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M artiíi Francisco — Rindo dessas paginas vibrantes —r ri de ver...
tphos Mas chora áe rir -— Não tem bastante
Cou­ e a Revista do Brasil S ã o
isenção para perdoar, nem philoso­
ro e Pau lo, 1919/. phia para comprehender a reálidade
lida/ Cuido ser este o primeiro livro de do mal. ' ; .
rita, Martim Francisco. E não foi certa­ ^ O progresso, para elle, é a decaden-
mente sem difficuldade que, os edito­ cia.. Deforma a realidade para graval^a
res o trouxeram a lume. Marti^n Fran­ e nisso se rolava bom natyrista. Como
cisco é o mais desçabellado,~ o mais t a l dev^a ser julgado. E ' desmedido, ex­
curioso,
nda, sos escriptores. o mais independente de nos­ cessivo, B em unidade, e acanhado de
Seus escriptos, como visão. "Mas sabe rir e deblaterar com
i de seus discursos, como suas razões em
nen- autos, como sua conversação, o mais coragem e sem despeito pessoal: será
rrei* estranho tecido de incongruências es­ talvez um caso unico entre nós. Na
e r t o pirituosas, de talento despr-diçado, de longa melancolia que ennnbla toda
;e. impetos e escarneos. Sua vida é uma a nossa litteratura Martim Francisco
cor- perplexa irrisão ao bom senso e á ro­ lança o clarim de uma voz ousada, ini­
3sta- tina. Tenho qije o faz sinceramente- miga- da rotina e resumbrante de es­
th.ur mas não deixa por vezes de forçar a pirito. Para mostrar quem elle seja,
i S9- nota. Extremamente egoista, sem uma basta a recordação de um episodio no
aula maneira unica e inimitável de ver e jury de S. Paulo, onde Martim Fran­
commentar o m undo. cisco, em pleno tribunal, auxiliar da
par- Ainda agora está a Revista do Bra- accusação n*um crime de adultério, lan­
sil"" publicando algumas notas de suas çou em voz sonora o celebre epigram-
lio r viagens. Nunca viajante algum nem ma de Curvo Semedo:
rita ainda o Président des Brosses, viu a Certo escrevente casado
Ga- destituido um
Italia por prisma tão pessoal, tão
de rhetorica, tão imprevis­
Tinha em casa por dinheiro
B<„ to . Elle sabe Outro escrevente solteiro.
combinar como ninguém Houve entre elles grande enfado
um facto historico, com um incidente E de murros um milheiro;
comico de viagem, numa citação apro­ Mas por causa bem pequena:
priada com uma obsçrvação inédita. F o i p or m olh a res a pen na
ira Procura esconder a erudição admira-
A m bos no m esm o tin te iro
res vel que possue, deixapdo que ella aflo­
re sem ser invocada, ao calor das cir-
Tristão de A T IiA Y D E
do cumstancias. Se é naturalmente pes­
soal, gosta de fazer sentir a sua inde­ F rei V icente do S alvador —
iia pendencia, de sustentai* paradoxos, de Historia do Brasil — ed. revista
in- “ épater le bourgeois”. por Capistrano de Abreu.
Ama o absurdo e o imprevisto. Ao Weisz-Flog Irmãos. S . Paulo
lo, guarda do cemiterio de cães de Asnié- 1*918.
o res pergunta .de chofre: d
A ' munificenciq, de Paulo Prado e á u
“ Por que razão abanam os cães com erudição carinhosa de Capistrano de
a cauda?” . *. ' ■ e
Abreu devemos essa re-edição da ‘‘ pri­
EÍ o guarda — ‘‘ Porque estão conten­ meira historia do Brasil composta por
c<

tes, porque vêm o dono, ou a co­ P


ha m i d a .. . ” -• , r» brasileiro”, em 1627. Por longos annos e
do — MNão, o cão ‘Abana çom a cáuda desconhecida foi provavelmente fo­ n
porque ô maior do que "ella. Si esta lheada em Lisbôa pélo infatigavel, Var- di
fosse maior do que aquelle, seria a nhagem, lá copiada pela commissão de ri
cauda a abanar com o cão”. Gonçalves Dias ou J. F). Lisboa em d <
Em Florença, procurando hotel onde 1850, vindo ter á bibliotheca do Mar- m
tia-
81*. se hospedar, chega a um, onde vê, na quez de Olinda. ci
Adquirida pelo livreiro João Martins
na­ pia de lavar mãos, uma toalha suja: cr
ção — “ Fico áqui, pois se as toalhas esjtãp Ribeiroj este a offereoeu em 1S81 á Bi-
i 9 sujas, é que os hospedes lavam as blotheca N acional-e serve de texto A p e

