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HISTÓRIA DA PSICOLOGIA1 - AULA 4

manhã e noite: 12/03/2024

Texto da aula de hoje:


MASSIMI, M. História dos Saberes Psicológicos. São Paulo: Paulus, 2016. (Capítulo 6).
SANTI, P. L. R. A Construção do Eu na Modernidade. 6. ed. Ribeirão Preto/SP: Holos, 2009. (Capítulos 7, 8 e 12).

Texto da próxima aula:


SANTI, P. L. R. A Construção do Eu na Modernidade. 6. ed. Ribeirão Preto/SP: Holos, 2009. (Capítulos 9, 10, 11, 14, 15).

ESQUEMA DOS TEXTO


Pontos centrais:
1. Descartes: como o ‘eu’ chega a seu ponto máximo de afirmação no século XVII.
2. A influência decisiva de Descartes no projeto para produção de um conhecimento objetivo,
independente da subjetividade.
3. A influência decisiva de Descartes na formação das ideias psicológicas e da relação mente-corpo.
4. A crescente valorização dos aspectos racionais do homem à custa de uma sombra projetada e o
consequente surgimento da loucura como desrazão.
5. Algumas críticas e desenvolvimentos posteriores

1. Introdução
• Frente à “desordem”  ordenamento racional
Em mais uma das caricaturas que temos feito nesse percurso, poderíamos dizer que o século XVII tentou
organizar racionalmente a desordem do século anterior (SANTI, p. 58).
• Nesse sentido, os pensadores da época buscavam:
[...] criar um método para a compreensão do mundo em sua totalidade. Para isso, o mundo será dividido,
analisado, hierarquizado metodicamente (SANTI, p. 58).
• Razão como referência confiável
Dada a insegurança do ceticismo, é necessário encontrar algum ponto de referência confiável sobre o qual
edificar a existência. A razão humana buscará encontrar a ordem das coisas para dominá-las e, sobretudo,
dominar a si mesma (SANTI, p. 58-59)

2. René Descartes (1596-1650)


• Filósofo, físico e matemático
• “Discurso do método” (1637)
• Inaugura a Modernidade (com sua filosofia):
[...] trata-se da primeira tentativa bem-sucedida de pensar a realidade a partir dos novos pressupostos que
caracterizam a posição cultural da época (MASSIMI, 2016, P. 332).
• Contexto histórico de crise dos tradicionais sistemas de saber
• Preocupação: distinguir a verdade da mentira e assim poder orientar a própria ação.
• Propõe um novo método para orientar a razão na busca da verdade
• Método de Descartes  Cogito:

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Material para uso privado e exclusivo dos alunos da presente disciplina, no ano de 2024. Proibida a divulgação pública.
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Esse método, chamado de dúvida metódica, consiste na análise de todas as ideias, eliminando aquelas que
se apresentam como dúbias, e retendo apenas as ideias que não suscitam qualquer tipo de dúvida. Descartes
aplica a si mesmo esse método isolando-se num quarto aquecido ao longo de vários dias, onde empreende
suas reflexões. [...] (MASSIMI, 2016, P. 334, grifo do prof.).
No procedimento de Descartes, uma a uma, as coisas iam se mostrando enganadoras. Ele procedeu seu exame
de dentro para fora e, assim, em primeiro lugar, percebeu que as opiniões das pessoas comuns e de
"especialistas" eram duvidosas; depois percebeu a variabilidade das leis e regras morais. Já não podendo contar
com certezas externas, passa a interrogar a si mesmo (reencontra-se aqui o movimento que identificamos na
passagem da Idade Média ao Renascimento). Em primeiro lugar, averiguou se seus órgãos do sentido lhe
proporcionavam informações seguras, e chegou à conclusão de que não. Interrogou, então, seus sentimentos
e viu que o que eles lhe transmitiam não era nada objetivo. E então se perguntou se a sua sensação de ter
certeza sobre algo garantia a verdade correspondente e, ainda uma vez, concluiu que não. [...] Depois de
duvidar de todas as coisas [...] tudo o que tomou como objeto de seu pensamento era incerto, mas que algo lhe
parecia indubitável: enquanto duvidava, seguramente existia ao menos a atividade de duvidar e se havia esta
ação, ela deveria ter um sujeito, um "eu pensante" (SANTI, P. 60).
Ao colocar assim em dúvida todos os conhecimentos possuídos, ele chega ao resultado de que existe uma
única verdade totalmente livre de dúvida: o fato de que ele está pensando. Deduz então disso que, se
pensa, existe ("Penso, logo existo"). Para Descartes, então o próprio pensamento é a verdade absolutamente
firme, certa e segura, que constitui o princípio básico de toda a filosofia (MASSIMI, 2016, P. 334, grifo
do prof.).
• "Je pense, donc je suis" - Cogito Ergo Sum
• Grande influência conhecimento matemático como forma de conhecer o mundo:
o Ordem e medida
As Regras de busca da verdade, que Descartes propõe como parte de um novo método de uso da razão, são
baseadas no conhecimento matemático, por ser esse saber mais rigoroso e garantia da certeza (MASSIMI,
2016, P. 334, destaque no original).
• Novo conceito de mente e corpo
o Dualismo de Descarte: corpo (res extensa) e mente (res cogitans)

