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Contribuições do ECOM (Encontro de Comunicação Marista)

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Expediente

Província Marista do Rio Grande do Sul


Rede Marista de Educação e Solidariedade
Presidente e Provincial – Ir. Inácio Etges
Conselheiros – Irmãos Gilberto Zimmerman Costa
(Vice-Provincial, Vice-Presidente), Arlindo Corrent, Lauro
Hochscheidt, Onorino Moresco, Pedro Ost e Sandro Bobrzyk
Assessora da Presidência – Elaine Strapasson Faccin

Assessoria de Comunicação e Marketing


Coordenadora – Rosângela Florczak
Vice-Coordenador – Alexander Goulart
Núcleos
Criação – Lidiane Amorim (coordenadora),
Eric Bauer, Márcio Bertuol, Luíza Zaccaro.
Conteúdo – Marcelo Cordeiro (coordenador),
Alexander Goulart, Katiana Ribeiro, Roberto Winck
Web - Cleber Colares (coordenador), Antônio Melchíades
dos Santos
Atendimento – Diego Wander Silva (coordenador), Marciane
Görlach, Larissa Lofrano Souza

A Comunicação nas Organizações Educacionais –


Contribuições do ECOM (Encontro de Comunicação Marista)
CMC | 2011
Organizadoras – Lidiane Amorim e Rosângela Florczak
Supervisão Editorial – Marcelo Cordeiro
Projeto Gráico - Márcio Bertuol
Editoração – Roberto Winck
Revisão – Ir. Salvador Durante

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Encontro de Comunicação Marista


A comunicação nas organizações educacionais : contribuições do ECOM :
Encontro de Comunicação Marista / Lidiane Amorim e Rosângela Florczak
organizadoras. – Porto Alegre : CMC, 2011.
111 p.

1. Educação. 2. Comunicação. I. Amorim, Lidiane R. (Org.). II. Florczak,


Rosângela (Org.).

CDU 007:37

Bibliotecária responsável: Cássia Viviane Cunha Selbach – CRB10/1423


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espaço e dedicaram talento e tempo à construção da
proissionais de comunicação que passaram por esse
Nosso agradecimento especial, também, a todos os
que muito contribuiu com a consolidação da assessoria.
criador da Ascomk e do ECOM, e ao Ir. Dionísio Rodrigues,
Dedicamos esta publicação ao jornalista Joadir Foresti,
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Apresentação
dos autores

Alexander Goulart – Jornalista, é Vice-Coordenador da Assesso-


ria de Comunicação e Marketing da Rede Marista do Rio Grande do Sul.
Mestrado (2004) e Doutorado (2007) em Comunicação Social pela
PUCRS. Possui MBA em Gestão Educacional pela Fundação Getúlio
Vargas (2010). Foi Vice-Diretor do Colégio Marista Assunção, em Porto
Alegre (2007-2008). Atuou como docente na UFRGS (2007).

Cleusa Scroferneker – Doutora em Ciências da Comunicação


pela USP. Mestre em Planejamento Urbano e Regional pela PUCRS e
Graduada em Comunicação Social e em Geograia Licenciatura pela
mesma universidade, com bacharelado pela UFRGS. Atualmente é
professora titular da PUCRS. Tem experiência na área de Comuni-
cação, com ênfase em Relações Públicas, e atua principalmente nos
seguintes temas: comunicação organizacional, relações públicas, co-
municação, organizações e universidade.

Diego Wander Silva – Mestrando do Programa de Pós-Gradua-


ção em Comunicação Social (PPGCOM), da PUCRS, na linha de pes-
quisa Práticas proissionais e processos sociopolíticos nas mídias e na
comunicação das organizações. Possui graduação em Comunicação
Social, habilitação Relações Públicas, pela Faculdade de Comunicação
Social (Famecos/PUCRS). Pesquisa sobre o uso e a inclusão das redes
sociais no contexto da comunicação organizacional digital das univer-
sidades brasileiras e atua na Assessoria de Comunicação e Marketing
(Ascomk) da Rede Marista do Rio Grande do Sul.

Eugênia Mariano da Rocha – Doutora em Comunicação pela


UFRJ, professora titular e coordenadora do Programa de Pós-Gradu-
ação em Comunicação da UFSM. Publicou 40 artigos em periódicos
especializados. É autora de quatro livros e 16 capítulos. Sua produção
cientíica centra-se na área de comunicação institucional, comunica-
ção e cultura, comunicação midiática, estratégias de comunicação,
comunicação organizacional e processos comunicacionais.
Fernanda Laguna – Pós-graduanda em Planejamento de Comu-
nicação e Gestão de Crise de Imagem pela PUCRS. Possui graduação
em Comunicação Social, habilitação em Jornalismo, pela Faculdade de
Comunicação Social (Famecos/PUCRS). É assessora de Comunicação
do Colégio Marista Assunção.

Heloísa Lück – Doutora em Educação pela Columbia University


em Nova York, com pós-doutorado em pesquisa e ensino superior
pela George Washington University, em Washington D.C. É direto-
ra educacional do Centro do Desenvolvimento Humano Aplicado, em
Curitiba, atuando como conferencista e docente em cursos de capa-
citação para sistemas estaduais e municipais de ensino e instituições
de ensino superior. Publicou nove livros pela Vozes Editora e um livro
pela Editora Positivo, em parceria com a Fundação Lemann.

Lidiane Amorim – Doutoranda em Comunicação pela PUCRS,


Mestre em Comunicação pela mesma universidade e graduada em
Comunicação Social, habilitação Jornalismo, pela UFSM. Atualmente
atua proissionalmente na Assessoria de Comunicação e Marketing
da Rede Marista do Rio Grande do Sul, coordenando o Núcleo de
Criação. Pesquisa principalmente nos seguintes temas: comunicação
organizacional, complexidade, telejornalismo participativo, recepção.

Luiz Carlos A. Iasbeck – Doutor em Comunicação e Semiótica


- PUC/SP, pesquisador associado adjunto - FAC/UnB. Professor de
Comunicação na UPIS-DF e UCB. Possui graduação em Comunica-
ção Social, habilitação em Jornalismo, pela UFJF (1975), mestrado
em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP (1993) e doutorado em
Comunicação e Semiótica pela mesma universidade (1997). Atual-
mente é professor titular no Programa de Pós-Graduação, Mestrado
em Comunicação, da UCB, na linha de pesquisa comunicação orga-
nizacional, professor de cursos de pós-graduação lato sensu em Co-
municação Organizacional, Assessorias de Comunicação e Ouvidoria
e coordenador do Grupo de Pesquisa em Ouvidoria pelo CNPq. Tem
experiência na área de comunicação, com ênfase em semiótica, atu-
ando principalmente nos seguintes temas: comunicação, semiótica,
cultura, comunicação empresarial e publicidade.

Marcelo Cordeiro – Mestrando do programa de Pós Graduação


em Administração da UFRGS, é graduado em Comunicação Social, ha-
bilitação em Relações Públicas, pela UFSM e possui pós-graduação em
Gestão de Pessoas e Marketing pela UNIFRA. Foi colaborador da Escola
Marista Santa Marta, entre 2005 e 2007. Atua como Coordenador do
Núcleo de Conteúdo na Assessoria de Comunicação e Marketing da Rede
Marista do Rio Grande do Sul.

Rudimar Baldissera – Doutor em Comunicação Social pela


PUCRS (2004) e mestre em Ciências da Comunicação/Semiótica pela
Unisinos (1999). Vice-Presidente da Abrapcorp (2010-2012). Possui
graduação em Relações Públicas pela UCS (1989), especialização em
Gestão de Recursos pela Unisinos (1997). Atualmente é professor
adjunto do Departamento de Comunicação – Faculdade de Bibliote-
conomia e Comunicação – e professor e pesquisador do Programa de
Pós-Graduação em Comunicação e Informação da UFRGS. Tem expe-
riência na área de comunicação atuando principalmente nos seguin-
tes temas: comunicação, relações públicas, comunicação pública, es-
tratégia, comunicação organizacional, identidade, imagem-conceito,
cultura, relações de poder e comunicação turística.

Rosângela Florczak – Mestre em Comunicação pela PUCRS, pos-


sui especialização em Sociologia pela UFRGS e graduação em Comu-
nicação Social - Jornalismo pela UFSM. Atualmente exerce o cargo
de Diretora do Centro Marista de Comunicação e Coordenadora de
Comunicação e Marketing da União Sul Brasileira de Educação e Ensino
(USBEE) e da Sociedade Meridional de Educação (SOME), mantenedo-
ras da Rede Marista do Rio Grande do Sul. Pesquisa o sistema e os pro-
cessos de comunicação organizacional e o lugar da comunicação nos
sistemas de gestão das organizações, especialmente das educacionais.

Tiago Rigo – Especialista em Marketing Estratégico pela ESPM. Pos-


sui graduação em Comunicação Social, habilitação em Jornalismo, pela
UPF. Atua como Assessor de Comunicação do Colégio Marista Rosário.
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Sumário

Apresentação
Conhecimento a compartilhar ................................................. 11

Apresentação do tema
A comunicação nas organizações educacionais.......................... 13

Gestão educacional e o desaio da comunicação


Heloísa Lück ........................................................................ 19

Comunicação em rede: um conjunto de nós


Luiz Carlos Assis Iasbeck ....................................................... 25

Comunicação interna – todos querem, poucos fazem


Cleusa Scroferneker ............................................................. 39

Comunicação, identiicações e imagem


nas instituições educacionais
Rudimar Baldissera ............................................................... 51

A construção da visibilidade e a legitimação


das instituições na contemporaneidade
Eugênia Mariano da Rocha Barichello....................................... 61

Públicos, mensagens e produção de sentido


Lidiane Ramirez Amorim ........................................................ 67

Apontamentos sobre comunicação e gestão de crises


Rosângela Florczak ............................................................... 79

Comunicação e exposição nas redes sociais: diálogos com


estudantes e famílias maristas
Diego Wander Silva, Fernanda Laguna e Tiago Rigo ................... 89

A Comunicação na Gestão do Planejamento Estratégico na


Rede Marista de Educação
Marcelo Cordeiro .................................................................. 97

Comunicação e Gestão Educacional


Alexander Goulart................................................................105
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Apresentação
Conhecimento a compartilhar

Atuamos e reletimos sobre o que desenvolvemos em nosso espaço


de trabalho, gerando, assim, novos jeitos de atuar. É a partir do princí-
pio de uma prática relexiva que a Assessoria de Comunicação da Rede
Marista do Rio Grande do Sul tem se posicionado, desde a sua criação
em 2002, buscando, de forma sistematizada e iluminada pelas teorias,
atuar e, concomitantemente, gerar novos conhecimentos. Mais do que
produzir boas campanhas, projetos, ações e peças de comunicação,
buscamos contribuir para ampliar o conhecimento da grande área de sa-
ber na qual estamos inseridos, que é a da comunicação. Dentro dela, da
subárea da comunicação nas organizações e, na especiicidade da insti-
tuição a que atendemos, a comunicação nas organizações educacionais.
Em quase 10 anos de trabalho, inúmeros proissionais atuaram e
continuam atuando no espaço da Assessoria, em tempos diferentes.
Cada um deles contribui para ampliarmos um pouco mais o olhar,
descobrirmos novos ângulos e possibilidades de estudo e incremento
de nossas práticas. Vindos de campos diversos, publicitários, jorna-
listas, relações-públicas, analistas de sistemas, entre outros, aceitam
o desaio de trabalhar pensando e pensar trabalhando, plenamente
conectados com o sentido maior do trabalho que desenvolvem.
É preciso pontuar, entretanto, que uma área ou setor não é uma
ilha dentro de uma organização e que é muito difícil tecer aprendizados
relevantes em um sistema fechado. É na interação cotidiana com os su-
jeitos que atuam como acionistas1, gestores educacionais, professores,
estudantes, entre outros, que o conhecimento de comunicação efetiva-
mente se conigura e assume relevância e pode ser compartilhado.

1 A Assessoria de Comunicação é parte da estrutura administrativa da Província Marista do Rio Grande


do Sul, instituição confessional católica administrada pelos Irmãos Maristas. Com foco em educação, a
Rede Marista no Rio Grande do Sul responde por um grande conjunto de escolas de educação básica,
centros sociais, ensino superior e saúde.

Apresentação – 11
Outro conjunto de sujeitos fundamental na interação provocada e
provocadora da Assessoria é o meio acadêmico. A crença de que a in-
terlocução mercado-academia é fundamental para o desenvolvimen-
to de novos cenários impulsionou o movimento de busca e encontro
dos proissionais de comunicação da Ascomk com pesquisadores e
professores de cursos de pós-graduação em comunicação. Mais do
que produtivo, o diálogo gerou formação continuada dos proissionais
e multiplicou as possibilidades de conhecimento para todo o grupo.
Além dos espaços tradicionais deste encontro, muitos outros foram
criados, como o Encontro Marista de Comunicação (ECOM)2 que, a
cada dois anos, coloca frente a frente, os três grupos de interesse:
proissionais de comunicação, gestores educacionais e pesquisadores
da área, com tempo privilegiado para dedicar-se ao debate do tema.
Mais do que a aplicabilidade imediata do conhecimento produzido,
é preciso pensar que ele deve transcender muros. Como um bem in-
tangível, sabemos que ao ser partilhado, o saber sempre se multiplica.
É, pois, este o principal propósito da publicação que agora está em
suas mãos. Reunimos aqui a produção de proissionais da Assessoria
de Comunicação e de pesquisadores que nos ajudam em relexões
importantes, a maioria delas feita no espaço do ECOM. Esperamos
que os textos publicados sejam do interesse de todos os interlocu-
tores envolvidos no diálogo que viemos propondo na última década:
proissionais de comunicação, pesquisadores e gestores educacionais.
Aqui partilhamos, para multiplicar o interesse e a compreensão que
ousamos exercitar a cada dia como apaixonados pela comunicação nas
organizações educacionais.

Boa leitura
Lidiane Amorim e Rosângela Florczak

2 O Encontro de Comunição Marista (ECOM) teve sua primeira edição em 2001 e ocorreu anualmente
até 2007. De lá pra cá, passou a ter periodicidade bianual.

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Apresentação do tema

A comunicação nas organizações educacionais


Rosângela Florczak

A priori e conceitualmente, a comunicação pode ser compreen-


dida por sua dimensão normativa ou por sua dimensão funcional
(WOLTON, 2006). Enquanto a primeira remete ao ideal do diálogo, da
intercompreensão, da convivência e, portanto, do outro e das rela-
ções, a segunda diz respeito à necessidade de permutar informações
permanentemente. É claro que no viver, no cotidiano de pessoas e
organizações, ambas se mesclam constantemente.
Compreendemos que, nas organizações educacionais, e para dar
conta de um processo de aprendizagem e de formação de sujeitos,
da busca pelo desenvolvimento de pessoas e de suas identidades,
é de grande relevância trabalhar o tema da comunicação humana,
ou seja, normativa, ou ainda relacional. Na complexidade do tempo
vivido, é preciso extrapolar a mera transmissão de informações e nos
situarmos no tenso espaço das relações, da coniança e do vínculo.
“Informar, expressar-se e transmitir não são mais suicientes para
criar uma comunicação” (WOLTON, 2006, p.31).
É de Lück (2006), a airmação de que a interlocução e o diálogo
assumem grande relevância na gestão educacional3, pois a participa-
ção é uma exigência vinculada à interação entre as dimensões políti-
ca e pedagógica na condução dos destinos e das ações das organiza-
ções educacionais. Isso que nos remete diretamente à comunicação.
Freitas (2004) reforça que a comunicação é apontada como poder

3 Gestão educacional corresponde ao processo de gerir a dinâmica do sistema de ensino [...] e de


coordenação das escolas em especíico, ainado com as diretrizes e políticas educacionais públicas,
para a implementação das políticas educacionais e projetos pedagógicos das escolas, compromissado
com os princípios da democracia e com métodos que organizem e criem condições para um ambiente
educacional autônomo (soluções próprias no âmbito de suas competências) de participação e compar-
tilhamento (tomada conjunta de decisões e efetivação de resultados, autocontrole (acompanhamento
e avaliação com retorno das informações) e transparência (demonstração pública de seus processos
e resultados) (LÜCK, 2006, p.36).

Apresentação do tema – 13
para facilitar a cooperação, a credibilidade e o comprometimento com
valores, portanto, para a criação de um universo comum comparti-
lhado, espaço no qual o entendimento poderá prevalecer diante dos
riscos da incomunicação.
Para que a comunicação aconteça, embora se saiba que no hori-
zonte das relações organizacionais é permanente a presença do risco
da incomunicação, parte-se da questão central que é o outro. O ou-
tro que aqui assume o lugar de interlocutor. E como airma Wolton
(2010), é aí que tudo se complica.

Ontem, a comunicação era hierárquica, quase sempre


limitada à transmissão, sem possibilidade de discussão
de parte do receptor/ator. Hoje, quase todo mundo está
em pé de igualdade, negocia e responde. [...] O reco-
nhecimento do estatuto do receptor perturba tudo, pois
legitima a questão da alteridade (WOLTON, 2010, p. 59).

Tendo como pressuposto um contexto democrático, Lück (2006,


p.36) defende que a gestão da escola implica a participação responsá-
vel de todos os membros da sociedade civil e da comunidade escolar
em vários âmbitos das decisões necessárias e da sua efetivação. A
autora airma que a exigência de participação na tomada de decisões
está vinculada à interação entre as dimensões política e pedagógica
na condução dos destinos e das ações das organizações educacionais.
Hutmacher (1992) destaca que na gênese da organização escolar
encontra-se o surgimento da ordem racionalizadora de controle. Ao
citar as experiências do Colégio de Genève (1559) e de nomes ex-
pressivos da educação confessional, como Calvino, Loyola e J.B. La
Salle, ele sustenta que a organização da atividade surgiu claramente
sob o modelo de organização burocrática com a nítida noção de auto-
ridade e da regulamentação das atividades de professores e alunos.
Hutmacher alerta: “[...] a história da escola revela uma tensão es-
trutural permanente entre a vontade de controle racionalizador das
práticas de ensino e o caráter relativamente incerto e imprevisível
dos acontecimentos educativos” (HUTMACHER, 1992, p.61). Apesar
disso, o modelo burocrático prevaleceu e ainda marca, fortemente, a
cultura de organizações como escolas e universidades.
O modelo que ainda permeia o universo simbólico dos sujeitos das
organizações educacionais torna raras as ocasiões em que há igualda-
de e reciprocidade entre os interlocutores na comunicação de escolas,
universidades e sistemas de ensino. A organização educacional, assu-

14 – Rosângela Florczak
mindo o lugar4 da autoridade, transmite informações aos estudantes,
familiares e comunidade; o professor, também assumindo a condição
de autoridade, transmite mensagens aos estudantes, e assim suces-
sivamente. Dessa forma, a convivência ou coabitação entre diferentes
lógicas e interesses é comprometida. Para Wolton (2010), a coabitação
é um paradigma do século XXI e é indissociável de três realidades:
“[...] a democracia, a abertura e a interação (Ibidem, p. 60).
Compreende-se assim que é preciso assumir a incomunicação
como realidade presente e risco constante nas organizações educa-
cionais e nas relações entre os sujeitos que protagonizam o processo
e o entorno das situações de aprendizagem. É a partir da tomada
de consciência dos riscos que estabelecemos estratégias5 para poder
avançar e descortinar as possibilidades de comunicação, muito além
daquelas que estão presentes na dimensão instrumental. Ou seja, a
transmissão de mensagens, de informações, a partir de um lugar de
autoridade, direcionadas a públicos de interesses aparentemente he-
gemônicos não representa o comunicar de uma organização educa-
cional. Transcender e incluir novas dimensões possíveis no processo
de convivência/coabitação assume o caráter de condição imprescin-
dível para evitar que a incomunicação prevaleça.
A comunicação vem sendo assumida como uma nova área técnica
nas organizações educacionais em pleno momento de desconforto
e de mudança de modelos e, talvez até, mudança de paradigmas.
Oicialmente ocupa espaços privilegiados junto ao poder de decisão,
mas ainda não está plenamente compreendida, portanto, não incluí-
da com seu potencial de intervenção e transversalidade. A receptivi-
dade de um projeto ou de uma estratégia de comunicação de caráter
mais abrangente, baseado no diálogo e não apenas na transmissão,
ainda é vista com alguma (in)segurança e/ou (des)coniança.
De maneira geral, prevalece, ainda, nas organizações o viés uti-
litarista e instrumental (SCROFERNEKER, 2006) da comunicação, o
qual tem seus objetivos voltados para a medição e controle. Assim, a
comunicação como ciência/saber encontra lugar e sentido na gestão

4 [...] sendo a porção do espaço apropriável para a vida, que é vivido, reconhecido e que cria/possui
identidade. Tem densidade técnica, comunicacional, informacional, normativa e, por que não, educa-
cional. O Lugar é, em sua essência, produção humana, visto que se produz e reproduz na relação entre
o espaço e a sociedade (CASTROGIOVANNI, 2006, p. 87).

5 Para a Teoria da Complexidade, de Edgar Morin, a ideia de estratégia é oposta à de programa. Um


programa é uma sequência de ações predeterminadas, que deve funcionar nas circunstâncias que
permitem o seu cumprimento. Se as circunstâncias externas não forem favoráveis, o programa cessa
ou fracassa. A estratégia elabora um ou vários cenários. Desde o início, há uma preparação para o
novo ou inesperado, para integrar, modiicar ou enriquecer a ação.

Apresentação do tema – 15
da organização educacional. É fundamental, contudo, que a comu-
nicação transcenda o modelo instrumental, de transmissão. Supere,
porém, incoporando-o, ou seja, assuma seu caráter multidimensio-
nal. Para que isso aconteça, é preciso admitir que o lugar da comuni-
cação é transversal, ou seja, perpassa, impregna e se deixa impreg-
nar pela contextualização dos conceitos observando os diferentes e
múltiplos vieses na apreensão da complexidade dos fenômenos e dos
objetos observados (MARTINAZZO, 2004).
A comunicação conquistará um novo lugar no contexto organiza-
cional se for compreendida, também, pela possibilidade relacional.
Em relação dialógica com a gestão educacional, poderá contribuir na
produção de sentido dos novos elementos que se incorporam ao uni-
verso educacional, no estabelecimento e na manutenção do diálogo
imprescindível entre os interlocutores internos (pedagógico, admi-
nistrativo), assim como nas negociações com os interlocutores inais
(estudantes, familiares e comunidade/sociedade), buscando o com-
partilhamento de conhecimento e de vivências que poderão produzir
o saber especíico para cada organização educacional (quadro 1) e
promover a coabitação das diferenças de interesses.

● Interlocução “sincera”
Escuta ativa ● Canais
● Posicionamento e ● Ações
abertura para falar ● Meios
e justificar ● Peças
● Atribuições de sentido ● Linguagens
ao que se quer
comunicar
● Compreensão de
contexto e das Dimensão Dimensão
dimensões ou não Relacional
do que deve ser Instrumental
entendido
● Comunicação
para liderança

Dimensão Dimensão
Mercadológica/ pedagógica
sustentabilidade

● Conhecimento ● Apoio nas


das necessidades relações
do público de ensino
● Gestão das aprendizagem/
necessidades gestão do
● Relacionamento conhecimento
produtivo

Quadro 1 - Fonte: FLORCZAK, R., 2010

16 – Rosângela Florczak
Referências bibliográicas

CASTROGIOVANNI, A. C. A complexidade do espaço geográico esco-


la: lugar para estudar ou entre-lugar para turistiicar?. In: Cadernos
do Aplicação (UFRGS), 2006, vol. 19.

LIBÂNEO, J. C.; SANTOS, A. As teorias pedagógicas modernas revisi-


tadas pelo debate contemporâneo. In: Educação na era do conheci-
mento em rede e transdisciplinaridade. Campinas, SP: Alínea, 2005.

LÜCK, H. Gestão educacional: uma questão paradigmática. Petrópo-


lis: Vozes, 2006.

MARTINAZZO, C. J. A utopia de Edgar Morin: da complexidade à con-


cidadania planetária. Ijuí: Unijuí, 2004, 2 ed.

MORIN, Edgar., ROGER, C. E. & MOTTA, Raul D. D. Educar na era


planetária: O pensamento complexo como método de aprendizagem
pelo erro e incerteza humana. São Paulo: Cortez e UNESCO, 2003.

SCROFERNEKER, C. M. A. Trajetórias teórico-conceituais da Comuni-


cação Organizacional. In: Revista Famecos - mídia, cultura e tecnolo-
gia. Porto Alegre: dezembro 2006.

WOLTON, D. É preciso salvar a comunicação. São Paulo: Paulus, 2006.

