma.

Giordano não registra apenas o momento do rapto, mas também a


margens do Rio Estige. Caronte e o cão Cérbero estão à sua espera, para
fazer a passagem do reino dos vivos para o reino dos mortos.
Do lado esquerdo, no rio Estige, na barca com Caronte, estão os

que separa os dois mundos. Expressa o quanto a vida é frágil e indefesa


diante da morte. Perséfone ainda resiste em fazer a passagem, porém,

confere dramaticidade à cena.

-
tros, também retrataram a cena do rapto de forma dramática, enfatizan-
-
gens representadas.
-

dramaticidade na concepção da cena do rapto, expressando esse mo-


mento com delicada sutileza.

Figura 3. Èmile André Boisseau, O Rapto de Perséfone, 1860. Relevo em alabastro,


69x32 cm. Coleção particular.
neobarroco, é reconhecido pelos franceses pela estátua que representa

Revolução Francesa), que está na fachada da prefeitura de Paris.

-
pectos do estilo da arte barroca, que se caracterizou pela grandiosidade,

Boisseau (1842-1923), é um relevo em alabastro, que se caracteriza pelos


detalhes de linhas suaves e precisas. A cena é delicada, há tristeza e co-
moção sutilmente representadas. A jovem despede-se das companhei-
ras, que se dirigem a ela lentamente, surpresas, num súbito instante que
se fez eterno, enquanto a pedra durar. A jovem é bela e seu raptor, bem
mais velho, porém forte e ágil. Ele sobe na biga em movimento, dispos-

-
Figura 4. Dante Gabriel Rossetti, Proserpina, 1874. Óleo sobre tela. Tate Britain.

a deusa do mundo subterrâneo na obra (1874).

Dante Gabriel Rossetti (1828-1882), fundou em Londres uma sociedade


secreta, a Irmandade Pré-rafaelita, tendo como objetivo reformar a arte
.

pintores ingleses propunha romper com a tradição artística, assim, en-


vinha de um lado da tela, enfatizando as sombras e destacando o relevo,
os pré-rafaelitas utilizavam cores vivas e iluminadas em todo o quadro,

centrais, com muito mais detalhes e não trabalhar tanto os elementos


no segundo plano, os pré-rafaelitas, entretanto, tratavam todos os ele-
mentos, até o pano de fundo, com pormenor e precisão.

Inglaterra. Sua arte se caracteriza pela sensualidade e mistério. Poeta,

europeus.
A obra (1874) representa Perséfone em um salão som-
-
te e deixa penetrar a luz do mundo superior, projetada na parede atrás

hera e o incensário, atributo da deusa.


-
za, envolta em leve vestido azul acetinado. Parece concentrada em seus
pensamentos, segurando na mão esquerda uma romã aberta, fruta que

esposo, passando com ele uma parte do ano no mundo subterrâneo.


Ao fundo pende um ramo de hera. A planta, sempre verde, repre-

Na Grécia antiga, era entregue aos noivos na cerimônia de casamento.


Trepadeira vigorosa, a hera simbolizava a vida vegetativa e a sensuali-

mão esquerda, perto do coração, transmite saudades. A mão direita pa-


rece deter a esquerda, impedindo-a de dar continuidade à ação pensada.
Parece hesitar em comer a fruta que a manteria vinculada para sempre
ao mundo subterrâneo e a seu esposo. Perséfone está vestindo um tecido

vestido azul, com suas dobras, completa o mistério que a envolve.


Gabriel Rossetti pintou no início de 1874). Rossetti, que também era

quadro:

Unto this wall, - one instant and no more

Dire fruit, which, tasted once, must thrall me here.

Afar from mine own self I seem, and wing

And still some heart unto some soul doth pine,


(Whose sounds mine inner sense in fain to bring,

Longe a luz que traz fria alegria /Para esta parede, - um ins-
tante e não mais/ Admitida na minha distante porta do palá-

que provei uma vez, e me manterá aqui. / Longe os céus deste


tartárico cinza / Isso me arrepia: e longe, a que distância, / As
noites que serão dos dias que foram. / Longe de mim mesma
eu me vejo, e voando / Estranhos caminhos no pensamento,
atenta a um sinal: / E ainda algum coração por alguma alma
-

momento lhe parece tão distante, a ponto de se sentir confusa e infeliz.


Figura 5. Ulpiano Checa, O Rapto de Proserpina, 1888. Nanquim, aquarela e guache
sobre papel. 59 x 44,2 cm. Museu Ulpiano Checa, Madri.

Ulpiano Checa (1860-1916), pintor, escultor e ilustrador espanhol,


foi considerado um artista eclético, que incorporou conceitos do impres-
sionismo e academismo sem se enquadrar em nenhum desses movimen-
tos. Sua obra se caracteriza pela fantasia e movimento. Cavalos a galope
são elementos constantes em suas pinturas. Interessou-se pelo impé-
rio romano e estudou a arquitetura, vestuário, carros, batalhas e outros
detalhes da época. Suas obras transmitem impressionante sensação de
movimento e dinamismo. Ficou mais conhecido atualmente depois que
diretores de cinema se inspiraram em suas telas para compor detalhes

A cena do rapto é dramática, porém, representada com a simpli-


cidade e a suavidade que a técnica da aquarela permite. Transmite a

sombria como o cenário e os cavalos negros. Destaca-se a imagem de


Core, muito alva. A jovem loira é carregada nos braços fortes do pode-

-
cida, totalmente passiva e alheia ao que acontece. A sensação da descida

a partir de cima e de frente, sendo está uma perspectiva incomum nas


obras sobre o tema.
-
los negros, que estão a galope. São cavalos das trevas, do mundo ctonia-
no, vivem nas entranhas da terra ou nas abissais profundezas do mar.
-
dor de morte e de vida, a um só tempo ligado ao fogo destruidor e à
-
das pelo I-Ching, o cavalo tornou-se montaria dos deuses. Considerado
montaria de , a divindade dos ventos, está relacionado ao elemento

inconsciente ou da psique não humana, arquétipo próximo ao da Mãe,


memória do mundo, ou então do tempo, ligado aos relógios naturais, à

pelo desejo de possuir Perséfone, libera a impetuosidade instintiva, sua

seus braços e a conduz ao mundo subterrâneo.


Vários artistas se ocuparam com a temática do mito, porém o re-
presentaram em diferentes etapas da narrativa, não se limitando à cena
-
mas obras.
Figura 6. Frederic Leighton, O Retorno de Perséfone 1891. Óleo sobre tela, 203 x 152

-
dental até o século XIX. Manifesta-se contra os excessos decorativos e

cultura da antiguidade clássica.

mito na obra (1891). Retratando o momento em


-

com duas serpentes entrelaçadas, símbolo do mensageiro dos deuses,


que a conduziu dos infernos, de volta para a mãe. Perséfone estende as
mãos para a deusa que a espera de braços abertos, à beira do abismo
rochoso. Do lado de fora há muita luz, que ilumina o rosto daquela que
emerge da escuridão. Predominam as cores rosadas e suaves. Este é um
-
dicam que se trata do reencontro das deusas que governam a terra, os
grãos e os mistérios da vida, morte e renascimento.
Aqui Perséfone encontra-se novamente no limiar entre os dois
mundos, porém, no caminho inverso, saindo do reino dos mortos e re-
tornando à superfície da terra, onde reina sua mãe, Deméter. Como rai-
nha, Perséfone conhece os mistérios que envolvem o mundo subterrâ-
neo, mas também precisa retornar periodicamente para que a alegria de
sua mãe faça renascer a vida na terra.
-
perior. Sua saída do mundo inferior se deu com a intervenção de Zeus,

entre os mundos. Ele é o mensageiro dos deuses e é quem conduz as


almas, tendo livre. Acesso ao mundo subterrâneo.

são as deusas da alternância entre vida e morte, que marcam os ritmos

Deméter Pranteando por Perséfone, 1906. De Morgan


Centre, Londres.
irmandade Pré-rafaelita, mas sua obra apresenta características simbo-
-
vimentos da natureza vida-morte-vida, a vida em si, o subjetivismo, a
musicalidade e o transcendentalismo, inspiraram muitos artistas, tais

simbologia da cor, a relação entre forma e cromatismo, como pode ser

Em
à imagem de Deméter. Pintou a deusa vestida de amarelo dourado como

ao fundo, sendo que o sol é símbolo do eterno ciclo do retorno da morte.


Deusa da fecundidade, fertilidade, regeneração e renovação da
vida, Deméter já existia antes da Grécia antiga, tendo se originado nos

Menor, no Egito e na ilha de Creta entre 4000 a 1000 a. C. Seu animal

Na pintura, as rochas escuras e pontiagudas do primeiro plano ex-


pressam a dor e o sofrimento da De joelhos sobre as pe-
dras, Deméter envolve a cabeça com as mãos, olhando para o chão, como

diante dos fatos são notáveis. A deusa está profundamente deprimida.

corpo, é símbolo de autoridade e do poder político e social. Ao ajoelhar-


-se Deméter demonstra sua humildade diante dos deuses e se submete
à sua vontade.
Com a cabeça entre as mãos olhando para as rochas percebe que
não pode fazer nada e que depende da intercessão de uma divindade
suprema. Sua energia vital está se esvaindo. As mãos buscam, entre os
cabelos de trigo, renovação.

até antes deste período, é símbolo de morte e de ressureição, presentes


um alimento primordial.

Rogai a Zeus infernal e à pura Deméter para tornar prenhe em


sua maturidade o trigo sagrado de Deméter, no preciso instante
em que, ao começar a lavoura e segurar a empunhadura do ara-
do tangereis os bois que puxam o arado sob o cravelho da can-
ga... Assim, no momento de sua plenitude, vossas espigas ver-

A simbólica do trigo está presente em diversas culturas, perpassa


pelas mitologias chegando ao judaísmo cristão. Quando São João (12,23-
-
nhum outro símbolo, senão ao grão de trigo.

verdade, em verdade, vos digo: Se o grão de trigo que cai na terra não mor-
rer permanecerá só; mas se morrer produzirá muito fruto. Quem odeia sua
vida neste mundo guardá-la a para vida eterna.”

seus atributos e representa a terra, mas também o sono e o esquecimento


que toma os seres humanos após a morte e antes do renascimento.
-
ce pela obra, sua intensidade se compara aos raios do sol no amanhecer,
atravessa os limites do azul celeste. Amarelo é a cor do deus do sol, é a luz
do ouro, da terra fértil, da eternidade. Mas também é a cor do entardecer,
do outono, anuncia o declínio da vida, a velhice e a aproximação da morte.

deusa e os grãos, que com seu sofrimento, também secarão e a humanida-


A partir do relato, da leitura simbólica e da representação na arte,
observa-se que o mito estimula o surgimento de uma série de temas

algumas ideias, mas como os mitos são inesgotáveis, muitas mais podem
ser utilizadas.

I.

• Qual a sensação de viver temporariamente num lugar estranho,


-



• Vários artistas imaginaram e reproduziram a cena do rapto de
Perséfone, como as obras comentadas anteriormente. Qual a
-

II.

• Apresentação e narrativa do mito: No ambiente decorado com


-
sentar as deusas e narrar o mito de Deméter e Perséfone.
• Escolher uma música que estimule os participantes a dançar li-
vremente utilizando lenços ou véus coloridos.
• Expressar com gestos que somos capazes de aprender tudo o
que a deusa tem a oferecer. Lentamente vamos parando o movi-

o grupo.

desenhá-las.

• Escolher uma das obras acima e fazer uma releitura da obra.
Utilize a técnica da colagem, tendo como suporte a cartolina ou
papelão.
• Escrever uma poesia sobre a primavera. A atividade pode ser
feita em grupo ou individualmente. Para estimular a escrita
criativa retire algumas palavras do mito e as inclua no poema,
tente rimar os versos.
• Criar objetos artesanais utilizando elementos da natureza,
tais como, casca de coco, de nozes, grãos e sementes variadas,
transformar esses materiais, símbolos de renovação da vida, em
novos produtos.
• A partir da poesia abaixo crie uma expressão utilizando tinta
gauche ou giz de cera.

Passarão com o inverno,

As lágrimas e a tristeza.

Fez encontrar lá no fundo,


Um pedaço esquecido de mim,
Uma semente de mundo.
(Lúcia Soares, poesia não publicada).
Numa luta de gregos e troianos

Conta a história que um cavalo de pau


Terminava uma guerra de dez anos.
Menelau, o maior dos espartanos,
Venceu Páris, o grande sedutor,

Em defesa da honra caprichosa.


Mulher nova, bonita e carinhosa,
Faz o homem gemer sem sentir dor.

Zeus, apaixonado por Leda, esposa do rei Tíndaro de Esparta, to-


mou a forma de um cisne e a seduziu, às margens de um riacho. Leda deu

eram semideuses.

que levou à Guerra de Troia. Essa estória, porém, começa muito antes, no
casamento de Peleu e Tétis.
Prometeu, o titã que havia roubado o fogo dos deuses para a hu-
manidade, previu algo que interessava a Zeus e em troca dessa revelação,
foi libertado de seu castigo. Tétis, a linda nereida por quem estava apai-

ser derrotado, Zeus, desistiu de Tétis e resolveu arranjar-lhe um marido

costumava nadar completamente nua numa praia deserta, cavalgando


-
reção, mas ela fugiu desaparecendo nas ondas do mar. Tétis não queria
se casar e rejeitava seus pretendentes. Ela tinha o poder de se transfor-
mar em animal selvagem, fogo ou tempestade para se livrar do assédio.
Peleu, não sabendo como se aproximar da amada, resolveu aconselhar-
-se com o centauro Quíron.
Quíron disse que Tétis era tão especial que até o próprio Zeus a
desejava. Aconselhou a abraça-la fortemente enquanto ela estivesse
adormecida e não soltar apesar do que acontecesse. Assim, Peleu apro-
Ela
então se transformou numa fogueira, mas ele resistiu à queimadura. Em
forma de serpente, várias vezes ela o picou, mas ele não a soltou. Então
ela virou uma tigresa feroz e mesmo assim ele continuou resistindo aos
seus ataques, até que ela cedeu
aceitou como marido.
A cerimônia do casamento de Peleu e Tétis reuniu deuses e mor-
tais. Conforme a tradição, cada um dos deuses ofereceu um presente ao
casal. Éris, a discórdia, compareceu sem ser convidada e lançou em di-
reção às deusas, uma maçã de ouro, destinada a mais bela. Esse gesto
provocou uma disputa entre .
Zeus determinou que Páris fosse o juiz da competição desencadea-
da pelo pomo da discórdia.
Troia. Pouco antes de nascer, sua mãe sonhou que uma tocha incendia-
que traria a
destruição e decidiu expor a criança logo após o nascimento. Um servo,
porém, recolheu o menino e o criou secretamente. Páris se tornou pastor
de rebanhos no Monte Ida, mas ao vencer os jogos disputados em Troia,
foi reconhecido por sua irmã Cassandra e acolhido por seus pais.
Páris era um jovem belo e sedutor que se envolvia em muitas aven-
turas amorosas. Por esse motivo foi escolhido por Zeus para a difícil ta-
Cada uma
prometeu proteção e favores especiais para que ele as escolhesse.
lhe ofereceu poder, Atena, sucesso e sabedoria; enquanto Afrodite pro-
meteu-lhe o amor da mulher mais bela do mundo.

Esparta.
Depois de ter escolhido a quem daria a maçã de ouro, Páris viajou
para Esparta onde foi bem recebido por Menelau. Ficou aguardando uma
oportunidade e assim que o rei precisou se ausentar, com a ajuda de
Afrodite,
-
nha nove anos de idade, mas foi libertada por seus irmãos Castor e Pólux.
Tornou-se uma bela mulher e foi disputada por muitos pretendentes.

com o irmão dele, Agamenon.


Tendo a esposa raptada por Páris, Menelau apelou para o pacto
-
to e declarando guerra contra Troia. Como vingança, as deusas preteri-
. Apolo,
Afrodite e Ares, lutaram ao lado dos troianos.
Troia foi sitiada e a guerra se prolongou por dez anos até que, por
meio da armadilha do cavalo de madeira, os gregos conseguiram pene-
-
mão Deífobo. Durante a invasão da cidade, Menelau entrou no palácio
mostrou seu corpo nu e Menelau perdeu a coragem, acabou se reconci-

-
to, o mito traz o tema arquetípico da união dos opostos no casamento

-
guiana, o casamento simboliza, no curso do processo de individualiza-
ção ou de integração da personalidade, a conciliação do inconsciente,

Essa estória se inicia com Tétis, uma divindade aquática que não
se deixa seduzir. A sabedoria de Quíron, o curador arquetípico, entre-
-
çá-la, os dois corpos se tornam um, ocorre a soma das energias, aquele
que deseja abraçar contém o outro que resiste ao abraço. Mesmo com

realmente a deseja e a ama.


A espera não a conquistaria, sendo necessário agir com energia.

-
traparte feminina, a anima, e a mulher seu aspecto masculino, o animus.
A leitura do mito pode ser feita a partir de ambos os pontos de vista.
Tétis pode representar a mulher que exige do companheiro, a prin-

de afeto. Necessita de um parceiro que a compreenda em suas mudanças


Simbolicamente, Tétis é o princípio feminino, o elemento rege-
nerador e iniciador do masculino. Peleu aceita passar pelas provas de
iniciação, quando decide abraçar sua arredia amada. Ao se transformar
em fogueira, Tétis encarna o elemento fogo, que em seu aspecto positi-

e iluminadora; em seu aspecto negativo, queima, devora e destrói. Na


junção destas polaridades, o fogo, em sua totalidade simbólica, é trans-
formador espiritual.
Ao se metamorfosear em serpente, Tétis dá vida ao conjunto de
arquétipos, morte, vida e renascimento, de forma primordial. Neste mo-
mento Tétis faz Peleu descer as camadas mais profundas da psique, onde
se encontra a origem da vida. Assim, Peleu traz conteúdos profundos

Transformando-se em tigresa, Tétis manifesta poder e ferocidade.


Considerado como um ser da escuridão e da lua nova, o tigre é também
-
doeste asiático, o tigre ancestral mítico é visto como o iniciador.
Em outra versão, entretanto, a divindade se metamorfoseia em
-
melhas, do período clássico, século V a. C. citada por Campbell (2015, p.
256) e que mostra um jovem sendo iniciado por uma mulher. É uma cena
de casamento como iniciação do masculino, despertando-o para o senti-

segundo o autor, a imagem pertence a uma tradição anterior, semelhan-


te à deusa cretense que tinha os mesmos atributos, segurava nas mãos
as serpentes e uma pantera ou leão na cabeça. A picada da serpente é

para o transcendente, para a energia e conhecimento da vida que o leão


representa. As serpentes simbolizam a energia no campo do tempo e
a pantera, o poder solar, a vida eterna desvinculada da temporalidade,
onde tudo se divide em pares opostos, vida e morte, luz e escuridão. A

animal terrestre e outro solar, a vida na matéria e a espiritualidade. Esse


é, portanto, um casamento sagrado, simbolizando a união de princípios
opostos.

se una com sua parte feminina (anima) ou estabeleça uma harmonia com
ela, assim como a mulher igualmente se integre com seu lado masculino
(animus). Esse equilíbrio é importante para manter a integridade psíqui-
ca e para um parceiro não subjugar o outro na relação conjugal.
No casamento em que se pretendia, a todo custo afastar a discór-

Desde o início havia incerteza quanto à relação de um mortal com


uma nereida instável e relutante e o casamento não foi mesmo uma
-

o pai o salvou a tempo. Não podendo imortalizá-lo, a mãe ainda ten-


tou torná-lo invulnerável mergulhando-o no rio Estige. Para isso teve
de segurar a criança pelos calcanhares, assim essa parte do corpo era

-
lho participasse para a guerra de Troia, obrigando-o a ir para a corte do
rei Licomedes de Squiros. Aquiles vestiu roupas femininas e escondeu-se
entre as mulheres, mas foi descoberto por Ulisses e foi convocado para a
-
sa à proteção no anonimato.

A desavença provocada por Éris envolveu as deusas Afrodite,

a mais bela, foi um apelo à vaidade. Além disso, essa atitude levou a uma
comparação. Determinar quem é mais, ou melhor, provoca julgamento

-
çado porque a deusa excluída quis se vingar. Na Psicologia Analítica,
considera-se que os aspectos reprimidos se tornam sombrios e exercem
-
mente emerge com mais intensidade.
Assim, a tentativa de exclusão da discórdia, de uma simples fes-
ta de casamento, acarretou uma guerra longa e sangrenta. Apesar dos
-
mente ferido, no único ponto vulnerável de seu corpo, que a mãe não
conseguiu proteger, o calcanhar.

fada. Despertou interesse em pesquisadores renomados.


A maçã é um símbolo do conhecimento do bem e do mal que pro-

pentagrama no interior da maçã representa o espírito na matéria e esta-

-
no e o princípio feminino. Para os pitagóricos da antiguidade representa
.
Antigo símbolo da fertilidade, a maçã vermelha representa o amor.
Pela forma esférica, está associada à imortalidade. Simboliza ainda a sa-

opostos (EDINGER, 1989, p.42).


Como um dos frutos simbólicos dos desejos sensuais, da imorta-
-

fundamental do princípio da vida, com seu poder e força vital, é a cor


do sangue, do fogo, e do sol. Evoca a paixão, a intensidade, a ação e a
expansividade.
Para a Alquimia, o ouro é a matéria perfeita. É o metal cujo brilho
e perfeição inalterável faz com que seja considerado valioso e cobiçado

-
to, gerado nas entranhas da terra, de Gaia. Para os egípcios o ouro era a

contraponto do simbolismo do ouro, ele representa a perversão, a impu-


reza a exaltação dos desejos, degradação do imortal em mortal.
As tentativas dos alquimistas de obter ouro podem ser relaciona-

o que é superior, o tesouro difícil de encontrar, os bens espirituais e a

A maçã de ouro representa, portanto, a imortalidade, a sabedoria,


um bem espiritual difícil de atingir.

A maçã dourada propicia a entrada no paraíso da forma e da


beleza. A maçã associa-se à imortalidade e sabemos que alguns

recebiam uma maçã dourada como passaporte para o paraíso. A

detalhe delicioso sobre a maçã: se a cortarmos transversalmen-


te, veremos nas sementes escuras o pentáculo sagrado com
suas cinco pontas. É esse o sinal secreto da Mulher Sagrada,

1991, p. 180).

Na mitologia grega, havia as maçãs de ouro no Jardim das

cumprido sua missão, as entrega para Atena, mas a deusa recusa e devol-
Psicologia Analítica, o . Assim, McLean (1992, p. 30) considera que

elas representam. Por vezes, entretanto, uma parte desse conhecimento


penetra na mente consciente, causando certa perplexidade, mas oferece
uma fonte de inspiração.

Jardim, portanto, o que estava em jogo não era o troféu, mas o título de
mais bela, como num concurso de beleza.

nos assuntos humanos, tomar partido, proteger alguns e prejudicar ou-

A desmedida da beleza é a vaidade e este seria o motivo da dis-


puta. A verdadeira beleza, porém, está simbolizada pelo brilho dourado
do espírito que anima a matéria. A maçã de ouro estaria simbolizando o
feminino espiritualizado.

é a manifestação do espírito no mundo material. Se a maçã representa


a tentação, o gozo, o deleite do sabor e do aroma, a entrega ao prazer e

e se há correlação de sentido entre a fruta e a mulher, a maçã dourada é

bela do mundo foi motivo de uma guerra entre os homens.

-
do que escolheu entre muitos pretendentes. Afrodite, entretanto, a fez
-

-
tencesse a todos os espartanos e não pudesse ser tomada pelo inimigo,
devendo ser resgatada à custa de muitas vidas, em dez anos de batalhas.

próprio Zeus, o espírito que desce ao plano terreno metamorfoseado


-
dor divino com a matéria; é uma semideusa, uma mulher extraordinária.
Representa o princípio feminino, dotada das melhores qualidades, capaz
de encarnar a projeção da mulher ideal.

instrumento do jogo dos deuses. Como objeto em disputa, não tem von-

unir-se a ele, a deusa ameaça deixá-la entregue à própria sorte e à morte,

A mulher que se destaca pela beleza, de certa forma, perde o di-


reito de viver por si mesma e passa a existir para ser admirada; servir
como tela de projeção, modelo, objeto das fantasias e desejos alheios.
Torna-se alvo de inveja das outras mulheres e motivo de disputa entre os
homens. Essa mulher não pode ter personalidade. É o que esperam que
seja, um objeto de desejo.
-
-

A cultura grega, voltada para as artes, valorizava a harmonia das

relacionada aos elevados ideais masculinos projetados na imagem femi-


nina e paradoxalmente, ao medo da atração fatal que ela exerce.

p. 140).

ao momento em que se deve tomar uma importante decisão. A escolha


revela o caráter e implica em responsabilidade porque toda ação tem

2017, p.48).

de poderes que operam na vida e aquele a que se escolhe reverenciar,


simboliza as possibilidades que serão representadas dentro da própria
realidade. Assim, quando Páris é solicitado a escolher uma das deusas,
-
sas são os possíveis destinos de Páris. Representam as energias femini-
nas das quais o masculino é apenas um agente. Como musa, deusa mãe
que o feminino representa.
-
tino, o passado, o presente, assim como o futuro, que é o que há de vir
após a morte.

A literatura, o folclore, o mito e a teoria psicológica reprodu-


-

de Páris), isso quer dizer que a beleza e o amor, prometidos ao

imagem silenciosa da morte que o recolherá em seus braços


amantes (MEIRA PENNA, 1999, p.82).

Desprezando poder ou riqueza, Páris escolheu possuir a mais bela


mulher. Foi uma escolha imatura, motivada pela impulsividade ou uma
decisão orientada por um aspecto mais profundo da dinâmica intrapsí-
-
-la representa um poder muito maior, que o colocaria acima de todos os
homens, por ser o único a ter o que todos almejavam. Imaginou, talvez,
conseguir se tornar completo, encontrando sua contraparte feminina na

de todos os homens e um bem maior que todas as conquistas materiais.


-
-
dades. Paris escolheu o bem que julgou mais precioso com a proteção
da deusa do amor. Conseguiu conquistar, mas não foi capaz de manter

os sexos. A escolha da atraente Afrodite como principal interesse mas-


-

os outros desvalorizados. Assim, os homens perdem a oportunidade de


-
lheres são forçadas a desenvolver uma única faceta de sua natureza. Isso
-
mens e mulheres na sociedade atual.
-
são atual. Reúne em si os aspectos da sexualidade, da vida íntima e das
-
tidos, a imaginação e o contato criativo entre os sexos. É a deusa da be-
leza e, portanto, inspiradora das artes visuais, da música, e da poesia.
Afrodite é extrovertida, só se sente plena com a presença física daqueles
que ama. Dá sustentação espiritual e física, mas não protege de forma
maternal possessiva. Afrodite era e é, em tudo, uma presença sensual.
Para os gregos antigos, ela era a ‘deusa áurea’. Como o sol glorioso, ela
brilhava sobre aquela cultura precoce abençoando-a com as artes da es-

da fecundação e sendo raptada por Teseu e Páris, faz supor que teria sido
primitivamente uma deusa da vegetação e, portanto, uma vítima des-
tinada ao rapto. Com o tempo, suplantada por outras divindades, teria
caído no esquecimento e integrada ao grupo das heroínas, fato comum

um ritual agrícola, que se pratica no outono, após a colheita, momento


de preparar a próxima safra. Faz parte de um ritual de iniciação e de um
rito da vegetação, como ainda se pode observar em culturas primitivas.
Raptar a esposa é parte de um rito de fertilização. Atualmente existe

-
dantes ligadas ao simbolismo do casamento sagrado, em que a união
do masculino e do feminino, cria uma harmonia que se expande pela a
natureza e propicia abundância.
deve possuir, mas que todos desejam.

uma versão, noventa e nove homens, aguardavam uma resposta de seu

para essa disputa e aconselhou o pai da jovem a propor um acordo. A

e defender aquele que seria seu esposo.


-
ca da totalidade. Noventa e nove homens esperando por uma mulher,
somam cem pessoas, dez vezes dez. Cem é a mais alta representação de
uma pluralidade fechada em um todo maior. Noventa e nove, reforça o

No simbolismo numérico, dez é o retorno à unidade, iniciando


uma nova etapa depois dos nove primeiros números. A dezena simboliza
a totalidade do universo. Como último número da série dos números

a morte e o renascimento. Expressa o término de um ciclo e o início de


-

1998).
Menelau queria recuperar a esposa e empreendeu uma jornada
com a ajuda dos melhores guerreiros e companheiros que lhe prome-

uniram para resgatá-la. Atravessaram o mar enfrentado perigos e sitia-


ram a cidade de Troia, por dez anos de luta, por causa de uma mulher.

Torna-se, a essa altura, mais claro o motivo do pacto entre os pre-

ele a perdesse, todos deveriam resgatá-la. Num certo sentido, é como


se ela fosse parte de uma totalidade. A mulher real, que fora raptada,
deixou de ser apenas uma pessoa e passou a representar a alma dos gre-
gos, levada pelo inimigo.

-
cia do feminino.

A anima não é a imagem de uma mulher. Não é a reprodução


-
sito sublimado da imago da mãe pessoal, concreta. É antes a
mulher desconhecida, uma visão intuitiva ou onírica do eterno
feminino inspirador que nos persegue a vida inteira, que pe-
renemente procuramos sem nunca encontrar (MEIRA PENNA,
1999, p. 308).

Segundo Jung (1987, vol. XVI/2, § 361, p.44), existem quatro está-

de Eva, caracteriza um padrão de relacionamento puramente instintivo

estético e romântico. No terceiro estágio, o amor se eleva a uma dimen-


-

de Goethe representando o princípio


feminino, a mulher que inspira o desejo e a cobiça dos homens. Fausto,
como Páris, parte em busca de sua amada e a toma para si à custa da
própria alma.
A anima é o aspecto da psique masculina que atrai o homem à
aventura, à conquista do novo, mas também está associado negativa-

p.244).
desenvolvimento sem enfrentar o perigo que esse processo representa.

resgatada a qualquer custo.


-
culino deve abraçar fortemente o feminino, e neste abraço, ambos de-
vem integrar seus pares opostos, anima e animus, para atingir equilíbrio,
harmonia e evolução espiritual.

Beleza e harmonia era a constante busca dos gregos nas artes e nas

deu origem a uma guerra longa e sangrenta. Esse tema inspirou uma

escultura de Antonio Canova (1757-1821), (1819) tem na


cabeça uma parte da casca do ovo em que nasceu, como uma touca, da
qual se desprendem algumas mechas de cabelos cacheados. A escultura
representa um rosto feminino de rara beleza e suavidade, com uma ca-

Zeus, é a marca de sua origem divina.

que se inicia com o pomo da discórdia, a maçã dourada, alvo da disputa

escolhido por Zeus para escolher a mais bela. Páris opta por Afrodite e

Watteau (1684-1721), Renoir (1871-1919), Anton Raphael Mengs (1757)

pintura de Tiepolo (1696-1779).


Figura 8. Peter Paul Rubens, O julgamento de Páris, 1639. Óleo sobre madeira, 144 x

na Itália, expandindo-se pelos países católicos da Europa e da América.


-

Deus.
-
va a cor e a sensualidade. É conhecido por seus retábulos contra a refor-
ma, retratos, paisagens e temas mitológicos.
Rubens retrata o momento em que Páris estava pastoreando e

aparece uma Erínia, sinal de mal pressagio, pois, essa atitude causará
uma guerra.
eram guardiãs das leis da natureza e da ordem física e moral, por isso
puniam os transgressores, somente muito tempo depois se tornaram di-
vindades vingadoras.

e proíbe, e em seguida condena e destrói. Podem transformar-

mórbida aplacada a uma apreciação mais equilibrada dos atos

uma delas, com certeza, geraria uma guerra. Cada uma possui caracterís-
ticas próprias e únicas, mas todas querem ser a mais bela, pois a beleza
é fundamental para o feminino.
As deusas foram retratadas nuas, envoltas em tecidos leves e
transparentes, deixando à mostra todo o corpo. Ao lado de cada uma es-
tão seus atributos. Nos pés de Antena, o elmo, a capa e o escudo. Junto a

profundidade de conhecimento mitológico por parte do artista.

