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proporcionou interpretações distintas do cristianismo, o que favoreceu, como defende

Almeida (2003), a ampliação da compreensão da religião, o poder governamental, o


desenvolvimento da burguesia e a liberdade religiosa. Além disso, é importante destacar nesse
processo que o século XVII viu florescer o período denominado iluminismo ou ilustração. Nesse
período, na perspectiva de Strenger (1998), podemos afirmar que surgiram as condições mais
favoráveis para o desenvolvimento das pesquisas científicas, dos modos de pensamento, da
compreensão de mundo, do desenvolvimento social, e, portanto, nessa esteira, também das
condições para o desenvolvimento dos estudos científicos da religião. O iluminismo foi um
movimento de 4 A leitora e o leitor compreenderão que não é nosso objetivo aprofundar a
complexidade desses eventos. O que se pretende, outrossim, é demarcar um conjunto de
fatores que contribuíram, de certa forma, para a criação de um ambiente cultural para o
surgimento da disciplina Ciência da Religião. 5 A renascença foi um movimento histórico
caracterizado pelo renascimento do pensamento, da redescoberta e da valorização da cultura
grega e por um processo evolutivo do conhecimento que favoreceu o desenvolvimento
gradual do espírito científico. Veja-se conforme Rosa (2012a). 6 Rosa (2012a) relaciona as mais
importantes universidades: Paris (1175), Oxford (1220), Montpellier e Salamanca (1222),
Pádua (1224), Nápoles (1229), Palermo (1230), Toulouse (1230), Cambridge (1231), Siena
(1246), Sorbonne (1253), Lisboa (1290), Roma (1303), Coimbra (1308), Praga (1317), Florença
(1349), Cracóvia (1364), Viena (1365), Heidelberg (1386), Saint Andrews em Edimburgo (1410),
Louvain (1426), Poitiers (1432), Caen (1436), Bordéus (1441), Valencia (1452), Nantes (1460)
Burgos (1463) e Uppsala (1476). 14 Maurílio Ribeiro da Silva Flávio Senra Estudos de Religião,
v. 35, n. 3 • 9-32 • set.-dez. 2021 • ISSN Impresso: 0103-801X – Eletrônico: 2176-1078 ruptura
epistemológica com os valores da chamada idade média, marcado pela valorização da
atividade intelectual e racional, um movimento que se considerava responsável por libertar a
humanidade do obscurantismo e da ignorância através da razão e da difusão do conhecimento
científico Esse ambiente de transformação social, cultural e político impactou fortemente a
vida acadêmica europeia. Some-se a isso o desenvolvimento de novas disciplinas e o interesse
por culturas não-cristãs, embora marcadas pelo viés do etnocentrismo. Entrementes, relativo
ao estudo das religiões, como destaca Rego (2018), uma questão importante em meados do
século XVII foi o desenvolvimento da filologia e da arqueologia na Europa, processo
alavancado pelo imperialismo colonialista7 com foco de interesse nos estudos sobre o
orientalismo8 . As traduções desenvolvidas nesse período, tais como as dos clássicos do
confucionismo, dos manuscritos avésticos, dos textos zoroástricos, do mahavansa, do
bhagavad purana e do dhammapada, abriram um leque de possibilidades para o estudo das
tradições orientais do século XVII ao XIX. Ries (2019) igualmente destaca o quanto o século
XVIII também foi produtivo para os estudos da religião. Foi nesse período que se utilizou pela
primeira vez os termos história da religião e ciência da religião, mesmo não aludindo ainda a
uma disciplina autônoma. Descobertas de textos dos vedas, como as do jesuíta Jean Calmette,
surgidas entre os anos 1730 e 1732, fomentaram a formação de sociedades de estudos sobre
temas asiáticos na Índia, em Paris e em Londres. Um reconhecido marco desse processo,
ocorrido em 1757, foi a publicação de História Natural da Religião, por 7 Como destaca Karina
Bellotti, o imperialismo e o colonialismo europeu produziram um imenso acervo de
informações sobre as religiões dos povos colonizados. Documentos religiosos, relíquias,
papiros, estátuas e inscrições hieroglíficas foram sequestrados pelos colonizadores para as
respectivas sedes. Além disso, a expansão colonial colocou em contato as elites europeias e as

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