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Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária – FAV

Programa de Pós-graduação em Agronomia


Manejo Integrado de Pragas.
Professora: Dra Ana Maria Resende Junqueira.
Aluno: Guilherme Facundes Balduino
Data: 30/03/2022.
RESENHA

Quando o habitat natural falha em melhorar o controle biológico de pragas –


Cinco hipóteses.

Tscharntke et al., 2016.

Os remanescentes de vegetação nativa nas propriedades rurais prestam serviços ambientais


que favorecem os próprios o cultivo como a conservação do solo, da biodiversidade e
fornecimento de polinizadores e inimigos naturais. Porém podem, as vezes, serem vistos como
áreas subutilizadas, barreiras a mecanização e fontes de pragas e doenças.

No Brasil, mais da metade da cobertura vegetal remanescente está em propriedades privadas.


a necessidade de preservação de fragmentos conservados no meio rural é absorvido na
legislação na forma da reserva legal, que tem objetivo de principal de conservar recursos
naturais, mas sem privar o uso econômico e sustentável da propriedade Rural. Para alguns
biomas a porção de área reservada chega a 80%.

Geralmente, é possível esperar que em áreas agrícolas com maior diversidade de ambientes
ou próximas de ecossistemas naturais, possuam maior diversidade na comunidade de insetos,
com populações de inimigos naturais mais altas resultando em maior supressão de pragas e
menor dano às plantas. No entanto também é possível que em condições específicas os
ambientes diversos tenham efeito inócuo ou negativo sobre o controle biológico. O artigo
avaliado busca estabelecer hipóteses e fornecer embasamento teórico para quais seriam essas
condições.

A primeira hipótese é de que as pragas não possuem inimigos naturais na região. Nesses casos
os ciclos, surtos e prevalência da praga não são função da atividade de inimigos naturais, mas
de outros fatores como condições abióticas, uso de variedades susceptíveis, tamanho da área
cultivada e práticas culturais. Essas pragas também podem ter hábitos migratórios de grande
escala reduzindo a relevância dos remanescentes naturais locais. Em algumas regiões as pragas
possuem inimigos naturais que são menos eficazes, quando atuam em uma fases menos
agressiva da espécie praga, ou quando são significativamente menos prolíficos que a praga
com número de parasitoides e a taxa de parasitação baixa.

Um clássico exemplo é o de espécies invasoras, muitas vezes introduzidas junto a culturas em


locais onde não há a presença do inimigo natural. Existem políticas para contornar o problema
como a introdução do inimigo natural ou o uso de espécies predadoras generalistas nativas,
porém nem sempre existe uma compatibilidade satisfatória entre a taxa de predação e os
requisitos de produção.

Outro aspecto que pode reduzir a aptidão dos inimigos naturais é o fornecimento de
predadores com preferência pelo inimigo natural pelos remanescentes, de maneira que os
inimigos competem entre si com relação de predação entre eles, assim, um predador se
beneficia pela eliminação de um outro inimigo natural. Podem ser aranhas, pássaros, outros
insetos.

Os autores sugerem que esses efeitos indesejados da biodiversidade local podem ser
abordados pela manipulação e direcionamento da biodiversidade na área de cultivo. Isso pode
ser realizado com estratégias de consórcios de atração e repelência ou misturas com cultivares
resistentes que se mostram promissoras, que devem ser sempre ajustadas para não
comprometer a produtividade.

A hipótese prevalente é que habitats naturais abrigam uma grande quantidade de inimigos
naturais, outras espécies neutras e poucas espécies de pragas. Porém a segunda ideia do artigo
é que podem existir situações onde os inimigos naturais não dispersam para áreas cultivadas
com o mesmo sucesso que as pragas. Nesses casos as diferenças nas condições ambientais,
como temperatura, umidade, sombreamento podem reduzir a aptidão do inimigo e somente
as pragas que aproveitam diferencialmente os recursos dos cultivos são mais aptos a sua
colonização.

Em situações de rotação de culturas, pousios, vazios sanitários os remanescentes podem servir


de refúgio para espécies pragas pela disponibilização de hospedeiras alternativas,
adicionalmente, os ambientes naturais podem servir de fonte para contaminação para vetores
com doenças bacterianas e viróticas das plantas.