Figura 9. Anselm Feuerbach. O Julgamento de Páris, 1870. Óleo sobre tela, 228 x 443
Na obra de Anselm Feuerbach (1929-1829) pintor de estilo clássi-
co, da escola alemã do século XIX, apenas a deusa Atena não está des-

retratadas nuas. Disso se pode inferir que o conceito de beleza é estri-


tamente ligado às formas físicas. As deusas se submetem ao julgamento
de um simples mortal, a quem foi concedido o poder de decidir qual é

tomada por várias crianças aladas, os Erotes, companheiros constantes

um espelho para Afrodite.


-
tido simbólico do espelho é revelar a verdade e a sinceridade, o conteúdo

lendas trazem o espelho como revelador. Algumas inseriram o espelho


sem seus rituais como instrumento mágico para invocar deuses e es-
píritos. Também há a crença de que o espelho tem o poder de afastar e

o espelho revele a vaidade da deusa e antecipe que ela será a escolhida


como a mais bela.

-
to da imortalidade, era símbolo do elixir da vida. A retirada da sandália
e a doação desta para o parceiro, para os hebreus, era a garantia de um
-

conjugal e protetora do casamento.

sua beleza. Posteriormente, no simbolismo medieval, passou a personi-


pela beleza de Io, princesa de Argos, cobriu o mundo com espessas nu-

deus a transformou em uma novilha branca. Intrigada pelo interesse do

gigante Argos Panóptes. Argos, quando dormia, mantinha abertos cin-


-

os olhos de seu servo e os pôs na cauda do pavão, animal consagrado a


ela.
-

No oriente Médio, eles são representados de um lado e de outro lado da

cauda, foi denominado de animal de cem olhos e representa a totalidade.


Chevalier e Gheerbrant (1998, p.693) relatam uma linda lenda

Diz que Deus o Espírito sob a forma de pavão e lhe mostrou

tomado de um temor respeitoso e deixou cair algumas gotas de


-
mento da cauda do pavão simboliza o desdobramento cósmico
do Espírito.

Páris, sentado sobre uma pedra, observa as deusas, pensativo, com


o pomo de ouro na mão direita, que descansa sobre a perna, dando a
entender que a escolha ainda não foi realizada. Sabe que a escolha será
difícil -
mente as mulheres à sua frente.
-
versas mitologias, tendo a função de psicopompo, guia de almas,
intermediário entre o reino dos vivos e dos mortos; aquele que guia o
homem na noite da morte, após ter sido seu companheiro durante o dia
da vida. Está relacionado à terra, água e lua, símbolos femininos. Na
imagem, a presença do cão, além de caracterizar o personagem Páris
como um pastor, talvez reforce o caráter instintivo de sua escolha, dei-
xando-se seduzir pela mais bela.

Figura 10. Jacques Louis David. Os Amores de Páris e Helena 1788. Óleo sobre tela,
144x 180 cm. Museu de Artes Decorativas, Paris.

Jacques Louis David (1748-1825), representante do neoclassicis-

neoclássico (
plano, desenhadas com exatidão. Predomina a cor, sem ilusão de profun-
didade, tendo em sua composição elementos romanos, tais como arcos,
colunas, valorizando a simetria e as linhas retas. A superfície polida é
resultado de pinceladas suaves. Em sua totalidade as obras deste estilo
transmitem harmonia e equilíbrio. A escultura clássica grega e a pintura
renascentista italiana, sobretudo do mestre Rafael, foram fontes de ins-
piração para os artistas neoclássicos.
Na obra (1788), o jovem usa na cabeça
o barrete frígio característico de pastor e tem a cítara em suas mãos.

-
bre vestes na Idade Média, os judeus em geral e os patriarcas e profetas

-
dades criadoras, que usam o capuz pontiagudo como sinal de reconhe-
-

foram seus criadores. Na Grécia antiga a música teve sua origem com o

Entre os judeus, Jubal.


-
buto de Terpsícore, musa da dança, que traduz em gestos os sons do

temperança, essa virtude fundada no sentido da medida, como a música.


A cítara simboliza o canto do universo. Corresponde à cosmologia pi-
tagórica”. Neste sentido a cítara é a voz do universo, do cosmos, o som
primordial sagrado. Para os gregos antigos os harpistas eram homens
livres, que não pertenciam a nenhuma classe social.

amor transcendente, além do espaço e do tempo.


Ao fundo da obra de Jacques Louis David, uma reprodução do
Pórtico das Cariátides, com as quatro colunas esculpidas com o corpo
-
reita se encontra o fogo sagrado.
tecido vermelho está na cabeça e no púbis. Vermelho é a cor que repre-
senta o desejo sexual, o amor carnal.

Vênus convence Helena a ir com Páris, 1790.

Rússia e Inglaterra, onde participou da criação da Real Academia de


Artes em 1768. Dedicou-se aos retratos, paisagens e pintura decorativa
em estilo neoclássico.
Na obra, -
monstra receio e dúvida, enquanto a deusa do amor a abraça suavemen-
te, mostrando-se acolhedora, porém persuasiva. Estão na cena, os pom-
bos, atributos da deusa, representando a união amorosa. Cupido, com
seu arco em mãos, pronto para atingir o coração dos amantes, puxa Páris
suas vestes revela o calor da paixão.

traiu Menelau por vontade própria, mas seu destino sofreu a interven-

aceitasse partir com ele para Troia, o que motivou a guerra que envolveu
deuses e mortais.

Figura 12. Dante Gabriel Rossetti, Helena de Troia, 1863. Óleo sobre tela, 32,8 x 27,7

conceito de beleza e seus artistas tentam reproduzir da melhor maneira


o imaginário de seu tempo. Na obra acima, o pintor deu destaque aos ca-

-
semblante carrega um indício de inquietação. As mãos seguram o colar
e o indicador aponta o pendente, enquanto Troia queima por trás dela.

presente nos rituais de iniciação. A simbologia da tocha está relacionada

e profunda transformação.

Helena de Troia
Liverpool.
-

participou da escola de pintores de Norwich. Especialista em retratos


-

expressão indica apreensão ou constrangimento pela situação em que


se encontra.
Cada artista imagina a mulher mais bela do mundo de acordo com

ruiva, de pele muito clara e olhos azuis. Exibe formas volumosas, usa
adornos na cor vermelha, enfatizada em toda a pintura, transmitindo
calor e sensualidade.

Helena de Troia, 1898.


marcadas pelo estilo pré-rafaelita, era seguidora de Burne-Jones e foi
discípula de seu tio John Roddam Spencer Stanhope, que exerceu gran-

do Renascimento, especialmente as obras de Botticelli. Deixou, porém


os temas clássicos e desenvolveu seu próprio estilo. Suas pinturas ca-
racterizam-se pela espiritualidade, uso de temas mitológicos, bíblicos e
literários.

sensual, assemelhando-se à deusa da beleza, Afrodite, e agregando seus

e ruivo, o gesto e as cores, tudo cria uma atmosfera de sensualidade e be-

-
promissos e disputas; a escolha entre poder, sabedoria e amor; a vin-

envolveu deuses e mortais.

I.









• Comente sobre a estratégia dos gregos para entrar em Troia.

II.

• De olhos fechados, explorar e perceber de forma intensa o pró-

Quais são as roupas, os adornos e maquiagens que o deixariam

• Crie uma imagem da mulher mais bela do mundo. Pode ser um


desenho realista ou abstrato, representando a beleza por meio

com os demais participantes.


• Com argila modelar um corpo feminino.
• Confeccione uma maçã dourada. Utilize materiais variados,

• Elabore uma poesia exaltando a beleza feminina.


Some of us wanted but none of us could
Listen to words of warning
But on the darkest of nights

And we were caught in our sleep

Abba

Desculpe Cassandra eu entendi mal


Agora o último dia está terminando
Nós queríamos, mas não pudemos

Mas na escuridão da noite


Ninguém sabia como lutar
E nós fomos pegos dormindo
Desculpe Cassandra eu não acreditei

tecia

(tradução livre)
passaram a noite no templo de Apolo. No dia seguinte, quando foram
encontrados, ainda dormiam e duas serpentes lambiam seus ouvidos.

dom da profecia.
Apolo havia se apaixonado por Cassandra e queria que ela o acei-
tasse como amante. A jovem não se entregou ao deus que, sentindo-se
rejeitado a amaldiçoou, mas não podendo retirar o dom concedido, tirou
da jovem a capacidade de persuasão e fez com que ninguém acreditasse

nada para evitar.


Durante o cerco a Troia, Cassandra pressentiu a derrota, mas os
seus avisos foram interpretados como loucura. Um imenso cavalo de
-
tir. Cassandra tentou avisar que era uma armadilha, mas os troianos não

gregos e se opôs à entrada do gigantesco cavalo na cidadela de Troia.


Chegou, então, a notícia de sua morte, devorado por duas enormes ser-
pentes saídas das águas, fato que foi interpretado como um castigo di-
vino por não ter aceitado a oferenda do cavalo, animal consagrado a

muralhas da cidade, apesar dos presságios de Cassandra.


-
ria tomada enquanto possuísse o Paládio, uma imagem de Atena, que

guerreiros ocultos dentro do cavalo pudessem agir, Ulisses, Diomedes e


outros homens disfarçados, conseguiram entrar no templo para retirar
o Paládio e levá-lo para o acampamento grego. Assim, a cidade sem sua
proteção, poderia ser ocupada pelo inimigo.
Cassandra estava junto ao Paládio, quando Ajax invadiu o tem-
plo e a violentou junto ao altar da deusa Atena. Desesperada, sem nada
poder fazer para salvar a si e a seu povo, a princesa troiana viu a cidade
incendiar.
Após a queda de Troia, Agamenon tomou a princesa Cassandra

se voltasse para sua terra, mas novamente a profetisa não foi ouvida e,

Graves (2004) e Franchini (2007).

Cassandra foi tema do poema , escrito por Lícofron (320


- 250 a. C.), autor de várias tragédias, que viveu em Atenas no século

princesa encarcerada numa torre, vigiada por um guarda, encarregado


de registrar as suas profecias e depois lhe comunicar.
Na trilogia de Ésquilo (séc. V a. C.) conhecida como , com-
posta pelas tragédias , e , Cassandra é
personagem da peça , cujo tema é o assassinato do rei por sua

antes da partida para a Guerra de Troia e pela traição com Cassandra, a


esposa de Agamenon e seu amante Egisto, tramam sua morte. Nessa ver-

Cassandra é a protagonista dos primeiros atos da ópera ,

a partir da de Virgílio (70 – 19 a. C.). A narra as aventuras


do herói Eneias, desde a destruição de Troia até a chegada à Itália, onde
funda uma nova cidade. Cassandra prediz os feitos de Eneias e sua gló-
ria, quando mais ninguém acreditava em seus presságios.
Nessa versão do mito, Cassandra é noiva de Córebo, mas esse re-
lacionamento logo termina porque o jovem morre por não acreditar em
-
res imploravam a proteção divina. Cassandra perguntou se aceitariam
viver como escravas dos invasores e propôs que decidissem seus pró-
-

admirados ao ver que Cassandra apunhalou-se, e caiu morta enquanto


as outras mulheres fugiram ou suicidaram-se para não se entregarem
aos invasores. Nesse relato, portanto, Cassandra morreu quando ainda
estava em Troia.
, pu-
blicado em 1983, de Christa Wolf (1920-2011). A autora representou

-
reriam na época. A fonte utilizada por Christa Wolf foi

-
máticas geradas pelos conquistadores patriarcais. Cassandra estaria em

no mundo dominado pelos homens. Mas a autora introduz um elemento


novo que é sua relação de amor com Eneias, símbolo positivo do mascu-
lino, contrário a Aquiles que é descrito como um poder masculino que
oprime e subjuga a mulher.
lançado em 1987, por Marion Zimmer

(2010), narra a Guerra pela perspectiva de Cassandra. A autora aborda

importante no processo de integração entre o matriarcado e as novas


no templo da grande Deusa. Assim como Christa Wolf, a autora mantém
a relação amorosa entre Cassandra e Eneias, que a aceita e acredita nas
suas profecias. Nessa versão Cassandra sobrevive. Assim, a autora cria

esquecidos no templo de Apolo, ali adormeceram e receberam o dom de

com suas línguas os ouvidos das crianças.


Cassandra recebeu o dom de ouvir os deuses, os sons inaudíveis,
mas não completa seu processo. A orelha é um dos canais da vida espi-
-
cutado, no sentido pleno de conhecer e aceitar, a anunciação que lhe era
feita, que Maria, livremente, concebeu o Messias. A orelha é aqui o órgão

-
tos relativos à história e ao culto das duas grandes divindades da poesia,
da música, da medicina e, sobretudo da adivinhação, Apolo e Dionísio.
-
dades, adentra ao reino das sombras e da luz, concilia a alma, o sagra-
do esquerdo e o sagrado direito. Apolo e Dionísio, nesse momento, se
complementam e realizam a harmonia, que é a meta suprema. Transe e

1998, p.819-820).
-
rio, interpretava o futuro a partir dos pássaros e outros sinais externos

Apolo é representado como um jovem alto e belo, junto a seus


-
palmente nas ilhas de Delos e Delfos, onde se situava o santuário com

certeiro, o conhecimento direto, a verdadeira capacidade de compreen-


são. Símbolo da beleza que resulta da proporção adequada, Apolo presi-
de as artes, a música e a cura, pois é pai de Asclépio, o deus da medicina.
-
censão humana. Representa a justa medida em todas as coisas, a busca
pela perfeição como forma de aproximação com o divino.
A imagem mais recente do deus Apolo é resultante de um vasto
sincretismo e de uma longa evolução da cultura e do espírito grego, que

se reunindo elementos de diversas origens, tornando-o uma divindade


-
piritualização progressiva, para um ideal de equilíbrio e harmonia, por

Apolo transformou-se, ao longo do tempo, de um deus ctônico, as-


sociado a primitiva deusa lunar, silvestre e pastoril como Pã ou Dionísio,
-
zou-se e passou a representar a verdade e a beleza, reinando absoluto na

-
cia e as orienta no sentido da espiritualização. Em algumas passagens da

Em outras passagens mais antigas, Apolo surge como pastor de ovelhas


e que mais tarde se transforma no deus que reina sobre os homens por

dos titãs Ceos e Febe, que pertence à primeira geração divina. A vingati-

nem um ponto da terra lhe desse abrigo. Leto vagou com dores de parto
por toda a terra, sem abrigo, condenada às dores eternas de um parto

que estava sempre à deriva no mar, lugar perfeito para desobedecer às


-
do-a sagrada, até hoje não é permitido nascer ou morrer em Delos.

a gigantesca serpente, guardiã do local As cinzas do monstro foram co-


locadas num sarcófago e enterradas sob o ônfalo, no centro de Delfos.
Ônfalo é a pedra considerada como o umbigo ou centro da Terra. Em
Delfos era originalmente consagrada a Geia, a Mãe Terra, antes de o
santuário pertencer a Apolo. A pedra sagrada foi aquela que Reia deu
a Crono em lugar de Zeus para que não fosse devorado pelo pai. A pele
de cobria a trípode sobre a qual se sentava a sacerdotisa de Apolo,
denominada, por essa razão, ou
Apolo, ao nascer, pediu que Zeus o presenteasse com o arco, a

de Zeus, seu pai. Suas sacerdotisas, as Pítias, não precisavam ser muito
preparadas, mas ter boa conduta. Apolo era o músico e a pítia era seu

na trípode, mastigava folhas de loureiro, árvore sagrada de Apolo, ins-


pirava os vapores que vinham de uma fenda no solo e profetizava. Suas
palavras eram anotadas e transmitidas ao consulente pelos sacerdotes.
Por meio do oráculo, os humanos podiam receber mensagens dos
-
pretá-las. Em Delfos, a pitonisa, antes de transmitir os oráculos, entrava
em uma gruta para tocar o , a pedra branca que cobria o túmulo
a Terra, foi morta por Apolo,

sobre o Píton é o da razão sobre o instinto, do consciente sobre o incons-

originou no Ônfalo
o centro do mundo, matriz, útero, onde se encontra o embrião. Simboliza

humano, como na Ioga. A concentração espiritual se faz sobre o umbi-

p. 659).
É neste ponto central de Delfos, onde foi enterrada a serpente

domina as forças cegas e monstruosas do caos. Delfos foi considerada


por muito tempo o centro do mundo, o centro do universo criado, a via

o reino dos vivos, sobre a terra, a morada subterrânea dos mortos, e as


divindades olímpicas.

sobre a terra. É ao mesmo tempo o macrocosmo e microcosmo, simulta-

caminho para luz, o lugar sagrado.

-
dor e ético do deus buscou conciliar a tensão que sempre existiu entre
as
as máximas do Templo de Apolo que pregam a sabedoria, o meio-ter-
mo, o equilíbrio, a moderação. A serenidade apolínea tornou-se, para
foram consideradas dons divinos, concedidos principalmente por Apolo

Apolo domina as forças primordiais e as organiza, canalizando a


energia de modo adequado. Deus que preside as artes plásticas, a músi-
ca, a mântica e a cura, como pai de Asclépio, o deus da medicina, Apolo
coloca a serpente, a energia vital, a serviço de um propósito guiado pela

imagem do bastão de Asclépio, símbolo das artes médicas, os opostos


estão integrados, a energia acende em espiral, em torno de um eixo, num
ciclo evolutivo.

conhecimento, o equilíbrio e a serenidade.

Na mitologia grega há muitas histórias sobre os amores de Apolo


que terminaram tragicamente. É o caso da ninfa Dafne que se metamor-

inoculou em Dafne a aversão. Perseguida por Apolo, vendo-se sem saída,


assumiu uma forma de vida vegetativa, ou seja, regrediu a um estágio
anterior na escala evolutiva.

proximidades do santuário de Delfos, atirou-se na fonte, que depois re-


cebeu seu nome. As águas de Castália davam inspiração poética e ser-

Seres mitológicos primitivos vivem escondidos na mata e não de-


vem ser incomodados com o risco de causar pânico ou confusão mental
no invasor. As ninfas que fogem de Apolo podem ser entendidas psicolo-
gicamente como aspectos fugidios, conteúdos inconscientes regressivos
escuridão. Por isso também é chamado Febo, o brilhante. Mas a luz ex-
cessiva e repentina pode prejudicar se o conhecimento for prematuro.

escuridão.
-

relacionamentos afetivos. Apesar de exigir certa dose de racionalidade

Apolo desrespeita Eros. A razão tende a querer se apropriar, entender,

vida empobrecida.
A tentativa de Apolo possuir as ninfas à força pode ser uma metá-
fora da razão quando quer controlar, submetendo os impulsos instinti-

surge do inconsciente em linguagem enigmática, incompreensível pela


lógica racional, é tido como ameaçador e deve ser dominado. Ao tentar
controlar ou interferir em um processo interno ainda não concluído po-
de-se provocar uma regressão ao inconsciente mais profundo.
-

(1978) o amor tem sido concebido como impulso cego e indiferenciado

racional. A razão, porém, não é boa guia nos relacionamentos. Sua ca-
pacidade de promover intimidade e conexão com o outro é bastante re-

duas pessoas e, internamente, para promover a totalidade. Uma boa re-


lação com Eros é o que falta a Apolo.
Negar-se ao envolvimento amoroso, não se deixar arrebatar pela
divindade, pretendendo manter um controle racional ou viver exclusi-
vamente o aspecto do poder, sem entregar-se à paixão, pode ter sido o
motivo de ter caído em descrédito. Cassandra foi punida com o isola-

convicção, não convence. A verdade fria e sem alma, não toca os demais.
Cassandra pode ter sido punida pelo deus porque não aceitou a di-
-

dos demais, foi considerada estranha e tida como louca.


A atitude de Apolo, por outro lado, pode ser compreendida como

manter livre, mesmo pagando um alto preço por isso. Foi considerada
louca e teve uma morte trágica, por querer manter-se virgem, ou seja,
pertencer a si mesma. Queria servir como mediadora, representante do
dom que lhe foi dado diretamente pelas serpentes do templo, não por
meio da relação com o deus, se tornando sua amante.
Cassandra não queria se unir com a divindade, não queria se en-
tregar ao deus Apolo, tornar-se sua esposa. Muitas divindades gregas

de todas as imagens estranhas, tão disponível quanto o era antes de nas-

Ao recusar a união com Apolo, Cassandra usurpou do poder con-


cedido pela divindade, sem retribuição. Nos mitos, essa atitude é punida
exemplarmente pelos deuses. Desse ponto de vista, pode-se compreen-
der a personagem trágica que ousou contrariar um deus. No plano psico-
lógico, esse aspecto do mito simboliza uma atuação egóica isolada, uma

que pode levar a um desequilíbrio patológico.


Um dom divino pode ser demasiado para um ser humano, incapaz
de suportar a intensidade energética que emana desse poder. A mito-
logia cita inúmeros casos em que mortais foram fulminados pela visão
da divindade. Para se relacionar com mortais, os deuses se metamor-
foseavam em animais ou assumiam a forma humana. Não podem se
manifestar em sua plenitude porque isso aniquilaria um ser tão frágil e
perecível. Uma pessoa não pode se unir completamente a um deus. Essa
só pode ser uma união parcial, como um intercurso carnal, que fecunda
a mulher para dar à luz um semideus, mas não perdura, a menos que a
parceira humana seja imortalizada e se eleve ao plano divino, depois de

vontade dos deuses.


Cassandra talvez não se sentisse pronta para aceitar a proposta,
que simbolicamente, era bem mais do que um caso amoroso. Unir-se

simbolizar uma tentativa de conjunção sagrada, uma proposta de união,


mais ampla e profunda, que a simples satisfação de desejos. A união com
-
mitindo a ela falar e ser compreendida. Sem a presença do deus, porém,
sua capacidade de comunicação foi esvaziada.
A persuasão requer certa dose de energia. Para ser convincen-
te é preciso ter algum carisma e entusiasmo. A palavra entusiasmo (en
) revela que nesse estado estão ativadas as forças divinas internas.
Quando se está entusiasmado, emana-se a energia poderosa e conta-
giante da alegria e do prazer divinos. Apolo é o deus da luz e da verdade.
Trazendo em si esses potenciais, Cassandra seria convincente. Aceitar o
deus simboliza integrá-lo em si, mas sem essa integração com o divino
apolíneo, suas palavras caem no vazio, não encontram repercussão, não
fazem sentido. Psicologicamente, a perda da persuasão, não decorre de
-

faz romper a ligação com as forças primordiais que a sustentam.


A tradição milenar de narrar os mitos sofreu o viés das diversas
culturas que os revisitaram, muitas vezes traduziu valores morais de seu
tempo, mas a análise psicológica isenta de juízos, pode mostrar os me-
canismos psicodinâmicos atuantes por meio desses temas. Assim, inter-
pretar a retirada do dom da persuasão como vingança de um deus irado
é uma projeção da pequenez humana sobre um ser divino. Ira e vingança

sua imagem e semelhança, mas as forças evolutivas da personalidade,


segundo a psicologia analítica, atuam sempre no sentido do desenvol-
vimento e da integração, buscando restabelecer o equilíbrio, ou seja, a
favor e não contra o indivíduo, por mais difícil que seja compreender sua
forma de ação.
É preciso ter cuidado ao interpretar os mitos para não contaminar
o conteúdo simbólico com julgamentos morais. Corre-se o risco de fazer
análises superficiais ou leituras ofuscadas por ideologias, perdendo
assim o sentido mais profundo. A personagem Cassandra pode servir
para representar a desvalorização do feminino na cultura patriarcal, mas
uma leitura tendenciosa do mito pode levar à distorção da compreensão

repressão ou abuso do poder de um deus masculino, é uma leitura válida,


porém parcial. Se for a única, acarreta a perda da possibilidade de uma
compreensão mais abrangente. Na mitologia grega, o que os deuses pro-

como estímulos ao aprimoramento. A tarefa ou castigo termina, quando


-
compreensíveis, podem representar fatores de cura e desenvolvimento.

como uma representação do declínio e desvalorização das divindades

vivendo a transição do matriarcado minoico cretense para o patriarcado

na cultura e na religião. A rejeição de Apolo por Cassandra represen-


da profetisa, simbolizam a repressão do feminino que estava ocorrendo

Como de certa forma, tal situação ainda persiste, o mito de


Cassandra continua representativo da alienação dos valores femininos
na sociedade atual.

Na Psicologia Analítica, Complexo de Cassandra é o termo utili-


zado para descrever um padrão de comportamento em que a mulher se

embasada no feminino a ponto de atingir seu pleno desenvolvimen-


-
-

estranhar, que não acreditem nela. Nem ela mesma acredita em si – seu

p.61).
Cassandra foi levada à loucura pelo impacto de suas profecias.

adequada adaptação à realidade, sem o que a capacidade de discriminar


conteúdos psíquicos individuais e coletivos, pessoais e impessoais, per-

não é sua como se fosse e perder-se em ideias que não lhe pertencem.
Em vez de mediatriz ela pode se tornar a primeira vítima de sua própria
natureza.
-
minada pelo medo e pela ansiedade e impulsivamente, deixar escapar

processo de desenvolvimento ela aprende a controlar a expressão dos


-
bilidade de ajudá-la a entender cognitiva e simbolicamente o que sente
da intuição. A descrição do tipo intuitivo traz muitas semelhanças com
a personagem mítica. Além disso, aborda alguns aspectos da questão do
descrédito.
Von Franz (1990, p.55) explica que a intuição é uma espécie de
percepção sensível por meio do inconsciente. É um modo subliminar de

Em termos psicológicos, os intuitivos conhecem os processos que ocor-


rem no inconsciente coletivo, as mudanças que virão e as comunicam à
sociedade. As pessoas em geral, entretanto, não gostam de ouvir essas

como representação do que ocorria no inconsciente coletivo da época.


A autora cita o vidente ou profeta, o xamã e o artista visionário
como exemplos do tipo intuitivo introvertido. Refere-se ao funciona-
mento da função intuição como um modo distanciado de observar as
coisas, porque, ao olhar com muita precisão, o foco serão os fatos e a
percepção vinda do inconsciente não surgirá. Por isso os intuitivos ten-

Daí talvez decorra a falta de persuasão de Cassandra.

-
sente na realidade atual. Evidencia-se no caso da mulher que rejeita a
feminilidade primordial e o seu poder de ouvir o inaudível, para adap-
tar-se ao mundo onde predomina o masculino ou, de modo mais amplo,
na desvalorização da intuição como função de orientação, dentro dos
limites de uma sociedade que valoriza a razão e o pensamento lógico,
desacreditando de outro tipo de percepção. Quem são as ‘Cassandras’

Cassandra queria ser sacerdotisa e para isso deveria manter sua


condição virginal. Rejeitado, Apolo a impede de utilizar sua capacida-

Cassandra à mulher que quer deixar o desempenho de um papel exclusi-


vamente biológico e desenvolver outros potenciais.
A imagem arquetípica de Cassandra pode ser reconhecida na mu-
lher cujo modo de perceber, pensar e se expressar, não é valorizado pela

dos quais deseja fazer parte. Representaria ainda, a mulher que assume
-
teúdos psíquicos; dinâmicas familiares ou grupais que ninguém admite,
muitas vezes, atraindo para si a antipatia alheia.
Toda pessoa experimenta o descrédito em algum momento em que
lhe falta a capacidade de persuasão e não pode convencer alguém de
que a sua opinião está correta, podendo evitar algum tipo de problema.
Na cultura dominada pela lógica racional, se os argumentos não forem

levadas em conta.
Tal situação pode se iniciar na família. Uma criança mais sensível,
-

ela ‘tenta’ avisar que algo ruim está acontecendo, mas ninguém a ouve
porque, devido aos sintomas, a desequilibrada parece ser ela. A crian-

que é encaminhada para tratamento em psicoterapia, talvez seja uma


portadora dos conteúdos psíquicos familiares não reconhecidos. Ela car-
rega a doença da família e se torna seu bode expiatório.
-

masculinos no inconsciente coletivo e na psique individual.


-
-
tura perdem a ligação com as fontes primordiais, com os potenciais cria-
tivos e com o inconsciente.

A mulher é a vidente primordial, a senhora das águas, dissemi-


nadora de sabedoria oriunda das profundezas. A mulher tam-
bém conhece os sinais da natureza, a qual está fortemente liga-
da. Ela é o centro da magia, do cântico mágico, da poesia, pois
a vidente é dominada por um espírito que irrompe dentro dela
e se manifesta em forma de invocação rítmica e intensa. Ela é a

anima inspiradora (NEUMANN, 1999, p.259).

o que pode ser compreendido, num sentido mais profundo, como uma
cisão de opostos que deveriam operar em harmonia no plano intrapsí-

sem a elaboração racional seus conteúdos não podem ser assimilados. É


preciso compreender o sentido e saber o momento adequado para emi-
tir uma opinião, revelar um pressentimento, por em prática uma ideia,
executar uma obra de arte. Aquilo que emerge das instâncias mais pro-
fundas da psique, vem em estado bruto e requer elaboração. É função da
-
cos, Cassandra representa um ego frágil, incapaz de suportar e elaborar
o que vem do inconsciente com intensidade avassaladora.
Cassandra é uma personagem trágica por representar o desequi-

conseguir fertilizar o solo da realidade concreta com a substância que


brota das fontes da vida. Fica confusa com a revelação que recebe e não
dúvida, o pressentimento e a convicção, intuição e razão. Precisa da luz

Durante o saque à cidade de Troia, Cassandra se refugia no templo


de Atena e tenta evitar o roubo do Paládio, imagem sagrada que pro-

Cassandra por Ajax é um tema recorrente na arte da antiguidade. Em

e o Paládio. Essa cena também é frequentemente retratada na cerâmica


grega.

Cassandra, 1863-1864. Óleo sobre tela. Ulster Museum,


Belfast, Reino Unido.
Na pintura
representa a princesa troiana no auge de seu desespero, com a cabeça re-
clinada, olhos arregalados e a boca aberta, como se gritasse aterrorizada.
-
mento pré-rafaelita. Sua pintura revela uma imagem real, viva, que des-

observador é capaz de sentir sua angústia, sua dor em não poder salvar
seu povo.
-
coço, um colar de folhas de oliveira, um colar de pérolas douradas e ou-
tro azul, que parece ser de pedras cianitas.

ser usado como proteção porque a oliveira é a árvore atributo da deusa


Atena. Por fornecer óleo para iluminação, a oliveira é símbolo da luz, do

paz e a conciliação. Cassandra estava no templo da deusa Atena, orando


por sua proteção, quando Troia foi invadida.
As pérolas estão ligadas ao símbolo lunar, às águas, a mulher, ao

da concha e da ostra. Em muitas culturas a concha é comparada com o


-
ca do múltiplo, a integração dos elementos dissociados de um ser na
unidade da pessoa, o relacionamento espiritual de dois ou mais seres.”

Cassandra sabe a verdade, mas ninguém acredita em suas pala-


-

da Verdade suprema, única, viva e adorável. Sua morada era na pérola e

1998, p.713).

-
lar, ígneo, divino, à perfeição.
-
-
nos. Está no plano intermediário entre o visível e o invisível. A cor azul

formas e movimentos desaparecem quando são pintados de azul. A cor

dos sonhos. Para os egípcios antigos, o azul é a cor da Verdade.


Para completar a beleza da composição, a orelha de Cassandra foi
delicadamente ornamentada com um brinco de pedra verde translúcida,
que parece ser de cristal. As pedras transparentes facilitam o transe, a
percepção do invisível e são usadas pelos xamãs, videntes e sacerdotes.
Por meio das joias e adereços, o artista representou a condição de sa-
cerdotisa vidente da princesa Cassandra e, pelo seu gesto, sua angústia

Figura 16. Solomon J. Solomon, , 1886.