_________. Informar não é comunicar. Porto Alegre: Editora Sulina,


2010.

Apresentação do tema – 17
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Gestão educacional e o
desaio da comunicação
Heloísa Lück6

A realização dos objetivos de toda organização de trabalho está


assentada sobre o processo de comunicação, em especial a escola,
cujo processo educacional é essencialmente um processo de comu-
nicação. Isso posto, a efetividade da escola não ocorre dissociada
da qualidade de seu processo de comunicação, uma vez que este se
constitui em elemento chave do desenvolvimento humano, da apren-
dizagem e dos processos sociais (Patton e Gifin, 1989). Por conse-
guinte, assume a natureza da comunicação, tanto como objeto de
desenvolvimento educacional quanto como instrumento especial do
trabalho educacional e da liderança na gestão escolar.
Por conseguinte, a comunicação constitui-se em importante área
de atenção dos gestores escolares, a quem compete manter sua
constante observação e cuidado, e adotar perspectivas de melhoria
contínua do processo de comunicação na escola e melhoria de seu
desempenho para a realização desse trabalho, pelo desenvolvimento
de competências de intervenção proativa a respeito. Do contrário,
como podem inluenciar positivamente o desempenho de pessoas
que participam do fazer pedagógico da escola, tal como é necessário
que façam?
Sabe-se que o desenvolvimento do ser humano se promove
em associação com sua capacidade de comunicação. Porém, nem
sempre este desenvolve as habilidades de comunicação necessá-
rias para a atuação eiciente e eicaz nos diversos contextos de que
participa. Veriica-se, por exemplo, que, muitas vezes, os prois-
sionais embora detenham excelentes conhecimentos e habilidades

6 Diretora Educacional CEDHAP – Centro de Desenvolvimento Humano Aplicado (www.cedhap.com.br),


Heloísa Lück proferiu a palestra de abertura do 8º ECOM, em 2009. O presente artigo foi produzido
pela autora a partir dos tópicos da palestra.

Gestão educacional e o desaio da comunicação – 19


técnicas a respeito de seu trabalho, pecam por falta de habilidades
de comunicação, deixando, em consequência de produzir os resul-
tados a que se propõem.
Com esse foco em mente e como contribuição e apoio à com-
preensão dos desaios da comunicação na escola, este artigo analisa
desdobramentos do processo de comunicação.

O signiicado e papel da comunicação na escola

O termo “comunicação” vem do latim “communis” que signiica


“comum”. Vale dizer que, pela comunicação, isto é, pelo processo de
troca de informações, ideias, expectativas, opiniões, conhecimentos,
signiicados, um entendimento comum pode ser construído, possibi-
litando o entendimento de questões vivenciadas em comum e o es-
tabelecimento de unidade de propósitos e ações, e de sinergia entre
as pessoas, de modo que maximizem em conjunto seus esforços, em
vez de pulverizá-los em ações desencontradas.
Todos os sistemas sociais necessitam de comunicação, a im de
que signiicados sejam transmitidos e construídos, de que informa-
ções sejam repassadas e trocadas, de modo que diferentes pessoas,
individualmente ou em diferentes grupos, setores, escolas e segmen-
tos da sociedade possam integrar esforços pelo bem comum e de-
senvolvimento conjunto. A comunicação, portanto, é processo funda-
mental de toda organização social e do relacionamento interpessoal,
afetando de maneira indelével e signiicativa os seus resultados.
Uma escola é constituída por uma rede de comunicações que se
desenvolve a partir das ações, comportamentos e gestos das pes-
soas, como por suas palavras faladas e escritas. Essa rede pode ser
saudável e eicaz, como pode ser inadequada e limitada, dependendo
da clareza que as pessoas tenham sobre esse processo, como tam-
bém das habilidades pessoais e sociais relacionadas a ele. Deixá-la
luir naturalmente, sem atenção especial, representa deixar que as-
pectos desfocados, aleatórios, desprovidos de orientação educacional
e formativa, e muitas vezes negativos, nela ocorram e impregnem a
cultura organizacional da escola.
Portanto, a responsabilidade pela gestão da escola representa,
também, o encargo e zelo pela qualidade do processo e rede de co-
municação que ocorre na comunidade escolar, de modo a orientá-la,
a im de que represente fenômenos socioeducacionais positivos, con-
dizentes com o ideário e propósitos educacionais condizentes com a
qualidade de formação dos alunos.

20 – Heloísa Lück
Por conseguinte, a comunicação é central ao processo de gestão
e liderança, sendo inerente a ele, uma vez que gestão se constitui
em processo de mobilização de pessoas para a realização de objeti-
vos (Lück, 2011) e essa mobilização envolve diferentes processos de
comunicação. Ela compreende muitas nuances e sutilezas, que de-
mandam atenção especial, competências diferenciadas e percepção
objetiva e clara, a im de se observar os aspectos necessários para o
seu exercício efetivo e competente.
Dentre essas nuances e sutilezas destacam-se a seleção e in-
terpretação de palavras, movimentos, sons, imagens, sinais, atos,
e demais manifestações que ocorrem nos processos de interação,
inluência, informação, ativação de emoções, ativação do pensamen-
to e construção de conhecimentos e feedback, que fazem parte do
processo educacional. Essas questões que fazem parte do processo
educacional, caso não sejam orientadas por um processo sistemático
de gestão, terão sua energia dispersa e até mesmo se expressando
de forma contrária aos objetivos educacionais, tal como ocorre no
contexto de muitas escolas, infelizmente. É o que se observa em
escolas cuja cultura organizacional se distancia signiicativamente da
cultura educacional (Lück, 2010).
A comunicação e seu inerente processo de feedback estabelecem
as perspectivas de relacionamento entre pessoas, num movimento di-
nâmico de ação – construção de signiicados – ação. A partir desse
entendimento, depreende-se que a comunicação, como processo de
construção de signiicados, é o que existe de mais essencial e estru-
turante do fazer humano em qualquer área de atuação humana, em
especial, a da educação. Nela, a gestão da comunicação ao mesmo
tempo focaliza os processos existentes visando à sua qualidade e coe-
rência com o ideário e objetivos educacionais, como também a utiliza
como instrumento do processo educacional e de gestão.
Conclui-se, portanto, que a comunicação é uma estratégia de
gestão, e a gestão é uma estratégia de comunicação pela qual o ges-
tor promove, dentre outros aspectos:
• A integração dos diversos públicos internos da instituição;
• A criação da identidade institucional e da identidade de todos como
membros dessa instituição;
• A integração da instituição com a comunidade externa;
• A formação de espírito de equipe;
• O fortalecimento de vínculos entre os diferentes públicos;
• A unidade de foco de atuação de todos os proissionais da escola;
• A busca de maior efetividade institucional.

Gestão educacional e o desaio da comunicação – 21


A atenção do gestor escolar no processo de comunicação

O gestor escolar interessado em realizar um bom trabalho e en-


volvido nos processos socioeducacionais da escola, por conseguinte,
observa continuamente o processo de comunicação que cria por sua
atuação, e o que se desenvolve na escola. Desse modo, atua para o
fortalecimento dos princípios educacionais e da rede de relações e
comunicação que estejam focados naqueles princípios. Dentre ou-
tros aspectos, compete-lhe reletir sobre questões diversas, como
por exemplo:

• Que signiicado atribui ao processo de comunicação?


• Que importância dá a ele?
• Quais as suas observações a respeito do processo de comunicação
em sua escola?
• Quais as características principais desse processo? Como ocorre?
Quais seus aspectos favoráveis e quais suas limitações?
• Que ações e medidas têm sido adotadas na sua escola para melho-
rar o processo de comunicação?
• Como o gestor pode contribuir para melhorar o processo de comu-
nicação na sua escola como um todo?
• Que medidas deve adotar para melhorar o próprio processo de co-
municação?

Para nortear a realização desse trabalho, é importante que, dentre


outros aspectos, seja capaz de:

• Reconhecer a diferença entre comunicação e informação e o papel


de cada uma na gestão escolar.
• Compreender a transferência de signiicados nos processos de co-
municação.
• Compreender estilos e formas de comunicação e a sua expressão
na realidade escolar.
• Conhecer características e processos de comunicação.
• Analisar as disposições pessoais em relação a essas características
e processos.
• Exercitar habilidades de comunicação de ajuda e orientação do de-
senvolvimento humano.
• Estabelecer orientações pessoais para o exercício da comunicação
de ajuda na escola, como parte do processo de gestão.

22 – Heloísa Lück
Nesse processo é fundamental que o gestor reconheça que grande
parte dos problemas organizacionais da escola, como divergências,
tensões, conlitos e falta de efetividade no trabalho, são resultantes
de diiculdades de comunicação, como por exemplo: insuiciência de
informações, ou sua inconsistência ou incoerência, falta de credibilida-
de na prestação de informações ou ainda morosidade em fornecê-las.
Conclui-se, portanto, que compete aos gestores escolares focali-
zarem essa fundamental área de ação educacional e expressão orga-
nizacional, de modo a dar-lhe maior e melhor direcionamento, assim
como maior efetividade educacional.
Elevar a comunicação como dimensão proissional do educador se
evidencia como fundamental, quando se reconhece que a educação,
conforme indicado por vários autores, dentre os quais Carl Rogers, é
um processo de relacionamento interpessoal e comunicação, sem os
quais a educação não acontece. Isto porque a educação se realiza pela
comunicação (considerada em seu sentido pleno) e relacionamento
interpessoal e pretende contribuir para a formação de alunos como
seres de comunicação e relacionamento interpessoal, voltados para o
desenvolvimento, que, aliás, constitui a possibilidade de humanização.

Referências bibliográicas

LÜCK, Heloísa. Gestão educacional: uma questão paradigmática. 8ª.


ed.Petrópolis: Vozes, 2011.

___________. Gestão do clima e cultura organizacional da escola.


Petrópolis: Vozes, 2010.

PATTON, Bobby R. e Gifin, Kim. Interpersonal communication: basic


text and readings. New York: Harper & Row, 1989.

ROGERS, Carl. Liberdade para aprender. Belo Horizonte: Interlivros,


1982.

Gestão educacional e o desaio da comunicação – 23


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Comunicação em rede:
um conjunto de nós
Luiz Carlos Assis Iasbeck7

A comunicação é um processo inerente aos seres vivos. Entre-


tanto, uma série de diiculdades, problemas e obstáculos impedem
que esse processo realize seu objetivo primordial, o de tornar comum
o incomum, de proporcionar o compartilhamento e a convivência en-
tre os seres vivos. O desenvolvimento de soisticadas tecnologias de
comunicação não garante a qualidade do processo, tampouco o aden-
samento das ainidades que geram vínculos. Isso, porque, indepen-
dentemente dos altares que erguemos para mediar nossas relações,
a comunicação é estabelecida a partir de uma predisposição interna,
de uma competência de conviver com diferenças e ousar enriquecer
o contato com o inusitado espaço da esfera da não-cultura. O que
nos põe em rede não são senão os vínculos que conseguimos estrei-
tar entre corpos e mentes que se mediam tecnologicamente. E os
vínculos insistem em se manter precários e cada vez mais tênues,
quanto mais soisticada e exuberante se torna a tecnologia que me-
dia as relações.
A comunicação é um fenômeno semiótico. Antes de se conigurar
como processo de estímulo e resposta, antes mesmo de assimilar
tantos e tantos aparatos capazes de soisticar as linguagens, arma-
zenar informações, estocar lembranças e memórias, disponibilizar re-
cursos de transporte e recuperação, a comunicação segue sendo um
fenômeno bastante simples de constatar e intensamente complexo
de se administrar. Segundo Pross, essa complexidade está no fato de
a comunicação ser o lugar de “dar e receber signos”.
Porém, são muitas as maneiras de se deinir comunicação, e to-
das elas passam pela interatividade, pela necessidade da presença

7 Iasbeck palestrou no 8º ECOM, em 2009. Artigo aqui publicado foi distribuído aos participantes du-
rante o evento.

Comunicação em rede: um conjunto de nós – 25


de um estímulo e uma resposta, da troca, do diálogo, do inter-rela-
cionamento. Tanto entre homens como entre fenômenos, animais e
objetos.
Quando nos referimos à ciência da comunicação, entretanto, es-
tamos tratando de “um campo delimitado dos estudos dos processos
comunicativos, assim como a investigação das estruturas e funções
dos sistemas sociais de comunicação” (Pross e Beth, 1987:13).
Comunicar, em latim, signiica compartilhar. Mas para que haja
compartilhamento é imprescindível que uma informação qualquer
saia de um emissor para um receptor e que este seja capaz de rece-
bê-la, interpretá-la e respondr a ela. Entre os homens, diz Pross, essa
prática não é possível sem a intermediação dos signos. A capacidade
de dar e receber signos é que caracteriza a comunicação humana,
diferenciando-a da prática comunicativa dos demais seres vivos.
Ao “tornarem comuns” experiências, necessidades, sonhos e pro-
jetos, as relações comunicativas criam entre os seus interactores um
vínculo de ainidade, unindo, ligando ou religando diferenças. O que
move o homem para a prática da comunicação é, segundo Medina
Rodrigues (1994) a realização de um sonho ancestral do homem,
o sonho de uniicar o mundo em detrimento das diferenças que o
tornam desigual, complexo e antagônico. Ao proporcionar vínculos
seriados, a comunicação cria redes de ainidades em torno de iden-
tiicações grupais, atando seus atores em nós conectivos, na forma
de um grande texto ou de um “hipertexto”, como quer Pierre Lévy,
um entusiasta das possibilidades de compartilhamento abertas pelas
novas tecnologias da comunicação.
Antes, porém, de adentrarmos em algumas relexões sobre a
competência comunicativa do ser humano, vejamo-la como prática
comum a todos os seres vivos, tal como nos ensina um sem-número
de estudiosos da área, desde os comportamentalistas (S. Stevens,
C. Hovland. W. Schramm, C. Cherry, P. Watzlawick) aos cognitivistas
(Shannon e Weaver, G. Steiner, F. Fearing).

A Comunicação Essencial

“Comunicação é um processo inerente aos seres vivos.”

Trocar informações parece-nos vital, uma atividade essencial à


vida e, portanto, comum a todos os seres vivos. As plantas trocam
informações com o meio ambiente, recebem energia, calor e res-
pondem à natureza oxigenando o ar, proporcionando ciclos de com-

26 – Luiz Carlos Assis Iasbeck


posição e recomposição do solo e do clima. Os minerais também
comunicam, recebem, estocam e distribuem informação, compõem o
cenário interativo dos ambientes naturais, os relevos e depressões,
expondo a quem quiser e puder ver as marcas do tempo e das in-
tempéries. Fora de seu habitat, os seres vivos perdem competência
de suprir seus organismos daqueles elementos de que necessitam,
perecendo por falta, carência ou solidão.
Nesses ambientes, o processo comunicativo é mecânico, padroni-
zado e corresponde a uma troca “programada” sem a qual o ciclo de
perpetuação do ambiente ica comprometido.
Para os estudiosos da semiótica, os animais se comunicam de
maneira codiicada, ou seja, utilizam linguagens bastante eicientes
para resolverem seus problemas de perpetuação da vida. Organizam-
se em torno de objetivos comuns, colaboram entre si, distribuem
funções e respondem solidariamente pelos projetos grupais. Não são
poucos os etólogos que se debruçam a estudar a competência comu-
nicativa de espécimes cuja precisão e objetividade não só os aproxi-
mam dos humanos como também os levam a superá-los em termos
de eicácia.
Porém, os humanos desenvolveram habilidades metalinguísticas
que os separaram das práticas meramente racionais e animais, levando-
os à especulação, à idealização, à abstração. A competência de “pensar
o pensamento”, como diz Norval Baittelo Jr., abre ao humano condições
de sofrer intensamente, preocupar-se, mentir, iludir-se, decepcionar-se
e superar problemas comuns de sua vida biológica e social.
A comunicação humana não é apenas um processo de troca de
informações, mas um espaço de compartilhamento de sentimentos
complexos e necessidades imprecisas. Parece-nos muito pouco pen-
sar esse fenômeno como atividade mecânica de emissão - recepção
- emissão, ainda que seja necessário entender que esse processo,
funcional como uma engrenagem, é o motor do evento comunicativo.
E vai permanecer, em essência, como tal até ser perturbado pelas
soisticadas tecnologias da comunicação do mundo atual, como vere-
mos mais adiante.

Humildade e Tolerância

“Entretanto, uma série de diiculdades, problemas e obstáculos


impedem que esse processo realize seu objetivo primordial, o de tor-
nar comum o incomum, de proporcionar o compartilhamento e a con-
vivência entre os seres vivos.”

Comunicação em rede: um conjunto de nós – 27


Tradicionalmente, a comunicação tem sido estudada como a ciên-
cia que se dedica a estudar esse processo de emissão e recepção de
informações, o que nos parece um conceito demasiado simples para
dar conta de tamanha complexidade envolvida nesse aparentemente
simples fenômeno.
Felizmente, para entender comunicação não é preciso sequer sa-
ber deini-la. É preciso saber utilizá-la de maneira eicaz. É na di-
mensão pragmática que ela melhor diz de si mesma. Lucien Sfez,
em sua obra A Crítica da Comunicação nos chama a atenção para
a etimologia que nos remete à ação de colocar algo em comum ou
compartilhar.
Reletindo sobre a necessidade de comunicar, alguns ilósofos
como Paul Watzlawick – que organizou o imprescindível A Pragmática
da Comunicação Humana – e Eric Fromm, em A Arte de Amar, dentre
outros, nos lembram de que esse tipo de comportamento humano
tem a sua origem junto com a origem do homem, e que a necessida-
de de comunicar se torna drástica a partir do nascimento. Para eles,
o homem se comunica para espantar a solidão.
A solidão, o sentimento de estar só, desamparado e sem ter onde
se segurar é o mais terrível, o primeiro e o último grande evento ne-
gativo que o ser humano enfrenta, uma vez que não tem como evitá-
lo ao nascer e ao morrer. Entre o nascimento e a morte existe a vida.
E a vida só pode ser vivida se desenvolvermos mecanismos eicazes
para espantar esse sentimento extremo e liminar que é a solidão.
Para superar simbolicamente esse problema, recorremos às cria-
ções culturais, somente possíveis no território daquilo que Bystrina
denomina segunda realidade. Os textos que produzimos nessa di-
mensão nos confortam, apaziguam as incompreensíveis contradições
da primeira realidade e só se tornam possíveis porque na realida-
de da cultura não podemos prescindir do outro: nossa sobrevivência
psíquica passa pelo acionamento de mecanismos que ultrapassam o
egoísmo biológico e o oportunismo solidário da dimensão social, ne-
cessários a nossa sobrevivência física.
Comunicar é, portanto, compartilhar sentimentos, temores, hu-
mores, angústias e surpresas, é estar junto, pertencer, vincular, estar
afetado e em afeto com quem nos cerca. Não é por outro motivo que
os mais intensos núcleos sociais de comunicação são aqueles dos
quais participamos com maior assiduidade e intensidade: a família,
o trabalho, os grupos de interesse proissional, os amigos, etc. São
esses grupos que nos encorajam a superar a solidão originária e nos
proporcionam sensações de segurança, conforto e amparo. Pertencer

28 – Luiz Carlos Assis Iasbeck


a um grupo, estar vinculado a uma empresa, compartilhar ideias,
estar casado (ou estar aliado, em aliança) com alguém são formas
de consolação (conforme airma Umberto Eco em um pequeno texto
publicado no livro Socialismo y Consolación, de 1970) absolutamente
imprescindíveis para que possamos viver em harmonia, sem os te-
mores da solidão.
Tornamo-nos, então, solidários para deixarmos de ser solitários.
Mais do que uma decisão pessoal, esta é uma questão de sobrevivên-
cia física e psíquica que assegura a vida humana.
Assim, quando estudamos o fenômeno da comunicação, não po-
demos deixar de lado as ligações afetivas e suas efetivações rituais
que consagram uniões, aproximações, asseguram empatias e decre-
tam vinculação, adesão, pertencimento. Não há como dissociar das
intenções do emissor – aquele que tem a iniciativa do processo de
comunicação – a sua íntima e vital necessidade de obter reconheci-
mento, compreensão e segurança.
A intensidade desses sentimentos e necessidades é talvez a
maior responsável pelo sucessivo insucesso da comunicação entre
pessoas, nações e organizações. Obter entendimento, compreen-
são e, consequentemente, apoio a qualquer custo é o que desejam
todos aqueles que investem na comunicação, que não têm como
deixar de ir à procura do outro para compartilhar seus interesses.
Sabemos que quanto maior é a ansiedade que impulsiona esse de-
sejo, mais complexa é a obtenção do que se almeja. Ir ao encontro
do outro signiica, também, estar disposto a respeitar outro tempo,
outro ritmo, necessidades e interesses alheios. Além disso, a pro-
cura do outro só é possível a quem reconhece, sinceramente seu
próprio estado de carência, sua condição existencial de falta e de
incompletude. Essa atitude, essencial para que aconteça o processo
da comunicação, exige do emissor uma certa dose de humildade,
paciência e desprendimento.
Na apresentação à edição brasileira do primeiro volume de A So-
ciedade do Protesto, de Harry Pross (Annablume, 1997), Norval Bai-
tello Júnior nos relata que na abertura do décimo e último Kornhaus-
Seminar, Pross declarou lapidarmente: “Aprendemos em dez anos
que, para a comunicação, nenhuma lei é mais importante do que a
tolerância”. Junto à humildade, a tolerância é imprescindível. Se ne-
cessitamos de humildade parair ao encontro do outro, necessitamos,
também, de uma boa dose de tolerância para entendermos que o
outro não é exatamente aquilo que gostaríamos que ele fosse, que
ele não reage como gostaríamos ou necessitaríamos.

Comunicação em rede: um conjunto de nós – 29


Ainidades e Diferenças

“O desenvolvimento de soisticadas tecnologias de comunicação


não garante a qualidade do processo, tampouco o adensamento das
ainidades que geram vínculos.”

Ainidades e diferenças. Essas parecem ser as forças que movi-


mentam não apenas a comunicação entre seres humanos, mas entre
tudo o que existe no universo. Medina Rodrigues, num texto informal
preparado para uma aula no curso de comunicação e semiótica na
PUC de São Paulo, precisamente se manifestou sobre essa questão,
destacando a relação paradoxal instaurada por tais forças. Medina
entende que o sentido uniicador do mundo está inscrito na própria
ordem natural do mundo físico:

O mundo tem um sentido uniicador e ediicante, um


movimento isicamente determinado, um telos na ordem
natural dos eventos que não se atropelam... A dinâmica
do mundo físico não dá saltos e se algum salto existe na
natureza, este é um salto previsto pela própria natureza.

Esse salto corresponde a uma diferença, a uma mudança repenti-


na de tempo e espaços e que, apesar de atropelar a ordem esperada,
está prevista no próprio curso da natureza. A ainidade e a diferença
fazem parte, assim, de uma certa previsibilidade, constituindo dois
movimentos aparentemente paradoxais, mas essencialmente neces-
sários ao equilíbrio das relações físicas.
O fato de encontrarmos diferenças quando procuramos ainidades
não constitui nenhum desastre irreversível na ordem do mundo natural e
também, acrescentemos, nas vicissitudes da comunicação humana. Ao
contrário, as diferenças nos levam a valorizar ainda mais as ainidades,
além de nos abrir caminhos para a absorção de outras possibilidades
de relacionamento não previstas inicialmente em nossas expectativas.
Não há dúvidas também sobre o fato de que há muito mais dife-
renças que ainidades no mundo físico e no mundo da comunicação
humana. As identidades não se airmam apenas pela ainidade que
mantêm com suas oposições, mas sobretudo pelas diferenças que as
individualizam e lhes dão contornos próprios e deinidos.
Conforme tivemos oportunidade de demonstrar em nossa tese de
doutorado (IASBECK, 1997), o conceito de identidade supõe tanto a
presença de ainidades quanto de diferenças:

30 – Luiz Carlos Assis Iasbeck


... não há como constatar oposição excludente entre ai-
nidades e diferenças. A ideia aristotélica precisa da di-
ferença para conirmar-se (o ser é; o não ser não é); a
concepção de Leibniz integra a diferença na essência do
ser (diverso e múltiplo) que se identiica por critério de
substituição; o estabelecimento de paradigmas, preconi-
zado por Waismann é realizado como critério de ainida-
de entre diferenças (IASBECK, 1997, p.175).