Ambientes naturais degradados com a presença de plantas invasoras ou com plantas


hospedeiras de cultivo capazes de colonizar essas áreas tendem a favorecer a presença das
pragas em detrimento dos seus inimigos naturais, portanto a composição florística desses
remanescentes e suas interações com as pragas devem ser estudadas nos casos onde seu
efeito é negativo.

No Brasil o produtor não possui a opção de destruir remanescentes, o entendimento do


comportamento das pragas e inimigos naturais nesses habitats é essencial, a fim de permitir
intervenções tanto na área de cultivo como nos próprios remanescentes, como a
recomposição de matas ciliares e o combate a ervas daninhas invasoras.

A terceira ideia proposta no artigo é de que em ambientes naturais de baixa produtividade


com solos pobres, baixa pluviosidade e áridos tornam as áreas de cultivo, especialmente
quando irrigadas, mais ricos em recursos para os inimigos naturais que os habitats naturais.
Dessa forma a maior proporção de áreas naturais em detrimento das cultivadas reduz a
população de inimigos naturais.

Nesses casos é importante manter um contínuo suprimento de recursos para os inimigos


naturais. Uma estratégia é o cultivo com plantios e colheitas assíncronas ou novamente o uso
de consórcios, porém deve-se ressaltar que o sucesso do inimigo depende da presença do
inseto praga, os recursos presentes no cultivo precisam ser ponderados para assegurar que o
resultado líquido seja positivo no aspecto econômico e de danos à cultura.

A quarta hipótese é trata de como a configuração da paisagem com áreas cultivadas e


preservadas exercem grande influencia no sucesso do controle biológico. Cultivos muito
amplos ou muito distantes dos remanescentes podem resultar em um controle menos
eficientes. Um habitat rico em recursos para inimigos naturais contribuem pouco com seu
sucesso se forem difíceis de acessar. Assim a distribuição espacial desses remanescentes deve
ser alvo de pesquisas para definir as configurações menos favoráveis às pragas.
Ao se falar de habitats naturais é importante entender que os processos que mantém os
serviços ecológicos a níveis satisfatórios normalmente acontecem em escala superior a da
propriedade rural. Isso ressalta a importância da colaboração entre produtores e do
alinhamento estratégico regional para combate a pragas e preservação de recursos naturais.
Nesse aspectos as políticas publicas têm um papel essencial em incentivar que desenhos das
áreas de cultivo podem prezar pela conectividade e complexidade do remanescente.

O ponto de vista econômico ou o custo de oportunidade das áreas preservadas dentro de


propriedades rurais raramente é avaliado em estudos de MIP, porém, acaba sendo um ponto
crucial para o convencimento dos produtores.

Para abordar os aspecto econômico não é possível levar em consideração apenas só o fluxo de
caixa. De maneira geral, a complexificação da paisagem contribui para a estabilidade e
resiliência dos cultivos, reduz o riscos da atividade econômica, os serviços de controle
biológico reduzem a necessidade do uso de pesticidas e trazem benefícios para saúde dos
funcionários, população e do meio ambiente. Essas externalidades são de difícil mensuração
porém se tornam evidentes ao longo prazo.

Esse artigo explora como a presença de habitats naturais pode não corresponder a expectativa
de melhoria do controle biológico. Esses eventos requerem o entendimento da dinâmica da
praga, do inimigo natural e como eles interagem entre si, com a cultura e com os
remanescentes. Existem várias formas de se manejar e ajustar o desenho de cultivo em escalas
de fazenda à regional para obtenção de melhor controle sustentável de pragas com o suporte
dessas áreas naturais.

Referências

LETOURNEAU, D.K., ARMBRECHT, I., RIVERA, B.S., LERMA, J.M., CARMONA, E.J., DAZA, M.C.
Does plant diversity benefit agroecosystems? A synthetic review. Ecol. Appl. 21, 9–21.

LEITE, SILVA JÚNIOR, CALABONI E IGARI Fatores socioeconômicos e a vegetação nativa em


imóveis rurais no estado de São Paulo. Ambiente & Sociedade. São Paulo. Vol. 23, 2020

TSCHARNTKE T, KARP DS, CHAPLIN-KRAMER R (2016) When natural habitat fails to enhance
biological pest control–five hypotheses.Biol Conserv 204:449–458

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