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Teorias Controle Motor-Joao-Sandra
Teorias Controle Motor-Joao-Sandra
INTRODUÇÃO
Como as pessoas estabilizam seus corpos no espaço? Como caminham? Correm?
Como aprendem estas atividades? Uma explicação unificada para estas questões está longe
de ser estabelecida. Teorias e modelos divergentes têm sido propostos para explicar a
ontogenia e o desempenho resultante da atividade do sistema motor. A relevância deste
tópico aumenta ao sabermos que diferentes métodos usados na recuperação de pacientes
portadores de afecções neurológicas envolvem aspectos controversos em diferentes teorias,
e que estes aspectos são desconsiderados na seleção dos métodos mais adequados para
reabilitação destes pacientes. Observa-se, em outras palavras, uma seleção aleatória,
baseada em critérios a posteriori, das sistemáticas consideradas adequadas para
recuperação de distúrbios motores.
Um modelo pode ser definido como uma "representação de um sistema por outro
sistema, usualmente mais familiar, cujo funcionamento é suposto ser análogo ao
primeiro"9. Um modelo é "um tipo de estrutura, ou classe de estruturas, que compartilham
certas características gerais"10; a compreensão do sistema ocorre por meio de aproximações
ou descrições simplificadas. Toda modelização envolve "idealização, simplificação,
abstração e sistematização" de um fenômeno, que resulta em sua capacidade para capturar
e relacionar "aspectos esquemáticos de sistemas", e de eventos, de diversas naturezas11.
Mas diversas limitações desta abordagem podem ser mencionadas. A maior refere-
se aos movimentos voluntários e à aquisição de novas habilidades na ausência de estímulos
sensoriais. A teoria de Sherrington também não explica como um estímulo similar pode
resultar em respostas distintas, dependendo do contexto e do controle superior13. Apesar
destas limitações, ainda é influente a noção que comportamentos complexos derivam de
uma seqüência de componentes, ou unidades, mais simples.
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2.2. Teoria hierárquica do controle motor
Importantes modificações na visão segmentar do sistema nervoso foram feitas por
Hughlings Jackson, citado por Luria15. O autor descreveu um fenômeno aparentemente
contraditório. Uma lesão, em uma área específica do cérebro, não produzia uma perda total
da função associada àquela área. Jackson propôs, baseado em suas análises, uma nova
teoria de organização do sistema motor. Esta organização tem como característica ser
vertical e estruturada hierarquicamente em três níveis (Figura 3). O primeiro nível, inferior,
é representado pelos segmentos espinhais e do tronco encefálico de controle da função
motora. Este nível sofre influência direta de uma porção intermediária, correspondentes às
divisões motoras e sensoriais do córtex cerebral. Em um terceiro nível, superior, as áreas
associativas são consideradas e, principalmente, as divisões frontais do cérebro13,15. Luria15
cita, "de acordo com Jackson, a localização de um sintoma (a partir da deficiência de uma
função particular), que acompanha a lesão de uma área circunscrita do sistema nervoso
central, não pode ser identificada pela localização de uma função particular".
3. Discussão e conclusão
Dividimos as diversas abordagens teóricas em dois grupos, que chamamos de
representacionalista e ecológico. Vimos que a antecipação temporal de um movimento
ordinário é considerada um exemplo de ajuste ao ambiente em termos
representacionais34,35. Um indivíduo deve reconhecer seu ambiente para planejar e executar
ações motoras apropriadas36. Tais ações dependem, de acordo com a tese
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representacionalista, de um plano geral, um “programa motor”, e de sub-programas
específicos (sub-rotinas), hierarquicamente organizados em um modelo antecipatório da
ação motora37,38. Em outras palavras, um movimento depende de uma representação ou de
um modelo preditivo de sua execução38. As investigações têm se concentrado nas bases
neurais destes processos39,40 e na natureza computacional de operações mentais a eles
associadas38, 40.
Introduzimos a teoria reflexa do controle motor (TCM) de Sherrington. Qual a
relação desta teoria com a abordagem representacionalista? A teoria reflexa de Sherrington
explica os mecanismos e as circuitarias envolvidas no nível mais elementar do
comportamento motor, por meio das quais são implementadas as sub-rotinas dos
programas motores. Um aumento de complexidade de movimentos é descrito como o
resultado do encadeamento das unidades reflexas, controladas pelos programas motores.
Isto explica como são possíveis respostas reflexas diferenciadas para um mesmo estímulo.
A abordagem ecológica, que tem em Bernstein seu mais notável representante,
baseia-se em princípios de coerções que cooperam sistematicamente na construção do
movimento. A tese dinamicista representa uma radicalização da perspectiva ecológica, e
sugere que a ação motora é um fenômeno emergente que resulta de parâmetros (o corpo, o
ambiente físico e cultural, e o cérebro) densamente acoplados.
De um modo geral, a visão representacionalista tende a desconsiderar a influência
de variáveis externas sobre o comportamento motor, e elege o sistema nervoso como o
principal determinante deste comportamento. A abordagem ecológica, por sua vez, enfatiza
a aquisição de novas habilidades como resultado de influência direta de parâmetros
ambientais. As diversas estratégias terapêuticas que examinamos baseiam seus programas
nestes dois grandes grupos teóricos, considerados divergentes, e por muitos especialistas,
excludentes. A possibilidade de integração das diferentes perspectivas deve ser
considerada em estudos futuros. O que nos interessa discutir é que sabemos das enormes
conseqüências de uma seleção adequada de estratégias terapêuticas sobre a recuperação de
pacientes com deficiências motoras. Sabemos, por outro lado, que estas estratégias estão
fundamentadas em diferentes perspectivas teóricas, e que tais perspectivas sugerem a
construção de abordagens terapêuticas distintas. Discutimos, neste capítulo, exemplos de
abordagens fundamentadas em diferentes perspectivas - a facilitação de uma resposta, pela
aplicação de um estímulo, por meio de um circuito reflexo, está subsidiada nas idéias de
Sherrington sobre a Teoria Reflexa; a modulação da atividade reflexa, por meio da
atividade gerada por níveis superiores de controle está apoiada na Teoria Hierárquica do
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controle motor; a ênfase no plano geral da ação baseia-se na Teoria da Programação
Motora; a intervenção nas características biomecânicas e ambientais, durante o
desempenho de uma tarefa motora, nas idéias de Bernstein, formulador da Teoria dos
Sistemas.
Duas questões devem ser formuladas: Quais são os critérios decisivos na escolha
das abordagens terapêuticas? Como otimizar esta seleção? A relação das fundamentações
teóricas com as implicações clínicas associadas à escolha de certas abordagens deve
permitir diversas considerações sobre a seleção dos melhores métodos fisioterapêuticos.
Estas considerações (teórico-terapêuticas) são, em geral, negligenciadas pela comunidade
de especialistas. Uma escolha de estratégias adequadas baseia-se em crenças tácitas do
terapeuta sobre a aquisição e efetuação de uma tarefa motora. Sugerimos, neste capítulo, a
necessidade de fazer explícita a discussão sobre esta relação. Falta-nos, ainda, estabelecer
critérios objetivos, baseados em protocolos experimentais, para investigar as relações entre
os modelos e teorias, de um lado, e os métodos terapêuticos, de outro.
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