de m ãos” . presente edição. -—Esta é enriquecida te


ro, Martim Francisco faz rir: pão creio d e preciosos proleg^omenos de Capis- trs
que elle ria . Tem um, temperamento 5de t r a ç o d e A b r e u , a cada capitulo: o e s ­ Uê
satyrista impiedoso, de discípulo de f o r ç a d o historiador comménta, recti- co;
Plauto e Juvenal, de Persio óu de Mar­ fica, e aponta *novas fontes referentes do
cial. O espirito latino foi a satyra. aos successos narrados com benedi­ ar
Martim Francisco é um romano. Elle ctina erudição. * c ia

tem de Roma a paixão da liberdade, a Capistrano d&Abreu 0 o npsso m:*ior 701


ito , ousadia., o espirito de critica. Em sabedor de historia patria: pena “é que ma
da Roma, porém, a feição satyriCa era so­ lhe faltem qualidades de generalisação. é i
de bretudo social: em Martim Francisco E ’ prodigioso dè-, informações, mâs vo­ zelí
xm - é antes politica. Não que o prisma so­
luntariamente secco. Vive na laboriosa pai
5an­ cial da satyra lhe se ja estranho. Nes­ colleçta de materiaes com que/ outros- da
da te seu livro -— “ Rindo” — tem .pagi­ lie;
Ra- nas de mestre ao traçar o typo do — irão construii*: nobre exemplo de dedi­ i
niá- engrossador — que f&lle appellida — cação a uma\tarõfá jngrat^. que só em fes
tlOK, grude. Distribue esse parasita por vá­ si mesma encontra recompensa. O 1
JJor- rios typos: o “ p o l i t i c o o “ fornece­ mundo aclama o architecto, nunca o bli
pedreiro. no»
dor”, o “ jornalista^, o “ que chagou do
ier. R io ”, o “ fundador da Republica”, o N ° prefacio- — diz Capistrano da sii^
.ria “ propheta”, o que “ brigou com o di- Abreu com acerto, dever o livro antes 3
3ta, rectorio local”. Para cada um delles, chamar-se — JBistorias do Brasil, que gai
iys, saba e s c o lh e r o traço que perpetúa. — Historia do Brasil. Com efeito. Frei pr€
nla “ Um traço, apenas um e banal, lhes ú Vicente faz a chroniea minuciosa e noi
Be- commum: são tódos governistas: não assás desordenada dos ' successos colo- co i
iz*?., ha “ grudes” n a' opposição” . Ora ê niaes, desde o deScobrin\ento até o te
ido aquelle cuja “ especialidade é a perma- inicio das TutaS hollandezas. Começa por
nio nencia: esse malvado é interminável; informar da terra, seus prpductos, ha­ saj
parece praga sem coméço, nem fim ” ; bitantes e çostumos; relata as PT*»meÍT
íbio ora o q u e'“ quando chega a palacio pa­ ras lutas com indigenas e francezes, as noj
da rece que já èstá';áli’ liá ^müitas' hórásv ; disse, -pelbs ^hoWandézes, na BQ/hia, m
ora ç jovn&Iirtta “<iue teve-algumas di­ cuja teimada e óccUpação desçrpve çom
verge nc ias com; o livro çai 3ça“ ; ^e a^sim, bastante^. ípittoresco^. muito curioso
por deante. Mas o livro é sobretudo po­ nos episodios ás vezes minimos que fi
en
aan. litico. Reunião de trechos dispersos, reconta bom chiste e até trocadilho: o
mi
irte, escriptos em varias épocas — dos úl­ ciumento de Cananga, as mulheres de
rier. timos armos da uonarchia, aos primei­
p&
Igaraçu e do Rio de Janeiro, os pre­
Ma- ros do seculo X X — está um tanto parativos para a conquista da Para-
ír 14 alongado de nós pelo assumpto. A Re­ vhyba, a saudade de Thomé de Sousa, a
i Ca- volta, o Ensilhamento, o Acre, o Codi- fundação do Rio de Janeiro, e outros
go Civil, ainda Hão nos interessam muitos. cr
como historia e já não nos interessam n*
São preciosos os testemunhos de
como vida. Cairam no purgatório de. chronistas inge»nuos como este, que^ôs-
hontem, de que só o tempo os resga­ rc
crevem o que vêm e o que satwm, sem fr
DE tará. De todas as questões que solici­ prevenções nem apologias tènden-
tam ò estylete acerado de Martim
Frapcisco, a mais remota, sem duvida,
za-se é a “ separação de S . Paulo”. Aliás, o
Cesta autor tem o bom gosto de dizer: • —
ciosa s. ■* '