Narra o mito que Cassandra foi arrebatada e violentada por Ajax,
aos pés da imagem de Atena. A obra (1886) retrata esse
momento de brutalidade. Solomon J. Solomon (1860-1927) pintor e ilus-

por retratos, cenas mitológicas e bíblicas.


-
culatura proeminente. Não aparece o rosto da profetisa, que se inclina

tomba a pira do fogo sagrado, enquanto isso, conforme o mito, queima


a cidadela de Troia.
Ajax invade o templo de Atena, como um homem bestial e, pos-
suído por seus desejos, desrespeita o templo e a deusa. Derruba o fogo
sagrado e quase o apaga, ignorando a sua importância. A descoberta do
fogo marca a etapa mais importante da evolução do ser humano, pois
afasta o homem cada vez mais da condição animal. A chama, que se ele-
va para o céu, representa o impulso para a espiritualização.

espiritual, mas, apenas carnal, profano.

de se defender.
Pelo ato de profanação do templo, o guerreiro foi punido por
Atena, que esperou o retorno dos gregos e enviou uma tempestade fa-
zendo naufragar seu barco e fulminando Ajax com o raio de Zeus.
Figura 17. John Collier, Cassandra, 1885. Óleo sobre tela, 62x48 cm. Coleção Particular.

dramáticos, retratos e paisagens em estilo Pré-rafaelita. Sua obra é um


(1885)
não apresenta traços de desvario, mas de discreta apreensão. Seu olhar
e suas mãos se juntam no peito angus-
tiado por presságios.
Sua beleza se torna secundaria diante da profundidade de seu
olhar. A princesa troiana, na concepção do pintor, é introvertida. Voltada

que ressalta e dá vida ao rosto e as mãos de Cassandra, remete ao isola-

envoltos por um lenço de cor azul acinzentado, que dá um sentido mais


frio à imagem.
Cassandra, 1898. Fundação De Morgan, Londres.

(1855–1919), mencionada anteriormente


na descrição da obra (1898), caracteriza as per-

gesto é uma postura, não um movimento ou uma ação. Isso pode

aspectos do feminino, que toda mulher pode manifestar, não são


pessoas reais, mas imagens arquetípicas.
Ao fundo, Troia é incendiada, enquanto Cassandra puxa seus pró-

sua cidade e ninguém ter acreditado. Ainda está lá o cavalo, presente dos
gregos, armadilha fatal.
-

pressagiadores da morte, estão presentes desde a Antiguidade grega e se


estenderam pela Idade Média.
Aqui o fogo toma outra proporção. Sem limite, destrói, queima,
deixa de ser sagrado e passa a ser profano ao ser usado como arma contra
outro ser humano, com a intenção de matar, de destruir, ferir e dominar.
Cassandra em seu desespero, se pune, puxando seus longos cabe-

cabelo é semelhante ao fogo e uma densa fumaça negra sobe por trás da
imagem de Cassandra. É como se a princesa e sua cidade fossem uma só.
Como se ela mesma se incendiasse e quisesse livrar-se das chamas por
meio de um gesto insano. Seu olhar está distante e vazio, como se não
tivesse foco de observação, dando a impressão de olhar para dentro de
si mesma.

da mulher clarividente, o descrédito, a insanidade mental, o conceito de


normalidade e patologia, o oráculo, o destino, a possibilidade de previ-

-
pirados pelo mito.

I. Sugestões de questões





• Acredita na sua capacidade de perceber coisas que os demais



II.


mudar, mas não consegue.
• -
-
mentos sobre isso.
• A partir de uma das imagens acima, faça uma releitura da obra,
escolha diferentes materiais.
• , do grupo Abba, cuja letra está abaixo

música.

CASSANDRA Now we must suffer and sell our secrets


Abba
Ano: 1991 hearts

Cassandra
Some of us wanted but none of us could
shouting Listen to words of warning
But on the darkest of nights

laughter And we were caught in our sleep


And we were caught in our sleep

fate

thorough
Tradução livre

sure to wait

Cassandra
Descendo a rua todos estão cantando e
gritando
Some of us wanted but none of us could
Estão vivos, embora a cidade esteja morta
Listen to words of warning
Escondendo sua vergonha em risos vazios
But on the darkest of nights
sua cama
And we were caught in our sleep Pobre Cassandra ninguém acreditava em

Agora nós devemos sofrer e vender nossos


segredos,
Barganhar, bancar espertos, saudosos em
I watched the ship leaving harbor at
sunrise Desculpe Cassandra eu entendi mal
Sails almost slack in the cool morning Agora o último dia está nascendo
rain Alguns de nós queríamos, mas não
poderíamos

pain Mas na escuridão da noite


Ninguém sabia como lutar
E nós fomos pegos dormindo
Some of us wanted but none of us could Desculpe Cassandra eu não acreditei
Listen to words of warning
But on the darkest of nights
tecia
Assim de manhã seu navio estará
velejando
Agora que seu pai e sua irmã se foram

assim continua

uma sombra

o destino.
Arrumando suas bagagens lenta e
completamente
Sabendo que, apesar de estar atrasada,
aquele barco vai esperar
Desculpe Cassandra eu entendi mal...
Eu vi o navio deixar o porto ao nascer do
sol
As velas quase afrouxaram na chuva fria
da manhã
Ela estava de pé no convés, parecia uma
imagem feita de lata
Rígida e reprimida com os olhos cheios de
sofrimento
Desculpe Cassandra eu entendi mal...
Sinto muito, Cassandra
Sinto muito, Cassandra.
Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas
Sofrem por seus maridos
Poder e força de Atenas

Quando eles embarcam soldados


Elas tecem longos bordados
Mil quarentenas
E quando eles voltam sedentos
Querem arrancar, violentos,
Carícias plenas, obscenas.

das trapaças, considerado o


dos heróis, Ulisses, foi educado pelo centauro Quíron. Com toda essa
malícias, se tornou um mestre absoluto nos disfarces. Sua astúcia serviu
inúmeras vezes para poupar seus homens do perigo. Ulisses era protegi-

herói era um guerreiro inteligente, hábil no manejo do arco, mas tam-


bém tinha habilidades como artesão e foi excelente carpinteiro.
-

após a vitória do herói, em uma corrida de carros, instituída pelo sogro.

Ulisses foi o estratagema do Cavalo de Troia, além de ter sido o sábio


conselheiro dos comandantes do exército grego e mentor intelectual dos
planos que os levaram à vitória.
Dez anos se passaram em batalhas e depois de vencida a Guerra
de Troia, os ventos sopraram e a nau de Ulisses foi navegar em outros
mares, distante de seu reino. Como Ulisses demorava a retornar, os sú-
ditos não mais acreditavam que pudesse estar vivo e insistiam para que
Penélope escolhesse um novo esposo.

entretanto, tinha esperanças de que Ulisses voltaria e utilizou um arti-


fício para ganhar tempo. Começou a tecer uma tapeçaria, prometendo
escolher um novo marido somente quando a concluísse. Durante o dia,
trabalhava na tecelagem, mas, à noite, desfazia o trabalho. E assim se
passaram mais dez anos, até que uma criada descobriu o plano e o reve-
lou a todos, forçando a rainha a ceder.
Penélope propôs que seus pretendentes participarem de uma pro-
va de habilidade no manejo do arco. Aquele cuja seta atravessasse doze

experimentou o arco de Ulisses, mas nenhum dos participantes conse-


guiu manejá-lo.
Depois de vinte anos transcorridos em guerra ou enfrentando os
quando o suposto mendigo pediu para tentar e, conseguindo atravessar

Apesar de vencer a prova, Penélope ainda estava em dúvida sobre


sua identidade e somente reconheceu o esposo, quando ele mencionou
um detalhe da intimidade do casal. Esse segredo era a construção do lei-
to conjugal, feito por ele mesmo, com um tronco de oliveira. Finalmente
-
cia. Aquela noite intensa havia passado muito rápida e como a Aurora
já se aproximava Atena a deteve em pleno oceano, prolongando a es-
curidão, para que o casal pudesse desfrutar por mais tempo o prazer do
reencontro.

-
mente ocorreram por volta de 1260 a 1250 a. C.. A Ilíada começa na fase

-
tando os deuses com as características dos dórios, povo vindo do norte,

1999).

elemento ctoniano da mitologia grega e que a importância das ideias


religiosas de fecundidade, vida, morte e renascimento, só foi revelada
por obras e estudos posteriores. A concepção homérica dos deuses e dos
-
tos excluídos pelo poeta eram mais populares e sobreviveram à margem
da cultura escrita.

do destino implacável que comanda a vida. É impossível fugir do destino


-

-
cepção dos deuses. As narrativas míticas, entretanto, continuaram a

cultural. A religião e a mitologia grega sobreviveram na cultura europeia


por terem sido representadas por meio das artes plásticas e literatura.

A Ilíada caracteriza o mundo de orientação masculina, volta-

(2015, p.179) há o retorno da Deusa. A diferença entre as obras é tão

Tendo esclarecido o contexto original do mito, segue-se a análise

uma série de aventuras, até que consiga retornar a seu lar e reencontrar
sua família. Ulisses é descrito como herói sábio e habilidoso, que cria
estratégias na batalha e ainda aconselha o valente e impetuoso Aquiles,
nos seus momentos de fúria.

explica sua esperteza (GRAVES, 2004, p.69). Sua mãe, Anticleia, esposa
de Laertes, entregou-se a Sísifo e com ele concebeu o herói, porque seu

de seu pai), queria um neto tão esperto como ele.


brilhante solução. Contou, além disso, com a ajuda de Atena, deusa da
sabedoria e da estratégia, porém, Poseidon esteve contra o herói causan-
do diversos empecilhos ao seu retorno.

de Mitologia Greco-romana, 1973). Vencedores, os gregos comemoraram

-
reiro conseguiria retornar à sua terra. Por esse motivo, Ulisses e seus
companheiros enfrentaram tempestades e naufrágios, perderam-se no
mar por muitos anos até que se aplacasse a fúria divina.
A jornada de Ulisses é, segundo Campbell (2015, p.197), um pro-
cesso de reintegração do masculino com o feminino numa relação de
reciprocidade. Simboliza a união dos opostos, a relação entre a cons-

-
tabelecer um relacionamento mais apropriado com o feminino. Assim, a
estória pode ser vista como uma metáfora do processo de individuação,
conforme descreve a Psicologia Analítica.

Comédia de Dante, com um homem que se encontra perdido na meta-


de do caminho da sua vida. Ulisses pode ser considerado um arquétipo

representa a transição da natureza selvagem para a civilização. Ulisses


-
manos, entre as quais se destacam as seguintes: sair de casa e viver so-
zinho; esquecer quem é e para onde vai; deparar-se com o próprio lado
sombrio; enfrentar forças incontroláveis da natureza; ser devorado; dei-
xar-se seduzir; descer ao reino dos mortos; encontrar-se frente a uma
dúvida insuperável; transgredir uma proibição e ser castigado; naufra-
gar; ser socorrido; enfrentar adversidades com habilidade e sabedoria;
ser acolhido num lugar distante do lar; buscar a paz voltando-se para
si mesmo; voltar ao lar transformado; ser reconhecido; lutar por justiça
e recuperar o que lhe pertence; celebrar o reencontro e retornar à vida

Na jornada de volta à terra natal, a primeira criatura com quem

tripulação tornou-se seu prisioneiro, mas conseguiu ludibriar o monstro


e se salvar. Vencer o ciclope simboliza o controle da razão sobre a força

que o indivíduo precisa vencer para libertar e expandir sua personalida-

A caverna é um local de iniciação e simboliza o retorno ao útero.


A cavidade sombria, a região subterrânea, o abismo de onde surgem os
monstros, simboliza o inconsciente e seus perigos inesperados. A en-
trada na caverna representa um processo de interiorização psicológica
e diferenciação da subjetividade. Enfrentar o ciclope é se deparar com
uma capacidade de compreensão primitiva e limitada (único olho) e lu-
tar contra forças regressivas.
Nessa fase, segundo Campbell (2015, p. 198), o herói desce ao in-
-
miladas. Antes de reencontrar Penélope, Ulisses se submeteu às forças
-

como Circe, Calipso, Nausícaa e as sereias.


A anima, fundamento arquetípico da feminilidade do homem, sur-
-
-
ma tem função de relacionamento e é mediadora junto ao inconsciente

A função da anima se concentra na adaptação ao mundo interior. A

profundidades da psique, funciona como uma ponte entre o inconscien-


te coletivo e o mundo (STEIN, 2005, p. 118).
A negatividade da anima está diretamente relacionada à falta de
percepção ou desvalorização do lado feminino. A mitologia grega per-

sua própria destruição. Circe e as sereias simbolizam os efeitos destru-


tivos da anima, que são experimentados primeiro e depois precisam ser

1986, p.45).
Circe tinha o poder de transformar seres humanos em animais e
vivia cercada de feras. Quando a tripulação desembarcou em sua ilha, os
homens foram transformados em porcos. Ulisses tomou uma bebida e se
apaixonou pela feiticeira que o manteve na ilha durante um ano. Só es-

fazer com que seus homens fossem libertados e que Circe lhe indicasse
o caminho de volta. Emma Jung (1991, p. 63) menciona o ato de oferecer
-
que dá uma taça com
uma bebida de amor, de encantamento, metamorfose ou morte.
A transformação dos marujos em porcos simboliza um estado psi-

-
ção. Tornar-se consciente e atento aos conteúdos inconscientes é a ma-
neira mais segura de estabelecer um relacionamento com esse aspecto e

-
sar ileso seu navio em um estreito entre dois rochedos perigosos, onde
espreitam os monstros Cila e Caríbdis. Evitando um, poderia ser pego
pelo outro. Antes de viver no rochedo, Cila era uma ninfa das águas por
quem Glauco era apaixonado, porém, não correspondido. Como era mui-
to feio, ele pediu a Circe um feitiço para conquistar a amada. A feiticeira
se apaixonou por Glauco, então decidiu transformar Cila num monstro
com seis cabeças de serpente. A criatura terrível foi viver no estreito da
Sicília, devorando os marinheiros que por ali passavam. Do outro lado
do rochedo havia um terrível sorvedouro denominado Caríbdis, ter-
ror dos navegantes, que ao passar pelo estreito, arriscavam-se a serem
vítimas de um dos dois monstros. Quando o navio de Ulisses passou
por esse caminho, Cila apareceu e devorou seis homens da tripulação.
Simbolicamente essa é uma situação recorrente na vida em que se deve
fazer uma escolha difícil e, seja qual for a opção, haverá uma perda.
Além disso, no mar havia outros perigos. Ulisses e seus marinhei-
ros precisavam resistir ao encanto das sereias. -
ta que antigos contadores de estórias diziam que as sereias eram compa-
nheiras e auxiliares de Perséfone. Levavam os marinheiros, atraindo-os
para a morte com sua música e seu canto suave. Servas da deusa do sub-
mundo estavam também condenadas a morrer, se um navio passasse por
elas e a tripulação escapasse. Quando Ulisses e seus marujos resistiram
ao encantamento, as sereias se suicidaram.
De acordo com McLean (1992, p. 49) a etimologia da palavra sereia

As sereias teriam sido belas jovens companheiras de Core

não terem impedido o rapto e as transformou em monstros. Como dese-


jassem reencontrar a amiga, pediram aos deuses que lhes dessem asas.
Por isso aparecem representadas com metade do corpo de pássaro e ca-
beça de mulher.

as musas em uma competição de canto. As musas venceram e como pu-


nição pela ousadia retiraram as penas de suas asas para fazerem coroas
(MCLEAN, 1992, p.50).
As sereias não tinham sentimento ou compaixão, seduziam os
marujos, não para o amor, mas para a morte nas profundezas do mar.

desejo. Representa a mulher sedutora, cuja atração é fatal. Conquista


o homem pela ânsia de obter poder sobre ele. Apesar disso, exerce um
intenso efeito atrativo sobre os homens. Quanto mais hábil e impessoal,
Ulisses conseguiu evitar a atração fatal das sereias amarrado ao
mastro do navio, enquanto seus homens, com os ouvidos tampados, es-
tavam imunes ao canto que atrai para a morte.
Tentando encontrar o caminho de volta, a embarcação percorreu
os mares, passando por muitas ilhas. Em cada uma havia uma precaução

uma tempestade com ondas gigantescas e o navio naufragou. Somente o


herói se salvou e chegou à ilha onde vivia Calipso, uma ninfa do mar, que

oferecendo-lhe a imortalidade. Calipso vivia em uma gruta no bosque

a Calipso, até que Zeus ordenou que o deixasse partir.


As Ninfas são divindades das águas, fontes e nascentes, que vi-
vem em cavernas ou lugares úmidos. Inspiram ao mesmo tempo atra-
ção e medo, pela fascinação que pode levar à loucura. No plano psico-

Ninfas são seres que simbolizam a força geradora da energia telú-


rica em sua união com a água, elemento úmido e fecundante. As Ninfas
são as múltiplas facetas da grande deusa, origem de todos os seres cujas
energias nunca se esgotam. Não são imortais, mas vivem muito e jamais
envelhecem. Representam a própria natureza, que não é imortal, porém
morre e renasce eternamente. As Ninfas das águas criavam nascentes,
viviam em cavernas, grutas e lugares úmidos, locais próprios para ini-
ciação, ritual em que se morre simbolicamente, para renascer para uma
vida nova. No desenvolvimento da personalidade, as Ninfas represen-

1986, p.214).
Calipso, que impediu a partida de Ulisses, é apenas um exemplo
das diversas estórias em que um homem é atraído para uma ilha por uma
mulher encantadora, de onde não pode encontrar o caminho de volta

reino sucumbem a uma sedução e são vencidos pela magia do feminino.


primordial e, portanto, também do arquétipo da anima” (JUNG, E. 1991
p. 88).
A Ninfa é um ser da natureza que busca humanização. Pode repre-
sentar um aspecto feminino não desenvolvido, que deve se tornar cons-
ciente. Ao tentar manter uma relação amorosa com o homem, exerce a

Quando um ser da natureza tenta se relacionar com uma pessoa e por ela
-
ciente não desenvolvido, busca tornar-se consciente.
A anima representa a ligação com a fonte da vida que está no in-
consciente. Quando não existe essa relação, o homem entra num estado
de rigidez ou estagnação perturbadora. Emma Jung (1991, p. 93) explica
que a anima é um fator psíquico a ser levado em consideração e que não

que faz parte do seu ser, reconhecendo e realizando Eros, o princípio de


relacionamento.
Calipso retém Ulisses em sua ilha paradisíaca e promete torná-lo

de todo homem é ser no tempo. Chegar à velhice e à morte. Envelhecer

1996).
Ulisses tinha que sair do estado de encantamento e retornar à vida

Calisto e se lançou ao mar em uma jangada. Poseidon que ainda estava

novamente naufragar. Dessa vez, Ulisses com a ajuda de Atena, que fez
com que Nausícaa o encontrasse, foi recebido no palácio do rei Alcínoo,
onde teve ajuda.
Na última etapa da jornada, Nausícaa, lhe arranja um barco e

jornada do herói como uma iniciação em que Ulisses vivenciou aspectos


encantadora virginal Nausícaa, mensageira de Atena.

pretendentes de Penélope. Entra disfarçado na cidade, mas sua antiga


ama o reconhece. As cicatrizes revelam a identidade de Ulisses. São as
marcas da passagem por um processo intenso e doloroso de profunda
transformação.

acreditam ser uma combinação de , ferimento, e i ,


-

dá-lhe um banho e, ao ver a cicatriz na coxa, compreende de re-

As coxas simbolizam a força, por sua função de suporte do corpo e


são fundamentais para a postura e o movimento. Ulisses tinha cicatrizes
de um ferimento na coxa, sofrido na juventude, durante a caçada ao ja-

para que se tornasse mais sábio e sagaz, escapando de muitos perigos.

-
tiga Grécia, os nomes femininos geralmente derivavam de animais, so-
Contos da Mamãe Gansa, de Grimm. Relacionam-se com o destino, como
no Jogo do Ganso, que é uma derivação simbólica dos perigos, aven-

A princesa Penélope nasceu da união do rei Icário de Esparta com


a ninfa Peribeia. É, portanto, sobrinha de Tíndaro e Leda, prima dos qua-
-
lata que eram muitos os pretendentes ao casamento com Penélope, por
isso seu pai a prometeu a quem vencesse uma corrida de carros. Assim,
-

pelo conselho de Ulisses, que sugeriu que deixasse que ela mesma esco-
-

Penélope, que esperou por vinte anos o regresso do marido man-

eram arranjados sem seu consentimento e podia ser negociada como


qualquer propriedade do marido. Nas guerras, as mulheres eram escravi-
zadas, estupradas ou mortas pelos conquistadores. Entre os casais rara-

-
pel importante na sociedade, ainda dependente do trabalho feminino na

motivo, as personagens femininas, segundo o autor, parecem mais ativas


-
-
teve os bens do esposo, cuidou de sua propriedade, administrou a casa e
todos os seus pertences foram preservados para quando ele retornasse
e pudesse retomar sua vida como era antes de partir para a guerra. Dado
como morto, seus bens, sua esposa e seu reino passariam a ser proprie-
dade de outro soberano. Assim, Penélope, como muitas esposas, pode
representar a contraparte estável da personalidade aventureira do mari-
do, que corre o risco de perder tudo que conquistou.
A estória, compreendida de modo literal, não faria sentido na
atualidade. Penélope seria vista como uma mulher passiva e submissa,
-
tionar. Porém, como adverte Campbell (2015), os mitos são metáforas e

inconscientes mais profundos e abrangentes.


Como imagem ideal, Penélope pode ser vista como a esposa que
compreende e espera o desenrolar do processo de desenvolvimento do
-
soal. Respeita seu tempo interno e o acolhe em seus momentos de dúvi-
da ou hesitação. Deixa o esposo livre para empreender suas jornadas na
-
ção da vida prática e aguarda seu retorno. Mais que isso, ela o reconhece
na volta. Sua mais importante função é ajudá-lo a se lembrar de quem
é e qual é o seu lugar. A mulher Penélope não é uma guia, como Beatriz.
Ela deixa ir e espera voltar. É um porto seguro, o descanso, o lar para
onde sempre se pode retornar.

Penélope representa a esposa ideal por se manter constantemente


-

aos próprios sentimentos. Como rainha, seu papel exigia que se casasse
novamente, caso o esposo não retornasse da guerra. Ela cumpriria a
promessa, mas não era esse o seu desejo, talvez porque alimentasse a
esperança de que Ulisses ainda estivesse vivo. Seus pretendentes que-
riam se apropriar do reino, do poder e do espólio do rei supostamente
morto e Penélope seria mais um objeto valioso do tesouro real. Esperar
pelo marido, postergando a nova união, pode ser um modo de se manter

ação interminável, em vez de se tornar objeto da cobiça de usurpadores


oportunistas.
A capacidade de esperar o momento oportuno e dar o tempo ne-

Inclusive a mulher perdeu essa habilidade. A espera, entretanto, é es-


tratégia comum entre as heroínas de mitos, contos de fada e romances.
Algumas mulheres ainda conhecem o princípio feminino da espera
ativa, o mistério de tecer, tramar e esperar o momento certo. Preparar,
conceber, gestar, parir e cuidar, ver crescer, se desenvolver, amadurecer,
tudo que precisa de tempo faz parte de seu domínio.
-
gencia Penélope e lhe dá um papel secundário no mito, mas é a força da
rainha que mantem o reino unido, não deixa o povo desamparado, não
permite ser dominado por outros reis e incorporado em outro território.
-
lher ativa, forte, que sabe exatamente o que deseja. Durante vinte anos
governou seu reino e deu a ele o seu toque pessoal. Por conhecer os mis-
térios da trama, da tecelagem, por saber esperar o tempo certo, Penélope
-
mento de Ulisses é para fora, o de Penélope é para dentro, por isso o par
se torna perfeito. Para ocorrer a integração dos opostos, Ulisses deve
aprender a respeitar o feminino e integrá-lo em sua personalidade, as-
sim como Penélope deve integrar o masculino, estabelecendo um estado
de equilíbrio e formando uma totalidade.
Penélope tecia, segundo o mito, uma tapeçaria para o dossel fu-
nerário de seu sogro Laertes. Esse trabalho é o cumprimento de uma
obrigação familiar de dar sepultamento digno aos parentes. Assim, ela
demonstra ter assumido a família do marido, em seu cuidado e mantido
o vínculo afetivo com ele e tudo que lhe pertence.
Na mitologia grega, as atividades da tecelagem simbolizam a atua-
ção do destino. As Moiras

As irmãs, estão ligadas ao


mistério da tecelagem, atividade feminina milenar. Representam a vida,
morte e renascimento, os ciclos femininos, os ritmos biológicos e a exis-

Para Edinger (1989, p. 252) o arquétipo da trindade simboliza a in-


dividuação enquanto processo e a quaternidade representa o alvo, a in-

trazem em suas mãos fusos e rocas e controlam o nascimento, a vida e o

-
mento da vida.
-
ral como a lã, seda ou algodão, cria um tecido que se torna um produto
cultural. Simbolicamente esse processo civilizatório representa o desen-

Tecer e depois desfazer o trabalho é subverter o tempo, prolon-

a trama do destino, a mulher mergulha na imaginação e cria uma nova

objetivos, alinhavando ponto a ponto, entremeando cores e formas de


um desenho que ela preenche com desvelo.
Penélope, tece, desmancha e assim retém o tempo nas teias in-
conclusas, mantendo a história sem desfecho. Não espera passivamente,

processo, o momento em que Ulisses estaria pronto para voltar.

criação é trabalho do e a realização é trabalho do ego. Ambos os


processos acontecem no seu ritmo e no seu estilo. A atividade criativa,
doadora de vida, atrai tanto o aspecto transformador como o maternal
feminino. A criação tem paralelos na concepção, gestação nascimento e
cuidados no mundo físico, enquanto a realização tem como base o rela-
cionamento com o animus, que resulta num ego forte e bem desenvolvi-
do. Para a autora, enquanto tecia e desmanchava, Penélope não estava
tentando apenas afastar os pretendentes, mas era o seu próprio processo

que tece e é tecida, que é desfeita e que se movimenta.” (p.113).

Símbolo da conjunção dos opostos, o casal representa a integração

Penélope, de acordo com o mito, formam um casal que praticamente não


conviveu, separado pela guerra logo no primeiro ano de casados. Cada
um vivia no seu mundo, porém, mantendo um vínculo sólido, apesar da

voltar para Penélope.


Ulisses seria o tipo extrovertido, voltado para o mundo externo, enquan-
to Penélope, a típica personalidade introvertida, cultiva seu mundo in-
terno, trabalhando discreta e sutilmente, sem deixar transparecer suas

de Ulisses porque ela sempre o teve introjetado, como parte de si mesma,


por isso não se sentiu incompleta e pôde esperar o tempo necessário.
Ulisses e Penélope parecem formar um casal exemplar. Penélope
-
meiro ano a vida segue tranquila, e o casamento é coroado com o nasci-
-

os parceiros estão transformados, com sabedoria acessam o manancial


-
cias da vida de forma estável e equilibrada.

Atualmente espera-se das heroínas uma atuação dinâmica. Deseja-


se que as personagens das estórias em geral tomem atitudes efetivas,
sejam independentes e proativas. A personagem que espera é conside-

heroísmo entendido como ação, não compreende a espera. Aguardar o


momento certo, engendrar na obscuridade, criar secretamente, cultivar
o mundo interior, são modos de atuação do feminino, desvalorizados na
cultura atual, predominantemente extrovertida. Mas é na introversão,
necessária e criativa, que a pessoa se reorganiza, elaborando e assimi-
lando os efeitos de sua interação com o meio. É importante cultivar o
mundo interior e dele colher os frutos. A espera não é passiva. A não
ação também é uma escolha ativa. Anciãs experientes e sensatas sabem
que não se pode apressar o tempo das coisas. Ao tentar limpar a névoa
da cultura e enxergar sob outro ponto de vista, compreende-se o signi-

adequá-las aos vícios culturais da contemporaneidade.


Por que transformar a Bela Adormecida numa atarefada executiva

de se manter serena, lidar com a ansiedade e obter estabilidade emo-

variados papéis femininos, desempenhados por mulheres, deusas, semi-

personalidade é multifacetada e contém em si todas as possibilidades,

delas, mas mesclar e experimentar diferentes aspectos, conforme as si-

A personagem pode ser interpretada com uma conotação negativa,


-
gamentos de valores culturais, Penélope pode ser vista como represen-
tação de maturidade e equilíbrio. É um tipo de mulher estável, íntegra,
que respeita o parceiro e a si mesma. Não desgasta a relação com co-

a um relacionamento insatisfatório, sofrendo na solidão, abandonada

para que escolha um novo esposo, enquanto ela ainda se sente emocio-

Penélope representa a mulher sensata que, longe de ser passiva e sub-


-
do seus objetivos, graças à capacidade de esperar e agir com sabedoria.

Na literatura, Margaret Atwood, escritora canadense, narra as


A
(2005). A heroína faz uma crítica de sua época com
base na sabedoria acumulada ao longo do tempo em que foi testemunha

As artes plásticas geralmente retratam Penélope junto a seu tear.


Desde a antiguidade, da cerâmica grega até as pinturas mais recentes, a
maior parte das obras representa uma bela mulher concentrada em seu
trabalho de tecelã, algumas vezes com semblante entediado ou manifes-

na varanda de seu palácio, com olhar voltado para o mar, à espera do

Figura 19. John Willian Waterhouse, Penélope e os Pretendentes, 1912. Óleo sobre

John William Waterhouse (1849-1917) nasceu na Itália de pais

impressionistas. Destacou-se por representar personagens femininas da


mitologia grega e da lenda do Rei Artur.
Na obra (1912), em cores quentes aver-
melhadas e rosadas, Waterhouse representou o universo feminino da es-
posa dedicada, que trabalha no tear, concentrada na tarefa, indiferente
ao assédio dos pretendentes. Penélope está de costas para a janela onde
se debruçam candidatos a se casarem com a suposta viúva de Ulisses.
Ela, porém, deseja adiar esse momento ao máximo, tecendo durante o
-

trabalho.

seu ardor sexual e paixão pelo esposo. Concentra-se em seu tear e não

Ulisses.

Circe, 1911. Óleo sobre tela, 90 x 50 cm. Bruce Castle


Museum, Londres.
-
rie de retratos com temas mitológicos. Sua (1911) coroada de hera
é uma mulher jovem, bela e misteriosa. Traz na mão direita uma taça
dourada, supostamente contendo uma poção mágica. A taça está or-

está presente em várias mitologias, mas se apresenta sobre dois aspec-


tos essenciais: o vaso de abundância e o vaso que contém a poção da
imortalidade.
Em seu braço esquerdo usa uma pulseira em forma de serpente,
símbolo dos antagonismos morte e vida, remédio e veneno. A feiticeira,
especialista em venenos e drogas, conhece os segredos de magia dos en-

Conhece as forças sombrias do inconsciente, sabe como fazer uso delas,


conseguindo assim exercer poderes sobre os outros. Circe representa
um dos aspectos do feminino terrível que o herói Ulisses deve enfrentar
na sua jornada de regresso ao lar, simbolicamente, seu caminho de in-

na totalidade psíquica.

Figura 21. John Willian Waterhouse, Ulisses e as Sereias, 1891.


