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SANDRONI, Laura; MACHADO, Luiz Raul. A criança e o livro. São Paulo: Ática, p.10-11.

A leitura é um dado cultural: o homem poderia viver sem ela e, durante séculos, foi isso mesmo
o que aconteceu. No entanto, depois que os sons foram transformados em sinais gráficos, a
Humanidade, sem dúvida, enriqueceu-se culturalmente. Surgiu a possibilidade de guardar o
conhecimento adquirido e transmiti-lo às novas gerações. Assim, tornou-se cada vez mais importante
para o homem saber ler. Não apenas decifrar aquele código escrito, mas, a partir dele, discutindo-o,
contestando-o ou aceitando-o, construir um pensamento próprio.
Por isso dizemos que ler, no sentido profundo do termo, é o resultado da tensão entre leitor e
texto, isto é, um esforço de comunicação entre o escritor, que elaborou, escreveu e teve impresso seu
pensamento, e o leitor, que se interessou, comprou ou ganhou, folheou e leu o texto. Por isso a leitura é
uma atividade individual e só a leitura direta, sem intermediário, é leitura verdadeira: a leitura silenciosa,
que mobiliza toda a capacidade de uma pessoa, é uma atividade quase tão criadora como a de escrever.
Como não se trata de um ato instintivo, mas, pelo contrário, de um hábito a ser gradativamente
adquirido, é preciso que se dê desde o início ao aprendiz da leitura o objeto a ser lido (livro, revista ou
jornal), respeitando o seu nível de aprendizado. Daí a divisão em faixas de interesse, ou faixas etárias,
normalmente usada, que nada mais é do que uma indicação para essas diferentes etapas da lenta
caminhada até o domínio total da leitura.
Por tudo isso, existe uma produção específica destinada a crianças e jovens, que leva o nome
de literatura infantil e juvenil. Pode surgir agora a pergunta: Por que literatura? Por que ao pensar em
leitura falamos de livros de ficção, isto é, livros que contam histórias, e não de cartilhas ou manuais?
Acreditamos que a leitura de ficção (que supõe o uso anterior de cartilha) é a indicada quando se trata
da criação do hábito de leitura, devido ao interesse imediato que suscita. Falando diretamente à
imaginação e à sensibilidade, o texto literário, sem compromisso com a realidade, mas referindo-se
continuamente a ela, pode, por sua força criadora, levar à comunicação leitor-texto que caracteriza o ato
de ler. No mundo maravilhoso da ficção, a criança encontra, além de diversão, alguns dos problemas
psicológicos que a afligem resolvidos satisfatoriamente; percebe em cada narrativa formas de
comportamento social que ela pode aprender e usar no processo de crescimento em que se encontra,
informações sobre a vida das pessoas em lugares distantes, descobrindo, dessa forma, que existem
outros modos de vida diferentes do seu.
Se a leitura deve ser um hábito, deve ser também fonte de prazer, e nunca uma atividade
obrigatória, cercada de ameaças e castigos e encarada como uma imposição do mundo adulto. Para se
ler é preciso gostar de ler. Se deve ser um hábito, a leitura deve começar a ser sugerida ao indivíduo o
mais cedo possível. Por isso, a casa, a família, os pais são os primeiros incentivos à criança: o adulto
que pega uma criança no colo e a embala com aquelas cantigas tradicionais, que brinca com o bebê
usando as histórias, adivinhações, rimas e expressões de nosso folclore, que folheia uma revista ou um
livro buscando as figuras conhecidas e pergunta o nome delas, está colaborando – e muito! – para uma
atitude positiva diante da leitura. Os pais que leem, aqueles que já têm eles mesmos o hábito de leitura
desenvolvido, podem estar tranquilos quanto ao fato de que seus filhos serão bons leitores. Sabemos,
no entanto, que em nosso país eles são minoria. Por motivos diversos, principalmente de ordem
econômico-social, a maioria de nossa população não lê.

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