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V l.lí i “ Quanta despesa de logica mereceu) M EM EN TO B IB L IO G R A ti
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ousadia., o espirito de critica. Em sabedor de historia patria: pena % que ma
Roma, porém, a feição satyrica era so­ lhe faltem qualidades de generalisaçãó. é i
bretudo social: em Martim Francisco K' prodigioso dé»,. Informações, mâs vo­ zeli
é antes politica. Nâo que o prisma so­ luntariamente seccó. Viye n a ,laboriosa pai
cial da satyra lhe seja estranho. Nes­ da
colleçta de materiaes cotn que/: outros- lid
te seu livro :— “ Rindo” — tem vpagí- irão construir: nobre exemplo de dedi­
nas de mestre ao traçar o typo do —-- cação a um a ‘ tp.feía, ingrata que só em
engrossador —~ que Ifelle appellida — si mesma encontra recompensa» O
grude. Distribue esse parasita por va­ ]
mundo aclama o archltecto, nunca o bli
rios typos: o “ politico”^ o “ fornece­ pedreiro. . . .
dor”, o “ jornalista”, o “ que chagou do noi
R io”, o “ fundador da Republica”, o $ío prefacio — diz Capistrano de siii
“ propheta”, o que “ brigou com o di- Abreu com acerto* dever o livro antes J
rectorio local”. Para cada um delles, chamar-se -— JHistorias do Brasil, que gai
sabe escolher o traço que perpetúa. — Historia do Brasil. Com efeito. Frei prc
“ Um traço, apenas um e banal, lhes 6 Vicente faz a\ chronioa minuciosa e noi
commum: pão tódos governistas: não assás desordenadá dós . successos colo- eoi
ha “ grudeã” n a' opposição” . Ora é niaes, desde a •descobrimento até o te
aquelle cuja “ especialidade é a perma- inicio das futas* hollandezas. Começa por
nencia: esse malvado é interminável; informar da terra, seus productos, ha­ sa]
parece praga sem começo, nem fim ” ; bitantes e costumes; rèlata as prvmei-*
ora o que “ quando chega a palacio pa­ ras lutas com indígenas e francezes, as nò

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rece que já, èstã áli’ tíá ^míiitâs hôfàs^ ; ãtsàé, irelKs ?hoWaníTèzes, na Bahia,
ora c jornalista "íiue tève algumas dl* cuja tomada e òccupaçâo descreve com
vergencias com o 1ivrq. çai^a“ ^eoj^issjlm bastantevípittoresco.. «El*» muito curioso
por deante. Mas o livro é sobretudo po­ nos episodios ás vezes minimós que
lítico . Reunião de trechos dispersos, reconta com chiste e até trocadilhò: o en
escriptos em varias épocas — dos úl­ ciumento de Canah£a, as mulheres de mt
timos annos da monarchia, aos primei­ Igaraçu e do Rio de Janeiro, os pre­ P&
ros do seculo X X — está um tanto parativos para a conquista da Para-
alongado de nós pelo assumpto. A Re­ Jhyba, a saudade de Thomé de Sousa, a
volta, o Ensilhamento, o Acre, o Codi- fundação do Rio de Janeiro, e outros
go Civil, aindax tftão nos interessam muitos. .. v f"
como historia e já não nos interessam São preciosos os tès*temunhos de
como vida. Cairam no purgatorio de chronistas ingênuos como este, que~^es*
hontem, de que sõ o tempo os resga­ ro
crevem o que vêm e o què sa*bem, sem

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tará. De todas as questões que solici­ fr
prevenpões nem apologias tendeii-
tam ò estylete acèrado de Martim ciosas.
Francisco, a mais remota, sem duvida, •