Dessa forma, podemos assumir a hipótese de que a comunica-


ção estabelece vínculos não apenas entre ainidades como também
entre diferenças. Nesses casos, o vínculo que advém e proporciona
identiicação (Waismann) e identidade (Aristóteles) se dá naqueles
aspectos que não encontram ainidade senão fora de si mesmos,
pela interveniência de uma mediação ou de uma triangulação. O
elemento intermediário estabelece pontes, elos e suportes capazes
de reunir polos dissociados ou criar polaridades paralelas, porém
intercomunicativas, estabelecendo uma espécie de ainidade entre
diferenças.
As modernas tecnologias da comunicação parecem cumprir ri-
gorosamente esse mandato natural: aproximar o que está distante,
facilitar contatos, reunir fragmentos dispersos ou dispersar incongru-
ências que não se ainam. Porém, ao proporcionar ferramentas para a
comunicação, essas tecnologias expandem, para além do delimitado
espaço de nossas ordenações individuais, possibilidades de acordos
e promessas de encontros não realizadas, criando, assim, novos e
inusitados problemas de comunicação ou, como querem alguns, pro-
blemas por incomunicação.
Em muitos casos, entretanto, as tecnologias carreiam para si
mesmas as inalidades comunicativas, deixando de promover os elos
necessários entre diferenças que precisam se encontrar. Evidente-
mente, elas também trabalham no sentido de estreitar ainidades
e proporcionar manutenção a relacionamentos estáveis, até que se
tornem perturbadores. Nesses casos – e até eclodirem os conlitos
– as tecnologias da comunicação funcionam como meios rituais de
celebração de acordos e preservação de interesses já contratados. Se
não trazem novidades, pelo menos evitam que as forças de aproxi-
mação se dispersem em proveito de ousadias estranhas ou caminhos
desconhecidos. A manutenção se dá pelo circuito de redundâncias
forjadas no calendário ou nos espaços míticos construídos para lem-
brar o percurso circular do cotidiano.

Comunicação em rede: um conjunto de nós – 31


Identidades e Indiferenças

“Isso, porque, independentemente dos altares que erguemos


para mediar nossas relações, a comunicação é estabelecida a partir
de uma predisposição interna, de uma competência de conviver com
diferenças e ousar enriquecer o contato com o inusitado espaço da
esfera da não-cultura.”

Foi Norval Baitello Júnior, numa conferência realizada em outubro


de 2000, na Universidade de Brasília, para os integrantes da Asso-
ciação Brasiliense de Semiótica, que se referiu às novas tecnologias
da comunicação como “altares” mediadores. Desse modo, Norval (re)
liga o conceito de mídia ao conceito de mito, lembrando-nos de que
ambos funcionam como lugares ritualizados de passagem, de trans-
posição de um ambiente de cultura a outro, pouco conhecido ou mes-
mo desconhecido, o espaço de uma possível não-cultura.
Admitir que a não-cultura – tal como deinida pelos semioticistas
eslavos nas teses para uma semiótica da cultura9 – tenha uma exis-
tência provável, identitária e operativa para uma dada cultura, da
qual se é observador externo, se não constitui um avanço no sentido
de arejar os espaços da cultura é, pelo menos, a aceitação da possi-
bilidade de que “fora” deve existir algo e, portanto, como bem explica
Pross, não há “o” nada.
É esse o princípio que justiica a existência do signo e que faz
do “texto” a unidade básica da semiótica da cultura. O texto como
conjunto sígnico com sentido integral, estrutura, expressão própria
e fronteiras delimitadas, ou o signo entendido como parte do texto
e também um texto que comporta outros signos que o interpretam,
necessita escorar-se em conjuntos de linguagem, desde os mais ar-
caicos até os mais soisticados, aqueles que estão na base das tec-
nologias digitais.
Em nosso modo de ver, os diálogos com a não-cultura estreitam-
se signiicativamente com as tecnologias que proporcionam comuni-
cação em rede. A não-cultura (aqui e nas teses eslavas) é entendida
em oposição a uma dada cultura (identidade) e, em relação a esta,
como um lugar de indiferença, até que algum tipo de provocação,
instigamento ou curiosidade derrube ou daniique os muros que as
separam. O ilósofo tcheco Vilém Flusser airmava que o “incompará-

9 Lotman, Iuri et alli (1979) – “Tesi per un analisi semiotica della cultura”, in La Semiótica nei Paesi Slavi.
Milano: Feltrinelli. A cura di Carlo Prevignano. Pp 944-1020.

32 – Luiz Carlos Assis Iasbeck


vel é inconcebível”, evidenciando a diiculdade que cada cultura par-
ticular tem de dialogar com a sua correspondente não-cultura, sem
apropriar-se de conhecimentos estranhos (estrangeiros) mediante
analogias, traduções, miscigenações. Medina Rodrigues (1994) con-
corda com essa ideia ao airmar que “o ser humano possui categorias
apriorísticas que medeiam e condicionam seu conhecimento da natu-
reza (...) de forma que ele só pode conhecer algo novo pela interme-
diação de uma consciência que conhece”.
O trânsito cultura – não-cultura – cultura não apenas proporciona
arejamento e crescimento do acervo de uma cultura como também
a instrumentaliza a lexibilizar-se em mecanismos adaptativos aber-
tos à novidade, aos estranhamentos ou aos perigos da adversidade.
Aprende-se, dessa forma, a explorar aquilo que Medina denomina o
“universo da indiferença”:

O universo da indiferença é o que domina a usura em


surdina das coisas; ele é praticamente o contrário do
universo da ainidade (...) porém saber que ele existe já
é um saber sobre a indiferença, já é ter consciência de
uma ignorância e, portanto, ter consciência de alguma
coisa fora do ambiente do conhecimento estabelecido.
(Medina, 1994, p.4)

Essa competência não depende das tecnologias porque ela se es-


tabelece, primariamente, no desejo de cada um, de cada grupo, de
cada integrante de um texto cultural. A curiosidade em relação ao
desconhecido pode, entretanto, ser sobremaneira estimulada quando
os caminhos são encurtados, quando o acesso é facilitado, a despeito
de eventuais riscos e temores.
Desde a década de 80, quando a rede mundial de computadores,
a Internet começou a se popularizar, espaços e ritmos que até então
caracterizavam culturas, começaram a se modiicar, mobilizando-se
aceleradamente e, aparentemente, fora de compasso, ao sabor das
novidades que tomavam corpo. Peter Druker referiu-se a esse perí-
odo como Segunda Revolução da Informação, comparando-a com a
primeira grande ruptura na linearidade de um desenvolvimento ca-
denciado que aconteceu pela primeira vez com a invenção da impren-
sa por Gutenberg.
A introdução do computador promoveu mudanças substantivas e
sem precedentes na história da humanidade. Hoje, milhões de pes-
soas podem trocar informações, estabelecendo vínculos instantâneos

Comunicação em rede: um conjunto de nós – 33


e efêmeros que não têm compromisso de permanência, muito menos
de idelidade. A vida digital, consequência de um crescimento expo-
nencial das possibilidades de produção, distribuição, armazenamento
e recuperação de informações com base no código binário, proporcio-
nou processos comunicativos instantâneos e não lineares, atropelan-
do a sequência natural do clássico esquema tricotômico de Aristóteles
(emissor, mensagem, receptor).
Como consequência das tecnologias que aceleraram o processa-
mento das informações, foi possível realizar um antigo sonho de rela-
cionar em simultaneidade paradigmática ideias que se interpõem, so-
brepõem e que não podem localizar-se em sintagmas justapostos. O
hipertexto, termo cunhado por Theodor Holm “Ted” Nelson em 1965
em um artigo cientíico, tornou possível a escrita não sequencial que,
por sua vez, concretizou a comunicação em rede, em tempo real.
O alastramento lateral do pensamento semiótico em rede privile-
gia as relações que multiplicam sentidos, sem perda de profundidade
ou especiicidade. A velocidade de processamento das informações,
obtidas à custa do aperfeiçoamento de processadores cada vez mais
compactos e potentes, abreviou o tempo de espera das respostas,
preservando a linearidade dos sintagmas, na presença das interposi-
ções de sentido.

Vínculos Fáceis, Vínculos Frágeis

“O que nos põe em rede não são senão os vínculos que consegui-
mos estreitar entre corpos e mentes que se mediam tecnologicamen-
te. Vínculos que insistem em se manter precários ... e cada vez mais
tênues ... quanto mais soisticada e exuberante se torna a tecnologia
que media as relações.”

Dentre as facilidades que a tecnologia digital nos trouxe, a ins-


tantaneidade dos contatos e a fugacidade dos encontros talvez sejam
as contribuições mais signiicativas para a construção de uma nova
forma de relação entre as pessoas.
A motivação para estar em rede, atado em nós com uma coletivi-
dade virtual ainda segue sendo aquela mesma que levou o homem,
desde os primórdios, a buscar na companhia do outro consolo para
a solidão originária e inal. A tecnologia apenas cumpre o papel de
mediar esse encontro entre corpos e mentes que, agora, dispensam
a mobilidade e o momento oportuno. Precários ou consistentes, tais

34 – Luiz Carlos Assis Iasbeck


vínculos se estabelecem, se mantêm ou se rompem na exata medida
das possibilidades que o meio oferece. O que observamos é que a
oferta de possibilidades de contato cresceu assustadoramente, ani-
mando ligações pouco comprometidas, relações não tão responsáveis
e compromissos frouxos.
Se por um lado, os vínculos demonstram enfraquecimento nas
relações comunicativas em rede, por outro eles se multiplicam ten-
tativamente, encorajando a exploração do território da indiferença,
da não-cultura, ainda que de forma episódica. E tudo indica que essa
tendência irá se recrudescer enquanto o avanço e a soisticação das
modernas tecnologias não encontrar um ponto de equilíbrio que as
leve a procurar meios capazes de possibilitar o adensamento qualita-
tivo das múltiplas possibilidades de contato.
De qualquer forma, não é a tecnologia que vai melhorar a quali-
dade das relações humanas. Segue sendo o homem em sua relação
consigo mesmo, com suas competências expressivas e impressivas
que vai determinar a densidade e a consistência dos textos que te-
cem a malha de uma rede maior de desejos de interatividade e ne-
cessidades de complementaridade.
Tecnicamente, o hipertexto é um conjunto de nós atados por
conexões. Esses nós podem ser ideologias, palavras, imagens, so-
nhos, gráicos, diagramas, contratos ou afetos gratuitos, compro-
missados apenas com o prazer que o afastamento da solidão nos
traz as conexões, entretanto, constroem um texto, um tecido no
qual cada nó em particular tem um compromisso particular e uma
responsabilidade global.
Nesse formato, que não é novo, os sentidos se cruzam em densas
malhas. A complexidade resultante das novas relações – estimuladas
pelas tecnologias da comunicação – fortalece em nós a esperança em
conexões mais consistentes, ao tempo em que acirra a desconiança
e o temor de um iminente esgarçamento de alguns tecidos que não
se estabelecem competentemente nesse panorama.
O espírito do nosso tempo é conturbado, inquieto e não se sujeita
a ideologias que detenham o curso dessa instável e, por vezes, deso-
rientada evolução. Entretanto, nas brechas abertas pelo esquecimen-
to ou pelas tentativas frustradas de conexões consistentes, novas
relações podem ensejar a construção de textos não previstos pelas
estratégias hipertextuais.
De novo, é a transgressão, a desobediência, a criatividade e a
imaginação que podem criar, transversalmente, ramiicações nas
quais as conexões se façam também multiplanearmente, abrindo

Comunicação em rede: um conjunto de nós – 35


possibilidades textuais responsáveis e consequentes (com estrutura,
expressão e delimitação), a despeito da irresistível diversão com que
as novas tecnologias nos seduzem.

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Comunicação em rede: um conjunto de nós – 37


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Comunicação interna – todos
querem, poucos fazem
Cleusa Scroferneker10 registros e relato de Lidiane Amorim

Com o título Comunicação interna: todos querem e poucos fa-


zem, a professora e pesquisadora Cleusa Scroferneker iniciou sua
apresentação abordando o signiicado da prática da comunicação in-
terna: “é uma ousadia, um desaio e uma relexão”, airmou. Estes
três fatores colocam, segundo a professora, duas questões importan-
tes. Primeiramente, quais as implicações do “querer” e, num segundo
momento, quais as implicações do “fazer”. Ela, que desenvolve seus
estudos sob o paradigma da complexidade, lembra que, à luz desta
teoria, há de se aceitar que não existem verdades categóricas. Ou
seja, nada é deinitivo, tudo é mutável e passível de discussão.

“De que comunicação estamos falando?”

Conforme a professora, quando se fala em comunicação interna,


a primeira questão que se estabelece é “de que comunicação nós
estamos falando?”. Isso porque a comunicação pode ser aborda-
da sob várias perspectivas e enfoques. A segunda questão é “qual
o entendimento de comunicação em uma instituição confessional,
como uma Instituição Marista?”.
Para conceituar comunicação, ela faz uso das ideias de Ciro Mar-
condes Filho, um dos pensadores da Comunicação Social no Brasil:

Comunicação é antes um processo, um acontecimento, um


encontro feliz, um momento mágico entre duas intencio-
nalidades [...] ela vem da criação de um ambiente comum

10 Palestra feita pela professora Cleusa Scroferneker no 7º ECOM, em 2007. Registros foram feitos pela
jornalista Lidiane Amorim, que aqui relata o percurso da apresentação da professora.

Comunicação interna – todos querem, poucos fazem – 39


em que os dois lados participam e extraem algo novo, ines-
perado, que estava em nenhum deles, e que altera o esta-
tuto anterior de ambos, apesar das diferenças individuais
se manterem (MARCONDES FILHO, 2004, p.15-16).

Diante desse conceito, a professora questiona: “Até que ponto


nos damos conta, enquanto comunicamos, que se trata de um encon-
tro feliz? De um momento mágico?”. Ela acredita que talvez não se
tenha tal noção, em função da concepção que se tem sobre comuni-
cação. É preciso, portanto, admitir o processo de comunicação como
esse momento mágico que acontece entre duas intencionalidades.
Houve um tempo em que a comunicação esteve calcada no mo-
delo linear, lembra a professora, limitando-se à igura do emissor
como origem da mensagem, e um receptor que a recebia, sem mais
desdobramentos deste processo: “eu emito, tu recebes, cumpri a mi-
nha parte”. Hoje, a comunicação pressupõe uma interlocução. Quan-
do esse encontro feliz acontece, cria-se um ambiente comum, que
não signiica que se terá de pensar em comum. Isso quer dizer que,
neste momento, ambos estão se predispondo a comunicar, a aceitar
as diferenças do outro “e esperando que o outro aceite a minha di-
ferença”. Nessa relação, em que os dois lados participam, nenhum
deles sai desse encontro da mesma forma como entrou: “quando o
processo acontece, a mudança acontece, não somos mais os mes-
mos, mesmo com as nossas diferenças”, conclui.
Geralmente, ao se falar em comunicação, se pensa naquela que
se dá através de uma linguagem, especialmente uma linguagem co-
diicada: “eu estou falando e as pessoas estão me entendendo”. No
entanto, nem sempre acontece dessa forma, devido a uma série de
outras variáveis. Por exemplo, a predisposição é um fator capaz de
alterar este processo:

é comum que num determinado dia, enquanto dialo-


gamos com um colega, ele responde imediatamente à
nossa demanda e no outro dia, por questões das mais
variáveis, o colega não presta atenção, ou não entende
com facilidade o que estamos querendo dizer.

Através desse exemplo, a professora mostra que cada indivíduo


tem a sua realidade, sua subjetividade, seus momentos. Além disso,
a comunicação também se faz através de uma linguagem não-verbal.
Segundo ela, este talvez seja o maior desaio das organizações hoje:

40 – Cleusa Scroferneker
perceberem que nem tudo que é dito, verbalizado, é real, na medida
em que esta comunicação não verbal também pode comunicar. Há de
se ter a percepção destas outras possibilidades de comunicação, que
acontecem nos olhares, nos gestos, nos silêncios.
Portanto, é preciso estar atento a isso e nesse sentido a professo-
ra chama a atenção para a importância dos gestores das instituições
levarem em conta estes fatores. A questão da espera, do fazer-se
esperar, por exemplo, é crucial. Ela propõe que se imagine a seguinte
cena: “eu marco um horário com o diretor ou coordenador da escola,
e este horário não é cumprido. Espero durante 30 minutos para ser
atendido. Que sentido darei a isso? ‘Eu não tenho importância’”.
Ao se provocar sensações como esta, pode-se afastar clientes em
potencial, ou proissionais que poderiam ser, ou já o são, da escola em
questão. É por esse e outros motivos que se deve levar em conta outras
traduções de comunicação, tão imprescindíveis quanto a verbal, princi-
palmente quando se trata de comunicação interna. Neste contexto, é
preciso que se tenha noção e clareza quanto à dimensão da comunicação
da qual estamos falando. “Estamos falando da comunicação meramente
informacional, calcada no receptor?” É bom lembrar que ele não é mais
passivo, como se acreditava antigamente, “ele pode parecer ser passivo”.
Subestimar os públicos, no caso da Instituição os funcionários,
por exemplo, pode ser um grave problema, pois podem não verbali-
zar seus descontentamentos nos espaços de trabalho, mas o fazem
nos seus espaços de convivência, onde não há controle por parte
da instituição e ela tampouco consegue intervir. Portanto, esta outra
dimensão da comunicação, que pressupõe a ausência da fala, está
muito presente e pode ser crucial no bom andamento da comunica-
ção da organização e das suas atividades como um todo.
Daí a importância das atitudes e ações da Instituição e de quem
faz parte dela condizerem com a sua fala, “as comunicações verbais
e não verbais que eu realizo devem ser coerentes”, ressalta a pro-
fessora. A falta de coerência pode colocar em risco a legitimidade
da organização, a autoridade do gestor com relação a seus colabo-
radores, ou do professor com relação ao seu aluno. Novamente, os
relexos são visíveis na relação aluno-professor: “os alunos são muito
observadores e eles sabem quem tu és e se és coerente, se tua fala é
coerente com a tua atitude. A ausência dessa coerência pode resultar
no desrespeito do aluno em relação ao professor”.
Isso também acontece na relação entre funcionários e gestores:
“nós respeitamos os gestores que são coerentes, que têm atitude e
fala que se correspondem”, ilustra a professora.

Comunicação interna – todos querem, poucos fazem – 41


Comunicação Integrada: conceitos

A expressão comunicação integrada foi cunhada pela primeira


vez em 1986, pelo pesquisador Gaudêncio Torquato11, em sua tese
de doutorado e, posteriormente, foi apropriada e desenvolvida por
Margarida Kunsch12, também pioneira nos estudos de Comunicação
Organizacional no Brasil. Segundo esta autora, comunicação integra-
da “é uma ilosoia que direciona a convergência de diversas áreas,
permitindo uma atuação sinérgica” (KUNSCH, 2003).
O conceito terminou recebendo diversas interpretações, no en-
tanto, a professora ressalta que é sempre preciso ter a dimensão
desta comunicação como uma ilosoia, que, se aceita, pressupõe-se
que ela perpasse toda a organização. Na prática, não se trata sim-
plesmente de congregar proissionais da comunicação – jornalista,
publicitário e relações públicas reunidos em uma sala – e acreditar
que, com isso, se está fazendo comunicação integrada. Para que a
perspectiva da integração se efetive, a ilosoia que engloba esta mo-
dalidade de comunicação deve estar diluída em toda a organização.
E mais, ela precisa ser integralmente assumida pela direção, porque,
antes de mais nada, é uma decisão política. “A partir de agora a
nossa escola irá assumir a ilosoia da comunicação integrada. O que
signiica isso?”, questiona a professora.
O primeiro passo para que essa comunicação integrada se efeti-
ve é a crença do gestor nesta ilosoia, e a clareza do que ela real-
mente signiica. Cleusa ressalta este aspecto, pois muitas vezes as
organizações fazem comunicação administrativa e não comunicação
interna, como acreditam estar fazendo. A comunicação integrada é
uma comunicação bidirecional. É uma relação sinérgica que perpassa
toda a instituição, desde a comunicação interna e administrativa, à
mercadológica e institucional. Na perspectiva da professora, comu-
nicação interna é aquela desenvolvida paralelamente à comunicação
administrativa e visa proporcionar meios para promover uma maior
integração dentro da organização mediante o diálogo, a troca de in-
formações, experiências e a participação de todos os níveis. Sobre-

11 Pioneiro de Comunicação Organizacional no País e um dos maiores especialistas brasileiros em Co-


municação Empresarial, Marketing Político e Eleitoral, tendo escrito as primeiras obras sobre essas
áreas. Professor titular da Universidade de São Paulo, livre-docente e doutor em comunicação, Gau-
dêncio Torquato é também jornalista, escrevendo para 120 jornais brasileiros.

12 Mestre, doutora, livre-docente e professora titular em Ciências da Comunicação pela Escola de


Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), organizou diversas coletâneas de
Comunicação Social. Ex-presidente da Intercom - Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares
da Comunicação (1987-1989; 1991-1993), é presidente da Alaic - Asociación Latinoamericana de
Investigadores de la Comunicación (1998-2002; 2002-2005).

42 – Cleusa Scroferneker
tudo, dedica-se a desenvolver o sentimento de pertença, estimular a
interação, o diálogo e a satisfação no ambiente de trabalho. A concre-
tização de tais objetivos (que em última instância também auxiliam,
e muito, nos resultados positivos da organização, lembra a profes-
sora) necessita coerência e transparência entre o discurso e ação
organizacionais.

Ambientes internos saudáveis e climas organizacionais


positivos favorecem e estimulam a comunicação interna,
possibilitando a interação e abrindo espaço para o diálogo.

A professora também chama a atenção de que o sentimento de


pertencer vai além do “vestir a camiseta”. É preciso estar motivado o
suiciente para “suá-la”:

Não se trata somente de vestir a camiseta. Vestir simples-


mente não signiica um envolvimento completo dele (do
funcionário, colaborador). O ideal é que ele se sinta bem
em vestir, que tenha orgulho dessa vestimenta, que exte-
riorize o quanto é bom trabalhar na instituição. Nas pes-
quisas que diagnosticam a ordem de desejos na vida das
pessoas, o “sentir-se bem” no ambiente de trabalho e o
reconhecimento do trabalho que realizamos, vem antes do
valor remunerado.

Mudança de cultura: da informação para a comunicação

Para se planejar uma comunicação interna faz-se necessário uma


mudança de paradigma. É preciso sair de uma cultura da informação,
que, segundo a professora, predomina atualmente em 80% das orga-
nizações, para uma cultura da comunicação. Essa cultura vai pressu-
por a ideia da afetividade, que vai além de abraços e atitudes cordiais
e se retrata em detalhes do dia a dia:

muito obrigada! como você está? tudo bem? É no exercício


destes pequenos gestos que se cultiva a afetividade, se
cria um clima agradável de se trabalhar e de se (con) viver.

No momento em que se criam ambientes afetivos, onde é bom


estar e é bom trabalhar em equipe, a construção do sentimento de
pertença começa a acontecer. Feita essa mudança e assumido o pa-

Comunicação interna – todos querem, poucos fazem – 43


radigma da cultura de comunicação, tornar-se-á necessário a cons-
trução de uma política de comunicação, que, por sua vez, necessita
ser uma construção conjunta, participativa. A partir dessa política se
começa a pensar e planejar a comunicação e, especiicamente, a se
trabalhar com comunicação interna.

Algumas questões

Para a professora, questionamentos são necessários para pensar


a construção de uma política de comunicação interna e o seu plane-
jamento. O primeiro deles é “por que agora eu vou pensar em comu-
nicação interna?” É importante ter a clareza de que no momento em
que se decide pela comunicação interna, a instituição está assumindo
um compromisso com cada um dos públicos, pois será gerada uma
expectativa nos alunos, nos professores, nos funcionários, etc.
Portanto, o discurso da instituição necessita estar articulado com
as suas ações. Isso acarreta um cuidado quando se fala em missão
da organização: “Qual a nossa missão e a nossa visão?”. A missão é
um compromisso. Quando colocada na entrada da instituição é ex-
posta aos diferentes públicos. É fundamental questionar e tentar res-
ponder: “Eu estou dizendo quem eu sou, por que eu sou e como eu
faço”, e eu preciso responder a essas indagações não somente com
as falas, palavras, mas também com ações.
Um outro aspecto são as novas tecnologias. A professora ressalta
que elas devem ser vistas como auxiliares, pois nada substitui o “face
a face”. As obras publicadas nos dois últimos anos na área de organiza-
ções têm tentado recuperar essa ideia. Proissionais, lado a lado, cada
um com seu computador, ‘comunicam-se’ por MSN, Gtalk. A comunica-
ção face a face perde para uma comunicação mediada tecnologicamente
e, com isso, perde-se em interação e as trocas deixam de existir. Portan-
to, uma empresa ou instituição bem equipada tecnologicamente não é
sinônimo de bons resultados e tampouco de bom ambiente de trabalho.

