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Entenda como funciona uma estação de tratamento de esgoto

A água encontrada no meio ambiente é um bem extremamente precioso e presente no cotidiano de cada cidadão.
Afinal, lavar as mãos, tomar banho, lavar a louça e as roupas e usar a descarga do vaso sanitário são ações que fazem
parte do dia a dia das pessoas de qualquer cidade. Toda a água que é eliminada nesse uso é chamada de esgoto.
Nesse contexto, o saneamento básico, especialmente as estações de tratamento de esgoto, são fundamentais para
garantir que essas águas servidas retornem para a natureza despoluídas, contribuindo com a prevenção de doenças, a
promoção da saúde e a melhora da qualidade de vida da comunidade.
Neste artigo, falaremos sobre as estações de tratamento de esgoto (ETEs). Saiba como surgiram as primeiras estações
no Brasil, como funciona todo o processo de tratamento de esgoto e quais são os objetivos dele, a sua importância e as
tendências e novidades desse setor. Boa leitura!
O que é estação de tratamento de esgoto e qual é o seu objetivo?

De modo geral, o esgoto é formado pela água que, após a utilização, tem as suas características naturais alteradas,
tornando-se imprópria para o uso. O esgoto pode ter origem doméstica, ou seja, aquele que é produzido pela utilização
de água em atividades do dia a dia de uma residência, como lavagem de peças de roupa e de utensílios de cozinha,
limpeza de cômodos, banho, descarga de vasos sanitários e outros.
A água que escorre pelos ralos de estabelecimentos comerciais e de indústrias também cai na rede de esgoto e deve
ser transportada para receber o devido tratamento, por meio das tubulações.
O objetivo do tratamento do esgoto é remover os poluentes da água previamente usada pela população, de forma a
devolvê-la aos corpos hídricos em boas condições e de acordo com os parâmetros exigido pelos órgãos ambientais.
Para tanto, foram criadas as ETEs, ou Estações de Tratamento de Esgoto. Nesses locais, o esgoto passa por diversos
processos, químicos, físicos e/ou biológicos, que garantem a retirada dos poluentes de forma eficaz.
De modo geral, é possível dizer que o foco do tratamento dos esgotos é contribuir com a saúde da população e
preservar o meio ambiente, especialmente garantindo a qualidade das águas de lagoas, rios, mares e até de
reservatórios subterrâneos. Isso é importante para garantir a sustentabilidade desse recurso, que é finito, para toda a
comunidade biótica que depende dele, bem como oferecer melhores condições de vida para as pessoas.
Como surgiram as estações de tratamento de esgoto no Brasil?

