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Sumário
1. Introdução. 2. Direito de Família e Psicanálise. 3. O advogado e a escuta
psicanalítica.
1 Introdução
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* Palestra proferida na Faculdade de Direito da UFMG, em 15/05/95.
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** Advogado familiarista, Professor de Direito de Família na PUC-MG e na Escola de Advocacia da
OAB/MG, membro da Sociedade Internacional de Direito de Família; autor do livro Concubinato e União
Estável (Belo Horizonte, Del Rey).
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Psicanálise. A Psicanálise traz para o pensamento jurídico uma
contribuição revolucionária com a "descoberta" do sujeito inconsciente.
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[1] PETRAZYCKI, Leon. Law and morality, Twentieth Century Legal Philosophy series, v. VII, Cambridge
(Mass), 1955.
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O conceito de ficção utilizado por Kelsen será mais tarde
trabalhado por Jacques Lacan (1901-1981), que o elaborou a partir das
teorias de J. Bentham. Lacan constrói seu pensamento dizendo que o
inconsciente é estruturado como linguagem. Ele não desconsidera o Direito
na construção de seu pensamento. Em seu Seminário, livro 20 (1972-
1973), ele explicita esta ligação Direito x Psicanálise:
"...eu não me achava deslocado por ter que falar numa faculdade de
Direito, pois é onde a existência dos códigos torna manifesta a
linguagem..."
"...e lembrarei ao jurista que, no fundo, o direito fala do que vou lhes falar
- o gozo".
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UFMG, em 1976, em artigo sob o título Direito e Psicanálise, de autoria
do Psicanalista Célio Garcia, publicado na Revista desta Faculdade (v. 24,
n. 17), em outubro de 1976.
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trazer as teorias, os fundamentos de uma e de outra, ou a interlocução
possível, falarei de sua aplicabilidade no campo do Direito de Família.
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[2] BEVILAQUA, Clovis. Direito de família, Rio de Janeiro, Editora Rio, 1976, p. 16.
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Para o Direito, o conceito de família esteve sempre ligado a
dois elementos fundamentais: consanguinidade e casamento formal e
solene. Mas a realidade tem-nos dado outra noção de família. Primeiro
porque o elemento da consanguinidade não é fundamental para a sua
constituição, pois se o fosse não seria possível no Direito o instituto da
Adoção. A esse respeito João Baptista Villela muito bem já o demonstrou,
em seu trabalho publicado em 1979, sob o título A Desbiologização da
Paternidade. Segundo, porque o casamento não é mais a única forma de
constituição da família, conforme diz o art. 226 da Constituição Federal:
pela união estável (concubinato), pelos pais e seus descendentes.5[3]
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[3] VILLELA, João Baptista. A desbiologização da paternidade. Revista da Faculdade de Direito da
UFMG, Belo Horizonte, ano XXVII, p. 21, 1979.
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Para o psicanalista francês Jaques Lacan, a família não é
natural, é cultural. Por isso é que ela se apresenta das mais variadas formas,
de acordo com as diferentes culturas. Para ele, a família não se constitui
apenas de um homem, uma mulher e filhos, ainda que casados
solenemente. Ela é, antes de tudo, uma estruturação psíquica, onde cada
um de seus membros ocupa um lugar definido. Lugar do pai, da mãe, dos
filhos, sem entretanto estarem necessariamente ligados biologicamente ou
por qualquer ato formal.
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[4] CUNHA PEREIRA, Rodrigo. Concubinato e união estável. Belo Horizonte, Del Rey, 1994.
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quando a estrutura familiar não é capaz de se sustentar na originalidade em
que foi constituída, a lei jurídica pode vir em seu socorro.
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[5] FREUD, Sigmund. O inconsciente, in Obras Psicológicas Completas, Rio de Janeiro, Imago, 1974, v.
XIV, p. 191.
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[6] FREUD, Sigmundo. Op. cit., v. VI.
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Mais tarde, Lacan veio demonstrar e afirmar que "o
inconsciente é estruturado como a linguagem". Mas não há espaço aqui,
nos limites deste trabalho, para tecer maiores considerações e teorizações
sobre definições do inconsciente. Interessa-nos entender, ainda que a
grosso modo, como ele funciona e qual a sua influência no discurso de
nossos clientes. Nós trabalhamos com o discurso, com a linguagem. Daí,
precisarmos nos escutar. Nós, advogados de família, somos também
profissionais da escuta, assim como os psicanalistas.
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pessoa do juiz, que tem também uma função simbólica de grande
importância. O juiz ocupa o lugar da autoridade, da lei, da representação
do Estado, e isto não podemos desprezar. Talvez seja exatamente saber da
possibilidade de se recorrer à autoridade do "grande-pai" que torne possível
o estabelecimento de acordos pré-judiciais.
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estes cuidados, em caso de separação litigiosa, acabamos ocupando, na
fantasia da parte contrária, o lugar de "agente separador", como se
fôssemos os responsáveis por aquela desunião. É mais fácil achar que o
advogado o está separando do que o seu admitir o seu próprio fracasso da
relação. Mais de uma vez já fui ameaçado de morte pelo marido quando o
convidei, a pedido da esposa, a conversar sobre uma possível separação.
Aliás, em um desses casos em que fui ameaçado de morte, o casal acabou
não se separando, embora há muito o casamento, de fato, já não existisse.
Essa relação culminou com a morte (enfarto) da mulher, que não conseguia
dizer ou saber conscientemente que o casamento há muito não existia e a
sufocava.
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difícil solução para as partes e muitas vezes acaba em um longo e tenebroso
processo judicial, repita-se. Lembro-me aqui de um caso de separação
judicial litigiosa onde o ex-cônjuge, após a sentença transitada em julgado,
não podendo mais brigar naquele processo, começou a instalar outros,
como modificação de guarda, revisional de alimentos, etc. E dessa forma
ia mantendo a relação com a ex-mulher.
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de não se chegar a um acordo é do advogado. Enquanto isto mantém-se a
relação prazerosa da dor.
Bibliografia
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BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de Família. Rio de Janeiro, Editora Rio,
1976.
FREUD, Sigmund. O inconsciente. In: Obras psicológicas completas.
Rio de Janeiro, Imago, 1974, v. XIV.
KELSEN, Hans. Teoria geral das normas. Trad. José Florentino Duarte.
Porto Alegre, Fabris, 1986.
LACAN, Jacques. O seminário. Livro 20. Trad. M.D. Magno. Rio de
Janeiro, Jorge Zahar, 1985.
LEGENDRE, Pierre. O amor do censor. Ensaio sobre a ordem
dogmática. Trad. e rev. Aluisio Pereira de Menezes, M.D. Magno e
Potiguara Mendes da Silveira Jr. Rio de Janeiro, Forense Universitária,
1983.
CUNHA PEREIRA, Rodrigo. Concubinato e união estável. Belo
Horizonnte: Del Rey, 1994.
SILVA PEREIRA, Caio Mário. Instituições de direito civil. Direito de
Família. Rio de Janeiro, Forense, 1979, v. V.
VILLELA, João Baptista. A desbiologização da paternidade, in Revista
da Faculdade de Direito da UFMG, Belo Horizonte, ano XXVII, n. 21,
1979.
________. Liberdade e Família. Belo Horizonte, Fac.de Direito da
UFMG, 1980.
VOULET, Jacques. Le divorce et la séparation de corps. Paris, Delmas,
1991.
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