é a “ separação de S. Paulo”. Aliás, o T. de A . tr


autor tem o bom gosto de dizer: —~ ta
“ Quanta despesa de logica mereceu) Jbtà? MEMENTO BIBLIOGRA- ti
trinta annos. uma idéa que a marcha PHIOO
dos acontecimentos transformou, de
respeitável que era, em faceta que é - - A G R ÍC Ü tT Ü R A : E CRIAÇAO
a Sr^aTação S. Paulo” . Delgado de Carvalho -— Questões
Martius, confirmáudo a opinião una de avicultura. Respondendo cônsul*',
nime dos observadoíes, attribuia aos tas. “ J o r ia l do Com m ercio” , Rio,
paulistas: “ grande franqueza, coragem 1919, 62 pgs.
inquebrantavel, avidez romanesca de . V1- GUERRA
perigosas - aventuras, iracundia, vin­ Fernand Roches — *' Manuel des
g a n ç a rancorosa, orgulho e dureza”. Origines de la Guerre. Avec tin ta-
O seu orguMio, “ prosegue”, póde ser bleau synçnròriique. Pref. du prófès-
desculpado unicamente pela circum- seur Lapradelle. 1 vol. in 16. jÔoS-
stancia de poder vangloriar-se o pau­ sard. Paris, 1919. 6.6 0.
lista dos seus legitimos direitos a esta — - Livro imparcial, e cuidadosa­
parte do novç mundo, creada pelos fei mente félto. Muito exacto e còmmen-
tos dos seüs antepassados”. Martim tado. Indispensável pára a historia
Francisco não é só romano, é mais que da guerra. .
tudo, pauíista. ' — Morgenthán —— Mémoires de
Pessimista por principio, o autor TAmbassadeur Morgenthán. 1 vol.

guntai>l-lh*o. Não acha m elhor? . . . parte de minha vida para que me


— Que fará ella quando nós deixasseba deitar, vestido de Véspera*
não ^estivermos aqui, P eggotty? — v e já calçado com as minhas botas
tornei pensativamente, apoiando os de v ia g e m .
dois pequenos cotovel^os sobre a me­ E ’ com profunda e^moção, não ob­
sa como para dar mais “for^a a stante “a apparente leviandade com
minha interrogação -— ella não póde que a tudo isso me refiro, que :re-
ficar sosinha. lembro a alegria transbordante com
O buraco que Peggotty se poz su­ que deixei a casa onde fôra então tão
bitamente a procurar na meia que inconscientemente feliz, mal sabiá
remendava devia ser tão insignifi­ eu, naquelle momento, tudo o que
cante que imagino não valesse a pe­ para sempre ia deixar. > *
na con certal-o. Apraz-m e: recordar, quando o car­
— Ella não póde f ic a r ' sosinha ro parou deante da porta e qtie
Peggotty; como ha de ser? minha mãé me abraçava, as iagri-
---- Deus abençôe a innocencfa! — mas de ternura reconhecida qu <6 der­
suspirou Peggotty, levantando o re­ ramei, reconhecimento a ella, minha
mendo os olhos muito brilhantes ---- unica adoração, e á velha casa que
ella vai passar quinze dias em casa tantos annos nos abrigara tão estrei­
de mistress Grayper e mistress Gray- tamente unidos e da qual nunca me
per vai hospedar muita g en te. havia apartado.
.D esde que assim era, estava dis­ Apraz-me recòVdar que minha
posto a partir im m ediatam ente. E s­ mãe chorava tambem e eu sentia,
perei com mais ardega impaciência o apertado riòs seus braços dilectoS,
regresso de minha mãe v que, como bater-lhe emocionadamente contra o
sempre, jantara com m ^ s. Grayper, meu, o seu terno coração.
afim de ter uma respofeta que nos Apraz-m e recordar, que quando o
permittisse por em execução o nosso carro se poz, em marcha, minha mãe
bello projecto. Minha mãe adm irou- saiu correndo até a porta e fel-o
se muito menos do que eu pensara parar para me beijar ainda uma vez*
da idéa de Peggotty e accedeu sem Apraz-m e rêcordar o inexpriiriivei
relutância. carinho daquelle ultimo b eijo .
Tudo ficou determinado rio mesmo E lla ficou de ypé, banhada em
instante, dopois de terem convido o pranto, sósinha no meio da estra­
que se pagaria pela minha hospeda­ da . . . Seus cabellos louros, brilha
gem e alim entação. vam ao ^pol como o ouro e mrs. M urd-
O dia da nossa partida chegou de­ stone* que, não sei por que, se acha­
pressa . va presente, approximoú-ae delia. Pa­
H aviam -no escolhido tão proximo receu-me que elle lhe exprobàra a
que chegou depressa, mesmo para com m oçâo.
mim que o aguardava com febril im ­ Lancei-lhe, através do gradeado
paciência, receiando que um tremor da carroça, um olhar de odio, ^per­
de terra, a erupção de üm vulcão ou guntando-m e o que tinha elle a ver
qualquer outra grande convulsão da com iáto.
natureza viesse atravessar-se o. des- Peggotty, que ostensivamente vi-
truidorahiente entre os nossos “ pla­ rara a cabeça, não gostãra tambem
n os. de vel-o" a li. Comprehendi -0 perfei­
Deviamos fazer a viagem no cárrò tamente pela expressão offendida da
de um carroceiro que partia pela
manhã, depois do alm oço. ( Contínua)
3 *eria dado de bom grado grande • • ; ‘ I

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