A vinda da Família Real Portuguesa, em 1808, favoreceu a disseminação da cultura europeia no Brasil, o que incluía a
preocupação com a saúde pública e o saneamento básico. Dessa forma, um ano após a chegada da corte, criou-se o
cargo de Provedor-mor da Saúde da Corte e Estado do Brasil. Esse funcionário era responsável por fiscalizar as
quarentenas dos navios que chegavam aos portos do Rio de Janeiro e verificar as condições de armazenamento de
mantimentos e alimentos, por exemplo.
O objetivo desse serviço era basicamente evitar a propagação de doenças entre os cidadãos. Para potencializar esse
efeito, criou-se a Junta de Higiene Pública, em 1850. Esse órgão tinha a função de unificar os serviços sanitários do
Império. Dessa forma, durante esse período ocorreram as primeiras medidas sanitárias de grande importância no país.
Já em meados do século XIX, Dom Pedro II implementou o serviço de limpeza das residências do Rio de Janeiro e do
esgoto das águas pluviais. Nessa época, o sistema de esgotos compreendia duas redes separadas, sendo uma para
águas pluviais e outra para os rejeitos sanitários somado à contribuição pluvial de pátios internos e telhados.
As obras foram inauguradas em 1864, e marcam o início do uso de estações de tratamento de esgoto no Brasil. Na
época, elas eram constituídas por tanques de ferro de grandes proporções, abertos e com grades de barras, que
recebiam o esgoto sanitário da população.
A limpeza era feita de forma manual, com utensílios semelhantes a grandes peneiras. Além disso, o esgoto desses
tanques recebia um tratamento químico de cal e sulfato de alumínio, que agiam como redutores de odores e
aceleravam a decantação do material em suspensão. Após esse tratamento primário, o esgoto final da estação era
lançado no mar.
A partir dos anos 40, se iniciou a comercialização dos serviços de saneamento. Surgem então as autarquias e
mecanismos de financiamento para o saneamento, com influência do Serviço Especial de Saúde Pública (SESP), hoje
denominada Fundação Nacional de Saúde (FUNASA).
Em meados da década de 50, os investimentos em tratamento de esgoto começaram a aumentar de forma pontual.
Nas décadas de 70 e 80 houve um investimento ainda maior, motivado por diversos estudos sobre a redução da taxa
de mortalidade a partir do saneamento.
Com isso, criaram-se diretrizes de implementação, medidas e infraestruturas para o saneamento básico no Brasil. Em
1971, foi instituído o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA), com foco principalmente na expansão do serviço de
abastecimento de água. Outro marco do saneamento no país foi a Lei Federal 11.445, editada em 2007 e conhecida
como o marco legal do saneamento básico, com diretrizes para viabilizar os avanços necessários para o setor.
Por meio dessa lei, também chamada de Lei Nacional do Saneamento Básico, foi elaborado o Plano Nacional de
Saneamento Básico (Plansab), publicado em 2013, que projetou a universalização dos serviços para 2033.
Ao longo desses anos, os sistemas de tratamento de esgoto passaram por avanços e novas tecnologias foram
implementadas. Apesar disso, é evidente que em quase 50 anos, o cenário do saneamento no país pouco evoluiu.
Segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) coletados em 2017, 47,6% da
população ainda não tem coleta de esgoto e 55% do esgoto gerado não é tratado no país.
Como funciona uma estação de tratamento de esgoto?
Como mencionamos, a água utilizada nas residências, estabelecimentos comerciais e indústrias se torna o que
chamamos de esgoto. Ao deixar as casas, ele é encaminhado por tubulações para as redes coletoras e o destino final é
a ETE, estação de tratamento de esgoto.
Inicialmente, o tratamento do esgoto consiste na separação da parte líquida da sólida. Nessa primeira etapa ocorre a
remoção de materiais grosseiros, como objetos sólidos (papéis, plástico e outros), areia e gordura. O sistema é
composto geralmente por peneiras e grades, responsáveis pela retenção desses materiais.
Depois disso, o esgoto é transportado para uma caixa cuja função é retirar os resíduos de areia e a gordura que
permaneceram. Esses resíduos podem ser removidos de forma manual ou mecanizada e, posteriormente, devem ser
destinados de maneira adequada aos aterros sanitários.
Os processos subsequentes dependem da tipologia do sistema de tratamento e podem ser divididos em três níveis:
primário, secundário e terciário, de acordo com o grau de poluentes que se deseja remover.
Sistema primário
No sistema primário, ocorre apenas a remoção dos sólidos suspensos e sedimentáveis presentes no esgoto. Nessa
etapa utiliza-se somente processos físicos, como a decantação. Esse é um método simples e prático, em que a mistura
fica em repouso por algum tempo e, devido a isso, as impurezas se sedimentam, ou seja, depositam-se no fundo do
recipiente. Ao final, o líquido é escoado cuidadosamente.
O material em repouso forma um resíduo, neste caso chamado de lodo primário. É importante que o seu excesso seja
retirado do sistema a fim de não causar prejuízos nas outras etapas do tratamento. A sua remoção é feita por meio de
bombeamento para unidades de desidratação, que podem ser leitos de secagem, centrífugas, adensadores ou outro
processo definido pela empresa que controla a estação de tratamento.
Outra técnica usada é a flotação, que consiste em uma separação físico-química por meio da adição de bolhas de ar em
uma suspensão chamada de coloidal. As partículas que estão suspensas aderem às bolhas de ar e são arrastadas para
a superfície da mistura. Assim, forma-se uma espécie de espuma que pode ser removida da solução.
Comumente nessa etapa são usados separadores de água e óleo ou gordura, que são equipamentos que usam métodos
físicos para separar os dois líquidos. Um importante fator é a densidade, visto que o óleo flutua sobre a água. Essa fase
do tratamento é essencial em esgotos provenientes de áreas de manutenção industrial e lavagem de veículos e
máquinas, como em oficinas mecânicas, já que a água geralmente está contaminada com óleos e graxas.
Outra técnica é a eletrocoagulação, ou a passagem de corrente elétrica pela água, o que coagula os poluentes. Isso
acontece porque os campos elétricos tornam as reações de oxirredução possíveis, formando flocos de contaminantes.
Sistema secundário