Se a instituição marista decide-se por implantar uma co-


municação interna, será que ela de fato pretende fazer
desta ferramenta um diferencial da instituição? A marca
Marista, o jeito de ser Marista, está difundido entre os
professores, por exemplo?

44 – Cleusa Scroferneker
Ao ler o documento que fala do Estilo Marista de Educar, disponí-
vel no portal (maristas.org.br), a professora airma que encontrou ali
ações de comunicação que são foco e que necessitam ser legitimadas
quando se decide pôr em prática a comunicação interna. Ela destaca
as seguintes:

• Tem como fundamento e princípio o respeito, a aceitação, a


compreensão e a amizade.
• Mostra sempre uma atitude de disponibilidade, um ambiente de
bom relacionamento, de coniança, de escuta e ainidade.

“Já está escrito, já foi pensado”, assim sendo, a ação para uma
comunicação interna já está implícita no jeito marista de educar,
mas é preciso deinir “que jeito é esse de fazer comunicação inter-
na. Estamos preparados, de fato, para escutar e ouvir?”. Por vezes,
lembra a professora, escutamos e não ouvimos, ou olhamos, mas
não efetivamente vemos determinadas coisas. Daí a importância
dos espaços de oralidade. É preciso dar espaços de fala para as
pessoas e demonstrar a elas que elas podem coniar, que podem
verbalizar. “A coniança é a palavra-chave”, airma Cleusa, e é a
base para qualquer diálogo.
Comunicar, portanto, é um processo complexo porque envolve
pessoas com sensações, sentimentos e expectativas. “Não somos
iguais, ainda que com a mesma formação”. Logo, temos de entender
que é necessário respeitar o outro, no que há em comum e nas nos-
sas diferenças. Parece um conceito básico, primordial para a política
de comunicação interna, porém por vezes cai no esquecimento. A
instituição possui uma cultura, assim como cada unidade, e é ne-
cessário conhecer a realidade dessas unidades. Para tanto, é preciso
ouvir aqueles que constroem essa realidade e respeitar as individua-
lidades existentes em cada parte do todo.

Planejar a comunicação interna

Dentre as possibilidades para pensar o planejamento da comuni-


cação interna foram destacadas a realização de auditorias, cujo ob-
jetivo principal avaliar o ‘ambiente’ de comunicação na instituição,
mediante questionários, criação de espaços de oralidade e outraspro-
cedimentos que atinjam o objetivo proposto. Ela pode ser utilizadas
não apenas para detectar problemas, mas também para melhorar e
qualiicar a comunicação.

Comunicação interna – todos querem, poucos fazem – 45


A Auditoria de Comunicação tem como propósito funda-
mental, pesquisar, examinar e avaliar como funciona o
sistema de comunicação, do ponto de vista da eiciência,
eicácia e efetividade [...] Visa também, corrigir desvios,
prevenir e encaminhar soluções de problemas e aperfeiço-
ar o sistema de comunicação de uma organização, buscan-
do com isso melhorar o seu desempenho (KUNSCH, 2006).

A professora chama a atenção para a teoria da Investigação Aprecia-


tiva, que também é chamada de Método ou Metodologia da Investigação
Apreciativa (Appreciative Inquiry) e foi desenvolvida por David Cooperri-
der, Ronald Fry, Suresh Srivastva e seus colaboradores, no Departamento
de Comportamento Organizacional da Case Western Reserve University,
em Cleveland – Estados Unidos. Trata-se de uma nova prática, aplicada
atualmente apenas por algumas organizações no Brasil. A metodologia
proposta pela Investigação Apreciativa rompe com todos os paradigmas
sui-generis, principalmente quando se destina a pensar a comunicação.
Esta teoria não a pensa a partir dos seus problemas, ao contrário, parte
daquilo que a organização tem de melhor, trabalha com o positivo. Há
uma tendência geral de se realizarem reuniões para a resolução de crises,
ou levantamentos de aspectos não tão positivos e deixam-se de lado as
“coisas boas da instituição”, as ações bem sucedidas, os resultados ex-
pressivos ou não, mas bons resultados, acima de tudo.
Federico Varona, da Universidade de San Jose (Califórnia/USA), é
um dos autores que tem sistematizado e discutido os principais pres-
supostos dessa teoria. Em seu artigo Todavía es posible soñar: Teoría
apreciativa y Comunicación Organizacional, apresenta os quatro mo-
mentos que compõem essa teoria: descobrir, sonhar, desenhar e viver.

Descobrir: é perceber, por exemplo, quais são as melhores reali-


zações das nossas escolas, ou da nossa universidade? Ou seja, recu-
perar os aspectos positivos do sistema de comunicação. Com isso, as
pessoas começam a verbalizar e é possível para o gestor perceber o
que seus colaboradores esperam, o que eles valorizam e desejam em
relação à comunicação interna.

Nessa fase são compartilhadas e analisadas as melhores


realizações (as melhores práticas) de comunicação que
existem na organização, quer dizer, o núcleo positivo do
seu sistema de comunicação. Trata-se de descobrir o que
as pessoas valorizam, esperam e desejam do sistema de

46 – Cleusa Scroferneker
comunicação interna da organização. Para esta fase, Ve-
rona sugere a técnica das entrevistas apreciativas, que
contém apenas questões de teor positivo. É claro que
isso irá depender exclusivamente do gestor, “é necessá-
rio que ele acredite em tudo isso.

Sonhar: “Cada um de nós precisa ser um pouco Dom Quixote”.


Com essa frase a professora resume esta parte, que trata da ne-
cessidade de se ter utopias. São elas “que nos alimentam, que nos
mantêm acreditando”. É esta utopia que nos faz sonhar, e quando se
sonha se estabelece um diálogo criativo, “eu convido os meus pares:
vamos pensar criativamente?”. É o momento de imaginar que tipo de
instituição Marista se gostaria de ter, e a partir daí se deine o que é
bom, o que é possível e o que é ideal.

Propõe-se um diálogo criativo. É o momento de imaginar


(Sonhar) qual seria a comunicação ideal para a Organi-
zação/Instituição. Questiona-se sobre o bom, o possível
e o ideal para melhorar o sistema de comunicação [inter-
na] da organização/Instituição. Como nós gostaríamos
que fosse a comunicação daqui a cinco anos? Quais são
os nossos três desejos para que a comunicação seja me-
lhor possível na organização/Instituição?

Desenhar: a partir do sonho, desenha-se qual seria a instituição


ideal e qual seria o sistema ideal de comunicação para a instituição.

A partir da Descoberta e do Sonho é proposto o Desenho


da Organização/Instituição Ideal e do seu sistema Ideal
de Comunicação [Interna). São, então, formuladas Pro-
posições Provocativas.

São essas proposições que nos encaminham para o quarto mo-


mento que é o viver. É este momento que irá permitir que este “so-
nho sonhado em conjunto”, possa ser realizado.

O objetivo é garantir que o Sonho possa ser realizado,


identiicando e planiicando os programas (projetos), as
ações que são necessárias para viabilizar as Proposições
Provocativas formuladas na fase do Desenho.

Comunicação interna – todos querem, poucos fazem – 47


Conclusões

Para Cleusa Scroferneker, o planejamento de comunicação inter-


na não pode estar descolado do planejamento estratégico da insti-
tuição, para que se possa enxergar a organização como um todo.
E quando se decide pela comunicação interna, a organização precisa
ter clareza de que comunicação interna se está falando.

O planejamento de comunicação interna necessita estar


contemplado no planejamento estratégico da organiza-
ção/Instituição. O que signiica dizer que, ao decidir-se
pelo planejamento da sua comunicação interna, a orga-
nização/Instituição precisa ter clareza, inicialmente, de
que comunicação interna ela está ‘falando’

Algumas questões que podem auxiliar neste processo são:

• O que a organização/Instituição entende por comunicação?


• Acaso não estará confundindo comunicação com ações de marketing?
• Estará disposta a construir uma cultura de comunicação, assegu-
rando participação e voz a todos os membros da organização?
• Tem proissionais com conhecimento e expertise [em comunicação]
para planejar, implantar, implementar e gerenciar a sua comunicação?

O planejamento da comunicação interna inicia-se pelo diagnósti-


co, que pode ser feito através das técnicas de Auditoria/Investigação
Apreciativa. É necessário, no instante seguinte, identiicar e relacio-
nar (mapear, conforme FRANÇA, 2004) os diferentes públicos, além
de relacionar e caracterizar os principais veículos/canais/meios/espa-
ços que a instituição tem utilizado para se comunicar com seus públi-
cos. Este é o momento chave, em que se avalia se o boletim interno,
o intranet, ou o mural realmente comunicam. Assim, de posse dessas
informações, uma análise crítica necessita ser desenvolvida reunindo
proissionais capacitados e os gestores. Vale lembrar, que o ato de
propor políticas de comunicação sem o aval e o comprometimento
da direção é inviabilizá-lo de saída. Por isso a necessidade de clareza
conceitual e operacional sobre o que está sendo discutido e proposto:
“se a Direção não acredita, não acontece”.

48 – Cleusa Scroferneker
Pensar em comunicação interna é pensar em um outro
desenho de comunicação. É admiti-la como constituti-
va do amplo e complexo espectro da comunicação de
uma organização. É evitar reduzi-la a boletins internos,
a murais, a festas de confraternização – que em algu-
mas circunstâncias são apenas rituais – a cartazes na
intranet. Necessita, portanto ser pensada e planejada.
Requer conhecimento e proissionais efetivamente capa-
citados e competentes.

Acredita-se nas possibilidades das Instituições de Ensino efetiva-


mente viverem e praticarem a sua comunicação interna.

Exige ousadia,
É um desaio
Impõe [muita] relexão!

Sonho? Talvez... Mas, como diria Varona (2004): “Todavía es


posible soñar”. Está feito o convite.

Referências bibliográicas

MARCONDES FILHO, Ciro. Até que ponto, de fato, nos comunicamos?


São Paulo: Paulus, 2004.

VARONA, Federico. Todavía es possible soñar. Revista Organicom -


Ano 1 - Número 1 - Agosto de 2004.

FRANÇA, Fábio. Públicos. Como identiicá-los em uma nova visão


estratégica. São Paulo: Difusão Editora, 2004.

KUNSCH, Margarida M. K. Comunicação Organizacional: conceitos e


dimensões dos estudos e das práticas. In: Marlene Marchiori. (Org.).
Faces da Cultura e da Comunicação Organizacional. São Caetano do
Sul: Difusão Editora, 2006.

__________. Planejamento de Relações Públicas na Comunicação


Integrada. São Paulo: Summus, 2003.

Comunicação interna – todos querem, poucos fazem – 49


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Comunicação, identiicações
e imagem nas instituições
educacionais
Rudimar Baldissera13 registros e relato de Lidiane Amorim

A comunicação, construção de imagem e identiicação, sob a pers-


pectiva da complexidade, foram os temas por onde transitou a apre-
sentação do professor Rudimar Baldissera na 7ª edição do Encontro
de Comunicação Marista. Uma das ideias centrais de sua apresenta-
ção é de que o “o fato de se dizer algo para alguém não signiica que
se terá o retorno da forma como se espera”. Segundo ele, de modo
geral, trabalha-se comunicação em uma visão focada no marketing,
em que se pensa numa relação causa-efeito, “se... então”. Ou seja,
a organização faz um movimento em termos de comunicação e es-
pera que o público dê o retorno desejado. Porém, por melhor e mais
bem planejada que seja a intenção que move uma determinada ação
organizacional, o retorno depende de aspectos, tais como os saberes
prévios dos interlocutores, suas vontades, desejos e experiências; fa-
tores que são distintos, relativos, que variam de pessoa para pessoa.
Em se tratando de instituições de ensino, em que vários públicos
estão envolvidos, há uma diversidade de interesses – dos professores,
pais, alunos, gestores, interesses da comunidade, etc. – e nem sem-
pre tais interesses convergem para um mesmo ponto. É essa mesma
lógica que rege o processo que forma a imagem da instituição perante
seus públicos. Segundo Baldissera, ela tenderá a ser tanto mais positi-
va na medida em que conseguir atender às expectativas do seu públi-
co. É isso que conigura o processo de construção de imagem.

13 Palestra feita pelo Professor Rudimar Baldissera no 7º ECOM, em 2007. Registros foram feitos pela
jornalista Lidiane Amorim, que aqui relata a apresentação do professor.

Comunicação, identiicações e imagem nas instituições educacionais – 51


Comunicação e signiicação

Para Baldissera, a questão fundamental para se pensar a ima-


gem-conceito é a signiicação. Ele observa que, conforme Humberto
Eco14, toda comunicação supõe signiicação, porém nem toda signi-
icação pressupõe comunicação. Ou seja, mesmo que não haja uma
intenção de comunicar, as pessoas atribuem sentido ao que veem/
percebem. Em perspectiva de aproximar essa questão com as práti-
cas cotidianas, o professor exemplica:

Alguém que chega a algum lugar, como uma escola por


exemplo, sem nunca ter estado nela, ao chegar no local
e encontrar lixo espalhado diante do prédio da institui-
ção, provavelmente atribuirá sentidos ao que vê. Nesse
caso, é provável que sejam sentidos negativos, se con-
siderarmos os valores, crenças e padrões culturais, bem
como o imaginário que nos constroem. Certamente a es-
cola não tinha a intenção de comunicar o que o sujeito
visitante está vendo, mas, mesmo assim, ele atribuiu
sentidos e esses sentidos se articulam na sua constru-
ção da imagem-conceito da escola. Esse simples exem-
plo é suiciente para evidenciar que a imagem-conceito
se realiza sobre signiicação e não sobre comunicação,
por mais que a comunicação seja o principal processo
empregado estrategicamente para a fabricação de ima-
gens-conceito.

Portanto, uma das questões importantes quando se pensa em


processos comunicacionais, não é somente o que se quer dizer, mas
o que as pessoas irão entender sobre o que se disse ou sobre o que
se comunica, para além dos discursos institucionais. “Muitas vezes,
o nosso olhar, comportamento e postura, ou os ambientes, estão
transmitindo signiicados mesmo que não o queiramos”, lembra o
professor.

14 Escritor, crítico e professor de semiótica italiano (1932-). É considerado um dos expoentes da nova
narrativa italiana, iniciada por Ítalo Calvino (1923-1985). Exerce grande inluência sobre os meios
intelectuais internacionais ao estudar os fenômenos de comunicação ligados à cultura de massas,
como histórias em quadrinhos, telenovelas e cartazes publicitários (in http://www.netsaber.com.
br/biograias).

52 – Rudimar Baldissera
A comunicação sob a perspectiva da Complexidade

Partindo da ideia de distintas percepções e signiicações, Baldisse-


ra propõe que a comunicação seja pensada, na perspectiva do Paradig-
ma da Complexidade, como um processo de construção e disputa de
sentidos. Sob essa ótica, o público, no âmbito da comunicação, passa
a ser compreendido como agente do processo, ao contrário do que
acontecia antigamente, quando se imaginava o público numa posição
de passividade no processo comunicacional. No entendimento atual, a
comunicação é um processo de construção e disputa em que se lida
com um outro que também é ativo, que também percebe e atribui
sentido, que também (re)age, realiza estratégias que podem ser de
colaboração, de defesa, de desvio, de resistência, de vínculo etc.
A Teoria da Complexidade, de Edgar Morin14, possui três princí-
pios fundamentais: dialogismo, recursividade e hologramático. Bal-
dissera chama a atenção para o princípio dialógico, como uma das
importantes dimensões para se pensar comunicação nas organiza-
ções educacionais. Sob esse princípio, ressalta que a aparente orga-
nização vivida (o uno), guarda em si a permanente desorganização
(organização-desorganização – a dualidade), ou seja, as instituições
vivem permanentemente distante do equilíbrio. Essa tensão é fun-
damental para que a instituição se regenere e desenvolva. À medida
que a desorganização em relação com a organização gera algum nível
de desestabilidade também revigora a instituição educacional poden-
do gerar inovação.
O princípio da recursividade signiica que nos processos comu-
nicacionais “nós construímos e somos construídos pelo outro” – nós
construímos a sociedade que nos constrói. No caso de uma escola,
por exemplo, ela não apenas é agente na construção da socieda-
de senão que ela também é construída por todos os seus agentes
(alunos, professores, comunidades, mantenedora, governos, outras
organizações, etc). Particularmente, quando das relações mais es-
treitas, como as estabelecidas com alunos, professores e pais, dentre
outras, atualiza-se a ideia de corresponsabilidade no processo cons-
trutivo do educar; tanto do que cala quanto daquele que diz. Baldis-
sera lembra que, em situações de presença, é difícil não comunicar,
pois que, novamente, mesmo que não tenhamos intenção de dizer

14 Sociólogo, antropólogo, historiador e ilósofo, conhecido pela proposta do desenvolvimento do pen-


samento complexo, base de seus estudos, uma reforma do pensamento por meio do ensino trans-
disciplinar, capaz de formar cidadãos planetários, solidários e aptos a enfrentar os desaios dos tem-
pos atuais Pesquisador emérito do CNRS (Centro Nacional de Pesquisa Cientíica na França), autor
de mais de 30 livros, sendo a coletânia O Método, com seis volumes, a mais conhecida.

Comunicação, identiicações e imagem nas instituições educacionais – 53


algo, se o outro em presença atribuir sentido a algo (o comporta-
mento, os movimentos, o olhar, a postura) e perceber aquilo como
comunicação, será comunicação.
Já pelo princípio hologramático entende-se que “a parte está no
todo que está na parte” e que são, ao mesmo tempo, mais e menos.
A escola é parte de uma comunidade, é parte do todo comunidade.
Ao mesmo tempo, possui coisas que são próprias, que não estão na
comunidade. Da mesma forma, o todo, ou seja, as questões cultu-
rais, sociais, relações de poder que se estabelecem na comunidade
podem estar presentes na escola, o que não signiica que estejam
em sentido total, tal qual estão no todo. Sempre falta e sobra algo.
Diante disso, não é possível pensar a escola sem compreender a so-
ciedade, pois que a organização escola é parte do sistema sociedade.
Baldissera ainda lembra que, na perspectiva de Bakhtin, no pro-
cesso de comunicação, como diálogo, há, pelo menos, duas forças
em relação: o eu e o outro, e não um eu superior/inferior ao outro.
Tal relação de poder se dará no acontecer, ou seja, durante o proces-
so e irá depender, dentre outras coisas, das informações que cada
sujeito possui, suas competências, etc.

Cultura, pertencimento e identidade

Para se pensar em imagem, Baldissera também utiliza o conceito


de cultura, proposto por Geertz15, que vai pensá-la como uma rede
de signiicação construída pelos sujeitos e à qual se “prenderam”.
“Quando se pensa em valores, crenças, padrões, a cultura, na pers-
pectiva do Geertz, deve-se pensar no sentido daquela ação, qual o
seu signiicado e no que ela implica”. Nessa perspectiva, essa cultura
nos dá orientações de como devemos agir em determinado lugar/
grupo, etc. Ela também prescreve e proscreve, ou seja, diz o que
devemos ou não fazer e, concomitantemente, as condições para isso
e suas consequências.
Discorrendo sobre as questões do pertencimento, o professor ob-
serva que “ao se propor a estudar em uma escola, para além das
questões de técnicas de logística, também é manifesta a vontade de
pertencimento (de estar com um grupo; pertencer a ele)”. Segundo
ele, particularmente quando esse desejo de pertencer é forte, tende

15 Clifford Geertz é considerado o fundador de uma das vertentes da antropologia contemporânea, a


chamada Antropologia Hermenêutica ou Interpretativa, que loresceu a partir dos anos 50. Com
cerca de vinte livros publicados, Clifford Geertz é, depois de Claude Lévi-Strauss, um dos ícones da
prática antropológica.

54 – Rudimar Baldissera
a fazer com que os indivíduos procurem adequar seu comportamen-
to para se sentir incluído naquele grupo ou ambiente, baseado nas
informações e no imaginário que elas têm sobre tal grupo/ambiente.
A realidade das escolas comprova essa tendência. Crianças e jovens
agrupados tendem a vestir-se da mesma forma, apresentar as mes-
mas necessidades e vontades, compartilhar gostos e preferências,
expressar-se e comportar-se de modo parecido. Tudo muito similar
sob a pena de não poder pertencer – ser excluído do grupo – caso
destoem de determinados padrões. O grupo gera os modelos cultu-
rais a serem seguidos pelos seus membros e por aqueles que dese-
jam pertencer a ele. Como cultura, tendem a ser reproduzidos até
que se tornem inconsistentes segundo os padrões do próprio grupo.
Outra questão levantada por Baldissera foi a importância das me-
diações. Pensa-se muito nas questões de midiatizações, ou seja, nas
ações de comunicação da instituição através dos diversos dispositi-
vos midiáticos, e esquece-se das mediações. Em uma comunicação
organizacional, em uma instituição de ensino, por exemplo, os pro-
fessores são mediadores em potencial. Eles podem agir no sentido de
mediar os processos comunicacionais, qualiicando as relações entre
a instituição e seus públicos, em especial a relação com os alunos.

Identidade

Ao falar de identidade o professor lembra que quando se pensa


nesta noção, pensa-se na questão do uno, do coeso. Entretanto, o ser
humano contemporâneo é um sujeito fragmentado, não mais previ-
sível como se pensava na época do Iluminismo. Baldissera utiliza o
conceito de Stuart Hall17, para deinir o sujeito pós-moderno:

o sujeito previamente vivido como tendo uma identida-


de uniicada e estável, está se tornando fragmentado;
composto não de uma única, mas de várias identidades,
algumas vezes contraditórias ou não-resolvidas (HALL,
2000, p.12).

17 Stuart Hall é um dos maiores expoentes da corrente conhecida como Escola de Birmigham, ou "es-
tudos culturais", conjunto de pensadores britânicos contemporâneos que, a partir de uma leitura do
ilósofo marxista Antonio Gramsci, fazem uma radiograia dos processos culturais contemporâneos.

Comunicação, identiicações e imagem nas instituições educacionais – 55


Nesse contexto, autores acreditam que, no lugar do conceito iden-
tidade, é melhor se pensar em identiicação, processos identiicatórios.
Baldissera utiliza a dimensão de identiicação, a partir do sociólogo fran-
cês Michel Maffesoli18, para quem os sujeitos assumem diversos papéis,
numa multiplicidade de representações e identiicações. Então ele ques-
tiona: “qual seria o papel da instituição de ensino na comunidade?”.
Tomando-se a organização escola como uma identidade fragmen-
tada, pode-se pensar que ela, identidade, se exerce como força que
mantém coesas (juntas) as várias identiicações que a escola pode
realizar. Assim, também se exerce como força que libera as identii-
cações possíveis em situações contextuais. Dessa forma, pensando-
se os processos comunicacionais para gerar identiicação, observa-se
que a forma como a escola vai se comunicar com os pais é provavel-
mente diferente da forma como vai se apresentar às crianças. Cada
uma dessas formas é um papel que a escola assume, é um determi-
nado lugar de fala.

[...] como complexus de identiicações, isto é, a iden-


tidade é a tessitura e a força que amalgama as várias
identiicações possíveis de um indivíduo-sujeito – por-
tanto, também de uma organização, cultura e sociedade.
A identidade não é apenas diferença, exclusão, fecha-
mento, organização, unidade, antagonismo, egocen-
trismo, mas também semelhança, inclusão, abertura,
desorganização, multiplicidade, complementaridade e
sociocentrismo” (BALDISSERA, 2004).

Imagem-conceito

“É possível passar ou vender imagem?”, perguntou Baldissera


para introduzir este tópico. Antes de qualquer resposta é preciso se
pensar de que imagem se fala, alerta o professor. Da imagem física,
imagem-linguagem (quando se comunica através de uma imagem fí-
sica, como a fotograia, por exemplo) ou da imagem-conceito (aquela
que se forma na mente das pessoas, da alteridade)? Se for dessa
última, a resposta é “não”. Esta imagem não pode ser vendida e tam-
pouco transferida.

18 Sociólogo, professor na Sorbonne - Paris V, é diretor do Centro de Estudos sobre o Atual e o Quoti-
diano (CEAQ), e um dos autores franceses contemporâneos mais traduzidos no Brasil, com cerca de
15 livros publicados por editoras brasileiras.

56 – Rudimar Baldissera
A ‘imagem-conceito’ é um construto simbólico, complexo
e sintetizante, de caráter judicativo/caracterizante e pro-
visório, realizada pela alteridade (pelo outro) (recepção)
mediante permanentes tensões dialógicas, dialéticas e
recursivas, intra e entre uma diversidade de elementos-
força (BALDISSERA, 2004).

