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CONCEITO DA OBRA AUDIOVISUAL

“CÂMERA ESCONDIDA”

Professora:
Hadija Chalupe da Silva

Alunos:
Alexandre Berçott
Cainã Veiga
João Pedro Friz
Pedro Paulo Santoro

NITERÓI/RJ
2023
CONCEITO DA OBRA AUDIOVISUAL

O filme Câmera Escondida se baseia na implicação do olhar do outro numa


espécie de constituição de um indivíduo, de modo a desenvolver tal princípio com
humor e ironia.

Partindo do filme Janela Indiscreta, de Alfred Hitchcock, tornara-se bem


convidativa a ideia de construir uma narrativa apoiada na relação observador e
observado, sem perder a liberdade de inserir a roupagem mais cômica e identificável ao
público universitário que é proposta.

Por conta da limitação do formato vertical, o curta-metragem se utiliza


quase de uma metalinguagem para pensar e construir sua estrutura. Desse modo, a
câmera na mão e o fato de estarem a gravar com o celular desenvolvem um ambiente de
um quase amadorismo, quase uma filmagem caseira — e proposital, fazendo um uso
consciente da linguagem para a percepção do ambiente —, um pouco como em
Saneamento Básico, de Jorge Furtado. A câmera é operada, então — no espaço da
diegese — pelos protagonistas, de forma que não tentam, conscientemente — pois o
fazem —, controlar a realidade. Nesse ponto, nos valemos do que Maya Deren chama
de “acidente controlado” quanto à fotografia e à captação das imagens — uma vez que é
a captação do “mundo real” —, que leva à associação que ela faz de a imagem
fotográfica ser uma equivalente da realidade e não a realidade.

Outro ponto importante para a estruturação do filme é o som, uma vez que
as personagens são moldadas pelas vozes dos protagonistas — eles, detentores do poder
de contar as histórias daquelas personagens, que, mesmo obviamente falsas, ainda
podem se confundir com o “real” —, fator que implica em uma certa despersonalização
— e também quanto ao coletivo. Essa manipulação do ser e de sua constituição é algo já
explorado bastante na literatura, como em Dom Casmurro, de Machado de Assis, que,
para além do “traiu ou não traiu?”, pode ser enxergado, sobretudo, do ponto de vista do
apagamento da voz de Capitu. Aqui a linguagem trata de silenciar, no sentido literal, as
vozes dessas pessoas, que são substituídas pelas vozes de Caio e Júlia — e a evidente
captação de som de forma não direta. Com essa estrutura de narrativa, as personagens
são transformadas em arquétipos que satisfaçam o olhar do outro, em objetos de desejo
e prazer, onde esse outro detém o poder de seus corpos na realidade fílmica — conceito
de Siegfried Kracauer, que abre margem para as discussões acerca do que é a realidade
e de sua representação na fotografia e no cinema, em consonância, também, com os
estudos e trabalhos de Maya Deren. Com esse poder, as outras personagens somem nas
vozes de Júlia e Caio e quase como que perdem sua existência própria, uma vez que esta
é apropriada por parte dos protagonistas. Ou seja, há uma dissolução dessas pessoas e de
seus corpos nas figuras dos protagonistas, que nunca aparecem — em imagem — no
filme, fator que potencializa esse poder — muito associado, aqui, ao exercício de filmar
o outro, mesmo de modo consensual.

Ainda acerca da ideia de despersonalização desenvolvida a partir da


linguagem, é preciso pontuar o distanciamento da câmera, os enquadramentos e a mise-
em-scène como imprescindíveis para a corroboração da ideia na prática — entretanto,
esse aspecto é melhor desenvolvido no documento que trata a respeito da visão de
direção, sendo, aqui, apenas citado para uma concisão maior das ideias.

Entretanto, não há necessariamente uma vilania por parte de Caio e Júlia:


eles têm tal iniciativa de gravar e criar as histórias dessas pessoas de maneira quase
inocente. Dessa forma, todo o prazer escopofílico, do olhar, existe inconscientemente.
Eles são, sobretudo, sintoma de um regime social que espetaculariza a vida das pessoas,
que torna todos os seres passíveis de estar presentes no ambiente virtual, de terem sua
individualidade e privacidade invadidas. O que há, pois, é uma quase ridicularização
dos protagonistas, que, protegidos pelo anonimato, expõe suas facetas mais idiotas e
infantis.

Por fim, a evidência de um olhar irônico e cínico está na base da estrutura


do filme. Trata-se de uma questão extremamente pertinente, sobretudo na
contemporaneidade, onde há uma exposição excessiva de todas as pessoas, que é
pensada, aqui, a partir do anonimato de quem filma e tem a voz, aspecto que se faz
fundamental para a compreensão da obra.

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