No sistema secundário ocorre a remoção da matéria orgânica dissolvida, por meio de processos biológicos, em que um
conjunto de microrganismos consome a matéria orgânica presente para se estabilizar, removendo-a do esgoto. O
objetivo desses métodos é acelerar a decomposição dos poluentes orgânicos que ocorre de forma natural, porém mais
lentamente. Nesse caso, a matéria orgânica pode estar dissolvida, solúvel ou em suspensão.
Os processos biológicos usados para remover a matéria orgânica podem ser aeróbios (que necessitam da presença de
oxigênio para acontecer) ou anaeróbios (que não requerem a presença de oxigênio). No processo anaeróbio, a matéria
orgânica é convertida em gás carbônico e gás metano, sendo o último gerador de odores desagradáveis. O índice de
remoção da matéria orgânica nessa etapa de tratamento fica entre 60% e 75%.
No caso de decomposição da matéria orgânica feita por microrganismos que precisam de oxigênio, a matéria orgânica é
convertida em gás carbônico e água, e esse processo é mais eficiente que o anaeróbio. No entanto, é necessário
garantir aeração dentro do sistema por meio de difusores e sopradores de ar, o que envolve consumo de energia
elétrica e, consequentemente, um custo mais elevado.
Normalmente as estações de tratamento de esgoto optam pelos dois tipos de processos a fim de atingir a maior
eficiência operacional e, assim, um esgoto com baixos níveis de matéria orgânica.
Sistema terciário

No sistema terciário ocorre a remoção de compostos inorgânicos do sistema, tais como nitrogênio e fósforo. Dessa
forma, o tratamento tem foco em poluentes específicos que não foram retirados pelos processos anteriores, como
metais pesados, compostos não biodegradáveis, nutrientes e outros. Esta etapa é utilizada quando se pretende
remover esgotos com características de industrial ou remover nutrientes a uma concentração que não é possível de se
atingir apenas com o processo secundário.
O processo pode ocorrer por meio da utilização de produtos químicos (físico-químico) ou de forma biológica
(microrganismos ou bactérias). Nesse último caso é necessário criar estruturas que possibilitem um ambiente favorável
para sua ocorrência. A definição do processo depende da qualidade requerida pelo esgoto tratado e dos estudos de
viabilidade técnica e econômica.
Nesse caso, podem ser usadas várias técnicas, como:

 microfiltração: nesse processo, uma pressão aplicada realiza a separação da parte líquida do esgoto dos
sólidos poluentes;
 precipitação química: adição de substâncias químicas coagulantes, com o objetivo de formar flocos que
decantam com o lodo, removendo o poluente do esgoto, que fica mais límpido. Um exemplo é a adição de
sais de alumínio, ferro e cálcio para remoção de fósforo do efluente;
 adsorção: nesse processo, usa-se o carvão ativado para promover a adsorção, ou seja, os poluentes são
transferidos para a superfície do composto utilizado;
 troca iônica: íons poluentes que estão na água ficam retidos na resina polimérica aplicada no esgoto.
Qual é a importância da estação de tratamento de esgoto?

A ETE é responsável por receber o esgoto coletado no município e dar o tratamento adequado, sendo a última etapa do
sistema de esgotamento sanitário. De forma geral, um município que trata seu esgoto garante maior qualidade de vida
para sua população.
Segundo Pedro Gobbo, Coordenador de Operações na BRK Ambiental, muitas vezes os corpos hídricos que recebem
esgoto sem o devido tratamento servem de abastecimento para comunidades vizinhas, colocando em risco a saúde das
pessoas. Afinal, o tratamento da água evita a proliferação de doenças de veiculação hídrica, ou seja, aquelas que têm
na água um meio de propagação.
Em média 50 tipos de doenças podem ser transmitidos de uma pessoa contaminada para uma saudável por diferentes
caminhos, envolvendo as excretas humanas. Os esgotos não tratados contaminam a água, o alimento, as mãos, os
utensílios domésticos e o solo, assim como podem ser transportados por insetos (baratas e moscas, por exemplo) e
roedores, provocando novas infecções. Nesse caso, podemos citar a cólera, a hepatite, a leptospirose, as viroses, a
febre tifoide, a disenteria, as parasitoses e outras.
Para se ter uma ideia, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, a cada $1 investido em saneamento, há uma
redução de $4 em gastos com a saúde. O mesmo relatório da OMS ainda reforça que uma comunidade com esgoto
tratado é mais produtiva, com menos dias perdidos de trabalho, além de ter seus imóveis valorizados, o que impacta
positivamente na economia.
Outra razão de relevância para tratar os esgotos é a preservação do meio ambiente. Os poluentes presentes no esgoto
in natura, ou seja, sem tratamento, impacta diretamente na qualidade da água e na sobrevivência da vida aquática.
A decomposição da matéria orgânica por meio natural, por exemplo, causa a diminuição da concentração de oxigênio
dissolvido, provocando a morte do ecossistema aquático (peixes e outros organismos), escurecimento da água e
provoca cheiros desagradáveis. Também existe a possibilidade de eutrofização pela presença de nutrientes
provenientes dos restos alimentares e das fezes. Isso gera um crescimento acelerado de algas que produzem
biotoxinas na água.
Por fim, pensando mais além, a preservação dos recursos hídricos garantirá a sustentabilidade desse recurso para as
futuras gerações. Hoje em dia, temos a consciência de que a água não é um recurso natural infinito. Apesar de
renovável, devido à sua capacidade de se recompor (principalmente pelas chuvas), ela é usada em uma proporção
muito maior do que a natureza consegue produzir. Dessa forma, se os esgotos não forem tratados, pode ocorrer um
desequilibro, afetando a vida das próximas gerações.
Quais são as tendências e novidades no tratamento de esgoto?