John Willian Waterhouse (1849-1917) na obra
(1891), pelo realismo dos detalhes, dá vida ao mito. As sereias rondam

femininos, cujo perigo é a capacidade de sedução. Ulisses, amarrado ao


mastro, está protegido contra a atração fatal. Seus homens, com os ouvi-
dos tampados, estão imunes ao canto que atrai para a morte.

pode conduzir para cima ou para baixo, eleva aos céus e desce aos infer-
nos. Por meio do canto perturbador dos sentidos, as sereias seduziam os
navegantes para em seguida matá-los e devorá-los.
John Willian Waterhouse representa as sereias com corpos de pás-
saros, que simbolizavam o espírito dos mortos. As sereias pássaros, qua-

para aludir ao veneno que representam. As sereias também eram consi-


deradas como demônios femininos, a tentação diabólica da luxúria. Elas
atraem os homens pela beleza de seu canto, levando-os a perdição.
Ao observar a obra de Waterhouse dá para sentir o momento dra-
mático da tripulação de Ulisses cercada por estas sereias. É um momento
que exige muita concentração e introspecção, rever valores e fazer esco-

salvará a tripulação e a si próprio.


Ulisses, o mais brilhante e criativo dos heróis gregos, representa
-

outro, que pode ser realizada pelos vivos ou pelos mortos. Ulisses sabe
dos perigos da jornada, protege seus marinheiros e a si próprio das ci-

nau de Ulisses com as sereias, simbolicamente representa uma etapa no


processo de desenvolvimento em que é possível se deparar com aspectos
negativos e destrutivos sem se deixar envolver por eles.
Penélope chorando sobre o arco de Ulisses, Óleo
sobre painel de madeira, 1779.

(1779), a heroína encontra-se em um ambiente sombrio, expres-


sando tristeza e ansiedade, enquanto espera o momento da competição
entre os seus pretendentes, que deveriam tentar usar o arco de Ulisses e

teria sua mão em casamento.


Penélope está sentada em uma luxuosa cadeira revestida de veludo
vermelho, segurando com a mão esquerda o arco, que repousa sobre suas

as características da arte clássica greco-romana e os temas mitológicos.


-
terrada pelas cinzas do Vesúvio.
-

Penélope segura o arco de Ulisses e apoia a cabeça tendo no rosto


-

seu proprietário e só pode ser manejado por ele, portanto, Penélope de-
seja que nenhum de seus pretendentes consiga atingir o alvo e, por meio
dessa estratégia, possa se livrar deles. Por isso, somente Ulisses conse-

conseguiu vencer a prova. Ulisses retornou e eliminou os pretendentes,


reconquistando seu reino e sua esposa.

mundo interno e o mundo externo, o tempo e a espera são algumas entre


outras possibilidades.

I.





• Quais sentimentos surgem ao ver o parceiro sair para enfrentar





• Comente as aventuras de Ulisses.

II.

• Comprar uma taça de metal, cristal, ou vidro e pintar com sím-


bolos de poder, utilizando com as tintas adequadas ao material
escolhido.
• A partir do mito, criar um ou vários desenhos e bordar;
• Criar um mosaico de papel, com uma cena do mito;
• Elaborar uma pequena tapeçaria em tecelagem com algum
tema do mito.
• A partir da música , de Chico Buarque de

Mulheres de Atenas, de Chico Buarque e Augusto Boal, foi


composta em 1976, para a peça intitulada
, uma adaptação de , de Aristófanes. Esta
-

por Páris, fato que desencadeou a Guerra de Troia.


Mulheres de Atenas Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas
1976 Geram pros seus maridos

Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas Nem defeito, nem qualidade
Vivem pros seus maridos
Não tem sonhos, só tem presságios

Quando amadas se perfumam Lindas sirenas, morenas


Se banham com leite, se arrumam
Suas melenas Mirem-se no exemplo
Quando fustigadas não choram Daquelas mulheres de Atenas
Se ajoelham, pedem imploram Temem por seus maridos
Mais duras penas, cadenas
As jovens viúvas marcadas
Mirem-se no exemplo E as gestantes abandonadas não fazem
Daquelas mulheres de Atenas cenas
Sofrem pros seus maridos Vestem-se de negro, se encolhem
Poder e força de Atenas Se conformam e se recolhem
As suas novenas
Quando eles embarcam soldados Serenas
Elas tecem longos bordados
Mil quarentenas Mirem-se no exemplo
E quando eles voltam, sedentos Daquelas mulheres de Atenas
Querem arrancar, violentos Secam por seus maridos
Carícias plenas, obscenas

Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas
Despem-se pros maridos
Bravos guerreiros de Atenas

Quando eles se entopem de vinho


Costumam buscar um carinho
De outras falenas

Quase sempre voltam pros braços


Por favor
Deixa em paz meu coração
Que ele é um pote até aqui de mágoa
E qualquer desatenção
- faça não
Pode ser a gota d’água.

Chico Buarque

-
Néfele, receosa de que os

matá-los, pediu ajuda a Zeus, que enviou um carneiro voador, de lã dou-

Crisómalos, o carneiro dourado, nasceu da união de Poseidon e


Teofania. Poseidon havia se apaixonado por Teofania, uma princesa trá-
cia, raptou-a e a levou para uma ilha no mar Egeu. Para enganar seus
perseguidores, transformou a jovem e todos os habitantes do local em
ovelhas e a si mesmo em carneiro.
As crianças montaram no carneiro dourado que se elevou no ar,
tomando o rumo do nascente, até que, ao passar sobre o estreito que

ao reino da Cólquida, onde foi bem recebido pelo rei Eetes.

bosque consagrado a Ares, vigiado por um dragão que jamais dormia.

Na Tessália, perto das terras de Atamas havia outro reino, gover-


nado por Pélias, que usurpou o trono de seu irmão Eson.
de Eson e Polímede. Muito cedo foi para o exílio porque seu pai, legítimo

Poseidon. Educado pelo centauro Quíron, aos vinte anos, Jasão deixou o
mestre e retornou à cidade natal. Ao chegar, surpreendeu Pélias a quem
o oráculo havia advertido que tomasse cuidado com um homem que
chegaria usando apenas uma sandália.
No caminho, Jasão havia perdido uma de suas sandálias no fundo
de um rio, quando viu uma velha senhora que implorava ajuda para a

para levá-la nas costas, porém, sentiu um peso excessivo, pois não se

desejava punir Pélias por negligenciar seu culto. A deusa ajudaria Jasão
a destronar o rei para castigá-lo.
-

de Delfos revelou que Iolco nunca prosperaria até que sua sombra fosse

condição, Pélias renunciaria.


Quando Jasão reclamou o reino, seu tio propôs que fosse buscar o
Velocino. Jasão aceitou a tarefa e logo começou a fazer os preparativos
para a expedição. Encarregou Argos de construir uma embarcação ca-
paz de transportar cinquenta homens, o barco se chamou Argo em ho-

Argonautas. Jasão convidou muitos dos heróis e semideuses para parti-

Nestor.
-
-
tas precisaram de muita perícia para atravessar um perigoso estreito.
-
didas pelas vagas, ajuntavam-se, às vezes, esmagando completamente
qualquer objeto que estivesse entre elas. Eram as Simplégades, as Ilhas
da Colisão. Quando chegaram às proximidades, os marinheiros soltaram
uma pomba, que passou entre os rochedos, sã e salva, perdendo só algu-
mas penas da cauda. Jasão e seus companheiros aproveitaram-se do mo-
mento favorável em que as ilhas se afastavam uma da outra e passaram,
mas as ilhas colidiram de novo, atingindo a popa do barco.
-
rem ao reino da Cólquida. Jasão apresentou-se ao rei Eetes, guardião do

que como a tia, era uma poderosa feiticeira.

conseguisse arar a terra com dois touros de patas de bronze, que solta-
vam fogo pela boca e pelas narinas e depois semear os dentes do dragão,
que Cadmo matara e dos quais nasceria um exército de guerreiros, que
voltariam suas armas contra o semeador.
Cadmo era um dos irmãos de Europa, raptada por Zeus, que saíram
à procura da irmã, mas acabaram por desistir da busca. A conselho do
oráculo, Cadmo aceitou a missão de fundar uma cidade. Ao chegar ao lo-
cal determinado, um dragão devorou alguns de seus companheiros, po-

guerra, Ares, que exigiu reparação, fazendo com que Cadmo o servisse
como escravo durante oito anos. Atena o instruiu a semear os dentes do
dragão, que imediatamente se transformaram em guerreiros armados.
Cadmo atirou pedras no meio deles, que logo começaram a lutar entre
si. Desses homens sobraram cinco, que o ajudaram a cumprir sua missão.

Jasão deveria passar pela prova da semeadura dos dentes desse dra-

enviasse Eros para fazer com que Medeia se apaixonasse por ele e con-
cordasse em colaborar para que conseguisse cumprir sua tarefa. Medeia,
apaixonada, aceitou com a única condição de que se casasse com ela.

a prova. Medeia preparou um unguento para Jasão se livrar do fogo dos


touros e das armas dos guerreiros. Quando os touros de patas de bronze
foram soltos no campo, surgiram soltando fogo e queimando as ervas,
mas Jasão conseguiu acalmá-los e imediatamente colocou-lhes o jugo e
os obrigou a arar a terra.
-
ros gigantes na superfície da terra e brandindo suas armas, investiram

mas, vendo que seria derrotado, atirou uma pedra no meio dos inimi-
gos, que imediatamente se voltaram uns contra os outros, destruindo-se
mutuamente.

-
cer. Assim, Jasão conseguiu apoderar-se do Velocino e partir com Medeia
e seus amigos.
Em sua fuga da Cólquida, Medeia havia levado consigo seu jovem
irmão Absirto. Ao perceber que os navios de Eetes perseguiam os argo-
nautas e os estavam quase alcançando, Medeia mandou esquartejar o
irmão e atirar seus membros ao mar. Eetes, ao chegar ao local, encontrou

sepultá-los, os argonautas puderam escapar.

Jasão questionou o caráter da mulher com quem se casaria. Medeia en-


tão respondeu que o fez por amor.
Depois de muitas aventuras no trajeto, os argonautas chegaram à
Tessália a salvo, Jasão colocou o Velocino no templo de Zeus e consagrou
Argo a Poseidon. Jasão queria comemorar a façanha, mas estava preocu-
pado com seu pai Eson, que estava fraco e doente. Pediu então a Medeia
que usasse seus poderes para recuperar a saúde de seu pai. Ela assim o
fez e Eson recuperou a vitalidade da juventude.
Jasão imaginava que o tio cumpriria a promessa, mas Pélias era um
homem perverso e não pretendia devolver o trono de maneira alguma.
Jasão, sem meios de fazer valer o seu direito, decidiu partir para Corinto.
Mas antes que partissem, Medeia deu um jeito de se vingar do rei. As
-
mo tratamento para seu pai. Medeia, entretanto, fez um feitiço diferen-
te, convenceu as princesas a matar o próprio pai e colocá-lo no caldeirão
para que rejuvenescesse. Enquanto faziam os preparativos para o ritual,
Medeia partiu, em seu carro puxado por serpentes, antes que fosse des-
coberta sua traição.
Jasão e Medeia viveram alguns anos em Corinto. Medeia, apesar de
exilada, sentia-se feliz, pois vivia com o homem que amava e seus dois

aceitou o acordo.
Furiosa com essa ingratidão Medeia invocou os deuses, pedindo

de nada, mas ao colocar os adornos, imediatamente as vestes se incen-

Depois de ter incendiado o palácio, Medeia sabia que jamais teria

Subiu em seu carro puxado por serpentes aladas e fugiu pelos céus. Na

garotos, onde Perséfone os recebeu alegremente.


Medeia partiu para Atenas, onde se casou com o rei Egeu, que não

antes de se casar com Medeia, recebeu um jovem estrangeiro. Quando

beber uma taça de veneno. No entanto, quando ia receber a taça, Egeu


pode ver a espada que ele trazia, percebeu quem ele era e não deixou

e declarado seu sucessor. Medeia, desmascarada, fugiu mais uma vez,

da Média.
Jasão perdeu a proteção dos deuses por ter quebrado o juramento
feito a Medeia e levou uma vida errante, indo de cidade em cidade, lem-
brando suas glorias do passado e as desgraças que se abateram sobre ele.
Já idoso, passava seus dias sentado à sombra do velho Argo que apodre-
cia, até que uma viga, de repente, despencou sobre ele e o matou.
De Medeia se diz que jamais morreu, pois até a Morte tinha medo
de se aproximar dela.

Graves (2004) e Franchini (2007).

sendo representada pelos poetas trágicos Sófocles (496-406), Eurípides


(485-406 a. C.) e Ésquilo (525-456 a. C.). A tragédia possui regras e carac-

Com a transformação das comunidades tribais em cidades-es-


tados, surge a necessidade de reorganização da ordem social
comunitária, estabelecendo-se novas regras para determinar

diante de sua responsabilidade política e social. Contrapondo


-

A democracia ateniense possibilitou a intensa vida das artes, des-


de a poesia lírica, a poesia trágica e a poesia cômica, passando pela ar-
quitetura e pela escultura, que deixaram textos ainda estudados pelos
atuais arqueólogos e historiadores em geral.

tragédia -

-
los coríntios. Com o tempo a versão de Eurípedes foi sendo assimilada,
-

Em sua obra, , Eurípides (2001,


-

autor faz uma descrição nosogrática, metódica das doenças e


da loucura, descreve os componentes emocionais mentais e
comportamentais que conduzem a uma compreensão psicoló-

-
minina, ao mesmo tempo amorosa e destrutiva, bem como as profundas

traição e decidiu sobre a própria vida, num mundo dominado pelos ho-
mens, teve interesse renovado pelo movimento feminista.

Todos os versos que se referem à loucura de Medéia não men-


cionam divindades ou entidades míticas. Sua loucura é atribuí-

paixão fez Medéia perder o controle de seus atos, do bom senso


e da medida ( , mas não do uso da razão. Seu pensamento
2005, p.33).

A tragédia de Eurípedes foi adaptada para o cinema pelo italiano


-

dos escritores brasileiros Chico Buarque e Paulo Pontes, escrita em 1975.


A obra se inspirou em uma adaptação da peça grega clássica de Eurípedes

Na peça , Chico Buarque e Paulo Pontes adaptaram o


enredo da tragédia grega de Eurípedes para um contexto atual,
que tem como cenário um bairro pobre da cidade do Rio de Janeiro na
década de 1970. Joana, a personagem que representa Medeia, é abando-

-
dor do povo oprimido da Vila do Meio-Dia. Além de perder o companhei-
ro, Joana será expulsa por Creonte, com duas crianças. Tendo falhado
no plano de vingança, de assassinar a noiva no dia do casamento, ela

(21 de março a 20 de abril), que corresponde ao período de ascensão do


Sol, no hemisfério norte. A força procriadora masculina do carneiro é
exuberante. Simboliza a renovação da natureza e o poder do calor solar,

de ouro é símbolo de felicidade, poder e riqueza.

sombra à luz. Nesta época ocorrem as festividades do equinócio da pri-


mavera. Nesse momento, a natureza desperta, após o adormecer do in-
pois os machos lutam batendo as cabeças, o que era visto como mostra

Na mitologia egípcia, Amon, divindade do ar e da fecundidade, era


representado com cabeça de carneiro. Posteriormente, Júpiter Amon as-
, o carregador de carnei-

, igualmente venera-
do em Esparta, para afastar as feras e proteger os rebanhos. Esses ritos

cristãs.

e de razão. Simboliza a força psíquica e sagrada, a sublimação: ele voa e


seu velo é de ouro. Todavia, sua força de penetração é ambivalente, ela

chifre do carneiro é de caráter solar, é o do poder, de elevação, o do touro


é de caráter lunar, são emblemas da divina, presença da
Grande Deusa da fertilidade.
Na tradição judaico-cristã, o sentido simbólico é de força, em for-

eles representariam um princípio ativo e masculino pela sua


força de penetração; um princípio passivo e feminino, por
sua abertura em forma de lira e de receptáculo. Reunindo es-
ses dois princípios na formação da sua personalidade, o ser
humano, assumindo-se integralmente, atinge a maturidade, o
equilíbrio, a harmonia interior, o que não deixa de ter relação

Ares e protegido pelo dragão. Na Grécia o carvalho era consagrado a


Zeus por ser uma árvore majestosa e por atrair raios. Sua madeira resis-
tente, considerada imperecível, é símbolo da força e perseverança. Após
conquistar o Velocino, Jasão o entregou no templo de Zeus. Por essas

revelava os desígnios de Zeus por meio das folhas do carvalho sagra-


do. Esse seria remanescente do culto às árvores que remonta à idade do

Jeová, desempenhando assim seu papel axial, de instrumento de comu-


nicação entre o Céu e a Terra. Para os celtas, o carvalho, por sua ampla

foi pendurado em um carvalho, guardado por um dragão, revelando as-


sim, seu valor sagrado.
Considerado por muitas culturas em diferentes épocas, o ouro é o
mais precioso dos metais e corresponde ao Sol, símbolo do espírito, da
imortalidade, dignidade e elevação.

Na tradição grega, o ouro evoca o Sol e toda a sua simbólica


fecundidade-riqueza-dominação, centro de calor-amor-dom,

que o possui; já por si a força geradora de ordem corporal e,

as roupas funerárias era amarela. Na Grécia antiga, o deus solar Apolo,


consigo o brilho do ouro, ele é o iniciado, o condutor de almas, o mensa-

dourada.

alguns detalhes do mito remetem à obra alquímica. A alquimia é a arte


da transmutação dos metais para obtenção do ouro. A transmutação
é uma redenção; a do chumbo em ouro, a transformação do homem
em Deus, por meio de Deus. Sendo esse o alvo místico da alquimia
espiritual.

a semeadura dos dentes do dragão e o próprio Velocino, que simboliza


a pureza, são, segundo Santos (2012) vestígios de uma antiga fórmula
desaparecida.
-

de conseguir, cobiçado pelos Argonautas, sua busca expressa a tentativa


de conquistar o inatingível”. A procura do tesouro é símbolo do caminho

por sua própria transformação, que se realiza tanto no interior como no


exterior.
Jasão e os Argonautas simbolizam os heróis que partem em busca
de um símbolo espiritual de integridade e totalidade.

-
ropeia que expressa ideia de cura, conforme Brandão (2014) Como
com seu pai Eson, em grego , o que cura, ou reanima. Assim, missão
do herói pode estar relacionada à cura no sentido coletivo, quando é en-
carregado de quebrar a maldição e restabelecer a harmonia de seu reino.
Eson, velho e fraco, foi reanimado por Medeia. Ao reanimar Eson,
Medeia, dá mais tempo para Jasão evoluir em seu processo de autoco-
nhecimento; ela indica o caminho, mas Jasão não compreende o sentido
de sua missão.

assustado com sua chegada porque se lembrou de um oráculo, segundo


A
sandália não permite o contato direto com a terra, ela impede a conexão
com a natureza, no mundo manifesto. Quando as sandálias são aladas
representam a elevação mística, a velocidade aérea. Jasão perdeu apenas
-
rial e o espiritual.
A sandália que falta pode ser interpretada como sinal de estar des-

do jovem claudicante, inseguro e instável. Assim, não poderia ser um

Pélias diz que está disposto a abdicar, desde que o sobrinho lhe

aspira.
-
refa heroica de Jasão é combater o usurpador, buscando resgatar o poder,
mas sem se tornar ele próprio um tirano. Pélias estabelece tal condição
por deslealdade, pois espera que o sobrinho morra na tentativa, mas psi-

do arquétipo da totalidade, o , o centro da psique que organiza o pro-


cesso de desenvolvimento.
Diel (1976) interpreta o mito de Jasão observando que entre os
argonautas está a maioria dos heróis dominados pela impulsivida-
de e intemperança, além da incapacidade de fazer uma escolha jus-

de liberação.
Argo, a nave branca, símbolo da pureza, deveria conduzi-los à pu-
-
jetivo é a conquista da força espiritual, da verdade e da pureza da alma.

-
-
cimento, morte e renascimento. Suas águas em constante movimento
revelam a transitoriedade entre as possibilidades, a realidade, lugar de
situação ambivalente, de incertezas, de dúvidas, de indecisão. Para os
místicos e poetas, o mar simboliza o mundo e o coração humano, lugar

-
vessia pelo interior de um obstáculo. Brandão (1987) relata que as Ilhas
de Colisão, as Simplégades, eram recifes móveis, que se chocavam e

pode, assim, vencer o terror inconsciente. As ilhas que colidem simbo-


-
ragem e decisão inteligente. Ao transpor o vão entre as rochas os heróis
obtém uma vitória, mesmo que ainda falte algo em seu aprimoramento,
Antes de tentar a travessia, os argonautas soltaram uma pomba,
que conseguiu passar por entre as rochas, tendo perdido somente al-
gumas penas da cauda. A pomba é mensageira, assim como aparece na
Arca de Noé, quando foi enviada para ver se as águas do dilúvio haviam
baixado e colheu uma folha verde de oliveira, trazendo-a como sinal de
que o perigo havia passado.

pássaros, geralmente pombos. A pomba é atributo da grande mãe, a deu-


sa da lua, aquela que brilha para todos.
Símbolo de pureza, simplicidade e paz, a pomba representa har-
monia, a esperança e o reencontro da felicidade. Como os pássaros em
geral, a pomba também simboliza a alma imortal, o sopro vital e a psique
-

essa pomba sugira a presença divina e proteção aos navegantes do Argo.

um pássaro para vencer o obstáculo. Simbolicamente, a psique humana


nem sempre consegue sair ilesa do confronto com os conteúdos incons-

deixa um aviso ao perder algumas penas, é necessário ser leve e veloz na


trajetória.

Eetes, rei da Cólquida, recebeu Jasão cordialmente, mas condicio-


Jasão teve como primeira prova o domínio de dois touros gigantes-

fogo pelas narinas. Com esses touros deveria arar a terra e, para tanto,
precisava se aproximar deles para atrelá-los ao arado.
-

-
cundidade e a virilidade indomada.

maneira justa, provando ter força e sabedoria que asseguraria um rei-


nado bem sucedido, vencendo o perigo e a tentação do abuso do poder.
Um animal com pés de bronze é uma imagem frequente nos mitos

o endurecimento do espírito.
Assim, a tarefa imposta a Jasão é domar essa energia fecunda-
dora e com ela fertilizar a terra. Como os touros eram divinos, forja-

um rito iniciático, que culminaria na conquista do ouro incorruptível.


Psicologicamente, o primeiro requisito no processo de desenvolvimento
é controlar as forças instintivas e aproveitar essa energia no trabalho
produtivo.
Com auxílio de Medeia, que lhe deu um bálsamo que o tornou in-
vulnerável, Jasão conseguiu domar os touros, arar a terra e semear os
dentes do dragão.

-
rística reforçada pelo fato de que o dragão pertencia a Ares (Marte), deus
da guerra. Esses dentes são potenciais destrutivos que se multiplicam
num exército de gigantescos soldados de ferro, símbolos de Marte. São
homens de ferro, de alma endurecida, predestinados ao poder, ambicio-
sos, ligados a agressividade perversa. Jasão deve se safar desses seres
brutais, contando com o fato de serem fortes, porém estúpidos e não
percebem de onde vem o ataque, enfurecendo-se uns com os outros.

objeto de ciúme, semeia a inveja, os dentes do dragão. A justa medida e a


moderação são interpretadas como fraqueza e encorajam os adversários.
Na segunda parte da tarefa, vencendo os guerreiros de ferro, Jasão

para usar de energia contra qualquer desordem. Mas ele não vence gra-
ças à sua força e usa a intriga. Jasão faz como os tiranos, para vencer os
adversários, tenta dividir e desunir. Lança uma pedra no meio dos gigan-
tes, fazendo cada um achar que estava sendo atacado pelo outro. Assim
Jasão demonstra que pretende assegurar o futuro reino pela intriga, mas

No plano subjetivo, é possível interpretar os lutadores nascidos


-
divíduo. Essa imagem representa tudo que divide a pessoa e a batalha
travada entre o bem e o mal, entre o certo e o errado, o justo e o injusto,
as polaridades que disputam lugares de soberania e poder que ocorre na
psique.

e sofre um processo de autodestruição. Impulsos agressivos indiscrimi-


nados extinguem-se por si mesmos se não forem estimulados. Essa é
-
solvam por si mesmos.

-
gão surge nos mitos protegendo um tesouro que o herói precisa resgatar,
seja algo material como ouro ou simbólico como a sabedoria. Eliade

árvore da vida, de objetos sagrados ou valores absolutos como a imor-

se apropriar desses tesouros deverá antes provar seu heroísmo ou sua


sabedoria frente ao perigo de enfrentar e matar o monstro.
Animal fantástico, símbolo dos instintos primitivos, psicologica-

psíquicos profundos e primitivos. Antes de se apropriar do tesouro, ou


-
gressivas inconscientes, os impulsos mais primitivos, sem ser devorado
por eles.
Para Diel (1976) Jasão percorreu muito fácil e rapidamente seu
caminho e a vitória do herói é duvidosa. Ao enfrentar o dragão, mais

próprias forças, não pediu ajuda aos seus companheiros, mas recorreu
novamente ao auxílio de Medeia. Essa não é uma escolha justa porque

ajuda da magia, o herói se deixou dominar pelas forças regressivas de


seu inconsciente e não se engajou no processo de desenvolvimento da

A luta entre o herói e o dragão, deixa transparecer o tema ar-

Na maioria das pessoas, o lado tenebroso, negativo, da perso-

dar-se conta de que a sombra existe e que ele pode tirar forças
dela. Tem de compor-se com as potencias destrutivas se quiser

p.671).

uma mulher, é a conciliação entre o princípio feminino e o masculino.


-

lugar de noiva, de prometida, disponibilizou seu amor e conhecimento


para Jasão vencer as provas.

venceu as duras provas. Mas ao prometer casamento à princesa, o herói


estaria agindo apenas por interesse. Esse tipo de relacionamento em que
prevalece o egoísmo e o abuso do poder é o prenuncio de um grande fra-
casso e tal casamento pressagia a tragédia. Jasão não está comprometido
psicológica e amorosamente com Medeia, não está pronto para assumir

seguir no processo de individuação.


Para ajudá-lo a escapar, Medeia assassina seu próprio irmão.
Culpado, ainda assim, o herói não encara a verdade, não toma conheci-
-
veitou, voltou-se contra ele próprio. Jasão foi expulso de seu reino, no

crime representa a desolação e o aniquilamento pelas forças destrutivas


do inconsciente, razão de seu sofrimento.
Jasão não estabeleceu vínculos durante suas jornadas. Não se
prendeu a nada, não se permitiu ser o herói que se esperava, torna-se o
que deveria ser. Preso em sua imaturidade, não desenvolve a criativida-
de para se tornar um adulto, passa seus dias revivendo as aventuras da
juventude.

Argo, que representa a esperança heroica da sua juventude, converteu-

peso que suportava.


pode culminar na morte.
Jung (2000, vol. IX/1, §55, p. 36) explica que
-
-

seja, na área que a metafísica reservou para si. Tudo o que é tocado pela
anima toma-se numinoso, isto é, incondicional, perigoso, tabu, mágico.”
(JUNG, 2000, vol. IX/1, §55, p. 37).

A -

-
te, da mente primitiva da história da linguagem e da religião.
Ela é um no sentindo próprio da palavra. Ela é algo que
vive por si mesma e que nos faz viver. (JUNG, 2000, vol. IX/1,
§57, p. 37).

Muitas vezes a
uma sacerdotisa. Mulheres ligadas às ‘forças das trevas’ e ao ‘mundo dos
espíritos’.

ao estudar outras culturas, nas quais os feiticeiros, profetas e xamãs dos


esquimós usavam roupas femininas e desenhavam seios nas roupas ou
preenchiam com tecidos dando volume ao seio. Alguns xamãs se ves-
tiam como mulheres porque acreditavam que elas eram mais capazes de

É a presença da que faz o homem se apaixonar ao ver uma


mulher pela primeira vez, despertando em seu coração o sentimento de
ter encontrado a pessoa certa. Ter a sensação de já conhecer aquela pes-

A assume um papel de guia ou de mediadora, entre o mundo


interior e o . Na Grécia antiga, a sacerdotisa, a Sibila, sondava a von-
tade divina, era o elo entre o divino e o humano. Beatriz conduz Dante,
na Divina Comédia. Assim também a deusa Isis quando apareceu em
sonho para Apuleio, iniciando-o em uma forma de vida mais elevada e

A formação da se dá na relação do homem com sua mãe e


é a partir deste relacionamento que a
-
ralmente, a se expressa de maneira irritada, depressiva, incerta,
insegura e susceptível. Este aspecto da negativa pode ser identi-

Rainha da Neve; a rainha da morte. Se este conteúdo negativo da


for conscientizado, o homem será capaz de lidar saudavelmente com as
investidas da e fortalecer a sua masculinidade.
-
mores, as expectativas, as fantasias que são enviadas pela , de-
-
pressivas, como a literatura, artes plásticas, música, dança e teatro
entre outras. Ao se dedicar com calma e tranquilidade a estes processos
criativos, surgem conteúdos profundos do inconsciente estabelecendo

1983, p.186).
A
psique do homem, é a imagem interior, da mulher, que se manifesta em
cada homem de acordo com sua psicologia individual. De acordo com
Neumann (2001) a é o veículo da transformação na psique mascu-
lina. Ela instiga a mudança, atrai e estimula o homem nas aventuras de
ação e criação no mundo interno e externo. Essa imagem causa respos-
ta emocional tanto positiva como negativa. Ela pode ser experimentada
como musa inspiradora ou como mulher fatal, sedutora e traiçoeira. Seu
mundo interior e seu relacionamento com mulheres só se desenvolve,
quando o homem se torna consciente e se torna capaz de valorizar o
feminino.
Para Jung (2000, vol. IX/1), a relação com a é um teste de
coragem, uma prova de fogo para o homem. Na está oculto um
poder dominador capaz de prejudicar ou, inversamente, estimular a sua
coragem para os atos mais arrojados. A pode servir como media-

o controle da personalidade. Quando o homem é possuído pela anima,


esta perde seu encanto e seus valores. Quando está no controle da per-
sonalidade, a é volúvel, desmedida, caprichosa, descontrolada,
emocional, às vezes demoníaca, intuitiva, indelicada, perversa, menti-
rosa, bruxa e mística. A psique masculina passa a ser dirigida pelo efeito
mágico exercido pela mulher.
mágica, que resolve
todos os seus problemas. A paixão de Jasão por Medeia pode caracterizar
o fenômeno psíquico da projeção da
por uma mulher que representa a , não é uma relação com a mu-

de envolvimento a mulher se torna uma função da psique do parceiro,


que exige que ela corresponda ao seu ideal, satisfazendo seus desejos. Se
permanecer nesse estado imaturo, ao invés de reconhecer suas próprias
qualidades emocionais projetadas na mulher, sua relação com o princí-
pio feminino permanece inconsciente e o relacionamento emocional na

quer e que aja como mãe para ele.


A mulher que se relaciona de maneira maternal com um homem
é dependente dele, assim como ele em relação a ela. Somente quando
abdica do seu desejo de servir de mãe e vive verdadeiramente suas emo-
-

preocupação maternal. Essa mulher deve desenvolver a habilidade de

da função maternal que Medeia exercia para o marido, demonstrada com


-
jetar, planejar. Conforme Brandão (2014) Medeia é hábil em planejar o

-
der divino para salvar ou destruir. Toda idealização do feminino constela
-
tativa de ser salvo por uma mulher está ligada ao medo de ser destruído
por ela.
Meira Penna (1999) demonstra que no decorrer da evolução psí-
quica, o ser humano passou a valorizar o aspecto generoso do materno,

megera, com ameaças, venenos e animais tenebrosos, associados à atra-

Mãe Terrível, a Velha Feiticeira, a Senhora da Morte.


Ao ser traída, Medeia deixou sua posição de companheira e, deses-
perada, não conteve a fúria e fez valer seu poder de dar a vida e a morte.

Brandão (1987) demonstra que a versão mais seguida do mito é a


-
tos pelos habitantes de Corinto por terem levado a Glauce os fatídicos

numa situação limite, dividida entre o ódio e amor materno.