É uma imagem que se transforma permanentemente, a cada


novo evento, fato, relação, e pode ser inluenciada por diversas ques-
tões internas e externas. É construída fora do que está em cena,
uma construção que acontece permanentemente em diferentes lu-
gares. Nas palavras do professor: “a construção da imagem-conceito
é transcênica, ou seja, dá-se por vias que transcendem os cenários
estrategicamente armados”.
Este construto compreende a capacidade de construção de senti-
do que, por sua vez, depende da capacidade de atribuição de sentido
do público. Sendo assim, caso se pense em estratégia para a constru-
ção de imagem-conceito, será necessário, dentre outras coisas, “do-
minar os seus códigos culturais, levar em conta seus saberes prévios,
suas experiências. Quanto mais se conhecer os códigos do público
que se quer que construa a imagem da organização e se souber em-
pregar esse conhecimento de modo qualiicado nos processos de co-
municação organizacional, mais provavelmente se poderá conseguir
atingir suas expectativas”.
Outro ponto importante destacado por Baldissera é a construção
da imagem da instituição de forma não oicial. Segundo ele, a cons-
trução da imagem-conceito não se restringe aos processos formais,
oiciais. Mas se realiza, também, através das relações/interações não
oiciais. Assim, ela se dará inclusive pela manifestação das opiniões
dos alunos sobre a escola, os professores; também contempla as
opiniões dos pais em diversos ambientes da comunidade e os co-
mentários daí advindos. Tudo inluenciará nas imagens-conceito da
instituição formadas pelos públicos.

O processo de construção

Antes de mais nada, importa conhecer a própria identidade: “quem


sou”? Segundo o professor, “é preciso compreender quem é a institui-
ção, sua função social, a que se propõe”. Logo, pensar a autoimagem
ideal, e a autoimagem reconhecida, ou seja, “como eu deveria e como
acredito que estou sendo vista”. Neste momento, entram em cena cul-

Comunicação, identiicações e imagem nas instituições educacionais – 57


tura e imaginário: “o que a comunidade espera de mim? Qual a expec-
tativa que a comunidade tem de uma escola?”. Tudo isso pensado em
sua articulação aos paradigmas (econômicos, políticos, sociais, etc.)
em que se insere a organização escola e seus públicos.
A partir dos diferentes públicos deve-se pensar qual a alterima-
gem ideal, ou seja, “o que o público pensa que seja uma escola ideal”,
e a partir dessa expectativa, qual a imagem de fato (deinir os con-
ceitos a serem atingidos – autoimagem ideal). Assim, quanto mais
próxima a imagem-conceito estiver das expectativas do público, mais
provavelmente a imagem será positiva. Distanciar-se das expectati-
vas em sentido negativo tenderá a se traduzir em imagem-conceito
negativa. Considerando que a imagem-conceito transforma-se per-
manentemente, importa o constante acompanhamento através de
diagnósticos e, na medida da necessidade, ajustes da comunicação
ou mesmo sobre a própria identidade organizacional.

Para se pensar um plano de comunicação

Deinida a identidade, os conceitos que se deseja ver associados


à instituição, começa-se efetivamente o planejamento da ação de
comunicação que deverá compreender, conforme Baldissera, conigu-
rações signiicativas, mensagens e criação de fatos. É preciso pensar
em uma relação entre a rede de circulação mediatizada (mediado-
res) e midiatizada (através da mídia), com o intuito de se atingir o
público-alvo.
Esse público é constantemente informado e persuadido pelo que

Repertório
competências
experiências
outras
Percepções informações e
Fluxos de estímulos não planejados associações
psique

Autoimagem
ideal Rede de
Planejamento Alternativas
circulação de
configurações ideais
estímulos Públicos-alvo
significativas
mediatizações,
mensagens
mediações
fatos
Identidade

Imagens-conceito
Aferição de imagem

Fonte: Baldissera, 2004.

58 – Rudimar Baldissera
se planeja, porém, ao mesmo tempo, “recebe inluências de outros
lugares dos quais não nos damos conta; são inluências externas que
escapam a qualquer possibilidade de controle, mas que inluenciam a
percepção do público sobre a instituição”.
O repertório, as competências, informações e experiências dos
públicos também inluenciam a construção de imagem que realizam.
Sendo assim, o público deve ser visto como composto por sujeitos,
com suas individualidades, que percebe as informações oiciais e não
oiciais, e articula tudo isso, juntamente com suas expectativas. É
através desse longo e articulado processo que se construirá a ima-
gem-conceito da instituição no imaginário de seu público.

Referências bibliográicas

BALDISSERA, Rudimar. Imagem-conceito: anterior à comunicação,


um lugar de signiicação. Porto Alegre: 2004. Tese (Doutorado) – Fa-
culdade de Comunicação Social da PUCRS.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução


Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro - 7ª edição. Editora
DP&A. São Paulo 2002.

Comunicação, identiicações e imagem nas instituições educacionais – 59


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A construção da visibilidade e
a legitimação das instituições
na contemporaneidade
Eugênia Mariano da Rocha Barichello19

Os novos contextos que servem de ambiência para a visibilidade e


legitimação das instituições, e a íntima ligação entre estes dois concei-
tos, é o tema desta palestra. Para início é importante conceituar os dois
temas. Visibilidade é, no seu entendimento, aquilo que ilumina o fato, o
que o expõe, e as escolhas estratégicas que estão envolvidas nesse pro-
cesso. Se na Idade Média uma execução em público conferia visibilidade
à instituição que agia dessa forma, hoje em dia essa visibilidade se dá
através dos meios de comunicação, assim como a legitimação.
Há, portanto uma forte ligação entre o visível e o legítimo. No âmbi-
to da comunicação organizacional, fala-se muito na “boa imagem diante
do público”, na “aceitação dos públicos”, isso, de certo modo, é legiti-
midade. Legitimidade, portanto, é reconhecimento. Conforme ensina
a sociologia, sempre que uma determinada prática é institucionalizada,
ela é legitimada, lembra a professora. Hoje em dia, com a nova coni-
guração espaço-temporal que se vivencia em função das tecnologias de
comunicação e informação, a visibilidade está, cada vez mais, associada
ao poder e aos dispositivos que iluminam os fatos em cada época.
Já o conceito de imagem é referenciado como resultante da re-
presentação da identidade pela organização/instituição e da percep-
ção desta pelos públicos. É preciso pontuar que questão da identida-
de, outrora, era percebida como algo estático, mas é um processo
dinâmico, que conigura a maneira como os outros nos reconhecem
e como nós os reconhecemos. A identidade costumava aparecer no
plano de comunicação da organização/instituição como uma proposi-
ção. É preconizado como ela deveria ser, e como se deveria agir para

19 Eugênia Mariano da Rocha foi palestrante do 7º ECOM, em 2008. A partir do relato da apresentação
realizado por Lidiane Amorim, a autora desenvolveu o presente artigo.

A construção da visibilidade e a legitimação das instituições na contemporaneidade – 61


mantê-la. No entanto, a identidade é muito mais que uma proposta
e um reconhecimento.

Essas noções (visibilidade, legitimidade, identidade e


imagem) têm uso corrente em outros campos do saber,
como a ilosoia, a sociologia, o marketing e a psicologia,
e são pertinentes para estudar aspectos fundamentais
nas práticas de Relações Públicas e de Comunicação Or-
ganizacional.

Vamos abordar o tema em quatro momentos: primeiramente o


poder outorgado pela visibilidade, em meio a uma sociedade pautada
pela imagem, fazendo uma distinção entre a visibilidade e a “visuali-
dade” nos meios. A visibilidade no seu entendimento é mais do que o
“ser visível”, possui um signiicado estratégico.
Num segundo momento, o novo local da cena de legitimação,
que antes se dava no local do acontecimento. Não estamos mais na
época em que, para chamar a atenção dos seus superiores, trabalha-
dores quebravam máquinas, como na Revolução Industrial. Se hoje,
professores da rede pública de ensino, por exemplo, desejarem cha-
mar a atenção, realizar uma greve não é suiciente. Se não tiverem
uma estratégia de visibilidade na mídia, na internet, “se não tiverem
obtido a presença de sua manifestação na mídia e nas redes sociais
digitais, não adianta parar”.
Uma terceira questão é o reconhecimento da identidade institu-
cional como uma construção conjunta entre a organização/instituição
e seus públicos. E por último, os quatro fatores para se pensar a co-
municação organizacional na contemporaneidade.

Visibilidade

O conceito de visibilidade modiicou-se de acordo com os mo-


mentos históricos da humanidade. Na sociedade de soberania, onde
o rei ou senhor exercia o poder por meio de uma vigilância externa e
geral, a visibilidade se dava pela suntuosidade das vestimentas, pela
arquitetura, pelos desiles, etc.
Na sociedade disciplinar, as instituições são os maiores disposi-
tivos de visibilidade. Enquanto na sociedade de controle, entram em
crise os modos de existir e representar das instituições disciplinares.
Atualmente ocorre a implantação progressiva do exercício do poder a
distância, proporcionada, especialmente, pelos meios de comunica-

62 – Eugênia Mariano da Rocha Barichello


ção digitais. A professora acredita que estamos vivendo uma trans-
ferência da sociedade disciplinar para a de controle, ou uma coexis-
tência de ambas.
Há o pressuposto de que a necessidade de legitimação acompanha
o próprio processo de institucionalização e tem como objetivo expli-
car e justiicar a instituição perante a sociedade (Berger e Luckmann,
1997). Porém, atualmente é possível observar a transferência da cena
do processo de legitimação, que deixa de ser o local onde ocorrem
as práticas institucionais e inclui, cada vez mais, a representação nos
meios de comunicação. Nesse contexto, a mídia é o principal dispositi-
vo contemporâneo de visibilidade das instituições, sendo responsável,
em grande parte, pela sua legitimação junto à sociedade.
Também é preciso estar atento às novas lógicas que regem a
sociedade e se instalam através da evolução das tecnologias de in-
formação, como acontece com a “lógica da midiatização”. “A lógica
midiática tomando conta de tudo”, o que faz da mídia um palco de
visibilidade, de disputa e legitimação e, ainda, faz as organizações
não midiáticas atuarem segundo as lógicas da mídia. O ambiente
midiatizado cria novos luxos de comunicação e novos formatos or-
ganizacionais. Criam-se, também, novas mediações e interlocuções,
nas quais a atuação dos meios de comunicação é peça fundamental e
legitimadora de um processo permanente de construção identitária.

Identidade como construção

Atualmente, identiicar uma instituição signiica reconhecê-la entre


tantas outras, e o processo de identiicação é determinado pelo olhar
dos outros (sujeitos e organizações) e pelo relacionamento com esses
outros. Uma instituição é criada com um propósito, uma missão, ob-
jetivos, mas, durante sua existência, ocorre uma série de processos
que consistem em fatores negociáveis. “A instituição não é somente
um polo de emissão, pois, atualmente, o contexto de possibilidades
comunicativas provoca um deslocamento do polo emissor, que faz dos
receptores também emissores, ativos no processo de comunicação”.
As primeiras teorias das organizações consideravam só a comuni-
cação interna, a estrutura da organização, e seus conlitos. Foi com a
abordagem sistêmica e, posteriormente, com a teoria da complexida-
de, que as organizações começaram a dar ênfase à sua comunicação
como condição de continuidade e, atualmente, a questão posta é a
ampliação das possibilidades interativas e a multiplicidade de luxos
de comunicação proporcionados especialmente pela mídia digital.

A construção da visibilidade e a legitimação das instituições na contemporaneidade – 63


Quatro fatores para pensar as práticas
da comunicação organizacional hoje

1. Fenômenos sociais

Os fenômenos sociais são ações intencionais efetuadas em campos


de interação e tecnointeração simbólica. “Interagimos simbolicamente
quer seja na presença do outro, quer seja através de uma interação
mediada por tecnologias”. Estávamos acostumados a estudar a so-
ciedade dividida estruturalmente em campos: o econômico, o educa-
cional, o social, etc., como foi proposto por Bourdieu (1998). Neste
contexto, a mídia assume um papel de mediador entre os campos.
Complexiicando a divisão estrutural da sociedade em campos autô-
nomos, a proposta de Castells (1999) apresenta uma sociedade marca-
da pelo funcionamento de redes interligadas. O sociólogo catalão propõe
a noção de “espaço de luxos” com base na premissa de que espaço é
a expressão da sociedade e estão surgindo novas formas e processos
espaciais por conta da comunicação mediada por computador.
Como o espaço não pode ser deinido sem referência às práticas
sociais, passou a se utilizar o vocábulo território para denominar o
espaço no qual ocorrem práticas sociais e que incluem, desde uma
dimensão geográica, até uma dimensão simbólica. É nesse território
que se estabelecem os campos de disputa.

2. Campos de disputa

Os campos de disputa estruturam-se em territórios; urge, porém,


pensar em novas territorialidades ou conformações territoriais, como
as possibilitadas pelas redes. A deinição de uma posição no mundo
se dá por um conjunto de processos que incluem o estabelecimento
de laços sociais, o território no qual ocorrem essas trocas e as formas
de pertencimento às organizações sociais.
É preciso observar especialmente as novas topograias territoriais
proporcionadas pelos meios de comunicação que vêm redeinindo as
práticas sociais e as bases tecnoculturais nas quais se estruturam as
organizações. A partir dessa premissa é possível pensar nas novas ter-
ritorialidades e nos luxos comunicacionais, que utilizam como suporte
os e-mails, os blogs, o Orkut, o Facebook e as redes sociais digitais em
geral. Nelas, os sujeitos, os públicos de uma organização, possuem um
espaço de expressão, que deve ser considerado no planejamento das
estratégias de comunicação das organizações contemporâneas.

64 – Eugênia Mariano da Rocha Barichello


3. Fluxos comunicativos e possibilidades (tele)interativas

É através destes luxos que são estabelecidos os entendimen-


tos possíveis. Com base nas relações comunicacionais estabelecidas
entre as organizações e seus públicos, James Grunig e Todd Hunt
(2003) propuseram quatro modelos de relações públicas: agência de
imprensa/propaganda; informação pública; assimétrico bidirecional e
simétrico bidirecional. Esses quatro modelos têm suas especiicida-
des e podem ser utilizados conforme a demanda ou problema de co-
municação que se apresenta. Porém, é preciso considerar que hoje,
diante das possibilidades de comunicação digital, temos possibilidade
de exercer o terceiro modelo, o simétrico bidirecional.
Diante do exposto, é preciso considerar a comunicação mediada
por computador e suas propriedades tanto na utilização como na for-
mulação de novos modelos, de forma a contemplar a convergência
das ações possibilitadas pelo suporte digital e pela interatividade que
ele proporciona, fatores que reconiguram, queira-se ou não, as
tipologias de luxos comunicacionais existentes hoje.

4. Organização e seus públicos

A essência continua sendo a comunicação da organização com


seus públicos. Atualmente, a comunicação digital reorganiza a tipolo-
gia dos públicos e sua relação com a empresa/instituição. Isso, por sua
vez, demanda denominações novas ou híbridas para os públicos e pro-
porciona uma convergência de possibilidades técnicas, ações e usos.
A gestão da comunicação interna incorpora práticas, como reu-
niões virtuais, troca informal e formal de correspondência, convoca-
ções e ordens de serviço. E, cada vez mais, se diluem os muros entre
a comunicação interna e a externa. Esta última permite ao portal
institucional na internet efetuar transações, publicar editais e outras
comunicações formais ou não.
Em síntese, o contexto atual propicia novas formas de organiza-
ção, funcionamento e legitimação das instituições/organizações, ao
proporcionar diferentes modalidades de interação e luxos comunica-
tivos, novas formas de visibilidade, interatividade e maneiras diferen-
ciadas de comunicar-se com os públicos.

A construção da visibilidade e a legitimação das instituições na contemporaneidade – 65


Referências bibliográicas

BERGER, Peter e LUCKMANN, Thomas. Modernidad, pluralismo y cri-


sis de sentido. La orientación del hombre moderno. Barcelona/Bue-
nos Aires/México, Paidós.

BORDIEU, Pierre. Escritos de Educação. Petrópolis: Vozes, 1998.

CASTELLS, Manoel. A sociedade em rede. A era da informação: eco-


nomia, sociedade e cultura. São Paulo: Paz e Terra,1999.

GRUNIG, James. A administração das relações públicas na adminis-


tração e sua contribuição para a efetividade organizacional e societal.
Tradução de John Franklin Arce. Comunicação & Sociedade, São Ber-
nardo do Campo, v. 24, n. 39, p. 67-92, jan./jul. 2003.

66 – Eugênia Mariano da Rocha Barichello


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Públicos, mensagens e
produção de sentido
Lidiane Ramirez Amorim20

Embora a aproximação entre os campos da comunicação e educa-


ção ainda seja recente, as intersecções que se fazem possíveis entre as
duas áreas são inúmeras. Este texto é um convite a enxergar o universo
escolar a partir dos saberes da comunicação, o que já traz, em si, um
segundo convite: compreender a comunicação para além da técnica,
das ferramentas, dos canais. Este entendimento é o ponto de partida
para podermos pensar na relação que se estabelece entre as dimensões
de público e mensagens no contexto escolar, e as produções de sentido
que ecoam em cada fragmento do espaço-tempo escola.
A comunicação que trago presente neste texto é aquela que está
implícita em qualquer relação que se estabelece entre a organização,
neste caso a escola, e seus diversos públicos. Relação intencional
ou não, verbal ou não-verbal, direta ou indireta, consciente ou invo-
luntária. Falo da comunicação segundo a compreensão proposta por
uma série de pensadores contemporâneos, entre eles Ciro Marcondes
Filho, professor e investigador da área, jornalista, sociológo e pós-
doutor em Comunicação. Partilho da sua convicção de que a comuni-
cação não está na difusão em massa dos jornais, rádios, televisões,
revistas, publicidades de rua, nos folderes, cartazes, banners, murais
presentes em nossas escolas.
Nesses casos a comunicação é apenas difusão, defende o pesqui-
sador, uma vez que não há uma ação recíproca, troca, aprendizado
e relação com o outro. Signiica pensar que a comunicação não se
realiza apenas no que é expresso intencionalmente, nas palavras do
autor “na maquiagem que pretendemos de nós, de nossas coisas, de
nossos produtos, de nossas ações”. Tudo isso fornece sinais de quem

20 Artigo produzido pela autora com base na apresentação feita em mesa temática no 8º Ecom, em 2009.

Públicos, mensagens e produção de sentido – 67


somos, mas não necessariamente é comunicação. Na perspectiva de
Marcondes Filho, e que signiica meu lugar de fala nestas linhas, co-
municação é, acima de tudo, relação entre mim o outro e os demais,
a relação da escola com seus estudantes, educadores, funcionários,
famílias, e, por esse motivo, ela vai além da linguagem estruturada
ou dos canais institucionalizados com os quais lidamos diariamente.
Signiica compreender também que transmissão não necessa-
riamente é comunicação e que a técnica não garante o sucesso da
compreensão do que queremos comunicar. Dominique Wolton, pes-
quisador francês que também tem difundido esse outro modo de ver
e pensar a comunicação, nos faz lembrar que a dimensão técnica não
basta para comunicar, já que a comunicação possui uma dimensão
social e cultural que interferem na apreensão do que é dito, do que
é comunicado. Logo, a intercompreensão não é diretamente propor-
cional à eicácia das técnicas. Basta olharmos em volta e perceber-
mos os grandes avanços tecnológicos que estamos presenciando, o
volume incontável de informações às quais temos acesso e, ainda
assim, seguimos esbarrando na incompreensão, nos mal-entendidos,
na incomunicação.
Esses autores nos propõem pensar que do outro lado há um su-
jeito que sempre receberá nossas mensagens de maneira mediada,
entendendo aqui mediações como lugar onde a comunicação ganha
signiicado e produz sentido. A construção do sentido que esse Outro
fará do que nós comunicamos é imprevisível. Como airma Eliseo
Verón, importante pesquisador argentino da área de comunicação,
linguística e semiótica, não há uma causalidade linear no universo
dos sentidos. O que nos leva a acreditar que a produção de sentido
das nossas mensagens e, por consequência, de toda e qualquer ação
de comunicação, é um campo de incertezas, mas que a não torna
menos fascinante, importante e fundamental para a continuidade e
perpetuidade de nossas instituições.

Parada obrigatória: pensar os/nos públicos

Deslocar o foco da emissão para a recepção, preocupar-se com


esse Outro, com a linguagem, com a produção de sentido é um
aprendizado que vale para todas as dimensões de uma instituição
de ensino. Este é um dos conceitos-chave quando se pensa qualquer
relação de comunicação. Comunicar, em meio a sua complexidade,
é, antes de tudo, reconhecer a importância do outro e ir ao encontro
dele, como defende Wolton (2006). Pensar nos públicos antes de re-

68 – Lidiane Ramirez de Amorim


alizar qualquer ação, evento, projeto, atividade é fundamental para
que consigamos atingir plenamente os objetivos traçados para cada
iniciativa. Qualquer planejamento depende, essencialmente, de uma
clara deinição de que público(s) queremos atingir e, posteriormen-
te, todo nosso conhecimento sobre o peril desse público precisa ser
evocado no momento de deinir que iniciativas, que linguagem, que
estratégias, canais, ferramentas, métodos, etc., serão utilizados.
Ao olhar da comunicação contemporânea, o Outro não se encon-
tra mais apenas do “outro lado”. Ele está cada vez mais próximo, e,
se pensarmos na realidade do cotidiano escolar e, em âmbito geral,
da relação que se estabelece entre consumidores e organizações que
oferecem serviços ou produtos, no contexto globalizado e midiatizado
em que nos encontramos, já não há como controlar os luxos de troca
comunicativa em que nossas instituições podem estar presentes, e
tampouco fechar os olhos e optar por não escutar os anseios e neces-
sidades dos nossos públicos.
Pensemos em uma situação cotidiana, a relação família e escola,
por exemplo, fundamental e que costuma ser um diferencial das ins-
tituições de ensino confessionais católicas. Especiicamente, lembre-
mos dos momentos necessários de visita da família à escola, como
entrega de boletins ou reunião de pais. Sabemos que, em alguns
casos, há a tendência em planejar esses momentos com o foco no
olhar da escola, no que ela acredita que precisa ser dito, nas dinâmi-
cas que, a seu ver, podem ser realizadas, sem incluir nessa relexão
o pensamento sobre o peril das famílias, ou sobre suas agendas e
rotinas, por exemplo.
Esse exemplo deixa claro o polo emissor como deinidor da ação.
O ato de se colocar no lugar do Outro, quando se planeja qualquer
atividade, ação, projeto, mensagem, em âmbito geral, ainda é pouco
praticado. Permanece, quase que inconscientemente, talvez por estar
enraizado na cultura da escola, planejamentos centrados nas pessoas
que os elaboram. Esse pensar no Outro requer que a escola se auto-
questione: o que é realmente importante informar às nossas famílias?
Essa dinâmica que, ao nosso olhar parece signiicativa, vai ser inte-
ressante para o peril de pais e responsáveis deste nível de ensino?
Que estratégias precisamos utilizar para dizer o que precisa ser dito de
modo a ser compreendido e produzir o sentido que esperamos?
Um outro exemplo são os eventos escolares. Em algumas reali-
dades, ainda se tem o hábito de construí-los apenas com base nas
ideias dos organizadores que nem sempre são as mais adequadas
para o peril dos “convidados”. Isso revela outra lacuna: o quanto