O desenvolvimento de novas tecnologias é importante para aumentar a eficiência nos serviços de saneamento básico.
Afinal, os sistemas que pertencem ao saneamento são bastante complexos, com redes de distribuição que podem se
estender até por dezenas de quilômetros. Dessa forma, para conseguir a ampliação da oferta para a população, a
otimização do tratamento e a redução dos custos, é necessário empregar soluções criativas e inovadoras.
Nesse contexto, as empresas do setor de saneamento básico têm buscado por novas tipologias de tratamento de
esgoto, a fim de garantir alta performance operacional e eficiência na remoção de poluentes. Nas últimas décadas,
houve a entrada de diversos players no setor, que estudam e desenvolvem novas soluções de tratamento para
agregar tecnologia aos processos convencionais já existentes, aumentando sua performance e fazendo com que eles
tragam vantagens técnicas e econômicas para as empresas de saneamento.
Entre essas tecnologias podemos citar as membranas de microfiltração e ultrafiltração, reatores de leito móvel com
biofilme (MBBR) e a técnica do lodo granular aeróbio. O interessante é que essas novas tecnologias podem ser
utilizadas separadamente ou em conjunto para potencializar os processos convencionais, o que depende do grau de
exigência do tratamento do esgoto.
A disposição de lodo é um problema no Brasil, visto que grande parte dos municípios não têm aterros licenciados. Por
isso, as empresas têm procurado alternativas para promover a desidratação do lodo, pois assim menos volume terá
que ser disposto. Entretanto, normalmente esse processo exige custos com energia elétrica, o que onera as despesas
operacionais.
Para resolver esse e outros problemas de custos com os processos há uma tendência no Brasil para gerar energia
elétrica por meio das etapas das próprias estações de tratamento. Um exemplo é a utilização do biogás gerado em
reatores para produção de energia elétrica a ser usada pela própria planta ou então injetada na rede pública de
energia.
Além disso, a planta de biometano está sendo estudada para uso em veículos, algo que ainda é inédito no Brasil. A
energia é gerada a partir do biogás, produto que é resultante do tratamento dos esgotos. Em média, a planta consegue
produzir 1.500 Nm³ de biometano diariamente, o que é equivalente energeticamente a 1.500 litros de gasolina comum.
Outra medida tecnológica interessante tem sido implementada em áreas remotas, onde o tratamento dos esgotos é
difícil e mais raro. A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) desenvolveu uma fossa séptica
biodigestora que é capaz de tratar o esgoto diretamente do vaso sanitário e, depois, produz uma substância que é
usado para adubar o solo. Esse sistema é ideal para uma residência com até cinco moradores, e a única exigência para
o seu funcionamento é adicionar, mensalmente, uma mistura de água e esterco de boi fresco.
Esse processo fornece nutrientes às bactérias presentes no meio, a fim de que elas possam realizar a biodigestão dos
dejetos, transformando-os em fertilizante para o solo. O interessante é que a fossa tem baixo custo, é de simples
instalação e ainda não gera cheiros desagradáveis.
Por fim, é possível concluir que o processo realizado na estação de tratamento de esgoto é longo e bastante complexo,
demandando custos relevantes para a companhia de saneamento. Apesar disso, as etapas permitem que o esgoto fique
livre de contaminantes que trazem riscos ao meio ambiente e aos seres humanos, sendo devolvido para a natureza sem
causar impactos negativos.
Além disso, é importante que a população colabore com todo o processo. Para tanto, alguns cuidados podem ser
adotados a fim de evitar problemas com os sistemas de esgoto, como:

 sempre deixar a caixa de gordura perto da pia da cozinha, uma vez que se houver acúmulo de gordura será
mais simples limpá-la e desentupir o cano;
 investir em sistemas com sifão, visto que essas peças retêm a sujeira;
 evitar jogar restos de alimentos e de qualquer outro detrito em vasos sanitários, pias e ralos;
 evitar o descarte de lixo, como papéis, plásticos, cigarros, fraldas, absorventes, ou de qualquer outro objeto
nos vasos sanitários, pias e ralos;
 descartar o óleo de cozinha separadamente e não em pias e ralos;
 observar se toda a casa está corretamente interligada à rede de esgoto.

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