Jung (1986, vol. V, §48) se refere ao teatro como ‘instituição públi-
ca para tratamento de complexos’ e explica que, isso se dá por meio da

também ameaça o espectador.


Nos santuários gregos sempre havia, junto ao templo, um está-
teatro, eram considerados igualmente importantes para o desenvolvi-
mento do indivíduo.
A tragédia é uma modalidade de espetáculo teatral com caracte-

fazer escolhas num mundo de opostos que ora se confrontam, ora se


-
-
blemas humanos, que aparecem como enigmas, que nunca podem ser
-

Medeia foge num carro puxado por duas serpentes aladas, pre-
-
dial, que representa a energia, a sabedoria, a cura, mas também a morte.
Como animal primitivo, a serpente simboliza os impulsos instintivos
inconscientes.
Na natureza, as serpentes vivem em buracos e penetram em fen-

associavam ao mundo subterrâneo e aos mortos. Como símbolo ctônico,


a serpente companheira da mãe terrível, é atributo das deusas da terra
-

mitologia grega representam a transição para o patriarcado, quando a


cultura egeia matriarcal, em que eram praticados cultos da grande mãe,
frequentemente representada por uma serpente, foi sobrepujada pelas
divindades solares dos invasores patriarcais. A serpente está ligada ao
elemento ctônico feminino, opondo-se a um mundo luminoso, masculi-
no, espiritual, para o qual ela passou a representar o mal.
A serpente e o ser humano distinguem-se das demais espécies de
animais. Se considerarmos que o ser humano está no topo da evolução
animal, a serpente está no início deste processo evolutivo, é uma criatu-
ra fria, sem patas, pelos ou plumas. Nesse sentido o humano e a serpente
são opostos. Pode-se considerá-los complementares, portanto, há algo
de serpente no humano.
Ao fugir conduzida por serpentes aladas, Medeia penetra na obs-

volta para um nível arcaico do desenvolvimento. Medeia regride à Mãe

energia indiferenciada, que pode ser usada tanto para o bem quanto
para o mal. Medeia é uma iniciada nos mistérios das forças primordiais

dos poderes de sacerdotisa e mediadora entre o plano humano e as di-

um limite frágil entre o bem e o mal, entre remédio e veneno, entre a


vida e a morte. Aquele que cura também é capaz de matar. Todo o mito é
permeado por símbolos que expressam essa polaridade.

mãe de todo feitiço e de todas as feiticeiras, representa o poder da mãe

as encruzilhadas, onde eram oferecidos sacrifícios. As encruzilhadas são,


ao mesmo tempo, o ponto de união, onde os caminhos se entrecortam,
expressando assim a união dos opostos, bem como o local onde os cami-

separação, vida e morte.

-
nhora da feitiçaria. É representada com archotes na mão, acompanhada
de jumentos, cães e lobas. Devido aos seus poderes terríveis é temida
durante a escuridão da noite.
Essa deusa representa o aspecto ambivalente das divindades ctô-
nicas, que trazem ao mesmo tempo a renovação da vida e a sua extinção.
-
mares do mundo: os infernos, a terra e o céu.
Segundo Chevalier e Gheerbrant (1998, p. 485):

Toda decisão tomada num cruzamento implica não só uma di-


reção horizontal, na superfície da terra, mas, mais profunda-
mente, uma direção vertical para qualquer um dos níveis es-

simbolizaria o inconsciente, onde se agitam feras e monstros,


o inferno vivo do psiquismo, mas também reserva de energia a
-
cia do espírito.

-
tivos, a lua minguante representava os poderes da morte e destruição e,
portanto, era desfavorável para qualquer empreendimento. Na obscuri-
dade da lua, as forças destrutivas estariam no auge. Nesse momento os
poderes da magia negra poderiam ser invocados. Para os gregos, o poder

apaziguá-la, evitando sua ira e o mal que praticava. Era a deusa que pro-
vocava as tempestades, a destruição e os terrores noturnos. No mundo
interior, a deusa era responsável pelos distúrbios mentais.
No aspecto positivo, a deusa propiciava a inspiração criativa, a
imaginação e a intuição. Para os povos antigos, as fantasias criativas e
misteriosas provinham do mundo dos espíritos, do reino subterrâneo.
Toda vida subjetiva estava no inconsciente, nas profundezas da escu-
ridão. A lua representava a sabedoria de natureza instintiva, enquanto

criatividade, porém, dela não viria apenas luz, mas obscuridade e confu-
são. A inspiração e a fantasia também poderiam levar à loucura.
mitos, contos de fadas e lendas. Geralmente é de mental, o ferro. É resis-
tente ao fogo. Simboliza o local e o meio da revigorarão, da regeneres-
-
dio ao nascimento de novo ser, através da morte e da cocção. Em rituais
de passagem, a cocção dentro de um caldeirão leva a imortalidade.

-
ção. Como recipiente onde se cozinha ou ferve algo, pode também ser

No caldeirão se produz o caldo, que é produzido devido à ação do


fogo sobre o líquido, que está contido dentro de um recipiente de ferro.

da harmonia universal. Nas -


pos atuais, os doentes devem tomar caldos, para fortalecer o restabele-

tribo. Na Idade Média os alquimistas fazem uso do caldeirão para trans-


forma pedra em ouro.

(1985), o caldeirão tem o poder de transformar o material em espiritual,


o mortal em imortal, nele se pode criar uma bebida para a regeneração
-
ria ser usado para preparar um medicamento, uma poção mágica pode-

e do renascimento, mas também da magia e da inspiração, da profecia e


da transformação.

que o caldeirão mágico é originalmente um símbolo de fertilidade, pelo


-
nos de transformação, considerados mágicos, são realizados pela mu-
lher, pois é ela que em seu corpo corresponde ao caldeirão onde ocorre a
encarnação, o nascimento e o renascimento. Por esse motivo o caldeirão
-
cerdotisa e mais tarde da feiticeira.
Em todas as culturas foi atribuído à mulher o poder mântico e má-

matriarcal se baseia na participação mística, ou seja, na ligação entre a


-
cal, por estar mais próxima e ter grande receptividade aos poderes do
inconsciente é o fundamento do poder mágico.
A manipulação de substâncias extraídas de plantas faz parte da

-
tilidade. Medeia, entretanto, usa o poder feminino mágico que o caldei-

em seu aspecto sombrio.


-
presenta a transformação do feminino da forma mais clara. Nela, o ma-
triarcado em declínio, está desvalorizado pelo princípio patriarcal e a
realidade mítica que ela representa já se encontra reduzida a nível me-
ramente pessoal e negativizado, da mesma forma que Circe, que origi-
nalmente era uma deusa, se tornou feiticeira.
As feiticeiras e as bruxas são símbolos do aspecto obscuro do femi-
nino. A imagem da bruxa, na tradição popular europeia, tem origem no
temor do poder feminino.
Segundo Chevalier e Gheerbrant (1998, p. 419):

A feiticeira foi considerada uma degradação voluntária, sob a

magas druídicas. Disfarçaram-se de modo medonho e diabó-


lico, ao contraio dos iniciados antigos que ligavam o visível e
o invisível, o humano e divino; mas o inconsciente suscitou a
fada, cujo traço feiticeiro, servo do diabo, só passou a aparecer
como caricatura. Feiticeira, maga, fada, criaturas do incons-

que as lendas hipostasearam, dando lhes trajes e a alma de


-
tação dos conteúdos irracionais da psique.

Como observa Biedermann (1993), mais recentemente, a bruxa se


tornou símbolo de movimentos feministas, em protesto contra o domí-
nio social masculino.

porque este não lhe fazia as honras devidas. A deusa teria pedido a
-
dasse em ajuda-lo.
marido e se tornou a protetora dos casamentos legítimos. Quando traída
e humilhada por seu esposo, torna-se ciumenta e vingativa, perseguindo

os opostos a se unirem, é o aspecto do feminino que busca a união com o

A planta hera se mantém viva e verdinha em qualquer época do


ano, qualidade rara entre as plantas. Alguns templos são ornamentados
com essa trepadeira, que delicadamente sobe pelas paredes, muros ou
-

como da videira, para provocar delírio místico nas mulheres que se recu-
savam a participar do seu culto.

sem um companheiro. Ao se casar, faz do marido prioridade absoluta e

admitir que nada perturbe a paz de seu lar. Quando contrariada, se torna

a uma profunda depressão.


A é um termo utilizado para descrever a mu-
lher que ao se sentir traída e abandonada, vai ao extremo para se vingar.

tudo e que se torna vingativa quando percebe que não há reciprocidade


nessa relação. Medeia é exemplo da mulher possuída pelo aspecto des-
-
-
jeitadas, Medeia trama sua vingança.

mulher traída direciona sua hostilidade aos outros em lugar da pessoa

traição, a mulher como Medeia pode tentar se vingar da rival, procu-


rando uma forma de prejudicá-la. Ela também pode tentar destruir o
-

parental.

-
forma em ódio, a generosidade em egoísmo. Medeia se dedica totalmente
a Jasão, a partir do momento em que se apaixona por ele. Deixa sua terra,
trai o próprio pai e mata seu irmão, ou seja, ela abandona suas origens e
seus valores para se dedicar integralmente ao amado. Cavalcanti (1988)
mostra que Medeia foi do extremo da doação e da disponibilidade ao seu
oposto, a destrutividade. Segundo a autora, a mulher que doa seu poten-
cial criativo, de maneira absoluta, no casamento e nega o desenvolvi-
mento de sua individualidade, anula a si mesma e se torna vítima de sua
atitude psíquica exagerada. Torna-se possessiva e autoritária. Impede as
pessoas ao seu redor de viver a própria individualidade, porque ela não
foi capaz de fazer o mesmo. Essa mulher tenta manter a família unida
numa relação simbiótica. Invejosa e ciumenta da realização pessoal dos
outros, quanto maior o potencial renegado, mais se torna destrutiva.

e causa intensa sensação de angústia. Carotenuto (1994) observa que

relacionamentos primários. Ante a situação de perda ou traição, surge a


criança interior, o medo da perda do amor e apoio, o temor do abandono.
de relação em que seja possível expressar o ciúme e a tirania. Emerge a
sombra violenta e um indivíduo ciumento e infeliz se transforma num

abandona é oprimido pela culpa e quem é abandonado é arrasado pela


destruição. Da mesma forma ocorreu com Jasão e Medeia.

-
venças, tornando-se devorador. A paixão é como o fogo que procura algo
que o extinga e é por isso que a pessoa, inconscientemente busca situa-

Por isso Medeia é rejeitada continuamente e não encontra ninguém que


a contenha.

natureza excessivamente apaixonada estão procurando uma


pessoa humana ou uma situação, em relação à qual possam

FRANZ, 1986, p. 225).

Medeia vive intensamente sua paixão, entrega-se de corpo e alma.


Sua paixão não tem limites, ultrapassa todas as medidas e todas as leis
divinas e humanas. Medeia é regida pelo -

Seu caráter irracional e desequilibrado está dentro das psicopatologias.


Para se viver em sociedade é necessário saber a medida de atos,

troca, da justiça e da harmonia.


-

torna-se indomável.

produtiva porque permite apenas descarregar a tensão. Seu pior efeito

-
metida para obter vantagem pessoal, então, no relacionamento predo-
minava o poder, não o amor.
Medeia, entretanto, não compreende que a traição revela o caráter
de Jasão e que a separação é um caminho de desenvolvimento. Assim
como no mito, muitas pessoas não conseguem terminar um relaciona-
mento sem se destruir mutuamente. Não conseguem reconstruir a vida
-
rando prejudicar o outro para que sinta uma dor semelhante a que estão
sentindo.

Jasão e Medeia foram mortos e isso, simbolicamente tem um importante


-
-
-

tudo que foi criado e conquistado por meio da união do casal.


Não ocorreu uma união sagrada entre Jasão e Medeia, apenas união
profana, temporária e interesseira. Jasão usou os poderes de Medeia, não
a respeitou como feminino sagrado, como sacerdotisa, nem como mãe
a

deuses e não aos humanos.

-
sim como um amor, uma planta, um animal, o ser humano. Chevalier e
-
pestade, mas na morte de um dia belo”. A morte introduz a mundos des-
conhecidos, infernos e paraísos, portanto, ela é também ambivalente,
sendo revelação e introdução.
-
-
dade, da abertura para o novo e do movimento.
A criança é símbolo do futuro e dos potenciais de desenvolvimen-

Assim, o símbolo da morte da criança indica o fracasso do herói Jasão


em recuperar seu reino, tanto no plano externo, quanto o reino espiri-
tual interior. Medeia também fracassa e repetidas vezes sofre a rejeição.
Ambos deixaram de cumprir as tarefas da jornada da vida, para realiza-
ção do processo de individuação, foram engolidos pelo mundo material,
pela ambição. Desrespeitaram seu passado e extinguiram seu potencial

mas a possibilidade de atingir a completude e integridade, tendo se per-


dido em seu caminho de desenvolvimento.

As artes plásticas representaram o mito de Medeia por meio de


diversas obras em todos os tempos. A personagem trágica inspirou e es-
timulou os pintores a representar sua beleza intrigante e fatal.
Figura 23. Carle Van Loo. Miss Clairon como Medeia, 1760.

Charles André Van Loo (1705-1765) ou Carle Van Loo, pintor

ecléticas em seu estilo. Destaca-se pela representação convincente de

exercendo forte impacto no observador.


Jasão olha atônito para Medeia que acaba de assassinar os pró-

adaga ameaçadora. Na outra mão tem uma tocha com chama ardente e
espessa fumaça negra.
-

mundo. Nas casas antigas havia uma chaminé por onde saia a fumaça
do fogão, da lareira, indicando que ali havia vida, considerado o respiro
tabaco, resinas, entre outros, as colunas de fumaça que se elevam simbo-
lizam a junção do céu com a terra e espiritualização do ser humano. Mas
a tocha que Medeia carrega solta uma fumaça negra, não indica vida e
nem espiritualização, e sim destruição, morte sem renascimento. A co-
luna de fumaça não está em ascensão, volta-se para terra.
Sua carruagem se levanta no ar, carregada por serpentes aladas,
que a conduzem numa nuvem negra. A carruagem a conduz pelo ar, mas
não para um plano espiritual elevado.

-
sem dela. Seu olhar furioso é como uma adaga querendo ferir Jasão e ao
mesmo tempo transferindo para ele a responsabilidade pela morte dos

deve ser punido.


Jasão segura a espada, mas não a ergue contra Medeia. Não há
mais nada a fazer. Ele é impotente diante do fato consumado.

descontrolada. É possuída pelo ódio.

o aspecto sombrio da deusa e foge levada pelas serpentes. Jung (1986,


vol. V, § 580) explica que a serpente representa a psique inconsciente e
surge geralmente na regressão. A energia psíquica representada por essa
forma primitiva, mantém a pessoa numa fase caracterizada pela falta de
controle e dominação pelos afetos.
Medeia, 1868.

está preparando a poção mágica com a qual irá ajudar Jasão a vencer as
-
culo protetor, dentro do qual estão as ervas e objetos que fazem parte do

vermelho e um sapo, do qual se extrai o veneno para a magia.

aspecto aversivo, esse animal se converteu em símbolo negativo asso-

fazendo parte de rituais destinados a propiciar a chuva durante períodos

está associado à terra, ao útero, ao feminino e ao inconsciente. Assim, o


símbolo que, a princípio, estava relacionado aos poderes de regeneração

ligação entre os elementos água e terra, por isso representam a criação


e a restauração da vida. Esses são os poderes das grandes deusas primor-
diais invocados por Medeia.

seu amado e que esse seria um ritual de amor e proteção.

Figura 25. Anselm Feuerbach. Medeia, 1870.

Anselm Feuerbach (1829-1880) pintor de estilo neoclássico ale-


mão, já citado anteriormente, procurava em suas obras expressar mais
a sensação que a ação dramática. Medeia não é retratada por ele em

diante do mar.
-
lhos, demonstrando que ela teve momentos de ternura e cuidado para
com eles. A mulher a seu lado parece estar em desespero. A sensação

coberta com vestes na cor marrom escuro, encurvada, com as mãos no


rosto, em pranto.
Ao fundo, à direita, marinheiros empurram um barco para o mar. É

-
ras e do céu cinzento que pressagia tempestade se aproximando.

Medeia, 1889.

corredores do belo palácio revestido em mármore, ainda como prince-

Medeia, já apaixonada por Jasão, leva um frasco de cristal, contendo um


líquido avermelhado, provavelmente o bálsamo que protegerá Jasão nas
provas que deverá enfrentar. Sua veste toda rosada caracteriza seu esta-
do de paixão, bem como seu olhar perdido, voltado para as fantasias no
mundo interior, próprio dos enamorados.
De Morgan retrata Medeia jovem, as vestes revelam seu corpo se-
dutor, como toda jovem apaixonada, onhadora, com planos para o fu-
turo. A seus pés há uma escultura de um leão negro deitado, como que

-
do-se protetor. Parece que ao ultrapassar estátua do leão negro, Medeia
adentra nos aspectos negativos simbólicos. A partir daquele passo não
terá mais volta, é o início de uma tempestade de acontecimentos.

O Velocino de Ouro, 1904.

-
ta a imagem da mulher fatal, forte e determinada, no dramático mo-
mento em que Medeia manda lançar o próprio irmão ao mar, obrigando,
assim, seu pai parar a perseguição para resgatá-lo, possibilitando que,
neste momento de resgate, ela e os argonautas escapem com o Velocino
A pintura transmite a sensação de dramaticidade e movimento.

o semblante duro e a expressão de frieza. Aponta para o mar, ordenando


que lancem o jovem, do qual ignora os apelos. Ele ainda tenta agarrar-se

irmão para atingir seu objetivo.


-
-
-
mando, com seu braço esquerdo aponta para o mar, sua mão está fechada

ação de Medeia jogando o irmão ao mar, ou também pode estar de pleno


acordo.

Figura 28. John William Waterhouse. Jasão e Medeia, 1907.


Medeia sentada em um trono de pedra branco, seus pés não tocam
o chão, apenas seus dedos estão à mostra, tem nas mãos um frasco e uma
taça dourada, com pedras preciosas encravadas em sua volta, onde en-
torna um líquido, que provavelmente é a poção mágica que vai proteger

A princesa tem um semblante sério e compenetrado. Jasão, senta-


do em banco de pedra, que tem em sua lateral a pata de um leão esculpi-
da. Sua cabeça está protegida por um capacete dourado, decorado com as

poderes e conta com sua ajuda.


A sacerdotisa das deusas ctônicas é representada ao lado de uma
vasilha sobre o fogo. Em seu vestido vermelho, há espirais douradas, tal-
vez representando serpentes estilizadas, símbolos de seus poderes.
A pintura apresenta o contraste entre azul e vermelho, razão e
emoção. Jasão, vestido de azul, é frio, racional e movido pelo interesse,
aproveita-se dos poderes de Medeia. Ela, ao contrário, é movida pela for-
ça da paixão.

ódio, crime passional, impulsividade, ambição, abuso de poder, entre


outros.

I.









• Foi em busca de procedimentos alternativos para ter o seu amor





• -

II. Sugestão de atividades

• Fazer a releitura de uma das obras acima utilizando tinta


guache.

• Quais

• Pegar diferentes tipos de ervas, se possível frescas, ao natural.


Pode ser erva doce, alecrim, arruda entre outras. Sentir o aroma
de cada uma e registrar por escrito a sensação que despertou
em seu corpo.



• Colar as ervas secas ao lado dos desenhos.
• Pesquisar as propriedades medicinais destas ervas.
• Escolha uma das ervas selecionada, a partir dela faça uma pin-
tura com mais elementos. Por exemplo, se ela estivesse em um
jardim.
os olhos, pois se Górgona (o rosto infer-

olhos, não voltarás jamais ao mundo


,
Inferno, Canto IX, 55).

Dos laços que Amor arma brandamente


Entre as rosas e a neve humana pura,

Quem dua peregrina fermosura,


De um vulto de Medusa propriamente,
Que o coração converte, que tem preso,

, Canto III, 142).

Acrísio, rei de Argos, recebeu do oráculo a previsão de que sua


morte seria provocada por seu próprio neto. Temendo que a profecia se
sobre ela uma fecundante chuva de ouro. Desse amor nasceu um me-
nino que se chamou Perseu. Seu avô, então deu ordens para que mãe e

até ser encontrada por um pescador e este os levou ao seu rei, que os
acolheu. Quando Perseu tornou-se adulto, Polidectes, apaixonado por

Noite. Medusa era especialmente admirada por seus lindos cabelos.


Apaixonou-se por Poseidon, deus dos mares, e tendo com ele um encon-
tro amoroso no templo de Atena, acabou provocando a ira da deusa, que
a puniu retirando sua imortalidade e transformando seus cabelos em
serpentes. Medusa se tornou uma criatura monstruosa e cruel, que tinha

a tarefa de exterminá-la.
Perseu aceitou a missão, apesar de todos os perigos e contando
com a ajuda dos deuses, partiu para a jornada em busca do refúgio de
-
suíam um só olho e um só dente. Perseu conseguiu tomar seu único olho,
-
tregariam tudo que precisava para matar a Górgona. Assim conseguiu as

invisível a quem o usasse. Atena emprestou-lhe seu escudo polido como


-
nando graças às sandálias aladas. Foi capaz de ver a Medusa por meio do
-
ram o cavalo alado Pégaso e o gigante Crisaor.
No caminho de volta, Perseu encontrou a bela princesa Andrômeda
acorrentada a um rochedo e por ela se apaixonou. A jovem teria sido
oferecida como vítima em sacrifício para um monstro marinho, porém
o herói a libertou e prometeu casar-se com ela. Durante a jornada de re-

gigante que sustentava nos ombros a abóbada celeste, transformando-o


-
no Atlântico.

mãe, o herói transformou o rei e toda a corte em estátuas de pedra.


Perseu entregou a cabeça da Medusa à deusa Atena, que a colocou no
centro de seu escudo.
Depois da missão cumprida, o herói retornou a Argos, sua pátria,
onde acidentalmente matou seu avô, Acrísio, que estava assistindo aos
jogos, dos quais participava, atingindo-o com um disco lançado pelo pró-
prio neto, cumprindo assim o destino fatal que o oráculo havia previsto.

do limiar entre os mundos, protetoras das fronteiras, que habitavam o


extremo ocidente, próximo ao reino da Noite. Eram divindades primor-
diais, pertencentes à geração pré-olímpica, descritas como belas mulhe-
res que possuíam asas douradas. Com a transformação do mito no decor-

de serpentes venenosas, presas de javali, mãos de bronze e asas de ouro

A palavra Górgona se origina do adjetivo grego -

(de , força), Euríale (de e , que pertence ao vasto mar)


e Medusa (de
mar, frequentemente invocado como soberano ( -

do mar e das vagas de espuma branca que se quebram nos rochedos do


litoral”. Representam o terror causado pela força do oceano. A etimolo-

irmãs revezavam entre si, apenas um olho e um só dente. Viviam numa


caverna e eram guardiãs do caminho para a terra das Górgonas. As ve-
lhas grisalhas, também podiam tomar a forma de belos cisnes. Essas aves
vivem a maior parte do tempo na superfície da água e por isso, segundo

porém acima das profundezas do inconsciente.


Para a psicologia analítica, o símbolo da Górgona alerta contra

(MCLEAN, 1992, p.41).


As Górgonas, e em especial Medusa, representam o medo, a estag-

podem representar o medo que protege, mas se for excessivo pode cau-
sar a paralisação do desenvolvimento.

A Górgona, com sua bela face e a cabeça coberta de serpentes,


simboliza a união dos contrários beleza e horror. Por isso ultra-

-
cia nos mosaicos romanos, como símbolo da mãe terrível, o as-

Atena ao ter um encontro amoroso com o deus do mar, Poseidon, em


-
-
tes caninos com presas de javali e cobras no lugar de cabelos. Seu olhar
transformava seres vivos em pedra” (MCLEAN, 1992, p.44).
A imagem da Medusa está relacionada ao medo, à vaidade e à
sexual, social e espiritual. A Medusa representaria a pulsão espiritual
pervertida pela vaidade e a cabeça com serpentes, simbolizaria o tor-

incapacidade de suportar a verdade sobre si mesmo. Não se pode olhar


para ela, mas capturar sua imagem no espelho da verdade. Segundo o
autor, mesmo depois de decepada, a cabeça continuava ativa, a vaidade

Com a ajuda dos deuses, Perseu venceu a Medusa. Diel (1976, p.

graças à sua vitória sobre a vaidade, elevado pela imaginação sublime,


torna-se capaz de escapar da perseguição dos próprios desejos exalta-

espiritualidade.

o grande esforço que o ser humano deve desenvolver para atingir a justa
medida que leva à harmonia. Trilhar o caminho da individuação requer
coragem para admitir as faltas, no contexto de um justo reconhecimento

dela de maneira objetiva, nem exaltada nem inibida, sem exagerá-la ou


minimiza-la.

Medusa e Poseidon violaram o templo sagrado de Atena. Possuir


Medusa no templo de Atena foi uma forma de banalizar os atributos es-
pirituais da deusa.
-
bedoria e do amor, é a aliança entre o céu e a terra. É o local de habi-
tação dos deuses, desde os primórdios, é o lugar do equilíbrio entre o
divino e o profano. Para os antigos gregos, os templos eram o centro
1998, p.874).
Em uma visão ampla, no macrocosmo, o universo é concebido
como um templo e o microcosmo, o corpo também é um templo, onde

e o sagrado, entre o ser humano e o divino. É no templo que ocorrem

livros sagrados. Muitas culturas consideram o templo como a morada de


seus deuses. Desenvolver qualquer ato profano dentro de um templo é
uma ofensa gravíssima.
Poseidon, o deus dos mares revoltos, e Medusa, a Górgona, se en-
tregaram ao prazer profano, violando o espaço sagrado de Atena. Ambos

severamente Medusa.

Para que a profecia não se realizasse, Zeus engoliu Métis. Pouco tempo
depois, Zeus andava pelas margens do lago Tritônis, quando sentiu uma

de ouro, abriu o crânio de Zeus e dali surgiu uma mulher belíssima, ves-
tida em armadura e elmo de ouro, nas mãos segurava o escudo e a lança,
emitindo um poderoso grito de guerra.

Assim, nasce Atena da cabeça de seu pai, Zeus. Essa é a versão mais
tardia do mito, porém, a deusa tem origens muito remotas, no culto da
deusa neolítica das cobras, na deusa das serpentes de Creta e da Líbia.
Alguns atributos dessas antigas deidades se mantiveram nas represen-

essencial feminina. ( 127).


A origem remota de Atena mostra que a deusa foi se aperfeiçoando

enigmática entre os deuses gregos.

de seu pai soltando um tremendo grito. Ao ouvi-lo Urano e a


Terra-Mãe estremeceram. Sua aparição determinou uma com-
pleta mudança na história do cosmo e da humanidade. Uma
chuva de neve de ouro espalhou-se sobre a cidade de seu nas-
cimento, Atenas. Neve e ouro, pureza e riqueza, provenientes
do céu com dupla função: a de fecundar como chuva, e a de
iluminar como o Sol. Essa neve de ouro é também a arte que

recorrer à fraude, isto é, a mentira, e sem recorrer a magias.

e a coruja, apontam
no sentido de uma espiritualização. A antiga Grande Mãe minoica, com

sabedoria, inspiradora das artes e da paz. A cabeça de Medusa no centro


de seu escudo é como um espelho da verdade para combater seus adver-

representa a atuação do espírito na transformação da personalidade do

p.31).
-
ramente intelectual, mas é criativa no desenvolvimento de habilidades
e objetos úteis para a manutenção da vida. Artesã habilidosa e inventora
criou a tecelagem, a cerâmica, o arado, o carro, o navio. Atena presen-
teou sua cidade com a oliveira. A oliveira é símbolo da paz, fecundidade,

1998, p.656).

Atena e seu irmão Apolo simbolizam a espiritualização comba-


nascidas da visão de ideais superiores: a verdade suprema Zeus

1998, p.97).

Atena está sempre alerta e vigilante, inteligente e ponderada,


guerreira pela justiça, considera que nenhuma perfeição é adquirida
para sempre. A perfeição é algo a ser almejado, jamais conquistado. É
a deusa, do equilíbrio e da medida em todas as coisas. Em dias de festa
em sua homenagem, as oferendas são doces em formatos de serpentes e
falos, símbolos de fecundidade e fertilidade. Seu escudo contém a cabeça

verdade.
Como deusa da sabedoria, Atena representa a mente lógica e o uso
da razão para resolver problemas. Para Bolen (1990) a mulher regida pelo
arquétipo de Atena, consegue pensar claramente, manter calma no mo-

associadas a Atena envolvem planejamento e execução, atividades que


requerem pensamento intencional, a estratégia, o aspecto prático e re-
sultados tangíveis.

A imagem arquetípica da grande mãe tem uma simbologia com-


plexa e está associada aos mistérios femininos, às forças da deusa pri-
mordial e aos ciclos da natureza como vida, morte e renascimento. Ela
representa tanto a capacidade de criar como de destruir da natureza em
eterna transformação. É a guardiã dos limiares e mediadora entre os rei-
nos do céu e da terra. A representação da deusa mãe que surgiu no neo-
lítico, geralmente apresentava posturas e gestos de poder, acompanhada
-
da com o aspecto destrutivo e assustador da antiga deusa e expressa sua
face terrível.
Na Grécia antiga, acreditava-se que a representação da cabeça da
Medusa, conhecida como Gorgoneion, era um símbolo protetor que tinha
a capacidade de repelir os males. A cabeça de aspecto grotesco, com den-
tes e língua à mostra, era colocada nos templos como elemento de pro-

p. 107).
Górgonas, sobre a porta de entrada das casas, protegiam contra
intrusos hostis. Até o século V a. C., a Medusa era representada com apa-
-
regalados e serpentes enredadas em lugar dos cabelos. Posteriormente,
essas imagens tornaram-se muito menos aterrorizantes, representadas
com belas faces e serpentes estilizadas.
Assim como Atena usa a cabeça da Górgona, no escudo ou presa à
couraça, Perséfone também a adota como proteção. A deusa do mundo
subterrâneo envia a cabeça da Medusa ao encontro dos que tentam inva-

da face feminina envolta por serpentes venenosas e asas douradas. A


cabeça da Medusa é incomum, pois nela se concentram vários elementos

Platão comparou a forma esférica da cabeça humana com o mi-


crocosmo, ela tudo contém, assim como o universo, o macrocosmo.
Portanto, o bem e o mal ali residem. A cabeça gera pensamentos sadios e
doentios. É a parte do corpo que abriga o maior número de sentidos, tais
como, a visão, olfato, audição, gustação. Por ela passa toda a percepção
do mundo. É o centro da imaginação e dos sonhos. Para algumas cultu-
ras antigas era morada do espirito.
A cabeça simboliza o princípio ativo da vontade, sabedoria, inteli-
-

espirito manifestado.
A decapitação ritual está relacionada com a crença de que a cabeça
é a sede do espírito. E ao levar consigo a cabeça do inimigo vencido em
combate, acreditava-se que a força do adversário passava para quem o
matou.
As asas douradas na cabeça da Medusa e de suas irmãs Górgonas,
representam o movimento espiritual dual, a descida aos infernos e a su-
bida aos céus. Nas artes visuais mais antigas, pinturas em vasos de cerâ-
mica, representam Atena alada.

representa a possibilidade de liberação e ascensão, como Pégaso. Possuir


-
-

A cabeça da Medusa faz parte da Trinácria, o símbolo da Sicília,


que remonta ao tempo em que a ilha fazia parte da Magna Grécia, uma
extensão colonial grega além do mar Egeu. A sua origem se deve à forma
triangular da ilha (tri , ponta).
A Trinácria, ou tríscele é um antigo símbolo indo-europeu que

curvas entrelaçadas. Tríscele vem de uma palavra de ori-


-

vida e do universo. Como espiral, pode se mover no sentido horário ou


anti-horário. Simbolicamente, o sentido horário representa expansão
e crescimento enquanto o sentido anti-horário, refere-se a proteção e
recolhimento.
A Trinácria siciliana é composta pela cabeça da Medusa, com cabe-

Gorgoneion (cabeça da Górgona)


tem função de proteção contra o mal. Além das serpentes e asas, possui
espigas de trigo, símbolo de fertilidade da terra, pois a Sicília era grande
produtora de cereais na antiga Roma.
proteção, mas também um forte componente de dinamismo, energia e
fertilidade.