Públicos, mensagens e produção de sentido – 69


conhecemos de fato esses nossos convidados? Falo do conhecer legí-
timo, baseado não só na experiência, mas em pesquisas, em estudos,
em olhares sensíveis a ponto de perceber para além da “ponta do
iceberg”. Infelizmente, não é prática consolidada na escola a escuta
aos públicos, posterior à realização dos eventos. Interessa-nos saber
se os públicos gostaram da atividade que promovemos? Quantos dos
eventos escolares passam por avaliações? E se elas são realizadas, os
dados são utilizados no momento de planejar o evento seguinte, ou
as respostas icam esquecidas nos bancos de dados ou nos relatórios
engavetados?
Comunicar, novamente, não é apenas informar, e o contrário,
como o título da última obra de Wolton, também é verdadeiro. Reuni-
ões meramente informativas, em que não se abrem espaços de inter-
locução e diálogo, em que o Outro que ali está para receber minhas
informações não foi incluído no processo de planejamento daquele
momento, comunica a maneira como eu percebo este evento e a
importância que dou aos meus interlocutores. Quando assume esse
formato de comunicação linear, de uma única via, “nós comunicamos,
eles nos escutam”, a escola perde uma grande oportunidade de cons-
truir vínculos entre família e escola, reforçar laços e demonstrar a
seriedade com que a instituição encara todos os processos inerentes
à sua rotina e o valor que confere a essa relação com as famílias.
O mesmo vale para outros públicos, não menos importantes,
como educadores e colaboradores. Eu, enquanto gestor, coordena-
dor, o quanto penso neles ao elaborar um evento, encontro, reunião?
O quanto estou aberto a escutar seus anseios? O quanto eles estão
informadas sobre o que se passa na escola, já que, em muitos casos,
são a primeira fonte de informação para estudantes e famílias? Há
espaços de diálogo para que possamos avaliar nossa caminhada de
maneira franca e apontar caminhos? O quanto eu os conheço, ver-
dadeiramente? O quanto do espírito de família, entre todos aqueles
que fazem a escola existir, se concretiza no cotidiano escolar? Se
pensarmos que são essas pessoas que permitem que a educação
aconteça todos os dias, já se justiica compreendê-las como públicos
prioritários, tão importantes como estudantes e famílias.
Proponho mais alguns questionamentos: como construir um cli-
ma saudável e feliz de trabalho, sem pensar nesses públicos? Como
construir os vínculos e a relação de coniança com as famílias, sem
pensar proativamente sobre elas? Como preparar aulas produtivas
sem pensar nas crianças e nos adolescentes que nos esperam na sala
de aula? Como preparar eventos sem entender quais as preferên-

70 – Lidiane Ramirez de Amorim


cias dos convidados? Como preparar um informativo, sem entender
a linguagem dos leitores? Como divulgar sem saber onde estão os
públicos que quero atingir? Como criar um peril nas redes sociais
sem saber em que redes da internet estão a maior parte de nossos
estudantes? Como deinir qual o melhor canal de comunicação com
as famílias, sem saber que canais elas mais acessam?
Poderiamos elaborar inúmeras outras perguntas para mostrar
que o pensamento nos públicos deve ser o primeiro passo de toda
e qualquer ação da escola que os envolvem. Isso requer um passo
anterior, que é ter clareza sobre que públicos queremos atingir. Um
dos grandes erros que se comete na elaboração de estratégias de
comunicação, o que também vale para ações em geral da escola, é
a falta de precisão dos públicos. Um exemplo muito claro: pensemos
nos informativos impressos. Há vários casos em que se busca atingir
com um único informativo públicos diversos: famílias, estudantes e
educadores. Como fazer com que um desses públicos se reconheça
na publicação se a linguagem, os temas, o visual, tentar dar conta
dos três ao mesmo tempo? É possível chamar a atenção dos adoles-
centes e das famílias utilizando uma única linguagem?
Diicilmente conseguiremos êxito e conquistaremos leitores as-
síduos se a publicação não “conversar” com eles, não falar a sua
língua, não for agradável aos seus olhos, não contemplar temas que
o interessam diretamente. A comunicação realizada em instituições
de ensino não pode se aproximar da lógica da comunicação de mas-
sa, típíca dos veículos tradicionais de comunicação, como televisão e
rádio, caracterizada pela emissão de mensagens únicas a um grande
público, sem distinção alguma. A eicácia das nossas ações é direta-
mente proporcional à clareza do(s) público(s) que queremos atingir e
o conhecimento que temos sobre eles.
O exemplo citado acima, do informativo escolar, evoca outra re-
lação fundamental: a adequação da mensagem segundo o peril do
público. Por muitos anos o pensamento teórico de comunicação, em
geral, foi centrado no emissor, naquele que diz, que informa, que
transmite, que codiica a mensagem, como se ali se bastasse todo o
processo de comunicar. Em algumas realidades, dentro das escolas,
essa perspectiva ainda permanece. Ela está presente, por exemplo,
naquele professor que, ao preparar a sua aula, deine o conteúdo
preocupado mais com a sua transmissão, esquecendo-se de reletir
sobre como esse conteúdo precisa ser comunicado para ser compre-
endido pelos estudantes. Mais adiante detalharei esse tema, mas é
importante lembrar que a perspectiva de uma comunicação de via

Públicos, mensagens e produção de sentido – 71


única, como já ilustrei acima, é uma visão superada teoricamente.
Os estudos contemporâneos de comunicação ressaltam esse novo
lugar que o receptor ocupa. O destinatário das nossas mensagens é
percebido como um ser ativo, que vai atribuir ou não sentido, depen-
dendo do seu interesse e da maneira como ele recebe a mensagem,
e nesse lugar reside o sucesso ou o fracasso da nossa ação. Apenas
a emissão não garante comunicação. A própria noção de emissor e
receptor como atores distintos já não corresponde à nossa realidade,
em que esses papéis podem coexistir no mesmo sujeito.
Nosso tempo é o tempo do compartilhamento, da produção in-
controlável de conteúdo e informação, da troca instantânea de men-
sagens, opiniões, impressões sobre tudo e todos, a todo momento.
Nossos muros não mais impedem nossa visibilidade e tampouco é
possivel blindar nossa imagem e reputação. O diálogo, portanto, já
não é escolha, é pré-requisito para uma convivência sadia, franca e
transparente com nossos públicos, além de ser também uma ação
estratégica já que, com base no resultado desses diálogos, é possível
perceber possíveis fraquezas e virtudes e, através delas, identiicar
grandes oportunidades de qualiicação e melhorias.

Parênteses: Educador, um comunicador por excelência

O aluno já não é um depositário de conhecimento, assim como


o receptor de um processo comunicativo já não é um ente passivo
diante dos meios de comunicação de massa, por exemplo. As mensa-
gens comunicadas e o aprendizado tampouco são predeterminados,
com um destino ixo e previsível. São, ao contrário, marcados pela
imprevisibilidade, por uma série de fatores que fazem com que pos-
suam ininitas formas de serem percebidos, de produzirem sentido,
dependendo dos personagens e dos contextos, das trajetórias, dos
repertórios e das mediações envolvidas.
Percebemos que o comunicador e professor trilham caminhos
semelhantes. Ambos possuem uma intencionalidade, um conteúdo
simbólico a ser transmitido. Ambos têm, na base do seu ofício, o
diálogo e a relação, o contato com a alteridade, com o outro com o
qual partilha um momento ímpar, um encontro único. O professor
tem muito de comunicador em si. Deve fazer com que sua mensagem
seja compreendida, a ponto de se transformar em conhecimento.
Deve primeiramente estar ciente do que quer comunicar e para que
público a mensagem será dirigida. E então pensar que estratégias
são adequadas para que o que se quer dizer seja entendido da forma

72 – Lidiane Ramirez de Amorim


como se pretende, embora a incerteza do sentido construído esteja
sempre presente, posto que a apreensão de uma mensagem é, es-
sencialmente, o mistério do processo comunicativo.
Trago presente novamente o conceito de comunicação de Ciro
Marcondes Filho (2004), que a entende como sendo, antes de um
processo, um acontecimento, um encontro feliz, o momento má-
gico entre duas intencionalidades, que se produz no “atrito dos
corpos” (se tomarmos palavras, músicas, ideias também como cor-
pos). Para ele, a comunicação decorre da criação de um ambiente
comum em que os dois lados participam e extraem de sua partici-
pação algo novo, inesperado, que não estava em nenhum deles, e
que altera o estatuto anterior de ambos, apesar de as diferenças
individuais se manterem.
A partir dessa perspectiva, o que é a relação entre professor e es-
tudante senão um encontro de duas intencionalidades, um momento
feliz? Um encontro no qual ambos têm algo a oferecer e levam para si
algo de novo. A educação, como a comunicação, não está na difusão
em massa de conteúdos. Aí, educação, e comunicação, como já disse
anteriormente, são apenas difusão. É a típica atuação do professor
“bancário”, como denomina Paulo Freire (1996), um mero depositário
de informações. Para que a comunicação, na educação e em qualquer
outro campo, se efetue, há de haver reciprocidade, troca, relação e
diálogo. Caso contrário, o momento resume-se no que Wolton (2006)
chama de “incomunicação”.

Cada um procura a comunicação, a relação, a troca, a


compreensão, em escala individual, do casal, da família,
da sociedade e, hoje, da globalização. E na maioria das
vezes, depara-se com a incomunicação. O outro simples-
mente não está ali, não responde, não escuta, opõe-se
ou foge (2006, p.147).

A situação colocada por Wolton traduz um dos aspectos que mais


gera ruídos e incompreensão no ambiente educacional, desde os pro-
cessos de ensinar e aprender no complexo e plural mundo da sala de
aula até as rotinas diárias que envolvem o diálogo com as famílias,
entre coordenação e professores, gestores e funcionários da escola.
Trata-se do estar ausente na presença, do escutar sem ouvir de fato,
olhar sem ver, sem perceber, sem atribuir sentido. Situação que, mui-
tas vezes, é relexo de um esquecimento em relação ao Outro, aquele
para quem eu me dirijo.

Públicos, mensagens e produção de sentido – 73


Um educador que não pensa no peril da turma, não percebe
as peculiaridades e diferenças nos modos de aprender de seus es-
tudantes, que, quando em sala de aula, simplesmente emite uma
mensagem com foco no seu jeito de pensar e falar, sem reletir sobre
métodos, ferramentas e tipos de linguagem que chamem a atenção
dos estudantes que causem identiicação. Este educador está fadado
a ser um “ser de passagem” na sala de aula e abre abismos intrans-
poníveis entre ele e os alunos, entre os alunos e o conhecimento.
Assim se dá o vazio da relação, quando os estudantes estão pre-
sentes de corpo, mas ausentes do diálogo que deveria se estabele-
cer no processo de aprendizagem, entre ele e o educador. Conforme
apontam os especialistas em neurociência, as crianças e jovens de
hoje já possuem um padrão de atenção completamente distinto ao
dos estudantes de gerações anteriores. Logo, o ato de ensinar requer
novas estratégias e, sobretudo, algo muito simples, requer pensar e
conhecer o Outro, para que ao invés de abismos o educador construa
pontes, conexões, vínculos.
Daí emergem situações como as que coloca Marcondes Filho, em
que “eu emito sinais e formas livremente e alguém os capta, mas,
rigorosamente, não se trata de comunicação, pois não há a ação
recíproca, a troca, o aprendizado” (2006, p. 47). Ou seja, a comu-
nicação e tampouco o ensino e a aprendizagem, não se realizam
unicamente no nível do expresso, do intencional, mas também nas
ações, na forma de falar e se mover, nas formas de ser que fornecem
sinais de nós, que são “decodiicados livre e aleatoriamente pelos que
são por eles sensibilizados” (idem). A comunicação, dentro e fora da
sala de aula, ocorre, sobretudo, no não-intencional, “na imagem que
transmitimos incontroladamente de nosso corpo, de nossa postura,
de nossa expressão, deixamos entrever o que há de sincero em nós”.
Isso vale tanto para aluno, quanto para educador. Aliás, mais do
que nunca o educador deve estar atento e ter sensibilidade suiciente
para compreender as entrelinhas que revelam os alunos nos modos
de ser em sala de aula. Eles, assim como tudo, comunicam sem que
seja preciso dizer uma única palavra. Da mesma forma, o educador
comunica, pelos gestos, pelos atos, pela postura e pela coerência
entre o que diz e o que pratica. Possui uma responsabilidade enorme
perante os seus estudantes para quem, em muitos casos, pode se
tornar exemplo a ser seguido. São formas de comunicação que vão
além da linguagem verbal, estão no silêncio, nos olhares, nos gestos,
no implícito e no subjetivo e merecem tanta atenção quanto aquilo
que é comunicado verbalmente.

74 – Lidiane Ramirez de Amorim


Produção de sentido: tudo comunica

É na dimensão simbólica que se encontra a riqueza “calada” da


escola e de quem a compõem. Se compreendermos nossas institui-
ções enquanto palco de representações explícitas e/ou implícitas, de
relações e produção de sentido, teremos um terreno fértil e revelador,
que pode (e deve) ser trabalhado pela comunicação, tanto quanto
percebido pelo restante da organização. Para isso, é preciso compre-
ender que aspectos materiais e imateriais das organizações podem
gerar uma série de processos de signiicação, sendo a signiicação a
articulação dos sentidos em um dado contexto socio-histórico-cultu-
ral (BALDISSERA, 2008). Signiica dizer que desde o atendimento das
nossas escolas até os seus ambientes produzem signiicados para as
pessoas que ali convivem, trabalham, estudam, ou que simplesmente
estão de passagem.
É possível pensarmos nessa relação ambiente-sentido produzido,
sob a perspectiva da motivação e relação que os individuos estabele-
cem com seus locais de trabalho, neste caso, estamos no âmbito da
imaterialidade dos espaços. Fischer (1993) é um dos autores que tra-
balha com este conceito, na perscpectiva da Psicologia Ambiental das
organizações, que se dedica ao estudo do indivíduo e à inluência do
ambiente sobre seu comportamento. Ela constitui um “conjunto teóri-
co estruturado que apreende o espaço como um objeto” (1993, p. 82).

os espaços de trabalho não são simples espaços mecâ-


nicos; são espaços humanos porque são humanizados
como todos os outros ambientes, de uma parte em fun-
ção de um jogo de diferenciação cognitiva e simbólica
permanentemente operado sobre ele, e de outra parte
em função de condutas que o integram como uma di-
mensão “oculta” (op. cit., p. 84).

Essa dimensão nos mostra o quanto os ambientes escolares podem


ser considerados fatores determinantes seja para a motivação dos fun-
cionários e educadores, seja no nível da aprendizagem quando se trata
dos estudantes. Se pensarmos que as crianças e jovens passam boa
parte dos seus dias nas salas de aula, como não compreender que as
condições físicas desses ambientes podem interferir no seu bem-estar
e predisponibilidade a aprender? Nessa perspectiva, a iluminação, o
clima, os ruídos, tudo que interfere na qualidade do ambiente é tão
importante quanto os recursos tecnológicos e pedagógicos.

Públicos, mensagens e produção de sentido – 75


Pressupor a inluência do ambiente é buscar compreender as
construções simbólicas que derivam da materialidade, ou seja, o ima-
terial que brota do material e faz com que cada objeto, cada espaço,
cada lugar da escola produza determinado sentido. É preciso estar-
mos atentos a essa dimensão, sobretudo naqueles espaços de maior
circulação das famílias e dos estudantes. Sabemos também que a
rotina, por vezes, nos cega, nos tornando acostumados com os am-
bientes e pouco críticos a ponto de perceber detalhes que podem ser
deinidores para quem nos visita pela primeira vez. Experimente an-
dar pela escola com um olhar diferente daquele do dia a dia. Um olhar
atento e minucioso, em horários distintos, passe pelos banheiros,
próximo às lixeiras, nos corredores, analise as paredes, as placas,
os locais onde a marca está estampada. Como estão esses lugares?
Lembre-se de que cada detalhe pode produzir algum signiicado, e se
ele for um sentido negativo, já basta para corrermos o risco de uma
comunicação negativa se espalhar sobre a sua instituição.
Mais do que isso, é importante reconhecer que a estrutura espa-
cial dos ambientes escolares atua como “mensageiros simbólicos”,
são como espelhos que traduzem não só a natureza da escola, mas
também das pessoas que a integram, a gerenciam, relete seus va-
lores e seus modos de vida. Ao serem carregados de sentido, os
espaços também exercem mais ou menos inluência nas interações
da escola, nos mais diversos níveis: entre os colaboradores, entre
professores e estudantes, entre a instituição e seus diversos públicos.
Com relação à comunicação verbal, escrita, é fundamental lem-
brar que a produção de sentido, como nos ensina o pesquisador ar-
gentino Eliseo Verón (1980, 2005) nunca está no que é dito em si,
mas nas formas de dizer, na maneira como se diz. A enunciação21,
para o autor, é mais carregada de signiicado que o próprio enuncia-
do, que o texto simplesmente, que o discurso isolado do seu contex-
to, da sua entonação, do seu universo extratextual.
Comunicar, novamente, é muito mais do que é dito simplesmente,
no nível das palavras, ou dos gestos, do material e imaterial. Tudo está
cercado pela nossa intencionalidade implícita nos modos de dizer, de
cuidar dos ambientes, de nos relacionar com os públicos. Sentidos que
se revelam conscientemente ou não, e que alguma signiicação produ-
zem através de tudo aquilo que fazemos sentir com a nossa fala, com
nossos ambientes ou até mesmo com o nosso silêncio.

21 Enunciação, para Verón, não está no nível do conteúdo. Segunto o autor é inseparável pensar o que
é dito dos modos de dizer e de quem diz (enunciador).

76 – Lidiane Ramirez de Amorim


Referências bibliográicas

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imagem-conceito. Revista Fronteira , v. 10, p. 193-200, 2008. Dispo-
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Públicos, mensagens e produção de sentido – 77


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Apontamentos sobre
comunicação e gestão de crises
Rosângela Florczak22

Contexto breve e necessário

No inal da década de 80 do século 20, o ilósofo italiano Gianni


Vattimo anunciou a vida na Sociedade Transparente. A multiplicação
vertiginosa da comunicação a que assistimos hoje, início da segunda
década do século 21, é ainda mais intensa do que as antecipações
do ilósofo. Talvez nunca na história da humanidade tenha se falado
tanto em comunicação como nos tempos vividos. E muito provavel-
mente a incidência do termo comunicação seja superado apenas pela
circulação do termo crise. Transparência. Comunicação. Crise. Três
fenômenos que se encontram e interagem para formar o pano de
fundo da relexão proposta neste artigo.
Para entender melhor a Sociedade Transparente que marca a ló-
gica das relações sociais contemporâneas, recorremos novamente ao
ilósofo italiano. O que Vattimo chamou de “tomar a palavra” (1992,
p.12), nada mais é do que a apropriação de espaços legítimos que
promove a emancipação23 dos emissores no contexto da Socieda-
de Aberta (WOLTON, 2006). Das massas de receptores passivos de
mensagens passamos rapidamente a um tempo no qual a mídia está
ao alcance da mão, e qualquer pessoa pode produzir conteúdo, ou
seja mensagens, tornando-se emissor.
Na Sociedade Transparente, ou Sociedade da Comunicação Ge-
neralizada, Vattimo mostra a instabilidade, a oscilação, o movimento.
Ele airma: “viver neste mundo múltiplo signiica fazer a experiência

22 Artigo produzido a partir da apresentação em mesa temática com o mesmo título no 8º ECOM, em 2009.

23 O sentido de emancipação aqui utilizado não tem o aprofundamento ilosóico proposto por Vattimo,
que problematiza os limites do conceito no contexto da racionalidade e da objetividade cientíica.
Quer simplesmente expressar a deinição de estar livre de uma tutela.

Apontamentos sobre comunicação e gestão de crises – 79


da liberdade como oscilação contínua entre pertença e desenraiza-
mento” (VATTIMO, 1992, p. 16). Enquanto, para o ilósofo, vivemos
entre essa nova liberdade e a nostalgia dos horizontes fechados, ao
mesmo tempo ameaçadores e tranquilizadores, prova-se que: “o ser
não coincide necessariamente com aquilo que é estável, ixo, perma-
nente, mas tem a ver com o acontecimento, o consenso, o diálogo, a
interpretação [...] (Ibidem, p.17)”.
No âmbito das relações sociais, e pelo viés da sociologia, somos
desaiados a compreender, também, o que é a comunicação no ce-
nário do século 21. Não há como compreender a comunicação das
organizações sem mergulhar e entender a própria comunicação. De
caráter polissêmico e onipresente na vida dos indivíduos, nas rela-
ções e nas organizações, a comunicação “é resultado do formidável
movimento de emancipação social, cultural e política nascido no Oci-
dente”, airma Wolton (2006, p. 25).
Por muito tempo confundida com transmissão de informações,
a comunicação começa a assumir seu estatuto normativo, ou seja,
começa a ser compreendida no espaço das relações, transcendendo o
caráter meramente instrumental e utilitarista herdado do modelo ma-
temático24. “Informar não é comunicar”, decreta Wolton (2010, p.11).
Apesar de não existir comunicação sem informação, o comunicar é
mais difícil, pois impõe a questão da relação, a questão do outro, da
sintonia entre emissor e receptor, e o resultado é incerto.
Chegando ao terceiro elemento que constitui o pano de fundo
para tratarmos da comunicação na gestão das crises, tema do artigo,
é imprescindível que possamos compreender, em meio à diversidade
de interpretações do termo, de qual crise estamos tratando. Proble-
matizamos, aqui, aqueles eventos que, conforme conceitua Lerbin-
ger (1997), trazem ou têm potencial para trazer à organização uma
futura ruptura. Partilhamos também da deinição de Wilcox (2002,
p.191), que deine as crises como um ou uma série de acontecimen-
tos extraordinários que afetam a integridade do produto [ou serviço],
a reputação ou a estabilidade inanceira de uma organização. Aqui
nos interessam, especialmente, as crises que afetam a reputação de
um projeto ou uma organização.

24 Teoria Matemática é um dos mais sólidos exemplos de empréstimo de modelo de cientiicidade das
ciências exatas para as ciências do homem e da sociedade. A teoria foi consolidada pelo matemático
e engenheiro elétrico norte-americano Claude Shannon, por encomenda dos laboratórios Bell Sys-
tems. Shannon contou com a contribuição de Weaver ao publicar sua teoria pela Universidade de
Illinois (1949). Considerada, em sua essência, como uma teoria sobre a transmissão ideal de men-
sagens, o sistema geral de comunicação proposto por Shannon é o da transferência de informação
(mensagem) de uma fonte por meio de um transmissor que a converte em sinal, o qual é recebido
por um receptor que novamente a converte em mensagem e entrega ao destinatário.

80 – Rosângela Florczak
Quando escolas e universidades mudam de editoria

Estabelecidos os conceitos que deinem o cenário que recortamos


para nossa sistematização, precisamos visualizá-los no espaço das
organizações educacionais. Antes, porém, esclarecemos que, como
Nóvoa (1992) e Hutmacher (1992), entendemos que escolas, uni-
versidades e outras partes formais do sistema de educação e ensino
precisam ser vistas como organizações. A escola é um agrupamento
relativamente permanente de forças de trabalho, um coletivo huma-
no orientado e atravessado por questões de poder, dispondo de re-
cursos e orientado para uma inalidade.
Entender esses espaços como organizações, segundo Nóvoa, é
importante para criar condições às inovações. É fundamental para
que “[...] as experiências pedagógicas não sejam sistematicamente
destruídas com argumentos burocráticos, para que os proissionais
do ensino sintam-se motivados e gratiicados por participarem em
dinâmicas de mudança” (NÓVOA, 1992, p.41). Especialmente diante
dos desaios contemporâneos que recaem sobre as escolas e insti-
tuições de ensino superior, a abordagem de escolas e universidades
como organizações abre espaço para deinição de sistemas de gestão
que incluam, junto do saber pedagógico, outros saberes essenciais
para o desempenho eicaz da organização educacional. O conheci-
mento das Ciências da Comunicação e, mais especiicamente, da su-
bárea, comunicação organizacional, é um destes novos saberes que
podem contribuir na gestão educacional.
Por gestão educacional entendemos, conforme Lück (2006, p. 36),
que é o processo de gerir a dinâmica do sistema de ensino [...] e
de coordenação das escolas em especíico, ainado com as diretrizes
e políticas educacionais públicas, para a implementação das políticas
educacionais e projetos pedagógicos das escolas, compromissado com
os princípios da democracia e com métodos que organizem e criem
condições para um ambiente educacional autônomo (soluções próprias
no âmbito de suas competências) de participação e compartilhamento
(tomada conjunta de decisões e efetivação de resultados, autocontrole
(acompanhamento e avaliação com retorno das informações) e trans-
parência (demonstração pública de seus processos e resultados).
É no contexto da gestão de organizações educacionais que que-
remos contribuir com a proposição de um processo para gestão de
crises que apresentam riscos de promover rupturas e afetar a reputa-
ção de escolas e universidades. Com o mundo novo que se descortina
na Sociedade Transparente, na qual todos têm o direito à palavra e,

Apontamentos sobre comunicação e gestão de crises – 81


facilmente, acessam canais e emitem mensagens, os riscos de sur-
gimento e propagação de crises estão permanentemente presentes.
Como jamais visto em outros tempos, assistimos à escola e à
universidade envolvidas em um clássico movimento que conigura a
crise e que pode ser expresso em um famoso jargão dos proissio-
nais da área de comunicação: “a crise pode ser claramente percebida
quando a organização muda de editoria nos veículos de comunicação
de massa25”. Ou seja, espera-se encontrar notícias de organizações
educacionais publicadas em editorias de educação e não em espaços
de jornais e telejornais que tratam de notícias policiais.
Ações de bullying entre estudantes, descontrole de professores e
estudantes que geram gestos de violência, denúncias graves envol-
vendo comportamento de agentes do processo educativo, invasões,
sequestros, desastres naturais, fechamento, venda entre outros te-
mas, têm levado cada vez mais, na atualidade, estas organizações a
ser motivo de notícias fora dos espaços de educação. A consequência
direta é o impacto na reputação de uma organização e, em estágios
mais graves, de todo o sistema. Conforme Srour (2008, p.65), quan-
do a reputação é boa, traduz-se em admiração, coniança e respeito;
quando é má, conduz para a desconiança, a rejeição e o estigma.
Mais do que nunca, as organizações educacionais mudaram de edi-
toria, portanto, é preciso mudar a forma de conduzir o problema nos
espaços da gestão educacional. O saber da comunicação organizacio-
nal é fundamental para a prevenção e o gerenciamento das crises.

