Você está na página 1de 2

Universidade Federal de Alfenas

História 7º Período

Prática de Pesquisa Histórica

Rodolpho Ferreira Borges

O indivíduo, como sujeito social, constrói as suas lembranças, impressões, reflexões e


pensamentos, ou seja, sua memória, sobre determinados fatos sociais (e aí eu deixo entrever a
filosofia de que devemos estudar como esses fatos viram coisas, ou melhor, como os
indivíduos dão sentido aos tais fatos, sendo isso o que realmente o faz existir) a partir do que
apreende do meio sob óticas socialmente construídas. Segundo Halbwachs, “só temos
capacidade de nos lembrar quando nos colocamos no ponto de vista de um ou mais grupos e
de nos situar novamente em um ou mais correntes do pensamento coletivo.” (1990,p.36) No
entanto, daí surge uma indagação, pois, segundo o mesmo autor, a memória coletiva não é
capaz de explicar todas as lembranças. Onde, se existe, estaria a memória individual?

Halbwachs (1990) nos exemplifica uma situação em que as lembranças e a


manifestação são silenciadas por estarem ligadas mais ao grupo ou situação anteriores ao
atual. Pollak (1989) materializa historicamente esse fato, e afirma a sobrevivência, por anos,
de lembranças traumatizantes que esperam o momento propício para serem compartilhadas. O
mesmo autor ainda nos afirma que essa relação se dá entre os grupos minoritários e a
sociedade englobante. Pollak (1989) traz ainda essa discussão ao nível da própria entrevista
na pesquisa oral ao afirmar que as dificuldades e os bloqueios são raramente causados por
brancos ou falhas de memória, mas sim pela reflexão sobre a validade de falar sobre tais
lembranças do passado, no presente.

A narrativa, como expressão das lembranças, carrega em si uma dimensão utilitária,


uma capacidade latente de aconselhar, segundo Benjamin (1987). Unido ao fato expressado
no parágrafo acima, demonstra-se aqui a relação entre a construção do passado no presente, o
que afetaria a construção do presente. Ou seja, conjectura-se que, a lembrança sobrevivente
esta sujeita ao tempo presente para emergir, e devido a sua característica utilitária, o conselho,
também possui uma força sobre o presente. “O passado traz consigo um índice misterioso,
que o impele à redenção. Pois, são somo tocados por um sopro de ar que foi respirado antes?
Não existem, nas vozes que escutamos, ecos de vozes que emudeceram? Não tem as mulheres
que cortejamos, irmãs que elas não chegaram à conhecer? Se assim é, existe um encontro
secreto, marcado entre as gerações precedente e a nossa.”(BEJAMIN, 1987, p. 223) Pollak
afirma no mesmo sentido: Distinguir entre conjunturas favoráveis ou desfavoráveis às
memórias marginalizadas é de saída reconhecer a que ponto o presente colore o
passado.”(1989, p. 8) Entretanto, segundo Benjamin, a era da informação em tempo real está
sendo a responsável por tirar força da narrativa, pois a noticia já vem acompanhada de
explicação, o que exclui o ensinamento do narrador. Mas isso não vem ao caso agora.

As nossas próprias mudanças de grupo estão sujeitas ao tempo, da mesma maneira que
o próprio tempo constitui uma mudança. Ou seja, não podemos mudar de um meio para o
outro sem que isso demande algum tempo, da mesma maneira que a própria passagem de
tempo muda o meio em que estamos inseridos; isso é lógica. O que resta dessas mudanças são
as reminiscências. A reminiscência “(...) tece a rede que em ultima instância todas as histórias
constituem entre si.” (BEJAMIN, 1987,p. 211) Mas na medida em que compomos diversos
grupos e participamos de diversas situações durante toda a vida, o que não se repete
plenamente com nenhum outro indivíduo, nossas preferências se tornam a expressão do acaso,
da aleatoriedade. Aí se encontra a memória individual. Na medida em que a situações não se
repetem e nem as influências do coletivo são as mesmas, pela própria natureza de tal relação,
as lembranças, as reminiscências, nunca se darão da mesma maneira.

A lembrança, desse modo, pertence ao narrador. Daí a própria utilização do termo, o


narrador conta a sua experiência. E a partir do momento em que a lembrança se dá sob as
influências nunca repetidas, entre um indivíduo e outro, do meio coletivo, o que se tem de
reflexível nelas e sua subjetividade como nos afirma Halbwachs (1990). “Recordar já é
interpretar. (...) Excluir ou exorcizar a subjetividade (...) quer dizer, em última instância,
torcer o significado dos próprias fatos narrados”, nos afirma Portelli (1996, p. 2). Desse
modo, “não temos, pois, a certeza do fato, mas apenas a certeza do texto.” (PORTELLI, 1996,
p. 4) Temos a certeza e a possibilidade de análise do relato transcrito, transcriado ou filmado,
a lembrança é do narrador.

Você também pode gostar