Poseidon a possuiu no templo de Atena e Medusa foi incriminada


pelo ato de sacrilégio, punida na sua característica mais encantadora,
tendo seus cabelos transformados em serpentes.
-
tes em lugar dos cabelos. As Erínias tinham faces horríveis e cabeças de
serpentes. Emergiam das profundezas, com tochas nas mãos, perseguin-
do os assassinos dos próprios familiares, principalmente os matricidas,

parte superior pelas forças inferiores, ainda mais porque o cabelo sim-

do pensamento, imaginação e fantasia, que, como o cabelo, brota da ca-

à ascensão, a fertilidade e a fecundidade. Desde a antiguidade acredita-


-se que os cabelos, unhas e dentes, concentram as virtudes espirituais,
a força vital e não se desvinculam do indivíduo a que pertencem, mes-
mo se forem separados do corpo. Por isso são usados em muitos rituais
mágicos.
A prática de conservar os cabelos ou mechas foi adotada pelo cris-
tianismo com o culto das relíquias dos santos. Na vida cotidiana, muitas
famílias guardam os primeiros cachos e os dentes de leite das crianças.

mais do que o simples desejo de perpetuar uma recordação: elas revelam


quase uma vontade de fazer sobreviver o estado da pessoa a quem esses
cabelos pertenciam.
exemplo, no mito bíblico de Sansão, sua força está em seus longos cabe-
-
cio ou rendição, às virtudes, às prerrogativas, ou a própria personalidade.
-
cheados, que seduziram Poseidon. Essa atitude, tomada como ousadia,
-
gura monstruosa.
Para a mulher, o cabelo expressa sua feminilidade e poder de se-
dução por ser atrativo sexual. A disposição dos cabelos, atados ou soltos,
à mostra ou não, revela sua disponibilidade, do desejo de entrega ou de

-
mento, a perda de entes queridos. As pessoas em estados depressivos
não cuidam de seus cabelos. Pentear os cabelos de alguém é sinal de

intimidade. Assim originam-se os pentes mágicos dos contos de fadas.

A boca da Medusa é representada com duas grandes presas de ja-

força e ao mesmo tempo, meio de assimilação, de divisão e multiplica-


ção. As presas do javali estão localizadas nos caninos da Medusa e reve-
lam seu ódio agressivo, devassidão desenfreada e brutalidade.

mundo mítico indo-europeu, da tradição primordial, na qual


o javali representa a autoridade espiritual. Na tradição cristã representa

De sua boca a língua sai estirada. A língua como órgão do corpo,


se assemelha a uma chama, devido a sua forma e mobilidade. É o órgão
da palavra, criadora do verbo, imbuída de um poder de fecundação da
mesma categoria da chuva, do sangue, do esperma, da saliva, que é o

algumas pessoas são consideradas de língua má, não sabem controlar


sua língua. Mas é a língua que distingue os sabores, é o órgão do paladar,
de caráter dual, sabe discernir o bom do ruim. Simbolicamente a língua

-
brado da língua.
A língua, como verbo, é uma estrutura mental e social. É a principal
via de comunicação de individuo para individuo, de grupo para grupo; é
o meio mais apurado de intercambio. Ela traduz certa unidade do ser, é
fator de coesão. Uma sociedade se desagrega quando abandona sua lín-
gua. A linguagem detém uma carga de energia, que provem de todo o ser
e visa ao ser por inteiro. A linguagem permite que se participe da vida.
A Górgona é frequentemente representada fazendo careta, com a
língua estirada. Mostrar a língua é um insulto, uma provocação. Como

demonstração de força ou capacidade mágica. Cascudo (2003, p. 160)


considera mostrar a língua um gesto de escárnio, que faz parte do patri-
mônio mímico de toda a Europa.
Na careta, a língua esticada para fora da boca é um alerta, um aviso
que ela sabe o que deve falar sobre o outro, que conhece e pode revelar
seus conteúdos sombrios e secretos, que sabe caluniar e difamar.
Fazer careta é um gesto milenar de intimidação, defesa instintiva
para atemorizar o inimigo. Por isso os elmos e escudos eram ornados

cara, inesperada e assustadora, aterrorizando o inimigo pela hediondez

Neumann (1999) demonstra que há uma correlação simbólica en-


tre os lábios e o princípio feminino e entre os dentes e o princípio mas-
culino. As presas do javali ou os dentes de outros animais aparecem nas
à mostra. As Górgonas possuíam presas de javalis, barba e língua esti-
rada, como símbolos do poder do feminino primordial. São imagens da

terrível do feminino se manifesta por meio de atributos masculinos, por


isso as Górgonas são representadas com presas de javali, dentes e língua
expostos e até barba.
A barba faz parte do corpo masculino devido aos hormônios e no
contexto simbólico está relacionada à virilidade, coragem e sabedoria.

barbas pontiagudas. Para igualar o poder entre reis e rainhas, algumas


rainhas egípcias são representas com barbas. Em outras culturas o herói
que não tem barba deve usar uma barba postiça. Deve se destacar que o
uso de barba não é para todos, e sim, somente, para os bravos, corajosos

olhar para os olhos da Medusa se adentra nas verdades mais profundas

considerar, sucessivamente, o olho físico, na sua função de recepção da


luz; o olho frontal, terceiro olho de e o olho do coração. Todos os

-
, terceiro
olho está relacionado à percepção intuitiva, ao fogo, indica a condição
-
-
ção de Deus e alma.

sóbrios. Se, como seres humanos, temos dúvida sobre a exis-

olhamos no espelho, alguém nos olha de volta questionando,


sério, alerta, e sem pretender consolar; e sentimos mais pro-
fundidade nos olhos que nos olham do que habitualmente nos

nós, a metade que não deixamos expressar-se pelos nossos


olhos quando olhamos para os outros — e essa metade mais

1985, p.217). Sentir o olhar do outro como perseguidor, é sinal de que

olhar causa desconforto pelo receio desse segredo ser revelado.


Segundo Cascudo (2003, p.228) é costume milenar a proibição de
-

religiosa. Preserva-se o hábito respeitoso de não olhar para a represen-


tação da divindade. Por outro lado, ao falar, deve-se olhar para o interlo-
cutor. Cascudo (2003, p. 151) esclarece que esse é um sinal de lealdade.

considerado possuidor de faculdades mágicas e irradiação de força mag-


nética. Por isso não se deve olhar para quem come, conforme a crença
-
sorve a energia alheia, essa é a origem do mau olhado, quebranto, azar,
inveja.
A respeito do simbolismo do olhar, Perera (1985) menciona a im-
alguns povos antigos, como sumérios e babilônicos, os olhos dos deu-
ses são aumentados para transmitir a impressão de seu poder sagrado.
Refere-se, por outro lado, ao olhar mortal e impiedoso, que paralisa pelo
medo, congela e destrói. Como imagem arquetípica, esses olhos impla-
cáveis e profundos, percebem com objetividade, penetrando a alma em

o que existe além de qualquer julgamento de bem ou mal, ultrapassa os

-
dade da vida.

o mesmo que estar morto”. Essa paralisação é o oposto da corrente da

esclerose. Assim, para o autor, a Górgona é símbolo inverso ao do útero


que dá vida.
-

-
ciona uma ampliação da visão da realidade a quem consegue suportar.

de que eles podem, de repente, se mover. Uma estátua pode ganhar vida.
Tememos o impacto que uma representação realista demais pode cau-
sar. Qualquer obra pode ser tocante e até assustadora pela sensação que
provoca. Pessoas mais sensíveis podem se sentir sem recursos para lidar
com a emoção despertada e, imediatamente, desviam o olhar. Mesmo
podendo-se perfeitamente distinguir entre realidade e fantasia, a ima-
gem pode ser tão temida quanto o ser real porque a sensibilidade está

do perigo.
para iluminar o mundo, abrindo-lhe o caminho da arte e da sa-
-

FERREIRA, 2013, p.151).

Perseu é mais conhecido pela façanha heroica enquanto a Medusa


é apenas um monstro a ser derrotado. Esta análise, entretanto, busca

psicológico.
-
lhar’, portanto, é um herói da luz. Por ter nascido de uma chuva fecun-
dante de ouro, tornou-se um símbolo solar. Filho de Zeus com Danae,
Perseu é um semideus, que nasce da matéria, concebido pelo espírito.

pelos deuses que o protegerão e o farão vitorioso.


Diferente dos heróis que partem em busca de um tesouro ou en-

por amor. Ele o faz para proteger sua mãe. Depois novamente enfrenta
um monstro para salvar Andrômeda, por quem se apaixonou assim que

por um ideal ou por quem ama.


Perseu entra na tenebrosa caverna das Górgonas para enfrentar
a Medusa. Segundo Jung (2000, Vol. IX/1), o herói da luz tem de ousar

que o poder da temível escuridão. Esse ato representa a vitória da cons-


A respeito do simbolismo do ato de Perseu, em um de seus semi-
nários, Jung (2011, p.233) comenta:

A grande cabeça da Górgona, a terrível face coroada por ser-

-
dora, ao terror perante esta, pois essa face pode nos transfor-
mar novamente em terra morta. Perseu conjurou esse perigo
na medida em que cortou a cabeça da Górgona com sua espada

desse terror.

transforma em poder. Assim, a cabeça da Górgona foi incorporada aos


atributos de Atena, simbolizando que a imagem recente da deusa assi-
milou o poder de uma divindade primordial que pertencia a uma fase já
superada, uma vez que os deuses também evoluem.
No plano coletivo, segundo Neumann (2000, p. 235) o combate he-

morta para dar lugar ao novo, uma nova etapa, um novo deus.
-
za, as atividades vulcânicas, por exemplo, e a própria instabilidade do
planeta em sua origem. Ao longo de eras, as mudanças climáticas per-
mitiram o surgimento das diversas formas de vida, que se renova em

processos evolutivos da natureza e dos seres humanos.


-

apenas aos intrusos aventureiros que lá chegassem para importuná-las,


inesperadamente e atacam. Estes representam conteúdos inconscien-

impactante. A jornada de Perseu à procura da Medusa traduz um movi-


mento inverso, ou seja, é uma atividade consciente de busca e resgate de
aspectos sombrios, que contém muita energia, mas estão inacessíveis.
Esse poder armazenado em camadas profundas da psique pode fazer
falta em algum momento da vida e requer grande esforço e sabedoria
Gorgoneion será uma arma importante para o herói em

o ego precisa resgatar qualidades e potencialidades que estão profun-


damente reprimidos no inconsciente, retendo a energia que necessita
canalizar adequadamente em atividades criativas e construtivas na vida
prática ou no processo de desenvolvimento.
Na cena heroica mitológica, assim como no plano psíquico, o tema
do tesouro difícil de encontrar, ou seja, os obstáculos a se superar em

-
to, é necessário um grande esforço. Não cabe a impulsividade, é preciso
agir com sabedoria. Perseu não usa a força bruta, não é impulsivo ou am-

pertence. Não toma o poder sabendo que é apenas um agente a serviço


de forças maiores e cumpre seu propósito. Na Psicologia Analítica, re-
presenta o ego a serviço do si mesmo, o arquétipo central, organizador
da psique, em busca da integração na totalidade.
A Medusa representa um poder reprimido e, por isso, não deve ser
totalmente destruído, mas transformado e reaproveitado no processo
evolutivo, tanto da psique individual como coletiva. Perseu não é sim-
plesmente o herói que derrotou a Medusa, mas representa um ego es-
truturado, que está a serviço de um centro organizador, que transforma
a energia retida num complexo afetivo paralisante, em capacidade de
ação produtiva.
-
bilidade paralisante. Nesse sentido, Von Franz (1985, p.271) esclarece
que Perseu consegue matar Medusa sem olhar diretamente, mas por
-
jetiva entre ambos, para evitar o choque emocional que poderia sentir
olhando-a de frente”.
Perseu tem um escudo espelhado, que lhe foi dado pela deusa
Atena, para sua proteção. A grande deusa da civilização conhece os be-
nefícios de seu escudo polido, mas depende da sabedoria de Perseu ma-
nipulá-lo. Atena lhe dá a ferramenta de proteção, mas não lhe ensina
como deve fazer para se defender da terrível Medusa. Perseu não pode

forma defensiva e cuidadosa.

adversas que não podem penetrar na face brilhante da superfície polida.

de amenizar os afetos”. Perseu, ao matar a Medusa, sem olhar para ela,


mirando apenas pelo escudo polido, pôde se proteger da paralisação que
resultaria da sobrecarga emocional desse confronto.

Atena a colocou em seu escudo para apavorar quem ousasse atacá-la


-

A espada relaciona-se à justiça, pois separa o bem do mal.


Simboliza a razão, a palavra e a luz. A espada é também um símbolo
.

monstros malévolos. Associada ao elemento fogo, pelo resplendor, seu

Assim, a espada e o escudo do herói representam suas capacidades

a serviço do processo evolutivo.

Ao decapitar a Medusa, Perseu venceu sua própria monstruosidade


e vaidade.

A Medusa representa a imagem excessiva da culpa, cortar sua


cabeça é dominar de forma durável o sentimento excessivo, pa-
ralisante e mórbido da culpa, é adquirir o poder de se ver a si
mesmo sem deformação para mais ou para menos. Diante do
universo mórbido da lucidez sem espelho que deforma.

da imagem do erro deformada pela vaidade seduzida, ou de-


capitar essa imagem triunfando da vaidade pelo exercício co-

1998, p. 714).

-
liza a comunicação da alma com o corpo. Em algumas culturas o pescoço
-
-
ção e mobilidade.
Para os índios guaranis, a alma do ser humano se localiza no pes-
coço e, também, seu temperamento. Se a pessoa tiver alma de borboleta
terá temperamento dócil, se tiver temperamento cruel terá alma de ja-
guar. Para a cultura árabe-persa o pescoço feminino é belo e sensual. Até
os dias atuais o pescoço é perfumado e ornamentado com colares que
valorizam sua beleza.

que pode ser controlada conscientemente. Simboliza a força, os im-


-
lo da sublimação dos impulsos instintivos elevados ao plano espiritual

Segundo Brandão (1986) o nome Pégaso deriva de , fonte.


Essa imagem concentra dois símbolos, a fonte e as asas: a fecundidade e
simboliza a imaginação criadora
sublimada e sua elevação real às qualidades espirituais.

1994).

quando enfrentou a Quimera. Exaltado, o herói o fez cavalgar até o


-
vas, portanto, está ligado as tempestades, ao trovão e ao raio. Seu simbo-

nascimento de Pégaso, a partir da decapitação da Medusa, representa a


liberação da energia psíquica e sua ascensão. É símbolo de sublimação e

A palavra Quimera (do grego , cabrita, segundo Brandão,


2014) nome do monstro que tem corpo de cabra, cabeça de leão e cau-
da de serpente, refere-se a um produto da imaginação, fantasia, utopia.
-
ferindo-se a algo que não existe realmente ou que toma fantasia por
realidade. No devaneio quimérico, alguém pode se perder, se iludir, se

monstro cavalgando Pégaso que, ao contrário da Quimera, representa a


imaginação criativa, inspiradora e produtiva. Um voo livre num espaço

em suas mãos a espada de ouro, a , que na mitologia grega, é

por ser de ouro está ligada ao sol, ao conhecimento, a razão, aos logos.
Contém duplo aspecto, destruidor e criador, é um dos símbolos do Verbo,
da Palavra. É uma arma nobre que pertence aos cavaleiros. Entretanto
esse poder está nas mãos de um ser brutal.
Crisaor é um gigante. Em geral, os gigantes são seres movidos
por uma força bruta, que só pode ser vencida pela astúcia do herói.

-
tam a força bruta que deve ser vencida para liberar e expandir a persona-
lidade. Na mitologia grega, os deuses Atena, Dionísio, Afrodite, Poseidon
e outros, deixam para o ser humano a tarefa de matar o gigante, pois é
uma tarefa humana e não divina. A evolução da vida no sentido de uma
espiritualização crescente é o verdadeiro combate dos gigantes.
-
va do símbolo. A energia reprimida, paralisante e destrutiva da Medusa,
depois de liberada, continuou reproduzindo o mal, pois Crisaor gerou
om

metade serpente. Équidna


1986, p.155), que mais tarde foram enfrentados e vencidos pelos heróis

Vencer Crisaor com sua espada de ouro é uma tarefa diária do ser
humano, se tiver a intenção de trilhar o caminho da individuação. Todo
dia se deve cortar, decepar, separar o bem do mal, a verdade da mentira,
portanto, a espada de ouro de Crisaor está em nossas mãos.
A oposição entre Crisaor e Pégaso indica que o potencial criativo
pode ser utilizado tanto para o bem, quanto para o mal. Tanto pode gerar
harmonia e beleza como medo e destruição.

contém vida e morte. Diante de uma visão universal o sangue é consi-


derado veículo de vida, sua simbologia relaciona-se com o fogo, calor,
vida e com o sol. Carrega valores como nobre, belo, generoso e eleva-
-

realmente o sangue, em outros o vinho é transmutado em sangue, como


na comunhão do Cristianismo.
Segundo a mitologia, o sangue retirado do lado direito da Medusa,
poderia curar e até trazer os mortos de volta à vida. No seu lado esquer-
do, havia um veneno fatal.
Atena deu um frasco do sangue da cura ao deus da medicina.
Asclépio (Esculápio na mitologia romana), foi educado
pelo centauro Quíron e com ele aprendeu a curar, tornando-se capaz de
impedir a morte. Zeus não aprovou esse procedimento porque alterava a
ordem natural da vida e acabou fulminando Asclépio com um raio.
ou destrutiva, mas continha forças positivas curativas. Remédio e vene-
no contidos na Medusa, além das serpentes em sua cabeça, permitem
estabelecer uma relação com antigas divindades ctônicas da vida, morte
e renascimento. A sua imagem seria um aspecto reprimido, um poder
remanescente de antigos cultos, ainda ativos no inconsciente e que de-

remete à simbologia da serpente.

psicológico.
As serpentes se deslocam por propulsão, em movimento sinuoso

Pela capacidade de renovação da pele e pela característica de seu mo-


vimento; por seu veneno ser também antídoto; provocar a morte, mas
também permitir a cura, a serpente representa a transformação cíclica

-
dial. Em alguns mitos primitivos a imortalidade era dádiva da serpente

a renovação da vida. No catolicismo, ainda há resquícios desse tema nas

Segundo Jung (1986, vol. V, §580, p.363) a serpente é mortal e


curativa, ao mesmo tempo um símbolo do espírito do bem e do mal. É
uma excelente representação do inconsciente, porque exprime sua pre-
sença inesperada e repentina, sua intromissão incômoda ou perigosa e
seu efeito amedrontador.
A serpente, como símbolo do medo, tem papel importante nos so-
nhos. Devido a seu veneno, sua imagem não rara precede doenças físicas
como sintoma precoce. Expressa uma animação anormal do inconscien-

serpente, para Jung (1986, vol. V, §681, p. 422) depende de inúmeras cir-

para os velhos, o medo da morte”.


As serpentes estão associadas ao feminino devido à sua ligação
com a terra. Por trocar de pele periodicamente, também se relacionam
às fases da Lua e ao contínuo ciclo de nascimento, morte e renascimento.

o feminino primordial devido às qualidades de esperteza e sabedoria.


Apesar do perigo que representa, exerce um efeito fascinante. Aparece
em sonhos como imagem da energia psíquica, indiferenciada e primitiva.

forma sutil de conhecimento, própria da mulher, que é a capacidade


de obter informação a partir de fontes instintivas. A serpente seria um
símbolo arquetípico do logos feminino, uma espécie de poder fálico

Paleolítico eram representadas com a serpente ou o chifre de um touro,


símbolos associados à capacidade de preservação da vida e aos sagrados

Segundo Jung (1972, p. 152) a serpente não provoca apenas medo,

foi incorporada aos símbolos representativos das atividades médicas.

as serpentes são inseparáveis. A água das profundezas representa o in-


consciente e lá geralmente há um tesouro guardado por uma serpente.

Aquele que se aventura na caverna é um herói. A descida trará a


-
mordial, da cura e da redenção, pois contém a joia da inteireza.
É a caverna onde mora o dragão do caos e também a cidade
indestrutível, o círculo mágico, o recinto sagrado onde todos os
fragmentos separados da personalidade se encontram. (JUNG,
1972, p. 159).
A serpente representa o impulso para o desenvolvimento da cons-
, en-
rolada na base da coluna a espera de ser despertada, é um veículo de
transformação, a luz do espírito que penetra a escuridão da matéria.
Despertá-la representa a tentativa de deixar o estado inconsciente e as-

A multiplicidade de serpentes que aparece na terrível cabeça da


-

arquétipo, e sim um complexo de arquétipos que estão ligados à noite e


ao frio, ao pegajoso e subterrâneo, as camadas mais profundas da vida; a
união de todas as serpentes forma a única multiplicidade indivisível que
não cessar de desenrolar, desaparecer e renascer, no estado primordial.

uma transformação no modo como aparece no mito. Na Medusa é carac-


terística de seu poder destrutivo, depois é incorporada por Atena como
a atributo da sabedoria.
Ao longo da história da humanidade o símbolo da serpente oscilou
entre as polaridades. De deusa da renovação da vida a representante das
forças do mal, instrumento da tentação. De símbolo do poder da morte,

humano elegeu a serpente como divindade e nela reconheceu a conjun-


ção dos opostos, bem e mal, luz e sombra, terra e céu. Mas a própria
humanidade, por viver no dualismo, não soube ainda onde colocar essa
imagem tão poderosa, assim, a serpente às vezes está no alto da cabeça,
na testa do faraó, outras aos pés da Virgem. É uma cobra grande que
serpenteia no rio, é a deusa que abriga o universo ou está adormecida
no interior do corpo humano. Aparece nos sonhos e assusta por ser um
profundo mistério.
Após cumprir sua missão, Perseu retornou trazendo a cabeça da
Górgona, porém, no caminho encontrou a bela princesa Andrômeda
acorrentada a um rochedo e, ao primeiro olhar, por ela se apaixonou.
Andrômeda foi oferecida em sacrifício ao monstro marinho envia-
do por Poseidon, a pedido das ninfas, que se sentiram ofendidas porque
Cassiopeia, mãe da princesa, ousou dizer que era mais linda do que elas.

foi abandonado, pois Perseu salva a princesa.


No episódio do salvamento de Andrômeda encontra-se o tema mí-

desinteressada que surge inesperadamente na jornada heroica, a prince-


sa que é mantida prisioneira, representa o inconsciente individual que

que virá despertá-la ou salvá-la.

imagem arquetípica da donzela ameaçada pelo monstro, portanto, con-

obstáculos a superar. A sua presença leva ao esforço heroico e ao domí-


nio do medo. É preciso vencer toda espécie de monstro, inclusive a si
mesmo para possuir os bens superiores que ele guarda. Não se chega ao

que é irracional, caótico e tenebroso.

Presente em muitos mitos, a pedra, chama a atenção por sua du-


reza, imobilidade e quase imutabilidade, sendo um grande enigma para
o ser humano.
A pedra é um símbolo da unidade, da durabilidade e da força
estática. A dureza da pedra sugere a antítese das coisas vivas, as quais
estão, de forma muito mais evidente, submetidas às leis de mudança,

impossibilidade de desenvolvimento e morte.

ser devido ao sentimento de culpa excessiva, orgulho, cobiça ou inveja.

Abstraindo ainda mais os elementos do mito, na caverna escura,

imagem fugidia de uma realidade em constante transformação. Por meio

como uma forma de eternizar, preservar do tempo e prender na matéria,


não deixando mudar. A nostalgia do passado e o medo do futuro deixam
a pessoa parada no tempo, estagnada, presa na imagem de si mesma
como foi um dia. Não seria esse o sentido da fascinação pela imagem no

Segundo Jung,

relação a um mergulho demasiado profundo em si mesmo, é

desse substrato anímico, desse espaço obscuro e desconhecido,


uma atração fascinante, a qual ameaça tornar-se tanto avas-
saladora quanto mais nele se penetrar. (JUNG, 1990, vol. XII,
§439).
Para Edinger (1989, p. 360) a Górgona Medusa representa o princí-
pio feminino negativo, no seu aspecto paralisante, que teria efeito imo-
bilizador sobre o ego masculino.
-
volvimento, como explica Neumann (2000, p. 231). A formação do ego e
da individualidade se caracteriza por um movimento de ascensão do in-

que é infantil, inferior, abissal e caótico deve ser superado. Todos esses
são símbolos do aspecto devorador do Feminino. A Mãe Terrível, a que o
autor se refere, torna-se o oposto da energia ascendente do desenvolvi-
mento do ego e símbolo de estagnação, regressão e morte.

desvalorização do Feminino deve ser entendida como uma tentativa de


superação do medo de seu aspecto perigoso, como a Grande Mãe e como

atitude defensiva, os homens associam a dimensão material, instintiva


e sexual ao feminino negativo e à mulher. Segundo o autor, o espírito
masculino característico do patriarcado, rejeita o feminino por julgá-lo
-
ta. Ele pode negar ou cindir a imagem feminina em duas polaridades

genuíno com a mulher real e com o inconsciente. Em virtude do medo,


o indivíduo do sexo masculino não consegue atingir a própria inteireza
que inclui o feminino.
Para Neumann (2000, p. 252), o medo resulta do confronto com os
aspectos desconhecidos de si mesmo, mas está a serviço da individuação
e deve-se lidar com o temor a cada transição de uma fase para outra do
desenvolvimento. A superação do medo ocorre pela integração do que
antes era estranho, quando passa a ser reconhecido como pertencente
à própria pessoa. Assim o homem incorpora o feminino integrando a
anima e assumindo os aspectos masculinos e femininos como partes da
própria personalidade.
plano psicológico, aos efeitos da atuação de um complexo materno
inconsciente.

complexo materno, demonstra que, nesse caso, a função sentimento

aprisionada, pois carrega afetos tão intensos que podem provocar muito

maneira adequada de liberar a energia e proporcionar uma sensação de


libertação seria admitir e expressar os sentimentos negativos.

-
frontar os conteúdos inconscientes, o complexo que estava no controle,
volta-se contra o ego e gera um medo considerável da mudança e do
desconhecido. Lutar diretamente com a Medusa é a derrota certa, por-
que o complexo pode estar tão carregado de energia reprimida, que en-
frenta-lo ocasiona uma paralisia de medo. Para a autora, o modo de lidar
com esse complexo é confrontar indiretamente a imagem da Medusa,
observando os símbolos para receber a diretriz do positi-
vo, representado no mito por Perseu, com sua espada do discernimento,
decapitando a Medusa, libera o potencial criativo.
-

-
senta o outro polo reprimido, atuando no inconsciente e que estaria por
trás dos vícios e outros sintomas que se observam na atualidade.

Na verdade, estou sugerindo que muitos de nós — homens e


mulheres — somos viciados de um jeito ou de outro porque
nossa cultura patriarcal enfatiza a especialização e a perfei-
ção. Compelidos a fazer o melhor na escola, no trabalho, nos
relacionamentos, em cada aspecto de nossa vida, tentamo-nos
tornar verdadeiras obras primas. Nessa árdua luta para criar a
nossa própria perfeição, esquecemos que somos seres huma-

Atena e, por outro, somos forçados a afundar na voraz e repri-


mida energia da Medusa. Atena está acorrentada à Medusa tão
certamente quanto esta àquela. Somos prisioneiros dos radica-
lismos dos deuses, um território que não nos pertence. Nesse

cultura. Enquanto estiver acorrentada à rocha, deve se manter

toda a sua ardente amorosidade paralisada na marmórea imo-

Uma mulher extremamente bela, muito sensível e vulnerável, pode


ter sido profundamente ferida em algum relacionamento do passado, o
que a fez defender-se, assumindo atitudes e aspecto físico desagradável
e sem atrativos para os homens (LEMESURIER, 1992).
-
mem que inadvertidamente dela se aproxima. A cabeça cheia de serpen-
tes é a metáfora das ideias ou comentários viperinos que desvalorizam

atuação no papel de Medusa é o contrário da Musa inspiradora, que in-


centiva, estimula e enaltece o companheiro no seu processo de desen-
volvimento pessoal.

pleno desabrochar dos potenciais do indivíduo. A Musa, por outro lado,


auxilia na descoberta de qualidades latentes, transformando um simples

Para os homens, a Medusa pode ser tanto um aspecto interno,


-

carregadas de veneno.
Supondo que Atena e Medusa representem aspectos opostos de
uma única personalidade, a deusa da sabedoria, como defensora dos va-
lores coletivos, reprime todo e qualquer comportamento que ultrapassa
a justa medida. Faz surgir no inconsciente, como compensação, a atitude
contrária. Assim, Medusa, que era bela e vaidosa, tornou-se horrível e
escondeu-se numa caverna, retornando ao ventre simbólico, no seio da
terra mãe. Medusa corresponde ao aspecto vergonhoso, que jamais pode
ser admitido e que se torna amedrontador.

A feiura, a escuridão, a destruição e o terror exigem de nós uma

os outros lados da beleza, do amor, do sustento, da alegria, e do


prazer: e isso diante da repugnância e do medo, que descobri-
mos em nós quando os enfrentamos. A vida não é só boa e agra-

feias e más, nossos desejos - de ódio, de vingança, de inveja,


para citar apenas alguns - fazem parte de nossa natureza. Mas,
-

No plano psicológico, o mito da Medusa pode se relacionar à auto-


crítica excessiva. Em termos da Psicologia Analítica, olhar para os pró-
prios defeitos, no confronto com a sombra, pode ser paralisante para o
ego, que precisa manter a objetividade e não pode se envolver emocio-
nalmente com esses conteúdos. Não deve ser crítico demais, nem tão
complacente.

não se permitem obter sucesso. Temem a exclusão social, a inveja alheia,


os comentários maldosos e a rejeição, principalmente quando se sobres-
-
to grau de alienação. Esse medo pode reprimir a criatividade e levar à
estagnação.
Atena pune a mulher que ultrapassa os limites da vaidade queren-
do concorrer com a deusa em habilidade (Aracne) ou beleza (Medusa).
psicologia analítica, os deuses mitológicos são imagens arquetípicas e
representam aspectos do psiquismo. Quando um deus pune com uma

aprisionada e a energia psíquica retida num conteúdo regressivo.

Psicologicamente, pode-se comparar à atuação de um complexo, cujo


núcleo é um conteúdo reprimido. Tudo que toca um complexo é tragado
por ele e paralisa o desenvolvimento. Assim como o monstro causa mui-

para enfrentá-lo, cortar a cabeça, ou seja, retirar-lhe o poder e reencami-


nhar a energia retida em seu núcleo. A polaridade consciente necessita

ao complexo, que precisam ser resgatados.