3. Dualismo de Descartes
• Corpo  entendido como mecanismo; como máquina; como uma lógica mecânica:
O mecanicismo implica que o corpo seja submetido ao mesmo tipo de determinismo, ou seja, de relação causa-
efeito, que ordena o mundo da matéria em movimento (MASSIMI, 2016, P. 340).
Descartes propõe o modelo da máquina (mecanicismo) como recurso para conhecer o corpo humano e o
mundo material e biológico. O mundo é uma máquina cujos componentes são matéria e movimento
(mecanicismo). Inclusive a vida se explica em termos de mecanismo (MASSIMI, 2016, P. 337).
• Mente  como a capacidade reflexiva; alma racional:
Para Descartes, o pensamento é a consciência, e a consciência compreende a vontade, o intelecto, a
imaginação, os sentidos (MASSIMI, 2016, P. 336).
• Com Descartes: o ‘eu’ chega a seu ponto máximo de afirmação no século XVII

4. O “eu” como central


• Humano como centro do mundo; razão como centro do humano:
O homem já era reconhecido como centro do mundo; agora, ele mesmo tem um centro, sua razão, sua
autoconsciência (SANTI, 2012, p.61, destaques do autor).

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Desde Descartes, só será considerado verdadeiro aquilo que passar pelo crivo (observação ou experimentação)
da razão humana. O lugar da verdade é o eu e não mais textos ou representantes do sagrado (SANTI,
2012, p.61, grifo do prof.).
• EU  Projeto científico:
A evidência do eu como única referência estável dará origem a todo o projeto científico. O homem passa a ter
segurança quanto à sua possibilidade de alcançar um conhecimento objetivo do mundo. A verdade já não será
procurada nas escrituras sagradas ou em iluminações místicas. Só poderá ser considerado verdadeiro algo que
tenha passado pelo crivo da observação e racionalidade humanas (SANTI, 2012, p. 66).
Ao eu será atribuída uma posição transcendente ao mundo material; com isto, nascerá o projeto da
produção de um conhecimento objetivo, neutro, independente da subjetividade: a ciência (SANTI, p.
58).

5. Razão e desrazão
• Loucura como ameaça à ordem do mundo:
De forma muito simplificada, poderíamos dizer que foi apenas no século XVII que surgiu nossa forma atual
de relação com a loucura; num certo sentido, a loucura surgiu nesse século. Isso não quer dizer que, antes
disso, não houvessem pessoas que alucinavam ou que fossem descontroladamente violentas, etc. A questão é
que antes do século XVII ou em culturas não ocidentais, a forma de se compreender o que se passava
com essas pessoas era diferente. Não havia o medo que temos hoje do louco, a ideia de que isso fosse uma
doença e, sobretudo, não existia a ideia de que ele devesse ser afastado do convívio social e isolado num
hospício. Em determinadas culturas, o louco pode ter sido tomado como um visionário: como aquele que
transcende a experiência imediata, entra em contato com outra dimensão da verdade que, ao regressar, a
comunica aos demais. Ele pode ainda ter sido tomado como um possesso pelo demônio ou simplesmente como
um bobo. O principal é observar que, até o século XVII, a perda da razão por um homem não produzia o efeito
de medo que passou então a gerar. Por que surgiu o medo da loucura? (SANTI, 2012, p.68, grifo do prof.).
• A estabilidade do mundo passa a estar profundamente ligada à identidade do “eu”:
[...] a única garantia e ponto de referência do homem é a sua crença em um eu pensante" objetivo e consciente.
A partir desse momento, qualquer coisa que pudesse pôr em questão a lucidez e a estabilidade do eu, seria
tomada como altamente ameaçadora. Agora é toda a estabilidade do mundo que está em jogo na identidade
do eu. E preciso criar mecanismos para afirmá-lo e defendê-lo (SANTI, 2012, p. 69).
[...] o nascimento de nossa representação moderna da loucura é contemporâneo e correlato ao momento de
maior afirmação do eu, enquanto sujeito consciente e livre para conhecer a verdade (SANTI, 2012, p. 69).
• O louco como o oposto do “eu” (racional):
O louco será tratado como um animal, como alguém que perdeu a alma, pois esta identifica-se com o eu e sua
racionalidade. Não se pode pensar em um eu louco; se há loucura, o eu submergiu. (SANTI, 2012, p. 69).

6. Crítica às ideias de Descartes:


• Crítica ao reducionismo de toda experiência humana à lógica matemática
Descartes é reconhecido como o filósofo mais expressivo desse movimento e um dos fundadores da
Modernidade: seu pensamento associa-se à origem do Iluminismo e, posteriormente, da ciência. Por outro
lado, não faltam aqueles que o tomam como o criador de um racionalismo exagerado, distante da experiência.
Ele seria o maior representante, juntamente com Platão, da filosofia da representação, que exclui o corpo e
seus impulsos, pretendendo que o mundo seja totalmente racionalizável, submetido a séries de causa e efeito
(SANTI, 2012, p.59).

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