Quando estamos, realmente, enfrentando uma crise

Na convulsão de mudanças de lógica de coabitação que enfren-


tamos hoje entre os sujeitos que protagonizam a educação formal,
é importante ter claro que nem tudo é crise. O desacomodar dos
processos de mudança nos joga entre as percepções de pertença e
desenraizamento (VATTIMO, 1992) constantemente. Muitos desses
movimentos, por vezes, dão a sensação de caos e descontrole, mas
não constituem crise efetiva. Para adotar uma classiicação de cri-
ses, buscamos a categorização de Lerbinger (1997). As crises podem
pertencer a três categorias e em cada categoria, tipos diferentes. A
saber:

25 Jargão comum entre os proissionais de comunicação, especialmente os jornalistas.

82 – Rosângela Florczak
1. Crises do mundo físico

a. Crises naturais – fenômenos da natureza, como fura-


cões, tornados, terremotos, inundações.
b. Crises tecnológicas – resultados negativos da manipu-
lação dos recursos. São riscos que se intensiicaram na
contemporaneidade com o uso intensivo de tecnologia.
Aí estão as invasões de vírus, corrupções de sistemas,
perdas de dados e quebra de sigilo, vazamentos de ma-
teriais tóxicos, entre outras.

2. Crises de clima humano

a. Crises de confronto – São aquelas que envolvem a atuação


de grupos organizados, movimentos e clientes/consumi-
dores e há um evidente antagonismo de interesses que é
levado a conhecimento público.
b. Crises de malevolência – Quando atividades ilícitas são
desencadeadas com visível interesse de prejuízo à orga-
nização. Terrorismo, atentados, invasões, boatos e ru-
mores são alguns dos casos.
c. Crises de distorção de valores administrativos – É desenca-
deada a partir da priorização de um dos públicos da orga-
nização em detrimento de outros. Envolve, regularmente,
funcionários e público interno, desagradando e não aten-
dendo à necessidade e/ou expectativas.

3. Crises de falha administratriva

a. Crises de decepção – Surgem quando há uma diferença


marcante entre o serviço ofertado e o que é realmente
entregue. São exemplos, o recall de automóveis e outros
produtos, as campanhas nas redes sociais contra os ser-
viços de telefonia móvel e operadoras de televisão a cabo.
b. Crises de má administração – é caracterizada por atos
ilegais e imorais de quem está à frente da administração
de uma organização. Assédio moral, assédio sexual, su-
bornos, roubos e desvios são alguns exemplos.

Aqui apresentamos apenas uma, entre tantas classiicações pos-


síveis. Uma das modalidades de crise que cresce a cada dia tem,

Apontamentos sobre comunicação e gestão de crises – 83


justamente, a ver com a lógica descortinada pela Sociedade Trans-
parente. Ou seja, situações que regularmente aconteciam e que
icavam veladas em espaços fechados, hoje são expostas ao grande
público. A exposição se dá pelos registros por meio de recursos
tecnológicos, como gravadores e ilmadoras de celulares, máquinas
digitais e pela propagação dos conteúdos nas redes sociais na inter-
net. Blogs, peris no Facebook, Orkut, vídeos no Youtube e posts no
microblog Twitter têm crescido em importância no desenvolvimento
de crises organizacionais.
Nas escolas e universidades não é diferente. A sala de aula, até
pouco tempo território fechado, inviolável, é descortinada com o uso
desses recursos. As crises e conlitos são registrados e percorrem
longos trajetos geográicos, repercutindo ainda mais rapidamente e
fugindo de qualquer possibilidade de controle.

Novo assunto para a pauta de escolas e universidades

Há quase uma unanimidade entre os proissionais e pesquisado-


res do tema, de que as grandes crises são intensivamente anunciadas
e nascem de pequenos problemas não tratados adequadamente. Um
dos pressupostos para a prevenção e boa atuação diante das crises
nas organizações educacionais é admitir os riscos. Sim, a crise pode
atingir a escola e a universidade e afetar gravemente a reputação
organizacional. Esse deve ser o primeiro movimento para prevenir e
atuar proativamente.
No intuito de contribuir com a gestão educacional, arriscamos
aqui, sob o olhar da comunicação organizacional, a propor uma es-
pécie de roteiro para abordar o assunto crise pelos gestores educa-
cionais. Não se trata de uma prescrição ou de um único caminho a
seguir, mas de uma possibilidade que pode apoiar a relexão interdis-
ciplinar em escolas e universidades.

Prevenção

1. Incluir o tema crise na agenda dos gestores – Ad-


mitir o risco das crises e fazer o gerenciamento adequa-
do dos pequenos problemas que surgem no cotidiano
das organizações educacionais é de fundamental impor-
tância para dar início ao trabalho preventivo. Não por
acaso, esse é o passo mais valioso quando se trata de
gestão de crises porque ajuda a evitar a ocorrência dos

84 – Rosângela Florczak
eventos indesejados ou ameniza a sua futura repercus-
são. Importante não se esquecer de incluir proissionais
com conhecimento de comunicação para apoiar o grupo
gestores na discussão.

2. Mapear os riscos – Ter um mapeamento claro e amplo


dos possíveis riscos de crise é uma iniciativa que preci-
sa ser vista como forma de encarar as situações e ad-
ministrá-las. Os riscos mapeados que estiverem fora do
alcance preventivo devem inspirar o plano de ação para
os casos de incidência.

3. Estabelecer ações possíveis para cada risco mapeado


– Com o apoio de áreas especializadas, como a comuni-
cação e o setor jurídico, elaborar um plano de ação para
cada possível ocorrência de crise.

4. Produzir o Manual de gestão de crise e capacita-


ção do comitê – Registrar os procedimentos previstos
para os vários cenários mapeados. Incluir também as
deinições do processo geral de gestão da crise, nomear
responsáveis por cada trabalho e deinir o que se espera
da atuação de cada um no desenvolvimento do proces-
so de prevenção e gestão das crises. Após a conclusão
do documento, é imprescindível torná-lo conhecido por
todos os gestores envolvidos, por aqueles que poderão
compor um eventual comitê de crise e capacitá-los para
a atuação prevista.

5. Capacitar os possíveis porta-vozes – Quando a crise


acontecer, os porta-vozes já devem ter passado pelos
treinamentos básicos de como atuar diante dos diferen-
tes interlocutores, como imprensa, comunidade educati-
va, entre outros. Escolhidos e capacitados, serão prepa-
rados no contexto de cada crise com as peculiaridades
da ocorrência para que possam dialogar em nome da
organização, de forma adequada.

6. Crie reserva de boa reputação – Atender os inter-


locutores adequadamente em períodos de normalidade,
dialogar e fortalecer a boa reputação com ações de co-

Apontamentos sobre comunicação e gestão de crises – 85


municação costumam funcionar como uma reserva de
boa vontade para os momentos difíceis. É importante ter
embaixadores de nossas escolas e universidades para
defender a organização nesses momentos.

Gestão

1. Atuação do comitê de crise – Na ocorrência de crise,


o comitê deve ser imediatamente convocado e o coorde-
nador do comitê deve assumir a coordenação das ações
a serem tomadas.

2. Tomar atitude – Comunicação não salva organizações


em momento de crise. A falta dela compromete, mas é
preciso ter ações claras de controle ou combate da crise
para ter o que dizer. Não é hora de fazer discurso vazio.
Medidas práticas são imprescindíveis. Atuação efetiva é
fundamental.

3. Ter informações e não ocultá-las – Falar é funda-


mental. O proissional de comunicação deve assessorar
na busca de informações adequadas e comunicar, inclu-
sive a apuração. Não é possível icar em silêncio. Se a
escola ou universidade não se pronunciar, alguém assu-
mira o papel de relator da realidade.

4. Monitorar as informações permanentemente – Es-


tar atento ao que se fala sobre a crise nos veículos de
comunicação, nas redes sociais e, principalmente, nos
corredores da escola e da universidade.

5. Avaliar resultados – Para gerar aprendizados posterio-


res e promover melhorias nos documentos e processos,
é fundamental avaliar os impactos da crise. Pesquisas de
percepção dos públicos, auditoria de imagem e outros
recursos podem ser úteis para avaliar os efeitos da crise
na reputação da organização educacional.

86 – Rosângela Florczak
Da área técnica de comunicação são esperadas iniciativas, como:

1. Deinição de mensagens preferenciais da organização –


ação preventiva
2. Assessoramento permanente do luxo de informações
emitidas e recebidas
3. Assessoramento nos contatos e relacionamento com a
imprensa
4. Preparação de conteúdos de apoio
5. Gestão de entrevistas coletivas e individuais
6. Participação efetiva no comitê de crise
7. Interlocução com os públicos nas redes sociais

Há que se compreender, porém, que a presença da comunicação


na prevenção e gestão de crises transcende em muito a dimensão
técnica instrumental. Todas as ações devem ser pautadas por ela. O
elemento transversal presente em todas as etapas do processo de
prevenção e gestão de crises: o diálogo. Desde a inclusão do tema na
pauta dos gestores até a avaliação do impacto sofrido, é fundamental
que haja movimentos planejados de escuta e de apresentação de
posicionamentos como atitude de todos os envolvidos.
Na Sociedade Transparente é cada vez mais difícil manter posi-
cionamentos convencionais das organizações em momentos de crise,
tais como: busca de cerceamento e sigilo de informações, transferên-
cia de responsabilidades, minimização das consequências, desaten-
ção com os públicos interlocutores, entre outros. É preciso encarar
a crise e comunicar-se: antes, durante e depois. A reputação das
organizações educacionais agradece!

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de sistemas às estratégias de estabelecimento. In: A. Nóvoa, As Or-
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Comunicação e exposição nas
redes sociais: diálogos com
estudantes e famílias maristas
26
Diego Wander Silva, Fernanda Laguna e Tiago Rigo

A temática das redes sociais é um assunto que está posto no co-


tidiano das unidades educacionais. Independente da presença insti-
tucional, através da criação de peris, diariamente aspectos da rotina
e acerca da percepção sobre instituições de ensino são divulgados
e replicados na Web. Digitando a palavra marista em aplicativos de
busca de conteúdo, por exemplo, encontramos uma série de referên-
cias, positivas e negativas, em sites, como Orkut, Facebook, Twitter,
Formspring, dentre outros.
Preocupados com essa questão e cientes da expressividade da
fala que estudantes possuem nesses canais, desenvolvemos, em
2010, um trabalho com jovens maristas, a im de evidenciar as fra-
gilidades e potencialidades no uso das redes sociais, abordando, de
maneira clara e objetiva, as dimensões expostas na Figura 1.
Realizamos a primeira atividade no Encontro de Grêmios Estu-
dantis da Rede Marista, em maio de 2010. Mais de 50 alunos parti-
ciparam do evento que tratou de assuntos ligados ao protagonismo
juvenil. O uso responsável das redes sociais, nessa edição, ganhou
destaque no programa, dada a clareza da Comissão de Educação
(Coeduc) e da Assessoria de Comunicação e Marketing (Ascomk) de
que esses jovens são líderes e formadores de opinião dentre os es-
tudantes de suas unidades e que, consequentemente, deviam ser
sensibilizados para que levassem as relexões para seus colegas.

26 Artigo produzido a partir da experiência com oicina desenvolvida para estudantes e famílias maristas
sobre a temática das redes sociais, ao longo do ano de 2010

Comunicação e exposição nas redes sociais: diálogos com estudantes e famílias maristas – 89
Risco de
Bullying

Facilidade em Possibilidades de
pesquisar entretenimento

Redes
Vícios do
Perigo da
Pedoilia sociais internetês

Condução dos Cuidado


relacionamentos com os
plágios

Figura 1: Eixos de trabalho


Elaborado pelos autores

#comofaz

Tratar de um assunto tão próximo deles, do seu dia a dia, impli-


cou no desaio de falarmos uma língua familiar a eles, o que incluiu a
busca de um vocabulário objetivo e sem jargões técnicos. Precisáva-
mos buscar estratégias de aproximação. Utilizar métodos burocráti-
cos e que não despertassem o entusiasmo dos estudantes faria com
o tema se tornasse desinteressante e o recado não fosse dado.
Decidimos começar a palestra de um modo diferente. A apresenta-
ção de cada um de nós ocorreu através de nossos peris nas redes so-
ciais. Mostramos como e em que nível é possível descrever uma pessoa
através de informações disponíveis na Web focando, evidentemente, o
que encontramos nas redes sociais. A partir dessa relexão, demons-
tramos aos jovens como a nossa marca e reputação está intimamente
ligada ao que comunicamos e damos visibilidade nesses espaços.

Figura 2: Apresentação via redes sociais e informações disponíveis na Web | exemplos


Elaborado pelos autores

90 – Diego Wander Silva, Fernanda Laguna e Tiago Rigo


A dinâmica de apresentação demonstrou que somos responsáveis
pela imagem que construímos de nós mesmos nas redes sociais, atra-
vés dos posts, das fotos veiculadas, dos grupos e comunidades a que
aderimos, dos vídeos que publicamos. Contudo, para que os estudan-
tes pudessem materializar as implicações, propomos uma atividade
prática em grupo.
Retiramos dez alunos da sala e atribuímos a eles ‘rótulos’: cada jo-
vem colou em sua testa uma característica, sem que soubessem qual era.
Junto aos demais estudantes que icaram na sala, combinamos que eles
deveriam expressar, somente através de gestos, o que cada um daqueles
alunos rotulados estava representando, interagindo com eles, sem falar.
O propósito desse momento foi salientar que nas relações, por diversas
vezes, somos rotulados devido a nossas atitudes e comportamentos, e
que as redes sociais podem potencializar essa rotulação, visto que evi-
denciam apenas recortes da nossa vida, do nosso cotidiano. Além dis-
so, reforçamos a teoria de que a responsabilidade pelo entendimento da
mensagem é do seu emissor, independente do veículo ou forma utilizada
para que o receptor possa interpretá-la.
Exploramos essa questão, ainda, a partir de marcas consolidadas,
reletindo as mensagens e os diálogos que elas estabelecem conos-
co, e que permitem construirmos imagens e percepções a respeito
delas. Focamos a logomarca marista, discutindo atributos, valores e
identidade, bem como os aspectos emocionais que se incorporam a
algo que, inicialmente, é apenas uma imagem, um ícone. Precisamos
atentar para o que comunicamos!
A construção descrita até o momento conduziu para reletimos sobre
como estamos cuidando da nossa marca pessoal através do comporta-

Figura 3: Exposição digital – metáfora dos recados na fachada de uma casa


Imagem adaptada pelos autores

Comunicação e exposição nas redes sociais: diálogos com estudantes e famílias maristas – 91
mento na Web. A Figura 3 nos pareceu bastante reveladora. Veja a seguir.
Ao sair de casa, escrevemos na fachada aonde vamos? Que hora
voltaremos? Na casa de quem estamos? Certamente não. Porém é
isso que fazemos nas redes sociais, o que pode ter consequências na
dimensão segurança, por exemplo. Outra aproximação trabalhada foi
a de que não colocamos um outdoor na frente de casa com nossas
fotos. Na Web, no entanto, publicamos imagens com teor muitas ve-
zes comprometedor, sem clareza da visibilidade que podem ter e das
implicações a que estamos sujeitos.
Trata-se de espaços que milhares de pessoas podem acessar
e compartilhar informações, imagens, áudios e vídeos. O número
de pessoas é bem maior do que as que possivelmente passam na
frente da casa de cada um, diariamente. Exemplificamos outros
perigos e ameaças comuns no ambiente virtual, para que pudes-
sem perceber que atitudes feitas sem a devida responsabilidade
podem acarretar grandes danos.
E, enquanto líderes estudantis, quais os seus papéis? Aponta-
mos e buscamos reletir sobre a expressividade de suas ações, den-
tre seu grupo de amigos, no lugar de exemplos a serem seguidos
e referências de comportamento e postura. Como tarefa de casa,
deveriam, ao retornar para suas cidades, observar as comunidades
do Orkut que participavam, as fotos que estavam postadas e os
comentários e posts no Facebook e no Twitter. Ainal, o que o con-
junto de ações e elementos presentes nos seus peris representam
e comunicam? Estão alinhados aos valores de um líder?
Destacamos, já nos encaminhamentos finais, os riscos e os
cuidados necessários para evitar o cyberbullying, bem como a
atenção no uso do internetês, tão comum nos diálogos nas redes,
e que, em alguns momentos, invadem as salas de aula e redações
de vestibular, causando prejuízos aos estudantes. Tratamos do
perigo da pedofilia, em função da existência de perfis falsos e por,
efetivamente, não sabermos de fato quem está falando conosco.
Sobre esse último item, utilizamos um vídeo veiculado no progra-
ma CQC27 (ao qual possivelmente os alunos assistam com regulari-
dade e que tem uma linguagem coloquial, o que gerou identiicação
e despertou atenção). O vídeo apresenta uma matéria na qual uma
atriz se passa por adolescente de 15 anos, evidenciando o tipo de
abordagem realizada por pedóilos. Uma frase que frisamos na con-
versa, a partir do vídeo, foi: “Sua mãe nunca falou que é perigoso
falar com estranho na rua? Na rua, sim! Na Internet, não?”.
27 Assista ao vídeo nos links http://youtu.be/mUOTdC_if1s (parte 1) e http://youtu.be/fyA_x5ecAZs (parte 2).

92 – Diego Wander Silva, Fernanda Laguna e Tiago Rigo


Figura 4: Matéria veiculada no CQC sobre pedoilia
Prints screen do vídeo

Tratamos também sobre o redimensionamento das possibilidades


de pesquisa e de como aproveitar isso a serviço do aprendizado. As
facilidades de entretenimento foram destacadas, como um diferen-
cial desses espaços, oportunidades bastante recentes e que devem
ser valorizadas, com responsabilidade e cautela, a partir do que foi
mencionado anteriormente.
Na avaliação da atividade, 97% dos estudantes a consideraram
ótima, conforme o Gráico 1. Além desse indicativo, no contexto do
questionário, havia uma questão aberta que solicitava que os jovens
citassem os pontos fortes do encontro. Há diversas citações que en-
volvem a atividade que propomos, dentre as quais relacionamos as
que seguem:

 a palestra sobre liderança e comunicação foi excelente, foi uma


palestra que prendeu a minha atenção em todos os minutos.
 um dos pontos altos que gostaria de destacar é a palestra sobre
liderança e comunicação com Diego Wander, Fernanda Laguna e
Tiago Rigo que foi fantástica e muito construtiva.

3%

Ótimo

97% Bom

Gráico 1: Avaliação da atividade (35 respondentes)


Elaborado pelos autores, com base na pesquisa realizada

Comunicação e exposição nas redes sociais: diálogos com estudantes e famílias maristas – 93
#vamosadiante

Algumas escolas de Rede Marista convidaram-nos para darmos


continuidade ao trabalho. Até o momento atendemos ao pedido do
Colégio Marista Santo Ângelo (Santo Ângelo/RS) e Colégio Marista
São Pedro (Porto Alegre/RS).
Em Santo Ângelo, a conversa foi estendida para as famílias, no tur-
no da noite. A iniciativa foi proposta pela Associação de Pais e Mestres
(APM) e Direção, que perceberam a importância da abordagem do as-
sunto entre as famílias. O objetivo da palestra foi aproximar os pais das
redes sociais mais utilizadas pelos jovens, alertando para riscos, com
dicas e orientações de como acompanhar e utilizar cada ferramenta.
Para ilustrar o peril do público jovem, foram utilizados dados do

Figura 5: Atividade com as famílias maristas


Foto: Rodrigo Copetti (Colégio Marista Santo Ângelo)

Dossiê Universo Jovem MTV, pesquisa desenvolvida pela Editora Abril


a cada dois anos. O vídeo tornou claro o conceito de que os jovens
vivem em rede, conectados em tempo integral, independentemente
da região ou estado em que vivem.
As dúvidas apresentadas foram das mais diversas ordens, muitas
buscando maneiras de controle sobre os passos dos ilhos na Web.
Reforçamos a urgência do diálogo, do estabelecimento da noção de
parceria e cumplicidade, pois a proibição é praticamente impossível.
É preciso conhecer e estar atento.

94 – Diego Wander Silva, Fernanda Laguna e Tiago Rigo


#prontofalei

Conversamos com:

55 líderes de Grêmios Estudantis das unidades maristas


442 estudantes maristas
36 pais/responsáveis maristas

É preciso ir além! Necessitamos conversar e ouvir mais e estar


abertos ao mundo dos adolescentes, para que visualizem as escolas,
não como instituições podadoras de suas ações, mas que estimulam
temas que atravessam o cotidiano dessa gurizada.

Enquanto gestores,

1. estamos reletindo e estudando sobre o tema?


2. estamos alertando/atuando sobre possíveis implicações?
3. estamos preparando esses jovens para utilizarem as redes sociais
de maneira responsável?

#icaadica | Vale a pena assistir

Análise sobre as redes sociais no Brasil em 2010 | Agência Click

http://www.youtube.com/watch?v=vCHFAcf_mfY

Dossiê Universo Jovem MTV

http://mtv.uol.com.br/dossie/programa

Comunicação e exposição nas redes sociais: diálogos com estudantes e famílias maristas – 95
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A Comunicação na Gestão do
Planejamento Estratégico na
Rede Marista de Educação
Marcelo Cordeiro28

Nas organizações, existe uma profunda relação entre gestão


e comunicação, pois é a partir dela que tudo deriva e acontece.
Do ponto de vista social, para o fazer da gestão, existe, necessa-
riamente, a mediação da comunicação em todas as suas formas.
Entretanto, como essa relação se estabelece, no que concerne à
tomada de decisão antecipada, ou seja, o planejamento estra-
tégico das organizações, ainda é um problema pouco explorado
nos estudos da área. Diante disso, o presente artigo, caracteri-
zado pelo estudo de caso da Rede de Marista de Educação do Rio
Grande do Sul, levanta, de maneira sucinta, como essa interação
se dá em um ambiente organizacional especíico: a escola. A co-
municação, aqui, tem um papel fundamental como mediadora e
propulsora do processo de gestão da organização e serve de ali-
cerce para o propósito essencial desse tipo de organização: educar
e formar seres humanos.

Organizações e rede de educação

As organizações se fundamentam na prática humana e no fazer


inerente à sua perspectiva de perpetuidade. Elas se formam para
atender a uma necessidade do homem de sobrepor a própria natu-
reza e se refazer a partir da construção coletiva de uma nova expe-
riência de sociedade. Entretanto, as organizações sociais têm sido
vistas sob uma nova ótica nos últimos tempos. Para Castells (1999,
p. 173), as organizações vivem uma nova fase, quando o que deine

28 Artigo produzido a partir de sala temática apresentada no 7º ECOM, em 2007.

A Comunicação na Gestão do Planejamento Estratégico na Rede Marista de Educação – 97


sua existência é o todo da sociedade e a revolução das tecnologias
da informação, formatando uma nova abordagem e um novo trata-
mento para todo o contexto social. É verdade que as relações sociais
e organizacionais têm sido afetadas ao longo das últimas décadas
devido à descoberta e ao uso efetivo das novas tecnologias, que
proporcionam uma forma diferenciada de relacionamento.
Empresas de todos os portes e organizações de variadas natu-
rezas estão, a cada dia, mais atentas aos problemas oriundos desse
cenário, que oferece tanto preocupações como possibilidades e opor-
tunidades de crescimento, divisando toda a facilidade que as tecnolo-
gias de informação trazem ao cotidiano organizacional. Isso, de certa
maneira, acaba se tornando um engodo, pois a organização sempre
será, ainda com todo o aparato tecnológico existente, formada por
pessoas, que realizam seus processos e aplicam suas vidas na conse-
cução dos objetivos elegidos ao longo dos anos. O organismo social
só consegue permanecer coeso e funcionando com pessoas capazes
de levar em frente a vontade do todo.
A empresa, agora, funciona como uma rede de relações, onde o
conhecimento é peça fundamental para seu crescimento e desenvol-
vimento. Essa ideia é defendida por Peter Senge et al. (2000) no que
ele conceituou como organização que aprende. O aprender do todo
passa a ser critério premente para se visualizar o futuro e trabalhar
de maneira harmônica e coesa no presente da organização.
Em uma rede de educação, como é o caso da Rede Marista,
composta por 18 colégios que desenvolvem seu planejamento es-
tratégico balizado por uma única diretriz, essa problemática pas-
sa a ser uma verdade constante. Ao se enfrentar no dia a dia a
necessidade de rápida adaptação e melhoria nos processos tanto
comunicacionais como administrativos, essa necessidade passa a
ser um imperativo, de entender a relação, no seio da organização,
da necessidade de se estabelecer uma comunicação fluída em
diferentes níveis da organização, com diferentes públicos, para
comunicar e fazer chegar a mensagem da gestão e a execução
dos objetivos propostos.
Essa é uma questão que vem se tornando bastante presente à
medida que a Instituição, como um todo, caminha para a uniicação
de processos e métodos administrativos, na busca da excelência
organizacional. Na elaboração do planejamento estratégico para o
período de 2005 a 2009, se viveu esse dilema, porém, uma co-
municação efetiva pode fazer esse processo acontecer de maneira
harmônica e dinâmica.

