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Português

Leia com atenção o texto abaixo. Depois, res-


ponda às perguntas a seguir.

Um cachorro de maus bofes acusou uma pobre


ovelhinha de lhe haver furtado um osso.
— Para que furtaria eu esse osso – ela – se sou
herbívora e um osso para mim vale tanto quanto um
pedaço de pau?
— Não quero saber de nada. Você furtou o osso e
vou levá-la aos tribunais.
E assim fez.
Queixou-se ao gavião-de-penacho e pediu-lhe jus-
tiça. O gavião reuniu o tribunal para julgar a causa, sor-
teando para isso doze urubus de papo vazio.
Comparece a ovelha. Fala. Defende-se de forma
cabal, com razões muito irmãs das do cordeirinho que
o lobo em tempos comeu.
Mas o júri, composto de carnívoros gulosos, não
quis saber de nada e deu a sentença:
— Ou entrega o osso já e já, ou condenamos você
à morte!
A ré tremeu: não havia escapatória!... Osso não
tinha e não podia, portanto, restituir; mas tinha vida e
ia entregá-la em pagamento do que não furtara.
Assim aconteceu. O cachorro sangrou-a, espos-
tejou-a, reservou para si um quarto e dividiu o restan-
te com os juízes famintos, a título de custas...
(Monteiro Lobato. Fábulas e Histórias Diversas)

Questões de 1 a 10, baseadas no texto.

1
O que significa de maus bofes, na primeira linha do
texto?
Resolução
“De maus bofes” significa “de má indole”, “mau cará-
ter”, “de mau humor”.

2
a) Dê o superlativo absoluto sintético de pobre, em
suas duas formas possíveis.
b) Numa dessas formas, o superlativo absoluto sintéti-
co de pobre assume característica latina. Ofereça
dois outros exemplos em que, de acordo com a
norma culta, isso ocorra.
Resolução
a) O superlativo absoluto sintético de pobre, em sua
forma erudita, é paupérrimo e, em sua forma popu-
lar, é pobríssimo.
b) Outros exemplos de superlativo absoluto sintético
de feição erudita prescritos pela norma culta: nigér-
rimo (de negro), celebérrimo (de célebre), amaríssi-
mo, (de amargo), crudelíssimo (de cruel).
Notar que, diferentemente do que se possa pensar
a partir deste quesito, as “características latinas”
desses superlativos não se devem necessaria-
mente aos sufixos empregados, mas à forma dos
radicais, apesar de -érrimo ser sufixo exclu-
sivamente erudito.

3
Ao gado formado de vacas, chamamos vacum. Aponte
cada um dos adjetivos utilizados para designar o gado
formado de:
a) cabras;
b) ovelhas.
Resolução
a) Caprino (variantes inusuais: cabrum e caprum);
b) Ovino (variante inusual: ovelhum).

4
Do texto, transcreva quatro palavras nas quais ocorram
diferentes dígrafos.
Resolução
Dígrafo é um conjunto de duas letras que representam
um único fonema ou som. Exemplos: cachorro, pobre,
ovelhinha, osso, quero.

5
No texto, encontramos o seguinte período: “— Para
que furtaria eu esse osso – ela – se sou herbívora e um
osso para mim vale tanto quanto um pedaço de pau?”
Nesse período, teria sido possível escrever Por que
em vez de Para que. Isso teria provocado sentido dife-
rente à frase? Explique.
Resolução
Para que é uma locução conjuntiva final; por que, cau-
sal. Portanto a pergunta formulada diz respeito à finali-
dade do hipotético furto, enquanto a pergunta com por
que diria respeito a uma possível causa, o que não está
em questão.
O argumento contido na indagação retórica da ovelha
patenteia que a acusação contra ela é improcedente,
pois o furto de um osso seria um ato desprovido de
qualquer finalidade para um herbívoro.