-
te no uso da capacidade de discernimento, ao separar o bem e o mal,
remédio e veneno, o criativo e o regressivo. Decepada a cabeça, há um
reaproveitamento da energia reprimida, paralisada e paralisante. Assim
como nos conteúdos da sombra, existem aspectos positivos, reprimidos
ou não desenvolvidos, que devem ser libertados para que o indivíduo
possa desenvolver todo seu potencial.
Medusa, com sua linda face e cabelos de serpentes, gera ao mesmo
tempo atração e repulsa. Essa imagem pode se relacionar simbolicamen-
te a alguém que encanta pela graça, mas que ao se olhar atentamente,
ao penetrar em sua morada, ou seja, conhecendo na intimidade, nota-
-se que a energia psíquica de um complexo, tomou o controle do centro

negativos. Metaforicamente, seu veneno fatal mataria quem se aproxi-


masse. Isso, porém, nem chegaria a acontecer, porque ocorreria antes a
-
te real, que paralisa sua presa para dominá-la.
Reprimida a capacidade criativa, a energia que seria investida em
algum tipo de ação externa, pode ativar um aspecto sombrio da perso-
nalidade. Surge assim, um tipo de transtorno psíquico em que o sujeito
-
mento perturbado por juízos delirantes, que podem prejudicar ou ofen-
der quem dele se aproxima.
-

a capacidade criativa no sentido involutivo, a libido regressiva ativando


conteúdos sombrios inconscientes. Toda imagem arquetípica tem a po-
laridade positiva e a negativa. Esses dois aspectos antagônicos, latentes
na Medusa, foram liberados pela espada de Perseu. Decapitar, simboli-
camente, seria retirar o controle do complexo negativo e libertar os as-
-
minho de desenvolvimento por meio da liberação do potencial criativo.

não o retém apenas para si, nem o entrega ao rei injusto que lhe in-
cumbiu da tarefa com a intenção de livrar-se do verdadeiro herdeiro do
-
nada, usa a cabeça da Medusa para defender-se e praticar o bem. Por

escudo e na égide.
Essa versão do mito representa a transformação das imagens sim-

exiladas, tornaram-se malignas e destrutivas. Seus poderem precisaram

-
nhora das habilidades, estratégia e sabedoria, passa a usar a cabeça da
Górgona e, desse modo, assume o poder da primitiva deusa ctônica da
serpente, integrando seus atributos.
-
rado simbolicamente pela mulher que busca resgatar a dignidade femini-
na, o poder das antigas deusas representantes das forças primordiais da
natureza, bem como o respeito e a valorização do modo de pensar e agir

a predominar os deuses solares, o racionalismo e os valores masculinos.


Para a Psicologia Analítica, a imagem da Medusa é uma expressão
da força vital, atuante no processo de criação, destruição, mudança e
recriação. Ela representa a dimensão transformadora do feminino, repri-

Medusa é o abismo da transformação, o enigma aparentemente


caótico que a mulher parece ser para si mesma e para o homem
desconsertado, que ela leva até o umbral do terror do imprevi-
sível, do suposto vazio e depressão, da aniquilação. Seu modo
de ser é o da sacerdotisa médium curadora, da artista inspi-
rada e a da personalidade limítrofe errática e histérica, devo-
radora. É a , , a bruxa. Em

Seu reino deve ser periodicamente visitado por toda mulher,


e toda anima, para sua renovação, assim como Inanna desce a

Na obra Whitmont (1991) comenta que é


possível observar o ressurgimento do feminino e das qualidades da ani-
ma dentro do sistema de valores coletivos na atualidade. Eles estão se
tornando outra vez determinantes culturais, forjando uma nova cons-

reintegrar à psicologia de homens e mulheres essa dimensão transfor-


madora e potencialmente destrutiva da Medusa reprimida. Sugere que
ao aceita-la, tanto em seu fascínio, quanto na ameaça que ela representa
para seu sistema de valores, tanto em sua beleza como em sua feiura, o
novo homem confronta seu medo do Feminino bem como seu medo da
-
tumeiros de compreensão e controle.

Devemos descobrir como essa força pode ser integrada àqui-


lo que consideramos aceitável do ponto de vista ético e mo-
ral. A meta do novo ego será viver, plena e conscientemente

devemos lutar contra tais dinamismos nem expressá-los


compulsivamente, mas vivenciá-los meditativamente, nos pla-
nos psíquico e somático, ao mesmo tempo em que lhes confe-
rimos tanto espaço e tanta consideração quanto o permitirem
nossas necessidades e nossos deveres. Agir assim parece que
nos vincula a um novo cerne de individualidade que ultrapas-

que, segundo a tradição ancestral, nos acompanha inclusive

p.206).

Na atualidade, a imagem da Górgona tem sido utilizada em di-

coletiva consegue abarcar. A Medusa representou a mulher reprimida e


foi ícone do movimento feminista. A cultura contemporânea resgatou a

atraente e poderosa, desejo inconsciente de homens e mulheres, mas


talvez ainda não muito bem integrada à imagem de Atena, a guerreira de
fria racionalidade, que prevalece na sociedade atual. Cabe a cada um, a
tarefa de promover essa integração em seu processo de desenvolvimen-
to individual e participação social.

Na Grécia Antiga, o uma imagem da cabeça da Górgona


Medusa, era utilizado como um amuleto apotropaico, símbolo protetor
que tinha o poder de proteger contra o mal. Até o século V a. C., essa re-

lugar dos cabelos. Nos escudos e vasos, a partir do século V a. C., a face
da Medusa passou a ser representada de forma menos ameaçadora e as
serpentes foram estilizadas.
-

antigas como a existente em Creta, no Palácio de Cnossos, que data do

sendo que uma das mais antigas é a do Templo de Apolo em Siracusa,


na Sicília. Em mosaicos, localizados geralmente próximos à porta de
entrada, eram utilizadas como proteção contra invasores e acidentes.
Encontram-se também imagens da cabeça da Medusa em vasos, pratos,
armas e moedas por toda região do Mediterrâneo.
Uma Medusa tríscele é o símbolo da Sicília. A cabeça da Górgona

movimento.

Figura 29. Górgona


Paris.

-
posto no Museu do Louvre, percebe-se nitidamente a formação de uma
suástica pelo posicionamento de seus braços e pernas. A cruz como

simbologia do número quatro. A cruz é o terceiro dos quatros símbolos


fundamentais: centro, círculo, cruz, quadrado. Faz a ligação de pontos
diametralmente opostos, é símbolo da unidade dos extremos, céu e ter-
ra, da síntese e da proporção. Nela se vinculam tempo e espaço. Também
é o símbolo universal da mediação e do mediador. Existem vários tipos

representa uma suástica, uma cruz em ganchos, a chamada cruz gamada,


constituída por quatro sinais alfabéticos gregos quase sempre

e depois na mitologia germânica, como o martelo de Thor. No budismo

-
madura. Em suas costas carrega dois pares de asas negras, duas abertas
para baixo e duas curvadas para cima. Em sentindo amplo as asas per-
-
tado espiritual. Ao alçar voo, o corpo perde seu peso, ocorre a desmate-
rialização, a passagem da alma ou espírito para o corpo sutil. As asas são
-
tiva, pode-se dizer que as asas estão presentes. A psique ganha asas para
percorrer os vários níveis conscientes, principalmente os inconscientes.
Seu rosto carrega um sorriso zombeteiro, como se o observador
não visse o que deveria ver. Ver aquilo que está muito além de ser capta-

cima e o direito para baixo, estão em movimento indicando atividade.


Como símbolo da força, do poder, do socorro concedido, ao mesmo tem-
po de proteção, o braço é o instrumento da justiça. A perna direita está

joelho permite dobrar-se diante dos mistérios e da divindade.


Essa ânfora ática foi datada entre 520-510 a. C., é importante pres-
tar atenção nessa data. A Medusa está de sapatos com uma pluma em

e dos viajantes que os ultrapassam, é um deus calçado, pois tem posse


1998, p.801).
Na cerâmica grega e na arte mais recente o tema da decapitação da
Medusa é recorrente.

Figura 30. Benvenuto Cellini, Perseu com a cabeça de Medusa. 1554, Piazza Della
Signoria, Florença.

Em Florença há uma importante obra de Benvenuto Cellini (1500-


1571) escultor e ourives italiano. (1554)
é o conjunto escultural em bronze, exposto na praça em frente à Galeria

Esta imagem da decapitação da Medusa faz de um ato brutal uma

mas conserva o semblante sereno e a cabeça baixa. Sugere o cumpri-


mento da missão com humildade e submissão aos desígnios dos deuses,
herói e da bela jovem metamorfoseada. No seu rosto também sereno, há

de uma ação libertadora.


Ao cortar a cabeça de Medusa, incorpora em si sua força. Embora

Segundo Chevalier e Gheerbrant (1998, p.714):

Se a medusa representa a imagem excessiva da culpa, cortar


sua cabeça é dominar de forma durável o sentimento excessivo,
paralisante e mórbido da culpa, é adquirir o poder de se ver a
si mesmo sem deformação para mais ou para menos. Diante do
universo mórbido de erro, é a lucidez sem espelho que deforma.

diante da imagem e erro deformados pela vaidade seduzida, ou


decapitar pelo exercício do julgamento comedido, pelo gladio
da verdade.

Figura 31. Caravaggio, Medusa Murtola, 1595, óleo sobre tela montado em madeira,

Michelangelo Merisi da Caravaggio (1571 a 1610), interessado por


temas religiosos e mitológicos, retratava as pessoas comuns, os velhos
e os trabalhadores, reproduzindo as imagens de forma realista, con-
trariando o modelo estético vigente. Foi considerado naturalista, pois
sombra para reforçar o contraste e dar mais vida à obra. Caravaggio foi
considerado o mais importante pintor do barroco italiano, contribuindo

, a primeira de 1596, conhecida como


, nome do poeta Gaspare Murtola (morto em 1624) que teria es-

fascínio, ela o tornará em pedra”. A segunda, de 1597, não está assinada

A Medusa de Caravaggio é uma imagem intrigante e diferente das


-
são de espanto. A boca parece soltar um grito de dor e o olhar expressa

enigmático, não tem traços femininos nem masculinos. Não é bela como
geralmente é representada, porém não é assustadora como as primitivas
imagens monstruosas. Seria assustadora pelo mistério e pelo grotesco. É
uma cabeça mais apavorada do que apavorante.

Figura 32. Peter Paul Rubens, Cabeça de Medusa, 1617-1618, Óleo sobre tela. , 68.5 ×
A horrorosa (1617-1618) de Peter Paul Rubens
(1577–1640) chega a ser repugnante pelo sangue e pelo excesso de ser-
-
lhados em profusão pela tela. A imagem apela talvez para os medos mais
primitivos. A cor da pele morta e os olhos arregalados dão realismo à
cena. Medusa, após a morte, continua apavorando.
-

pinturas. Após estudos na Itália, onde conheceu as obras renascentistas,


renovou seu trabalho tornando-o ainda mais exuberante e dinâmico,
iluminando seus retratos com tons quentes e dourados, além de adotar a
composição em diagonal, que cria movimento e exaltação em suas obras.
Na escultura barroca italiana se destaca Gian Lorenzo Bernini
(1598-1680) que esculpiu o (1630), uma imagem realista
da mais bela Górgona, representando o exato momento em que ocorreu
a metamorfose. Representou a expressão de espanto da jovem, cujos ca-
belos estão se transformando em serpentes. Bernini retratou o rosto de
uma adolescente confusa, sem compreender o que lhe está acontecendo.

Figura 33. Arnold Böcklin (1827-1901) Medusa, 1878 óleo sobre tela 39 x 37 cm
Germanisches Nationalmuseum, Nuremberg.
Arnold Böcklin (1827-1901), pintor suíço considerado simbolista,

-
brio, sendo frequente o tema da morte.
A (1878) impressiona pela face deprimida. Parece sofre-
-
leza se transformou em desencanto e abatimento. A face é assimétrica
e o lado luminoso do rosto ainda conserva algum sinal de feminilidade,
enquanto o outro lado parece ainda mais afetado pela deformidade. É a
face da dor e do sofrimento.

Figura 34. Edward Burne-Jones. O Nascimento de Pégaso e Crisaor (1822). Estudo a


guache Galeria Municipal de Arte, Southampton.

-
mento artístico formado por um grupo de poetas e pintores ingleses, os
pré-rafaelitas. Interessou-se por temas mitológicos e os representou em
várias séries de pinturas.
(1875-1890) é uma série de obras nas quais o
pintor representa o mito em etapas, sendo quatro pinturas a óleo com-
pletas e dez estudos a guache, que se encontram na Galeria Municipal
de Arte de Southampton. Burne-Jones descreve os principais episódios
criando uma narrativa coerente. Uma característica das pinturas desta
série é que, criaturas grotescas como a Medusa, são representadas de

quinto quadro da série capta o momento em que Perseu decepa a cabeça


da Medusa e do pescoço saem Crisaor e Pégaso. Nota-se a riqueza de
detalhes e a inscrição dos nomes dos personagens. A obra é arrojada e se
assemelha a pinturas modernistas.

uma missão espiritual. A morte da Medusa é uma transformação. Com

Seu sangue é ao mesmo tempo veneno e remédio capaz de ressuscitar


os mortos.
Pégaso nasce no momento que Medusa morre. Como símbolo da

aquele que tem uma espada dourada em suas mãos. Ambos saltam do
pescoço da Medusa e, enquanto ela cai por terra, elevam-se às alturas,
tomando quase todo o espaço ao fundo da pintura. Pégaso é a maior de

imagem parece revelar que não se trata apenas da vitória do herói sobre
um monstro que deve ser abatido. Mas é uma cena de libertação. Poderes
reprimidos e forças paralisantes, concentrados na Górgona, podem ser

é liberada e pode voar.

(1897) retoma a ima-


-
tando um rosto feminino terrível e apavorado, com algas coloridas nos
cabelos e o corpo imerso numa onda gigantesca. Representa a fúria da
natureza e o medo do mar, como nas origens do mito.
Uma emblemática imagem da Medusa é um alto-relevo no Palácio
Rondanini, em Roma. A obra de data desconhecida retrata uma face fe-
minina com asas na cabeça, da qual pendem duas serpentes que se enla-
çam abaixo do pescoço. Não é assustadora, ao contrário, é bela e serena.
Atualmente, a logomarca Versace reproduz de forma estilizada a Medusa
Rondanini. Gianni Versace, nascido no sul da Itália, interessado pela arte
clássica e arquitetura, escolheu a imagem da Medusa e reproduziu seu
rosto estilizado nos objetos de sua marca, como ícone da sedução e atra-

-
tar o poder feminino.
A imagem mitológica da Medusa continua sendo tema de interes-

pela fantasia e surrealismo. Explora alguns temas mitológicos e obtém


como resultado imagens ricas em cores e criatividade, como seus retra-
tos da Medusa. Na ilustração intitulada (2013), Medusa
transformada em monstro, tem a parte inferior do corpo de serpente, o
tronco e a face feminina com cobras nos cabelos. Está em frente a um

antes e depois da metamorfose. A autora retoma o tema em


(2014), imagem em que retrata uma jovem de bela face derraman-
do lágrimas de tristeza ao tocar seus cabelos transformados em serpen-
tes. Toda obra tende ao azul escuro, transmitindo profundo desalento.
A arte contemporânea retoma o tema e a imagem da Medusa se faz

necessita ser recuperado e integrado na cultura atual.


temas explorados pelo mito tais como a vaidade, a repressão, o medo, a
paralisação e o resgate da capacidade criativa, entre outros, com grande

mais diversos recursos artísticos.

I. I. Sugestões de

• Discorra sobre a relação entre Medusa e Afrodite.




• Em algum aspecto de sua vida, sente que está paralisado, sem




vários objetos mágicos para que pudesse realizar sua tarefa em



II.

• -
mite a expressão de conteúdo interno mais profundo. Por secar
-
ção, tema do mito.

mesmo, onde é possível observar a representação do esque-
ma corporal, a autoimagem e a expressão de conteúdos emo-

• Modelar na argila uma versão da Medusa, corpo de mulher com


cabelos de serpentes.
• Modelar na argila a cabeça da Medusa, como aquela que Atena
tem no escudo, como símbolo de proteção, para espantar seus
medos.
• Modelar seus objetos mágicos de proteção.

uma releitura da poesia.
• A partir da letra da música abaixo, elaborar uma colagem, ins-
pirada nas imagens sugeridas. Pode-se utilizar papelão como
suporte e os mais variados materiais para colar, como jor-
nais, revistas, gravuras, retalhos e sucata. Deixar voar livre a
A lenda do Pégaso

Jorge Mautner e Moraes Moreira

Artista: Moraes Moreira

Que não sabia o que era, nem de onde veio


Então vivia, vivia a sonhar em ser o que não era
Voando, voando com as asas, asas da quimera

Sonhava ser uma gaivota porque ela é linda e todo mundo nota
E naquela de pretensão queria ser um gavião
E quando estava feliz, feliz, ser a misteriosa perdiz
E vejam, então, que vergonha quando quis ser a sagrada cegonha

E com a vontade esparsa sonhava ser uma linda garça


E num instante de desengano queria apenas ser um tucano
E foi aquele, aquele tititi quando quis ser um colibri
Por isso lhe pisaram o calo e aí então cantou de galo

Tão triste assim como tu, querendo ser o sinistro urubu


E quando queria causar estorvo então imitava o sombrio corvo
E até hoje ainda se discute se é mesmo verdade que virou abutre

E quando já estava querendo aquela paz dos sabiás


Cansado de viver na sombra, voar, revoar feito a linda pomba
E ao sentir a falta de um grande carinho então cantava feito um
canarinho
E assim o passarinho feio quis ser até pombo-correio

Aí então Deus chegou e disse: Pegue as mágoas


Pegue as mágoas e apague-as, tenha o orgulho das águias
Deus disse ainda: é tudo azul, e o passarinho feio
Virou o cavalo voador, esse tal de Pégaso

Pégaso (11x)
Pega o Azul
Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera.
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado.
Ele dela é ignorado.
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E, vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora.
E, inda tonto do que houvera,

Ergue a mão, e encontra hera,

A Princesa que dormia.

Fernando Pessoa

porque ninguém a pedia em casamento. Não tinha pretendentes porque


a veneravam como se fosse a própria Afrodite e nenhum mortal ousava
corteja-la, mas a adoravam como se fosse a própria deusa do amor e da
-
-

Eros para fazer com que a jovem se apaixonasse perdidamente por um

vestida com uma indumentária fúnebre e levada para o cume do mais


alto rochedo, onde ela seria dada em casamento a um monstro terrível.

-
-

lindo palácio. Não podia ver ninguém, mas criados invisíveis lhe disse-
ram que toda aquela riqueza era presente de um deus que cuidaria dela.
clareasse.
Quem se escondia na escuridão era o próprio deus do amor, Eros,
que em vez de cumprir as ordens da mãe, apaixonou-se pela bela princesa.

estranhava mais e até esperava ansiosa pelas suas visitas. Eros disse à

ainda que ela daria à luz uma criança e se guardasse seu segredo, seu
filho seria um deus, mas se o revelasse, seria apenas um mortal.

castelo até que Eros permitiu a visita das irmãs, mas novamente a adver-

Quando entraram no castelo e viram aquelas maravilhas, as irmãs


-
cia, maliciosamente perguntaram sobre ele. Disseram ter ouvido falar
que ele era um monstro que a estava alimentando para depois devorá-la,
-
nasse seu rosto com uma lamparina e, se ele fosse mesmo um monstro,
deveria matá-lo.

surpresa. Admirada e encantada com a beleza do marido, acidentalmen-


te deixou cair uma gota de azeite quente sobre seu ombro. No local da
queimadura surgiu imediatamente uma grande ferida. Eros acordou e
percebendo que foi traído, fugiu dizendo que o amor não pode conviver

-
tando segui-lo, caiu desmaiada. Imediatamente o castelo desapareceu e

reconquistar o Amor perdido.

águas de um rio. Mas as águas a devolveram, temendo a ira de Eros. No


bosque, encontrou Pã, o velho sábio, que a aconselhou a não tentar tirar
a própria vida, mas procurar seu amado e tentar reconquistar seu amor.
templo de Deméter, foi orientada pelo oráculo a conseguir o perdão de
Afrodite, para reconquistar o ser amado.

ousadia. Em seu castelo, manteve Eros adormecido e decidiu impor a

uma montanha de grãos de diversos tipos que tinham sido misturados.


A princesa nem começou a trabalhar, considerando a tarefa impossível,
desistiu e adormeceu. Durante seu sono, surgiram milhares de formigas
que separaram os cereais.
Afrodite, então, pediu que lhe trouxesse um pouco da lã de ouro,
de carneiros ferozes, que não deixavam que ninguém se aproximasse.
-

pediu que trouxesse um pouco da água da nascente do rio Estige. Mas,


como era impossível escalar uma montanha tão íngreme e a fonte era
-
nhou o jarro o encheu. Assim o trabalho foi realizado.
Afrodite, desta vez, resolveu usar outros artifícios. Dizendo que
tinha perdido um pouco de sua beleza por ter que cuidar do ferimento

Perséfone, um pouco de sua beleza imortal. A deusa estava certa de que


-
selhos de uma torre muito alta, da qual tentou se atirar, ao pensar que

A torre disse para levar na boca, duas moedas e, nas mãos, dois pe-
daços de pão de cevada. As moedas seriam para pagar o barqueiro que faz
a travessia do Estige. As fatias do pão serviriam para distrair Cérbero, o
ajudar um homem coxo e a salvar outro que estava se afogando. Também

coisa enquanto estivesse no reino dos mortos.

-
mada de amor por Eros, antes de entregar a encomenda, resolveu pegar

que havia ali, entretanto, não era a fórmula da beleza imortal, mas o

Nesse momento, Eros, restabelecido, acordou e voou até a princesa


adormecida para salva-la. Despertou a sua amada e a levou ao Monte
-
-

nasceu uma menina, , o prazer, a bem-aventurança.

o único romance completo remanescente da época. Narra as aventuras


de Lúcio, um rapaz que foi transformado em asno por uma feiticeira e
precisou ultrapassar diversos obstáculos para conseguir voltar à forma
humana.
Na obra de Apuleio, a estória é contada por uma velha senhora,

seu casamento. Apesar de inspirada na mitologia grega, a narrativa se

ser salva de um monstro e tarefas a serem realizadas pela heroína. A ver-


são de Apuleio é a mais conhecida, mas o mito original é muito antigo e

(1990) na obra
-
bólica. Neumann interpretou esse mito do ponto de vista da psicologia
feminina, mas segundo Von Franz (1990, p.141) também pode ser rela-
cionado à integração da anima, no processo de individuação masculino.
Em (2014) Von Franz considera a narrativa do ponto de
vista da psicologia masculina, representando um problema do próprio
autor.
Simbolicamente, o mito se refere ao despertar da alma humana
-
volvimento da capacidade de relacionar-se com o outro e também com
aspectos desconhecidos de si mesmo. Revela que ambos os parceiros se
-
mentadas na jornada, representam oportunidades de aprimoramento e
desenvolvimento.

a própria mãe alude ao ciúme, à possessividade materna e a forças re-


gressivas que podem manter o jovem preso a um complexo materno. No
desenvolvimento da personalidade é necessário que Eros, ou seja, o im-
pulso para a união com o outro, se mova para fora da relação com a mãe.
Vários mitos podem representar as etapas do desenvolvimento
psíquico e inúmeras narrativas se referem ao tema da iniciação, mas,

Em grego, a palavra , -
lizada para designar a alma. , , que se perpetuou universal-
mente com o sentido de alma, deriva do verbo , soprar, respirar

é representada com asas de borboleta.


A linda princesa
era inconcebível para uma mortal. Tamanha afronta à deusa deveria ser
punida, por isso a jovem deveria ser oferecida em sacrifício a um mons-
tro terrível.
-
lores emergindo abalam as estruturas mais antigas, mas deve-se respei-
tar e honrar os antepassados e suas

honrar a grande mãe Afrodite e aprender a respeitá-la.

ser afastada de sua família. Esta previsão serve para todos os jovens de

nos mitos de criação e nas sagas heroicas.


A separação é o primeiro ato da criação. No mito cristão, deus
primeiro separou a terra e o céu. Psicologicamente, a separação corres-

da matriz inconsciente, conforme explica Edinger (2008). No mito, esse


processo se inicia com a exposição da jovem no rochedo, entregando-a
ao casamento com o monstro, quando é tirada de sua família e começa
uma nova etapa em sua vida. É um momento similar à expulsão de Adão
e Eva do Paraíso.
-
ge uma separação. Não uma perda ou afastamento concreto da família
original, mas libertar-se de compromissos e vínculos inconscientes para
poder iniciar uma nova relação. Se a pessoa participa de um relaciona-
mento simbiótico com a família ou se está muito empenhada num proje-

ou carrega mágoas e ressentimentos, isso pode interferir e até impedir


que se envolva completamente na nova relação.
foi atirada no abismo, para se tornar esposa de um monstro terrível.
Segundo Chevalier e Gheerbrant (1998, p.197):

aparece aureolado de um culto que exalta e exige a virgindade.


-
mem e da mulher não são senão receptáculos, instrumentos e
canais transitórios. Ele se inclui entre os ritos de sacralização
da vida.

Sob a perspectiva teórica da psicologia analítica, os mesmos auto-


-
dualização ou de integração da personalidade, a conciliação do incons-
ciente, principio feminino, como espírito, principio masculino” (p.197).
-
vem, isto quer dizer que os preparativos que antecedem ao casamento de

Nas montanhas se oferecem sacrifícios e a jovem princesa é levada como


oferenda. A exposição no alto da montanha também pode ser compreen-
dida nesse contexto como um isolamento e a necessária separação de
tudo que é familiar e costumeiro para entregar-se a uma morte simbóli-
ca da antiga personalidade.

-
tro é na verdade, outro aspecto de si mesmo, que é preciso vencer para
desenvolver um eu superior.
Ser devorado pelo monstro simboliza a morte do velho para que
nasça o novo. É necessária uma transformação interior, portanto, quan-
do se adentra ao mundo interior do espirito, entra-se em contato com
fabulosos tesouros e, ao renascer, o ser humano é novo. As imagens de
monstros devoradores, andrófagos e psicopompos estão presentes em

Neumann (1990), o modo feminino de derrotar o monstro é aceita-lo.

num belo palácio e sempre a visitava durante a noite, temendo que ela o
visse em seu aspecto real e despertasse da sedução que a mantinha ca-
tiva. Para Diel (1976, p.128) a reclusão, os encontros noturnos e a proi-
bição de olhar são símbolos claros de um amor proibido, que tem que

-
mento ilusório e mostra a realidade.
Quando se está apaixonado, facilmente se projetam no compa-
nheiro imagens idealizadas, mas o parceiro real não está visível. Como

Franz (2014) ela representa a anima que deriva da imagem materna e


serve como padrão de comportamento em relação ao feminino.
No início dos relacionamentos, geralmente, o animus e a anima

projeção vai diminuindo, o invisível vai se tornando visível, os conteú-


dos sombrios começam a se manifestar. As irmãs invejosas, que desper-
taram suas dúvidas, representam o lado sombrio da personalidade, que
-
necesse nesse estado de isolamento e insatisfação emocional, a relação
fatalmente acabaria.
A lamparina é uma luz que está disponível e sob controle, portan-

derrama, é um elemento de paixão, mais relacionado ao poder e à pos-

vista puramente intelectual e também não suporta a paixão possessiva.


reencontrá-lo” (p.148).

seu amante e que o amava pelo que era de verdade, não pelo que imagi-
nava que ele fosse. Tendo seu segredo revelado, Eros também teve opor-
tunidade de amadurecer e se preparar para o relacionamento, conforme
análise de Neumann (1990).
Psicologicamente, a mulher, prisioneira do componente masculi-
no de sua personalidade, age de modo inconsciente e até prejudicial.
Para evoluir, precisa libertar-se. Sob o domínio do animus negativo, a
-
tação ocorre quando a mulher deixa de se submeter ao modelo mas-
culino e de imitá-lo; quando passa a se valorizar e a viver de maneira
espontânea, de acordo com seus sentimentos e necessidades, tornan-
do-se capaz de se relacionar com seu animus, sem ser controlada por

parte afastada da própria personalidade, pode trilhar um novo caminho


de desenvolvimento.
Do ponto de vista da psique masculina, Von Franz (2014) inter-
preta que as irmãs invejosas representam aspectos negativos da anima.
Simbolizam a inveja, o ciúme, a possessividade e a mesquinhez de quem

com complexo materno negativo tem ciúme, é possessivo e ansioso em

em demasia.

leis mitológicas devem sempre ser transgredidas, pois, de outro modo,

harmonia resultam em estagnação da vida.


-
sava conseguir o perdão de Afrodite. Ao chegar ao palácio da deusa,
deparou-se com Costume, sua serva mais cruel, que a maltrata, queren-
do escraviza-la. Qualquer costume que se torna rígido tem o poder de
dominar, torna-se uma compulsão que tiraniza. A primeira atitude de

Tristeza. A deusa tortura e humilha a jovem além de culpa-la pela fe-

força da natureza, a energia vital que impulsiona para o relacionamento.

em busca do Amor.

Por que me descobriste no abandono


Com que tortura me arrancaste um beijo
Por que me incendiaste de desejo

Com que mentira abriste meu segredo


De que romance antigo me roubaste
Com que raio de luz me iluminaste

Por que não me deixaste adormecida

Por que desceste ao meu porão sombrio


Com que direito me ensinaste a vida

tentou se matar. Foi acolhida por Pã e aconselhada a buscar o perdão de


como o medo e fascínio pelos próprios impulsos naturais. Encontrar-se
com Pã pode representar a necessidade de confronto e aceitação de as-
pectos reprimidos da própria personalidade. Ele a incentivou a libertar-
-se do medo e da vergonha dos próprios desejos, a entregar-se à paixão,
lutar pelo amor e não desistir da vida.
de Chico
Buarque, por que razão Eros não a deixou no rochedo, para sempre ador-
mecida e a despertou para a vida, para o desejo, para o amor, quando ela
estava preparada para entregar-se à morte, desígnio dos deuses, e depois

deusa do amor.
-
pois deixa-las no abandono, tendo que descer ao seu porão sombrio,
enfrentar suas tarefas impossíveis, atravessar seu inferno, para depois
novamente despertar para o amor real.

castelos imaginários, não ousam iluminar o rosto do ser amado, não


querem tornar visível o que amam, preferem continuar na ilusão, na

coragem e ousadia. É um ato que não permite retorno, a partir dali o ca-
minho será árduo e o crescimento psíquico inevitável.

-
minar. Em busca do ontem, aceitou se submeter a duras provas. Apesar
da intenção de derrotá-la e até de expor ao risco de perder a vida, as
tarefas impostas por Afrodite são estímulos ao aprendizado e desenvol-
vimento. Afrodite, com desejo de punir e no papel de sogra má e mãe
ciumenta, tornou-se a velha sábia, que ao propor tarefas difíceis para
-
dora de Eros.
-

Quando ocorreu o rompimento da relação amorosa, a jovem princesa


desesperou-se e chegou a desejar a própria morte. É como se a perda a
-

Porém, Pã, o instinto sexual vital, lhe aconselha a viver. Com este novo
-
-
gurança, arriscar-se e aceitar o sofrimento” (NEUMANN, 2000, p. 228).