98 – Marcelo Cordeiro
Planejamento

O planejamento da ação empresarial, conforme denomina M


Mintzbert et al. (1998), no clássico o Safári da Estratégia, é, na ver-
dade, planejamento global estratégico e referencial para a direção
de toda a organização, subdividindo-se em outros três planejamen-
tos, seguindo os níveis hierárquicos da empresa, a saber: planeja-
mento estratégico, planejamento tático e planejamento operacio-
nal. Contudo, ainda é, referindo-se a isso, muito luido o conceito do
que é planejamento, em si. Planejar, o verbo é, primeiramente, uma
das funções administrativas que dá a linha para que todas as outras
aconteçam. Nas palavras de Ackoff (apud Kunsch, p. 205) é “algo
que fazemos antes de agir, isto é, tomada antecipada de decisão”.
Somente a título de registro, vale lembrar aqui que os outros prin-
cípios administrativos são: organizar, dirigir e controlar, reforçando
a ideia de que o planejamento é algo que precede todas as outras
atividades dentro de uma organização.
Existe, portanto, a necessidade permanente do planejamento
das organizações ser direcionado e dirigido para seus objetivos,
isto é, “as pretensões e propósitos das empresas”, conforme Porter
(1989, p.129). Assim, o planejamento que dá o norte institucional
para a organização é o planejamento estratégico, pois é elaborado
e discutido nas instâncias mais altas das organizações. Os outros
dois tipos devem estar alinhados ao que prescreve o planejamento
estratégico, por ser ele a síntese de tudo que representa a orga-
nização, sua missão, sua visão e seus objetivos gerais de atua-
ção. O planejamento estratégico é, segundo Porter (1989, p.128),
“um conjunto de tomada deliberada e sistemática de decisões en-
volvendo empreendimentos que afetam ou deveriam afetar toda a
empresa por longos períodos de tempo”, evidenciando seu caráter
corporativo, isto é, de totalidade, e seu alcance ao longo do tempo,
isto é, em longo prazo, fortalecido, nas palavras de Kunsch (2003,
p.233), “como instrumento e metodologia gerencial, ele abrange
toda a organização e vincula-se ao que acontece no meio ambiente
social. É no macroambiente29 que as empresas buscam os subsídios
para formulação e implantação do seu processo”.
Para Maria José Pereira (1998, p. 32), o planejamento é um pro-
cesso em si, pois signiica uma atividade intelectual, análises e previ-

29 Para ins deste trabalho, considera-se a deinição de Porter (1989), tendo macroambiente como o
ambiente total onde está inserida a organização, com suas ameaças e oportunidades, e o micro-
ambiente como o ambiente interno da empresa com seus pontos fortes e fracos, respectivamente.

A Comunicação na Gestão do Planejamento Estratégico na Rede Marista de Educação – 99


sões para futorizar a situação da empresa, ou seja, prever aconteci-
mentos, antecipar riscos, ter posicionamento prévio, tomar medidas
deliberativas, etc. Conforme Porter (1989), o planejamento estraté-
gico necessita de cinco etapas para que seu processo seja integral
e coeso, são elas: a) determinação dos objetivos empresariais; b)
análise ambiental externa; c) análise organizacional interna; d) for-
mulação de alternativas estratégicas; e) implementação através de
planos táticos e planos operacionais.
É de profunda importância a análise prévia de todos os ambientes
em que a organização está inserida, seus públicos, seus objetivos e
sua missão, para daí construir estratégias coerentes que levem ao al-
cance de seus propósitos. A organização precisa, portanto, estar pre-
ocupada em, ao mesmo tempo, se conhecer, para sua autogeração, e
deinir como será sua posição futura, levando em conta o estágio da
onde ela parte para fazer valer sua vontade e melhoria contínua de
processos e conteúdos.
O cenário atual revela organizações desesperadas por ter um pla-
nejamento estratégico eiciente, que consiga pôr im às incertezas
inerentes ao ambiente empresarial emergente. É impossível, no en-
tanto, ter tal instrumento. Como ciência social, o planejamento não
consegue acabar com a incerteza de mercados e públicos que se
desvelam a cada dia e passam diante das empresas e organizações
sociais. Mintzberg et al. (1998) compara a administração estratégica
a um verdadeiro elefante observado por cegos: cada um tem uma vi-
são diferente do que é, e todos, no entanto, podem estar corretos de
sua perspectiva, levando a conclusão de que a estratégia empresarial
é uma fera a ser descoberta e domada.
Existem, portanto, várias formas de se abordar o assunto e de se
implementar um planejamento para a organização. Planejar, como
foi sugerido, é tomada de decisão antecipada, diminuindo incertezas
e rebatendo riscos que possam comprometer o futuro do empreen-
dimento. Mintzbert et al. (1998) revela que existem, possivelmen-
te, cinco deinições de estratégia empresarial aplicável ao campo do
planejamento organizacional. Essas abordagens, contudo, através de
diversas interpretações e combinações podem levar a muitas outras
formas de entendimento da estratégia organizacional como um todo,
ou seja, a visão do planejamento global pode ser vista de diversos
ângulos, mas sempre se dirige a um denominador comum: estratégia
leva a resultados.

100 – Marcelo Cordeiro


Comunicação organizacional

Segundo Curvello (2002, p. 142), “a comunicação empresarial está


inserida num macroambiente que exerce forte inluência, agindo por
meio de fatores psicológicos, sociais e culturais e que, muitas vezes,
interfere decisivamente no processo comunicativo”, deinindo, assim,
que a comunicação empresarial nada mais é do que parte de uma co-
municação mais global, isto é, a política estratégica de comunicação,
conforme defende Kunsch (2003, p. 143). Segundo Kunsch (2003),
existe uma comunicação integrada que deve unir todos os outros tipos
de comunicação, isto é, “uma junção da comunicação institucional, da
comunicação mercadológica, da comunicação interna e da comunica-
ção administrativa, que formam o mix da comunicação organizacional”
(2003, p. 150). Valida-se esse conceito como promotor e esclarecedor
de uma série de discrepâncias que se vive no dia a dia da comunicação
dentro das organizações empresariais, tais como as disputas de campo
entre diferentes proissionais da área de comunicação, buscando espa-
ço para exercer suas funções dentro da organização.
A comunicação organizacional, então, reúne todos os esforços de
melhoria da comunicação e suas estratégias, podendo ser otimiza-
da e planejada assim como acontece com o planejamento global da
organização. É importante lembrar que o alinhamento entre comuni-
cação e gestão é de suma importância e a liderança da organização
deve estar sempre atenta a qual é a mensagem que ela está revelan-
do para o ambiente interno e externo do ponto de vista estratégico.
A comunicação, ainda que planejada e executada por bons proissio-
nais, de nada serve se não se vale de uma relação pertinente com
quem tem nas mãos a governança corporativa. É impossível se con-
duzir um processo de gestão ou até mesmo de mudança através da
comunicação, quando os envolvidos não acreditam nas mensagens
produzidas. E comunicação é, antes de tudo, relações que envolvem
produção e disseminação de mensagem para diferentes públicos com
objetivos pré-estabelecidos (BERLO, 1999).
A comunicação estratégica é, segundo Rego (1986), uma forma
de reunir elementos internos da empresas – suas potencialidades
– e levar ao ambiente externo, auxiliando no alcance dos objetivos
estratégicos da organização. Com essa ideia, pode-se inferir que a
comunicação estratégica busca gerar resultados, tanto internamente,
como externamente, a partir da implementação de atividades e ações
que proporcionem essa disposição. Assim, todos os tipos de comuni-
cação do mix de comunicação podem ser estratégicos, à medida que

A Comunicação na Gestão do Planejamento Estratégico na Rede Marista de Educação – 101


busquem algum objetivo, que não caiam na armadilha de ser apenas
um tareismo conformado.
Portanto, é esclarecedor dizer, nas palavras de John Newstrom:

Comunicação é a transferência de informação e com-


preensão de uma pessoa para outra. É uma forma de
atingir os outros com ideias, fatos, pensamentos e valo-
res. Ela é uma ponte de sentido entre as pessoas de tal
forma que elas podem compartilhar aquilo que sentem e
sabem. Utilizando esta ponte, uma pessoa pode cruzar
com segurança o rio de mal-entendimentos que muitas
vezes as separa. (1996, apud KUNSCH, p. 4)

Assim, toda comunicação é estratégica à medida que esclarece


problemas e resolve situações de desinformação, ou serve como ins-
trumento de gestão do planejamento da organização. O papel de um
gestor da comunicação é estar alinhado, segundo Kunsch (2003), ao
planejamento estratégico e global da organização, garantindo um bom
luxo de comunicação em todos os canais abertos por ela. O papel do
comunicador é, portanto, de ser também um planejador e estrategista
daquilo que é comunicação dentro das organizações às quais ele serve.

Comunicação e planejamento

O planejamento da comunicação é, como já foi sugerido, uma fun-


ção que se desdobra do plano estratégico de gestão das organizações.
A relação existente entre comunicação e planejamento, no entanto, é
ainda pouco explorada e com escassa produção teórica. No entanto, é
cabal airmar que existe uma relação pertinente entre o processo de
planejamento e a comunicação adotada pela organização. Ou, melhor,
os processos de comunicação adotados por ela.
Vários teóricos, como Mintezberg et al. (1998), Kunsch (2003), Dru-
cker (1995), e proissionais da área têm se esforçado para criar um qua-
dro que consiga remeter à necessidade que um tem de interação com os
outros. As escolas de planejamento estratégico têm despertado ao longo
do tempo para essa premente necessidade, e vêm buscando solidiicar
uma visão de que a comunicação e as relações culturais da organização
delimitam e formam com maestria o ato de planejar com eiciência.
No caso dos colégios maristas do Rio Grande do Sul, o que se
tem é uma política de comunicação inserida no planejamento, e uma
forte relação entre os gestores do planejamento com os facilitadores

102 – Marcelo Cordeiro


da comunicação da rede, isto é, de cada uma das Escolas e as as-
sessorias de Planejamento estratégico e comunicação e marketing. É
possível encontrar no planejamento elaborado pela Rede, durante o
ano de 2004, para o quinquênio 2005-2009 um tópico especialmente
criado para atender às necessidades de elaboração de políticas de
comunicação para o ambiente interno e externo dos Colégios da Rede
Marista de Educação.
Os proissionais de comunicação foram envolvidos em quase todo
o processo, dentro das unidades educacionais, para dar sequência à
proissionalização e adequação dos recursos de comunicação aos no-
vos tempos. Em levantamento realizado pelo autor em 2007, em to-
das as unidades os proissionais de comunicação estavam envolvidos,
de alguma forma, no desdobramento das estratégias, ações e planos
do planejamento estratégico para o período. Além dessa dimensão
dos proissionais, outras ações em rede no que concerne, principal-
mente, às estratégias de comunicação mercadológica e institucional
foram fortemente desenvolvidas ao longo dos anos para garantir a
sustentabilidade desse processo.
A atividade de educação, por si só, já traz um desaio enorme, visto
que, paulatinamente, os meios de comunicação e informação têm mu-
dado radicalmente a forma como se aprende dentro de um ambiente
formal de educação. Está se migrando de um modelo de escola fechado
e mecanicista, para uma escola mais dinâmica que acompanhe a vida do
indivíduo durante toda a sua formação (SENGE et al., 2000). As organi-
zações escolares, então, passam a ser um espaço rico de crescimento,
desenvolvimento e descoberta, em todos os campos da vida do aluno.
No entanto, essa visão é bastante difícil de ser atingida, pois pas-
sa pela quebra de diversos paradigmas e a remontagem de uma insti-
tuição secular, para um novo modelo de aprendizagem e ensino, onde
o ator principal desse processo é o aluno. O aprender, como fenôme-
no humano, há algum tempo já vem sendo visto como algo contínuo
e ininterrupto. Aprende-se durante toda a vida, de diferentes formas.
As escolas, hodiernamente, em especial as mais modernas, estão se
preocupando por deixar seus processos pedagógicos e administrati-
vos o mais próximo dessa visão.
A comunicação, como ciência que irradia seu espectro sob a exe-
cução da educação formal tem um papel relevante na modulação des-
se novo cenário para as instituições de ensino. Preocupados, também
estão os dirigentes em melhorar sua forma de atuação administrativa,
desenhando processos e pensando fórmulas para veriicar e quantii-
car de maneira mais aprazível os seus resultados inanceiros. É sob o

A Comunicação na Gestão do Planejamento Estratégico na Rede Marista de Educação – 103


prisma da mudança que esse trabalho se apoia, pois se vislumbra, no
limiar dos próximos anos, uma organização bem mais rica e voltada
para o aprendizado. Nada mais justo de que as organizações educa-
cionais, direcionadas para a formação humana, sejam umas das pri-
meiras a se tornarem organizações que, verdadeiramente, aprendem.

Referências bibliográicas

ACKOF, Russel L. Planejamento empresarial. Rio de Janeiro: LTC, 1978.

CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede: a era da informação, eco-


nomia, sociedade e cultura. vol. 1. 2 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

CURVELLO, João José Azevedo. Comunicação interna e cultura orga-


nizacional. São Paulo: Scortecci, 2002.

DRUCKER, Peter F. Administrando em tempos de grandes mudanças.


São Paulo, Pioneira, 1995.

KUNSCH, Margarida Maria Krohling. Planejamento de relações públi-


cas na comunicação integrada. São Paulo: Summus, 2003.

MINTZBERG, Henry; AHLSTRAND, Bruce & LAMPEL, Joseph. Safári de


estratégia. Porto Alegre: Artmed, 1998.

NASSAR, Paulo; FIGUEIREDO, Rubens. O que é comunicação empre-


sarial?. São Paulo: Brasiliense, 1995.

PEREIRA, Maria José L. Bretas. Mudança nas instituições. São Paulo,


Nobel, 1998.

PORTER, Michael. Vantagem Competitiva. Campus, Rio Janeiro: 1989.

SENGE, Peter, et al. Escolas que aprendem: um guia da quinta disci-


plina para educadores, pais e todos que se interessam por educação.
Porto Alegre: Artmed, 2005.

REGO, Francisco Gaudêncio Torquato do. Comunicação empresarial/


comunicação institucional. São Paulo: Summus, 1986.

TZU, Sun. A arte da guerra: por uma estratégia perfeita. São Paulo:
Madras, 2003.

104 – Marcelo Cordeiro


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Comunicação e
Gestão Educacional
Alexander Goulart30

Desaios! Essa palavra, no plural, parece nos cercar por todos os


lados. Desaios na gestão, na educação, na comunicação. Talvez não
estejamos compreendendo bem, de fato, quais são esses desaios. E
estamos buscando respostas, soluções para perguntas, cujo enuncia-
do não entendemos.
O cenário contemporâneo mudou. A escola está mudando, mesmo
que não aceite. O movimento vem do seu interior, da sala de aula, da sala
dos professores, do burburinho de pais e mães conversando nos pátios,
de postagens no Orkut, no Facebook, Twitter... São vozes que precisam
ser ouvidas pelos gestores da escola e acolhidas numa nova proposta
de gestão educacional, para muito além da simples administração, pois
gerir implica enfrentar crises e buscar consensos. O nosso tempo, aqui e
agora, tem na incerteza a sua marca. Nesse sentido, um dos “grandes de-
saios” que temos é justamente assumir publicamente a nossa fragilidade
diante das incertezas, das novas demandas; uma fragilidade que exige de
nós, como meio de equilíbrio, a capacidade de escuta, especialmente na
gestão educacional e na gestão da comunicação.
É na instância de comunicação interna que talvez residam as
maiores diiculdades de uma organização, pois envolve relações de
poder, tomada de decisões, transparência, diálogo. As prerrogativas
da comunicação contemporânea, como a escuta, têm na comunica-
ção interna uma vasta área de inserção. A diiculdade está na falta
de sensibilização e compreensão, especialmente dos gestores, de que
não há como evitar rádio-corredor, fofocas, boatos senão pela trans-
parência na comunicação, que, por sua vez, implica transparência no
modo de fazer a gestão.

30 Artigo produzido a partir de participação em mesa-redonda no 8º ECOM, em 2009.

Comunicação e Gestão Educacional – 105


Nas organizações educacionais, no entanto, a comunicação ainda
é vista pelo viés funcionalista, instrumental a serviço da gestão e não
como parte da gestão. Perceber a comunicação como parte da gestão
implica uma condição humanista do processo comunicativo. Pesquisa
realizada com proissionais de comunicação atuantes em instituições
de educação básica e superior associadas ao Sindicato do Ensino Pro-
vado – Sinepe/RS, bem como gestores destas organizações, no Rio
Grande do Sul, Florczak (2009) partiu da seguinte pergunta: Como
a comunicação está sendo incluída na gestão das organizações edu-
cacionais?
A autora descobriu alguns elementos que ajudam no mapeamen-
to das percepções acerca do papel da comunicação na gestão educa-
cional. A partir da aplicação de questionário e análise das respostas,
veriicou que 87% dos respondentes airmam que sua instituição pos-
sui área de comunicação formal, sendo que 42% delas formalizaram
o setor de comunicação nos últimos 5 anos. Em 77% dos casos, o
setor de comunicação está vinculado diretamente ao gestor principal
da organização, pertencendo à estrutura de primeiro escalão no or-
ganograma. Sobre o papel principal da área na missão institucional,
44% dos pesquisados entendem que a comunicação possui um papel
de apoio estratégico.
Como área organizada e presente na estrutura formal da institui-
ção, 28% possuem um plano formal de comunicação. Cerca de 70%
das instituições possuem proissionais formados na área de comuni-
cação atuando e 30% são de outras áreas. A presença de terceiriza-
ção através de agências é acentuada, alcançando o índice de 65%.
A pesquisa descobriu ainda que 74% dos gestores e proissionais
de comunicação consideram a área imprescindível nas organizações
educacionais e 23% a consideram como importante.
A pesquisa aponta para um primeiro problema que atinge as or-
ganizações educacionais, que é, justamente, compreender que co-
municação é essa. Martino (2001a) esclarece que, etimologicamen-
te, comunicação signiica “atividade realizada conjuntamente”, tendo
origem no vocabulário religioso. Foi nos mosteiros que surgiu a ex-
pressão communicatio, referindo-se ao ato de “tomar a refeição da
noite em comum”. A ideia, nesse contexto, é de uma nova prática
para romper o isolamento entre um grupo de pessoas.
Sendo assim, a comunicação não se confunde com o conviver
ou ter algo em comum, mas é uma relação intencional, um encontro
social onde uma pessoa age sobre outra. É a partilha de um mesmo
objeto de consciência, de algo pensado, uma relação de consciências.

106 – Alexander Goulart


Daí os sinônimos partilhar, transmitir, anunciar, trocar, reunir; todos
levam à ideia de “relação”; relação de consciências com a inalidade
de conhecer e compreender a realidade.
Ainda, segundo Martino (2001a, p.23), entre seres humanos, a
comunicação é um processo de compartilhamento de um mesmo ob-
jeto de consciência; é “tornar similarer e simultâneas afecções pre-
sentes em duas ou mais consciências”. Não se trata de algo mecânico,
mas envolve ação e reação, seleção de signiicados, interpretação por
meio da linguagem. Em todo processo há interlocutores, mensagens,
meios e contextos. Numa concepção mais contemporânea, Wolton
(2006) deine o Processo Comunicacional como um movimento que
parte da busca por uma relação, do expressar-se e ser escutado. São
os dois tempos do Processo, como que estruturado por uma dupla hé-
lice: primeiro a expressão, depois o feedback. “Comunicação é sem-
pre um processo mais complexo que a informação, pois se trata de
um encontro com um retorno, e, portanto, com um risco” (WOLTON,
2006, p.16). É o risco da incomunicação.
Para Wolton, a comunicação é um grande valor humanístico e de-
mocrático baseado na igualdade e liberdade dos interlocutores. Tra-
ta-se de um valor humanístico porque é inerente ao ser humano e é
democrático porque só a democracia coloca a igualdade como condi-
ção para a comunicação. Mas Wolton alerta para o grande risco da co-
municação: a não-comunicação, o não entendimento. Comunicação
e informação são valores de emancipação. Porém, informar não é si-
nônimo de comunicar. Quando falamos em revolução da informação,
não se trata de comunicação, pois melhores técnicas não garantem
melhor comunicação. Comunicar signiica compartilhar. Outro signii-
cado é “transmitir”. Em escala humana, queremos compartilhar. A di-
ferença entre compartilhar e transmitir está no fato de que podemos
transmitir sem compartilhar. Comunicar não é apenas expressar, mas
também deixar que o outro responda e que seja ouvido.
Eis a interatividade. Deve haver diálogo. O verdadeiro elogio da
comunicação é o diálogo; é também o seu desaio, sua diiculdade,
pois o diálogo exige retorno. O elogio da comunicação é reconhecer
que se quer comunicar; ter consciência de que o êxito é raro. Nesta
perspectiva, o horizonte da comunicação é a coabitação. Coabitar
signiica reconhecer a diiculdade, a diferença, e ainda assim querer
manter a relação. A coabitação exige igualdade e alteridade.
Em sua obra É preciso salvar a comunicação (2006), Wolton
atenta para o fato de que hoje tudo é discutível. Há um direito de-
mocrático à liberdade de expressão; mas não basta que possamos

Comunicação e Gestão Educacional – 107


nos expressar, queremos e precisamos também ser ouvidos. É esse
segundo momento, o de escutar e ser ouvido, o mais difícil nas rela-
ções, sejam elas familiares ou proissionais. Nesse contexto, a ges-
tão compartilhada ganha espaço; uma gestão, como defende Heloísa
Lück, que valorize os diferentes talentos e as responsabilidades indi-
viduais, convergindo para uma sinergia da responsabilidade coletiva.
Esse tipo de gestão exige transparência, abertura; abertura ao modo
de ser do outro, às ideias do outro, sem esquecer o feedback.
Nessa dimensão de abertura e diálogo, a comunicação surge
como elemento chave. Uma comunicação que não se confunde ape-
nas com um conviver, mas como uma relação intencional, onde uma
pessoa age sobre outra, partilhando pensamentos. A comunicação
como partilha e diálogo vai além do transmitir, do anunciar; vai além
do marketing. É uma comunicação que implica coniança e coerência.
E coniança sem transparência não é possível.
A atitude de escuta, tão fundamental, não serve só para a co-
municação, mas o próprio ato de educar implica uma atitude de es-
cuta. A educação se faz na relação entre pessoas, fazendo com que
brote em seus corações o que há de melhor. Diálogo, discernimento,
comunicação e gestão educacional são expressões que precisamos
aprofundar para superarmos o narcisismo da mínima diferença e
compreendermos melhor aquele que talvez seja o maior de todos os
desaios: aquele de aprender; o desejo de aprender nos estudantes,
educadores e gestores. Somos todos aprendizes e ao mesmo tempo
ensinantes.
Vivemos numa tensão constante, entre ser aprendiz e ensinante.
O ponto de equilíbrio pode ser, nesse sentido, a comunicação, o diálo-
go, valorizando as pessoas e a própria obra educacional em constante
diálogo, num processo permanente de abertura ao outro. O diálogo
leva à criatividade. E a criatividade faz a diferença entre o que temos
e o que desejamos alcançar. Se cada dia na obra educacional é um
novo encontro, então cada encontro representa a possibilidade da
mudança, do novo, da aprendizagem.

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