6
Observe o período “Para que furtaria eu esse osso –
ela – se sou herbívora e um osso para mim vale tanto
quanto um pedaço de pau?”. A respeito dele, pede-se:
a) O segmento para mim está próximo da palavra
osso. Pelo sentido, porém, percebe-se que sua rela-
ção imediata não se faz com essa palavra, mas com
outra. Diga com qual palavra ela se relaciona e expli-
que.
b) Explique a função da palavra ela.
Resolução
a) Para mim é complemento de vale, funcionando
como objeto indireto desse verbo.
b) Ela funciona como uma oração intercalada cujo
verbo, elíptico, seria disse ou respondeu. Portanto,
a função de ela, no texto, é indicar o emissor da
frase na qual o pronome vem intercalado.
7
A sentença a que a ovelha é condenada só se concre-
tiza realmente no último parágrafo. No entanto, ao
longo do texto, o narrador vai, aos poucos, oferecendo
indícios de que isso ocorreria. Aponte pelo menos dois
desses indícios e explique-os.
Resolução
Entre os indícios que podem ser arrolados como
sugestivos da condenação final citamos, no início, a
qualificação da ré como “pobre ovelhinha”, – com o
adjetivo e o diminutivo enfatizando uma imagem de
fragilidade e mansidão. A expressão “Não quero saber
de nada” patenteia a intransigência do cachorro. A alu-
são à fábula de Fedro, proveniente de Esopo, “O Lobo
e o Cordeiro”, estabelece um paralelo entre as situa-
ções e faz previsível o desenlace desfavorável à ove-
lha. A composição do júri é suspeitíssima, pois os juí-
zes são “carnívoros gulosos”.

8
No início, o narrador utiliza verbos no pretérito perfeito
do indicativo. Em certo momento, passa a utilizar o
presente do indicativo. Esse recurso produz efeito na
narrativa? Explique.
Resolução
O efeito da substituição do perfeito pelo presente é o
de dar vivacidade à narrativa. Por meio do presente, os
eventos são apresentados de maneira mais próxima,
como se estivessem acontecendo no momento da
enunciação. Muito expressivo, também, é o contraste
entre o perfeito, empregado até a cena do tribunal, e o
presente narrativo, introduzido naquela cena central.

9
O adjetivo referente ao substantivo Espanha assume,
por vezes, forma latina que pode ser notada em sua
grafia. No texto acima, ocorre fenômeno semelhante
com uma palavra. Identifique-a e explique esse fenô-
meno.
Resolução
São formas eruditas e, portanto, mais próximas do
latim, hispânico e ibérico. A primeira palavra deriva do
latim hispanicus, adjetivo de Hispania, designação
alternativa (e de cunho popular) da região chamada
Iberia, nome do qual deriva ibericus, étimo de ibérico.
No texto, o adjetivo herbívoro tem, em sua compo-
sição, a forma latina de erva: herba.

10
Explique o significado das expressões sublinhadas no
seguinte fragmento do texto: “Defende-se de forma
cabal, com razões muito irmãs das do cordeirinho que
o lobo em tempos comeu”.
Resolução
Cabal significa “completo”, “pleno”, “integral”; as
“razões muito irmãs” são “razões muito semelhantes,
muito próximas, parecidas”; em “cordeirinho que o
lobo em tempos comeu” há uma referência à perso-
nagem da fábula clássica , “O lobo e o cordeiro”, pro-
cedente de Esopo, mas mais famosa na versão de
Fedro. Em tempos é o mesmo que “há tempos”,
“antigamente”.

11
Leia atentamente a seguinte frase extraída do texto:
“Ou entrega o osso já e já, ou condenamos você à
morte!”. Poder-se-ia dispensar uma das formas já
dessa frase sem alterar-lhe o sentido? Explique.
Resolução
Já e já é uma expressão fortemente enfática; a forma
simples já, embora não tenha sentido diferente, é
menos expressiva, porque menos enfática.

12
Dê o plural de:
a) gavião-de-penacho;
b) espostejou-a.
Resolução
a) gaviões-de-penacho
b) espostejaram-nas

13
O que significa, no texto, a forma verbal espostejou?
Explique o processo de formação desse verbo.
Resolução
“espostejar” – no texto, significa “despedaçar, trans-
formar em postas”.
O processo de formação desse verbo é derivação
parassintética ou parassíntese.
Assim, “es” – é o prefixo; a raiz é post e o sufixo é
“ejar”.

14
Como se pode deduzir do texto, a palavra urubu não
tem acento gráfico. A palavra baú, também terminada
em u, tem acento agudo. Explique a razão dessa dife-
rença.
Resolução
As palavras oxítonas terminadas em u não se acen-
tuam, como é o caso de urubu.
Os hiatos cujo segundo elemento seja i ou u tônicos
acentuam-se, desde que o i ou u não sejam seguidos
de l, m, n, r ou z que travem a sílaba (como em Raul,
raiz) e também que não sejam seguidos de sílaba ini-
ciada por nh.

15
Por que, no texto, o narrador usa o pretérito mais-que-
perfeito do indicativo furtara?
Resolução
Porque o mais-que-perfeito indica uma ação ocorrida
antes dos outros pretéritos constantes do trecho —
perfeito tremeu e os imperfeitos tinha e podia.

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