As sementes e os grãos simbolizam a vida, a abundância e as po-


tencialidades ainda não manifestadas. Fazem parte do eterno ciclo de
-
ta nascer, por isso representa o sacrifício e o renascimento espiritual

Catar e separar grãos que foram espalhados tem relação com os


antigos cultos de Mistérios em que o cereal simboliza a grande mãe,
deusa da colheita. Von Franz (2014) interpreta as sementes misturadas
como uma multiplicidade de formas em potencial. Representam con-

-
vo são apenas virtualidades, se não forem ativados pelo contato com a

feminino arquetípico, buscar a energia nas fontes primordiais, trazendo

escolhas.

para executar a tarefa, que lhe pareceu impossível. Separar, organizar


e tornar novamente úteis e aproveitáveis, uma imensidão de coisinhas
miúdas, que se acumulam em uma enorme confusão, é um trabalho di-
fícil, porém necessário.
Após uma perda amorosa a pessoa está confusa, o corpo não dese-
ja nem um movimento, o mundo perde a cor o brilho, o vazio se insta-

mágoas, ressentimentos, lembranças boas e ruins, sentimentos contra-

devem ser separados pode representar a necessidade de reconhecer os


próprios sentimentos e desejos e recuperar o equilíbrio interior antes de
reencontrar o parceiro e restabelecer um relacionamento.
Grãos são alimentos, representam potenciais que só são úteis
separados, organizados e adequadamente encaminhados. A confusão
acarreta uma perda energética. Aprender a separar, também pode ser
um processo de recuperação e reaproveitamento da energia perdida com

se refere ao desenvolvimento da capacidade de discriminar. Quando os


conteúdos psíquicos estão em um estado de indiferenciação, é necessá-
rio colocar ordem no caos.

que não é capaz de fazer, sozinha, todo o trabalho. Desiste e adormece.

controle racional, ao emprego da capacidade intelectual para resolver o


problema. Em certos casos, quando a razão não encontra uma saída, a
resposta pode vir num sonho, fantasia ou imagem, por meio da intuição.
É no sonho que ocorre a síntese da atividade psíquica consciente com

criativo.
-
vidade psíquica inconsciente para realizar seu trabalho. As forças da na-
tureza colaboraram nas tarefas e a impediram de desistir da própria vida
e do Amor.
As formigas, que são insetos altamente organizados, representam
-
rando e organizando os grãos. Representam no mito elementos incons-
cientes de natureza mais primitiva. São aspectos ordenadores e inte-
vida. É preciso combater a fragmentação e a dissociação para manter o
equilíbrio psíquico.

houve a atuação de um princípio ordenador instintivo, que permite se-


lecionar, avaliar, discriminar e organizar a confusão. Quando há um de-
sequilíbrio na dinâmica intrapsíquica, entram em ação mecanismos que
buscam restaurar a harmonia interna. Esse processo de discriminação e

racional, mas numa busca interior que envolve a totalidade da persona-


lidade. Entram em ação instâncias mais arcaicas da estrutura psíquica,
que pertencem à esfera instintiva.
A tarefa das formiguinhas refere-se a uma atividade que requer
-

processo de desenvolvimento da personalidade e a capacidade de execu-

se uma moça seria boa esposa, a futura sogra lhe dava novelos de linha

A atividade de separação dos grãos remete às origens da agricul-


-
pécie humana. Selecionar e plantar sementes, cuidar e acompanhar o

Tais tarefas foram assumidas pelas mulheres desde os primórdios da hu-

adormecidos ou ainda não desenvolvidos.

Ao ouvir a própria voz interior, abrir-se para a intuição e entregar-

a calma e se colocar em harmonia com os acontecimentos. É o que ocor-


re na segunda tarefa.
-

-
mento secreto, um segredo ou comunica um ensinamento de sabedoria

-
blema. Representa uma intuição, que se manifesta de modo sutil, como
um sussurro.

da fertilidade. Existem momentos em que se deve sentar e esperar, dei-

aos galhos.

ascensão do sol no início da primavera, regido por Marte, deus romano


da guerra, da combatividade, que representa a impulsividade, a impe-

que desperta na primavera e reinicia o ciclo vital.


-
bolizam o poder solar arquetípico em seu aspecto destrutivo (NEUMANN,
1990, p.80).
-

Na tradição grega, ouro evoca o Sol e toda a sua simbólica fe-


cundidade-riqueza e dominação, centro de calor-amor-dom,

que o possui; o carneiro, que representa já por si a força gera-


dora de ordem corporal e, por transposição simbólica, de ordem
Como símbolo masculino, segundo Von Franz (2014) o carneiro
está relacionado ao animus, mas o homem também pode se deixar levar

então recolher a lã. A lã de ouro representa o tesouro difícil de obter.


Quando alguém está assolado por uma forte emoção, não deve se deixar
tomar por ela, mas encontrar seu sentido e seu aspecto luminoso. Não
-
ção destrutiva também pode trazer luz.
É necessário ter certa dose de agressividade, capacidade de
lutar e ter iniciativa. Qualquer pessoa precisa aprender a lidar com
esse potencial, porém, a energia psíquica criativa, quando excessiva e
descontrolada, se torna destrutiva. É um grande desafio para a mulher,
tentar atingir suas metas e adquirir poder, sem se deixar prejudicar
pela agressividade e competitividade do mundo predominantemente
masculino.
-
sário enfrentar a fúria dos animais sob o sol. Bastou esperar o momento

depois que os carneiros adormecem.


-
sou entrar em contato com a agressividade instintiva sem ser destruída
por ela e aprendeu a esperar o momento adequado para agir.
Essa prova mostra como a mulher pode lidar com a agressividade,
tanto no plano exterior, no relacionamento com os homens, como no
plano interior, na relação com seu próprio animus. Não confrontar, mas
esperar o momento certo e adotar a melhor atitude.
Nos relacionamentos amorosos é fundamental ter o cuidado de
não magoar a si nem ao outro, não se deixar consumir pela fúria extrema
de um afeto descontrolado. Em qualquer situação é importante saber
esperar para evitar desgastes desnecessários. Muitas mulheres insistem
em conversar quando o parceiro se mostra irritado e isso cria uma in-
disposição ainda maior. Quando os ânimos estão exaltados, a hora não
com a própria energia psíquica para não correrem o risco de serem con-
sumidos por ela.

torna claro, transparente, iluminado, ou seja, há uma expansão da cons-

da nascente que alimenta o Cocito e o Estige, ambos são rios que ba-

aprender a recolher e conter parte da energia dos mananciais sagrados.

torna-se símbolo da vida espiritual, a água da vida.


A nascente representa a inesgotável energia psíquica e beber da

A princípio, segundo Brandão (2014) Estige era uma fonte da


Arcádia, cujas águas vertiam de um rochedo e se perdiam nas entranhas
da terra. Era venenosa e corrosiva, destruindo qualquer objeto que nela
-
nham o poder de tornar invulnerável tudo que nelas fosse introduzido,
como ocorreu com o herói Aquiles.
A água do Estige, para Von Franz (2014) relaciona-se ao tema da
morte e ressurreição. Essa água mortal destrói qualquer coisa e nenhum

quais fazem juramentos. Simboliza o aspecto terrível do inconsciente


contato com as camadas mais profundas do inconsciente, pode-se dar
forma àquilo que quer ser expresso. A psique criativa é o único vaso ca-
paz de conter as águas do Estige.
Neumann (1990, p.83) interpreta essa tarefa como a necessidade

para receber o masculino sem o perigo de ser destruída por seu poder.

na leitura de Neumann (1990, p.86), uma associação com os elementos


espirituais masculinos inconscientes e uma compreensão desses con-

Psicologicamente, a águia representa a capacidade de pairar nas


alturas, ter uma intuição espiritualmente sublime, conforme Von Franz
(2014, p.171).
-
pectos do próprio Eros, pois a fertilização, o esplendor e a força motriz,
-

Eros e também se torna consciente de si mesma. Ela se prepara para


compartilhar com ele o poder divino.

seja, representa a atitude de voltar-se para o mundo interior, o incons-


-
consciente pessoal e transpessoal.
Um dos mais conhecidos e encantadores exemplos do motivo
das ‘tarefas difíceis’ é o da procura do amante perdido, Cupido,

invés de o amado tentar conquistar sua noiva, cabe a esta fa-

inúmeras aventuras desse tipo, empreendidas pelos heróis dos


contos de fadas e dos mitos (CAMPBELL, 1993, p.57).

torre é um edifício construído por força do trabalho e do conhecimento


técnico adquirido pelo ser humano, por isso representa a cultura e os

das leis, a tradição ou o sistema de valores que serve como referencial


para manter a pessoa orientada enquanto ela se aprofunda no seu mun-
do interior. Simboliza também a gradual ascensão, o distanciamento do

A torre é uma metáfora da introversão e do recolhimento. Do alto

-
do, é preciso ter. Acesso à sabedoria acumulada por toda a humanidade.
-
mem coxo e ao afogado porque a quarta tarefa requeria todos os seus
recursos e toda a sua energia. Não podia se desviar de seu objetivo, ne-

destino e procurou não se envolver com elas, conforme havia sido orien-

sua jornada e não interferir na vida alheia (NEUMANN, 1990, p.90).


Conforme explica Neumann (1990), o ato de ajudar cria uma ‘par-
-
sessão por aquele que é ajudado, por isso é perigoso. Assim, ao ajudar,
aceitar presentes ou comer junto com alguém, estabelece-se uma co-
munhão, identidade e um vínculo entre o ajudante e o ajudado. Por esse
-

que está trançando uma corda, que é imediatamente devorada por um


-
duzir, sua esposa consumia. Essa situação o levou a um estado de pro-

o risco de ser imobilizada. Von Franz (2014) lembra que popularmente


se diz que

tem dois lados, bom e mal, certo e errado. Toda escolha tem um incon-
veniente e o perigo. Tudo no inconsciente é ambíguo, mas não se pode

hesitação.
-

-
ria à face da terra.

parte de um ritual de iniciação. Ela trilhou o caminho heroico, mas só foi


possível empreender essa jornada depois que conquistou certo grau de

para encarar a morte.

A morte é um símbolo comum nos mitos e sonhos. Representa a


-
tiga maneira de ser, para surgir uma nova. Simbolicamente é a transfor-
mação de velhas atitudes, uma oportunidade de recomeçar desde que se
desapegue do passado e se lance para o futuro desconhecido.
-
-
vessam uma fase de morte, antes de abrir um. Acesso a uma vida nova.

restringe a preocupação às coisas essenciais. No sentido psicológico, a


morte liberta das forças negativas e regressivas, desmaterializa e libera
as forças de ascensão do espírito. No processo iniciático, a morte lembra
que é preciso ir mais longe e que ela é a própria condição para o progres-
so e para a vida.

de depressão. Estado que geralmente é uma reação à constatação de que


algo está terminando e ainda não há nada novo para ocupar seu lugar.

uma desgraça. A jovem princesa não era vista como pessoa, mas como
a encarnação da própria beleza. Esse fato, além de criar uma indispo-
sição com a deusa Afrodite, não permitia que experimentasse o amor,

desejava ser amada.

da beleza imortal, consciente do risco que estava correndo, pois foi avi-
sada pela torre. Mesmo assim, decidiu tomar um pouco para si, antes de
entregá-lo a Afrodite.

Eros. Desejou ser eternamente bela. Não a beleza vaidosa, voltada para
si mesma, fator de sedução, pelo simples prazer da conquista, mas a be-
leza da mulher que deseja ser bela para ser amada. A vaidade, nesse caso,
poderia ser admitida porque propiciaria o reencontro do ser amado. A
beleza está a serviço do amor, trazendo prazer e contentamento para os
pouco da beleza de Afrodite, para doar-se ao amor (NEUMANN, 1990,
p.97).
Morrer tentando manter-se bela seria um castigo dos deuses.

do feminino reduz a mulher a uma única dimensão do seu ser, ou seja, a


capacidade de ser atraente. Talvez em algum momento seja necessário
-
lorizada por outras qualidades e amada em sua totalidade. Se for ama-
da apenas pela beleza, quando deixar de ser bonita, perderá também o
amor.
Como no mito do julgamento de Páris, o pastor que preferiu a mu-
lher mais bela em lugar de poder ou sabedoria, pode-se supor que a bele-
za é fator preponderante na escolha da parceira. Algumas mulheres, mo-
tivadas pelo desejo de se sentirem atraentes e desejáveis, seriam capazes

Muitas mulheres valorizam tanto o aspecto externo que se tor-


nam incapazes de manter relacionamentos verdadeiros e satisfatórios,

-
tas da personalidade feminina e deixando de realizar plenamente seu
potencial (MCLEAN, 1992, p.93).
-
dutora do sono mortal, mostra que manter a eterna juventude só é pos-
sível por meio da morte. Morrendo jovem e bela, manteria ao menos a

mesmo que para isso tivesse que morrer, talvez porque tenha compreen-
dido que uma mortal não poderia conviver com um deus a menos que

tarefa está relacionada com um problema da anima, que faz com que
alguns homens ainda acreditem na ideia de que beleza e bondade ca-
minham juntas. Não esperam que uma mulher bela possa ter falhas de
caráter e isso causa muitos problemas no relacionamento amoroso. Para
Excesso de vaidade, natural em determinada fase da vida, se não for su-

interior, por isso é representada no mito como um perigo mortal.

bela adormecida’ e ‘Branca de Neve’. Em ‘A bela adormecida’, a jovem


princesa, ao completar quinze anos, por conta de uma maldição, cai em
sono profundo, assim como todos no palácio. No conto, isso indica a ne-
cessidade de uma profunda transformação. Adormecida, a princesa está
-
pertar quando um ciclo se completa. Cem anos seria o tempo necessário
para que o princípio feminino reprimido pudesse novamente emergir na

Cem anos é um tempo longo, toda uma geração nasce, cresce e


morre nesse período e muitas coisas podem se transformar. Assim o mal
que se abateu sobre aquele reino seria extinto por si só e o princípio fe-
minino poderia se reintegrar. No plano coletivo, aconteceriam mudanças
que facilitariam essa integração. Além do tempo transcorrido, é o amor

heroica da coragem, mas não precisa enfrentar nenhum obstáculo, ape-

certo, quando se fechou o ciclo de cem anos (SILVEIRA, 1981, p. 125).


-
ramento de um ciclo (nove) e a volta à unidade, iniciando um novo ciclo

Na vida real, muitas vezes é necessário que transcorra um tem-


po de maturação para que um problema possa ser resolvido ou uma
determinada situação ser superada.
pode ter servido como estímulo para que Eros amadurecesse, se liber-
tasse do domínio da mãe e assumisse seu amor.

Neumann (1990) nesse momento ela escolhe entregar-se espontanea-

beleza espiritual e na maturidade consciente quando a alma humana se


entrega com todo seu amor a Eros.

Símbolo de um segredo oculto e de verdades que não se pode re-

lenda japonesa de Urashima Taro. A estória é uma versão masculina do


matrimônio de morte.

de uma bela princesa e a imortalidade no paraíso. Entretanto, sua felici-

se perdeu e ele sentiu saudade de sua antiga vida. Talvez a plenitude


-
ção da vida. Sua companheira então permitiu que voltasse à aldeia, ao
mundo real, desde que não abrisse a caixa que lhe deu. Mas ao retornar,
Urashima percebeu que seu mundo se perdeu no tempo, então, abriu a
caixa e imediatamente envelheceu e morreu em desespero, chamando
por sua amada (SPALDING, 1976, p. 181).
Urashima Taro atravessou o limiar entre dois mundos sem per-
ceber e sem estar preparado. Não conseguiu deixar para trás sua velha
identidade, o apego à vida no plano material e teve saudade. Por que não
se sentiu plenamente satisfeito, tendo todas as necessidades atendidas,

Mesmo tendo todos os desejos satisfeitos, o ser humano quer


mais: quer saber, mesmo que o conhecimento faça perder o paraíso da
própria vida, liberdade e renovação. A eternidade no paraíso pode signi-

Por isso Urashima desejou voltar e compreender o que se passou. Abriu


-

não ingressou na esfera humana. Mostra que o animus pode atrair a mu-
lher para fora da realidade e frequentemente, nos contos e nos mitos,
aparece como um espírito de morte. Animus e anima, segundo a autora,
querem sempre nos afastar da realidade, induzindo a um estado de arre-
batamento ou absorção.
Na interpretação de Neumann (1990, p.99), ao cair desfalecida,

verdadeiro, é possível experimentar a sensação de plenitude e de ligação


com o divino.
Nos mitos, a criança divina, nasce do casamento sagrado como
-

prazer, que não pertence apenas aos deuses, mas todo ser humano pode
experimentar ao se deixar envolver e elevar pelo amor.
No divino impudor da mocidade,

A sombra entre a mentira e a verdade...


A nuvem que arrastou o vento norte...

Trago dálias vermelhas no regaço...


São os dedos do sol quando te abraço,

E do meu corpo os leves arabescos


Vão te envolvendo em círculos dantescos
Felinamente, em voluptuosas danças...

Volúpia
Florbela Espanca

o casal tem sido representado em todas as etapas do mito, principal-

seja a escultura de Canova (1757-1822) exposta no Museu do Louvre.


Antonio Canova (1757-1822) além de desenhista, pintor e arquiteto ita-
liano, é considerado o maior escultor europeu desde Bernini. Seu estilo
foi fortemente inspirado na arte da Grécia Antiga, permanecendo como

escultores do Academismo. A obra (1787) traduz a sublime

de Eros.
artistas ao longo do tempo, pois vários movimentos artísticos incor-
poraram os valores e a estética da antiguidade clássica e a temática
mitológica.

Figura 35. William-Adolphe Bouguereau, 1895.

William-Adolphe Bouguereau (1825-1905) executou uma série de

caracteriza pelo domínio da técnica, obtendo efeito de grande realismo.


-
de do século XIX, mesclando elementos do neoclassicismo e do roman-

mitológicos, alegóricos, históricos e religiosos. Pintou diversos quadros


representando o deus do amor. Na obra (1895) nota-
-se a harmonia cromática entre os tons violáceos, criando uma cena de

imortalidade.
-
cionais, em que o deus do amor é representado como uma criança, bem

Para resgatar o amor perdido, a jovem princesa precisou se subme-


-
sas obras ao longo da história.

Psyche in the Underworld, 1865, National

-
(1865) faz

Aparecem os perigos que a heroína deve evitar para poder sair do reino
-
deiras que tecem ao fundo. Na imagem, está prestes a pegar o barco de
Caronte e retornar. A heroína olha para o homem na água, mas seu corpo
se dirige ao seu objetivo. Esse é um momento crucial na estória e a pin-

término da vida diurna e do mundo manifesto. É também um momento


transitório, situado no ponto central entre visível e o invisível, dá início
a outro ciclo. Sempre presente nos rituais de passagem, morte e renasci-

quando a abóbada celeste reaparece, ainda vazia de cores, embora rica


do potencial de manifestação, cujo microcosmo e macrocosmo nele se

um renascimento após uma prova que consiste em morte ritual simbóli-


ca para iniciar uma nova vida.

Figura 37. Edward Burne-Jones (1833-1898), O casamento de Psiquê, 1895. Óleo sobre
tela, 119,5x215 cm. Museu Real de Bruxelas, Bélgica.
Na obra (1895), a jovem foi enviada para
o seu casamento de morte no topo da montanha, para onde se dirige o
triste cortejo. Dez pessoas caminham pela noite, com semblante pesa-

as irmãs estão à esquerda do observador, as amigas vão à frente do cor-


-
to, mas há muita tristeza porque a jovem será oferecida a um monstro
terrível.
A primeira jovem carrega o atoche com a chama acesa, que se in-
-
biente ainda mais lúgubre. Estaria ali representado em seu aspecto ma-
lévolo, pois uma ventania é prenúncio de frio ou tempestade. Inspira a
sensação de mistério e apreensão quanto ao que virá à frente.

sagrados, de iniciação e de passagem.

pleno de alegria juvenil, um nada anterior a todo nascimento,

p.142).

-
mero dez está ligado ao dualismo vida e morte, simboliza o término e o

uma nova etapa. Esse é o momento em que começa sua jornada.


Figura 38. John Roddam Spencer Stanhope (1829-1908) As tarefas de Psiquê, 1873,
Tempera em painel, 79.00cm x 31.00cm, Galeria Bridgeman, Inglaterra.

-
siderado pré-rafaelita, porém sua obra também tem sido enquadrada no

técnicas mistas. Foi considerado excelente colorista. Seus temas são mi-

artes plásticas. Foi uma reação ao naturalismo e ao realismo, a favor da


-

Na obra (1873), cada painel representa uma


das quatro tarefas propostas por Afrodite e a heroína é retratada com
os objetos que deveria buscar. Nas cenas os elementos simbólicos auxi-

fonte e descer ao mundo subterrâneo, para conseguir a caixa contendo a


poção da beleza eterna, são os quatro trabalhos da sua jornada heroica.
A veste principal é alva, ornada com outras cores, sobrepostas à roupa
concentração, entrega e seriedade na execução das tarefas, pois essas
fazem parte de um ritual de iniciação.

executa as tarefas ordenadas por Afrodite. Está subordinada à deusa e

pés que são a base do corpo e simbolizam a mobilidade e a liberdade.


-

representada descalça em diversas obras, simbolizando sua atitude de


submissão.

Leloup (2010) o equilíbrio psíquico e a vida espiritual também depen-

sólidas para manter-se equilibrada enquanto passa pelas duras provas a


que foi submetida.

Psyche after Curzon, 1889. Óleo sobre tela, Coleção


Particular.
-
ricos. Também pintou miniaturas, paisagem e natureza morta. Entrou
para o primeiro grupo de mulheres admitido na École des Beaux Arts,
em 1896. de 1889, foi pintado enquanto estudava
em Paris.
A pintura foi inspirada no original de Paul Alfred de Curzon
(
com pequenas asas azuis e semblante compenetrado na tarefa de tra-
zer a caixa da beleza, que tem nas mãos e carrega cuidadosamente. Dá

escuras dos mortos na barca de Caronte.


A veste leve, de cor branca azulada, com as asas azuis e caixa
também azul, transmite a sensação de leveza e alívio por uma fase en-
cerrada. Sendo o azul a cor imaterial, transparente, é o vazio acumula-

-
lidade. Seus pés descalços parecem não tocar o chão.

As asas, relacionadas ao elemento ar, sutil por natureza, são o


símbolo de alçar voo, de leveza, de desmaterialização e liberação da
alma ou do espirito, representa a passagem do material ao imaterial,
ao corpo sutil.
Figura 40. John Willian Waterhouse, Psiquê entrando no Jardim de Cupido, 1904,

-
cou aos temas da mitologia e literatura, em estilo suave e romântico,
-
-
mento e sutileza, a apreensão do momento em que a heroína adentra o
palácio de Eros, ainda sem saber de que se tratava de um deus e não o
monstro que iria devorá-la.

o interior dos jardins do palácio de Eros, deixando a porta entreaberta,


como se estivesse indecisa sobre entrar ou não. Suas vestes são de cor
rosa perolado e sua mão esquerda carrega um botão de rosa começando

Próximo ao portão há um jardim de rosas.


Cor de rosa é o vermelho suavizado pelo branco. Está associado à

nessa cor, criando uma sensação de calorosa afetividade e romantismo,


uma vez que a cena antecipa seu encontro com Eros, o deus do amor.

a perfeição. A rosa representa o coração, o centro místico, o Jardim de

Para os romanos, a rosa teria sido criada pela deusa Flora, quan-
do quis imortalizar uma de suas ninfas que acabara de morrer. Pediu

grega, quando Afrodite emergiu da água do mar, a espuma que escor-


ria de seu corpo se transformava em rosas. Por simbolizar o amor, na
antiguidade as noivas adornavam-se com coroas de rosas e murtas em
homenagem a Afrodite. Como símbolo do amor que transcende a morte,
a rosa surge no mito de Adônis, amante de Afrodite, cujo sangue teria
transformado as rosas, que eram brancas em vermelhas.
-
-
ca pela perfeição por meio do processo de individuação. Edinger (2008)

de atração. Representam a capacidade natural de atrair pela beleza.


Simbolizam o aspecto erótico e representam a beleza com que o incons-
ciente atrai o ego para o processo de individuação. Assim, o jardim de
-
dora para o início da jornada da heroína.

ou grau de evolução. A porta é um limite, um umbral. Por meio dela se


Figura 41. John William Waterhouse, , 1903.

Na obra (1903), a jovem abre deli-


cadamente a caixa da poção da beleza de Perséfone, sentada sobre um

-
mentos que simbolizam passagens para novas etapas de vida e amplia-

A caixa é um dos símbolos do feminino, representa o arquétipo


materno e o inconsciente. A caixa contém segredos que não devem ser
revelados, coisas que pertencem aos deuses e que não se pode possuir

deus do amor pede a Zeus que torne sua amada imortal e a eleva até o
estilos diversos retrataram o momento em que a heroína é salva do sono

-
ração, sofrimento e reintegração da unidade perdida, em um processo

a união e a passagem do caos inicial para a uma nova ordem, tanto na


psique individual como coletiva.

como a beleza, o ciúme, a paixão, o casamento, a relação conjugal, a


inveja, a relação com a sogra, o processo de individuação da mulher, a
integração da anima e do animus, a união dos opostos e o amor em todas

I.





com os pais, irmãs, Eros, Afrodite.



• Como reagiria se estivesse em um relacionamento afetivo em




• Conseguiria se controlar ou abriria a caixa da poção da eterna

II.

1. Separar os grãos

-
-
rada. Pode-se trabalhar com o mito em arteterapia ou na educação pro-
pondo atividades para as quais são requeridas as habilidades propostas
à heroína. A primeira tarefa, separar os grãos, exige capacidade de dis-

poderia ser indicada uma atividade de artesanato utilizando sementes,


contas ou miçangas coloridas. Ao produzir objetos, tendo que selecionar
e separar as pequenas peças por cor, tipo e tamanho, tem-se a oportuni-
dade de experimentar a transformação da multiplicidade caótica numa
unidade estética e organizada. Sugestão:

• Em um saquinho colocar diferentes tipos de grãos, arroz,


lentilha, feijão, entre outros, mais ou menos 50 gramas, o
participante devera separa-los, sem visualizar, tirando um a

2. A lã de ouro

sente que são impossíveis de serem cumpridas. Está insegura e não per-
cebe os vários aspectos da situação, assim, não consegue desenvolver es-
tratégias para atingir seu objetivo. Seu potencial criativo está bloquea-

Podem-se utilizar materiais não usuais para trabalhar livremente, sem

tema do objeto precioso, difícil de ser resgatado de um lugar cercado de


perigos.
-

lã dourada. Relaciona-se à impulsividade desenfreada que não se pode


confrontar, mas esperar o momento certo de agir. Sugere-se utilizar ma-

reaproveitamento de tocos de giz de cera derretidos pode ser um modo


interessante de integrar os efeitos de calor e cor. Num plano mais abs-
trato, trabalhar com a ideia do fogo simbólico ou dar expressão à própria
impulsividade, por meio de cores quentes. Sugestão:

• Escrever em uma folha seus sentimentos impulsivos e descon-


trolados sobre o seu relacionamento amoroso. Com um charu-
to/cigarro ir queimando o papel, para transformá-lo em perga-
minho, como um papel velho.

3. A água da fonte

-
te. A ascensão, porém, não necessita se realizar no plano real ou mate-
rial, mas pode ser por meio da imaginação ou pela abertura para o mun-
de inspiração, sabedoria e renovação da vida. Trabalhos que ajudem a
soltar a imaginação seriam indicados nesta etapa. Propor a temática dos
opostos altura – profundidade, subir – descer, cume – abismo.


alturas, acima das montanhas. Descrever, usando a escrita, essa
sensação e sentimentos.
• Elaborar uma colagem com plumas sobre o tema do seu
imaginário.

4. A jornada ao reino dos mortos

-
riores podem ter sido uma preparação para a fase mais difícil, a busca
da caixa da eterna beleza, que pertence a Perséfone, rainha do mundo
dos mortos. A descida representa a interiorização e o resgate de alguma
coisa valiosa que está guardada nas profundezas do ser, mas que é ne-
cessário trazer ao plano consciente para ocorrer uma transformação ou

é permanecer no reino da morte, ou seja, não poder mais retornar à vida


normal, mantendo um estado de ânimo depressivo. Se tivesse que descer

Atividades:

• Comprar um caderno e decorar a capa. Iniciar um diário com

• Caixa de sapatos ou outro tipo de caixa, decorar com objetos


-

cm de largura por 4 cm de comprimento (2X4 cm), coloque den-

-
re, aleatoriamente, um destes papeis. Leia e retorne para caixa.
Veja qual o sentido de sua mensagem.
5. A morte

Nesta fase seria interessante trabalhar o tema do desapego. Propor


atividades de construção e destruição, algo que se possa fazer e desman-
char. Criar um objeto e depois doar. Desenvolver o desapego, entregando
o próprio trabalho a um colega, que também lhe oferece o seu em troca.

6.

• Criar uma poesia sobre o tema do amor a partir de algumas pa-


lavras soltas, sugeridas pelo grupo ou colhidas do próprio mito.
Exemplo: beleza, princesa, abandono, sentimento, amor, morte
etc.
• Ler a poesia de Fernando Pessoa e fazer um dese-
nho, pintura, colagem ou escultura sobre ela.
• Escolher uma música que poderia se relacionar com alguma
parte do mito. Fazer uma pintura abstrata inspirada na melodia.
Esta singela obra não teve a intenção de exaurir os temas apre-

mentira, ódio, disputa, entre outros. Com o objetivo, bem simples, de


apresentar personagens e alguns mitologemas que passam despercebi-

do mundo de Gaia.
É importante travar empatia com essas personagens que fazem
parte do conteúdo sombrio e que, muitas vezes, se fazem presentes,
-
jo sexual, suprimido de suas vontades e desejos, humilhado, rejeitado,

louvado em versos, poesias e músicas, teve lugar de destaque nas mito-

seus lugares na psique coletiva.


Terminada a jornada, o leitor talvez possa observar que visitou
alguns lugares distantes e estranhos, outros mais familiares, mas com

porque, na verdade, essa caminhada o conduziu a seu próprio mundo in-


terior, em cujas profundezas já não há fronteiras entre o pessoal e o que
pertence a toda humanidade. Lá onde o micro e o macrocósmico perten-
cem a uma única realidade, não se caminha em linha reta, mas se move
em eternas espirais. Pode ter sido uma viagem no tempo e nada revela
tanto a alguém sobre si quanto o conhecimento das origens.
A antiga Grécia é a pátria mãe da cultura ocidental. Por meio de
alguns mitos, revelaram-se imagens que não se restringem a eles, mas
nessa mitologia preservada pela arte ao longo do tempo, pode-se ter
acesso às estruturas psíquicas fundamentais e assim compreender a es-

mas, das bases mais profundas do ser humano, em sua formação holísti-

expressão do feminino, um aspecto da personalidade da mulher e tam-


bém do homem, sua imagem feminina interior, a .
Confrontando o monstro, aprende-se a lidar com o próprio lado
sombrio e se um deus auxilia o herói é o momento de lembrar que se
pode contar com recursos imprevisíveis, potenciais desconhecidos e que
há uma organização psíquica orientando o desenvolvimento num inces-
sante processo evolutivo. Tudo adquire um novo sentido. Cada obstácu-
lo deixa de ser ameaça de retrocesso e passa a ser compreendido como
estímulo e oportunidade para aprendizado e superação. Questionam-
se conceitos e valores que embasam um estilo de vida insatisfatório.
Preparam-se as mudanças, abrindo-se para o novo.

constatação de que o princípio feminino deve ser reintegrado para res-


gatar o equilíbrio psíquico interno do indivíduo, bem como, no plano

A psicologia analítica auxilia a desenvolver um novo olhar sobre


o universo feminino, no qual as polaridades opostas caminham lado a

potencial criativo integrando feminino e masculino, sol e lua, dia e noi-


te. Em um mundo no qual não se tende mais ao egocentrismo do pa-

Para que o mundo atual se torne mais receptivo e tolerante, in-


tegrando a diversidade humana, os aspectos antes renegados, que ten-
taram se impor em radicalismos, necessitam agora de uma união justa
e equilibrada. É preciso que se faça, em todos os âmbitos, pessoais e
coletivos, individuais e sociais, uma profunda revisão de valores e essa
-
-
pera, distraidamente, ao se deixar tocar por uma estória e ela conduzir
às profundezas do mundo interior, onde o passado toca o futuro e o ser
encontra a eternidade.
. São Paulo: Nova Cultural, 1999.
ALVAREZ FERREIRA, A. E.
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da Religião. Me. em Psicologia da Saúde.
Especialista em Psicologia Analítica.
Musicoterapia. Membro Revisor de Revista
-
vros de Arteterapia e Psicologia Analítica.
Coordenadora e facilitadora dos cursos de
Psicologia Analítica e Arteterapia da UNIPAZ
Goiás.

Psicóloga, Mestre em Psicologia, Psicoterapeuta


Junguiana e Docente na área da Psicologia
Analítica. Autora de livros em Psicologia
Analítica.

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