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CAPÍTULO I

O pensamento político de CÍCERO.


CÍCERO escreveu no período final da República Romana, quando pouco falta já para
que o regime seja substituído pelo Império.
É um homem que recebe uma grande inspiração intelectual da Grécia, mas que procura
se adaptar às circunstâncias, aos costumes, às leis de Roma. Foi quem mais contribui
para difundir entre os romanos a filosofia grega. Por outro lado, CÍCERO é um dos mais
distintos representantes do estoicismo, escola de pensamento que por esta altura estava
já de tal maneira prestigiada em Roma que as suas ideias principais eram comuns a
todos os homens cultos. As ideias características dos estoicos nesta época eram uma
filosofia idealista; a existência de um deus único cuja relação com os homens é igual ou
semelhante à de um pai para com os seus filhos; a noção de igualdade fundamental entre
os homens membros de uma mesma família, a ideia de um Estado Mundial e a ideia de
um direito natural de origem divina.
CAPÍTULO II
O dever da participação na vida pública.
CÍCERO considera que a participação na vida política é o primeiro dos deveres que a
moral social impõe aos homens. Por outro lado, as ideologias da escola dos epicuristas
defendiam a abstenção (privação) do cidadão relativamente à vida política, advogando
que não é bom para a vida, ou para a alma, fazer política e que não vale a pena fazê-la,
porque o cidadão virtuoso ou o filosofo não poderá nunca influenciar positivamente a
política do seu país.
No entanto, CICERO reconhece, que embora a política tem grandes custos e implica
para todos muitos sacrifícios e perigos, entende que é um dever para todos os cidadãos
participar na vida política porque há na natureza uma tal necessidade de agir e uma tão
grande tendência para que cada um se exponha com vista à salvação comum.
Diz CICERO que o homem bom deve procurar a virtude, mas a virtude só se possui
quando se aplica, e a mais alta das aplicações da virtude é o governo da cidade.
Por outro lado, CICERO acrescenta que os valores fundamentais anunciados por
filósofos e moralistas são criados ou pelo menos confirmados pelos governantes. É dos
governantes que provém o sentimento do dever, a religião, a justiça, a boa-fé, da
equidade.
O político é, pois, mais importante que o filósofo e que o moralista, porque enquanto o
filósofo e o moralista apenas conseguem persuadir um pequeno número de pessoas a
seguir os seus conselhos, o político, através das leis que faz aprovar e do poder de
comando que exerce, obriga todo um povo a fazer aquilo que os filósofos apenas só
imporiam a um pequeno número de pessoas.
Reconhece CICERO, que a vida pública é penosa, é injusta para os políticos. Mas a isso
contrapõe o seguinte, quanto;
 ao perigo, o cidadão deve mostrar uma grande disponibilidade para dar
generosamente à pátria uma vida que sempre seria necessário dar um dia à
natureza. Não há que hesitar, assim, em "adquirir, pelos nossos próprios perigos,
a tranquilidade de todos os cidadãos.
 à injustiça, a verdade é que se os nossos compatriotas um dia nos fazem
injustiças, no dia seguinte têm pena e mostram saudades da nossa atuação. E as
saudades dos bons cidadãos dão-nos sempre mais satisfação do que o desprazer
que nos causa a alegria dos maus cidadãos.
 Aos homens desonestos esse é um preço necessário a pagar e que, se não for
assim, serão sempre os homens desonestos que triunfam, o que é necessário
evitar a todo o custo.
Alguns dizem também que os bons cidadãos e só deveriam entrar na vida política em
caso excecional de crise grave. Mas CICERO refuta tal tese dizendo que é necessária
uma preparação metódica, constante, permanente, desde a sua idade mais jovem, para
na altura própria atingir os mais altos cargos, e dar uma colaboração válida à República.
CAPÍTULO III
Formas de Governo
CÍCERO afirma que o poder político pode ser atribuído apenas a uma pessoa, ou a
algumas pessoas escolhidas, ou à totalidade do povo. No primeiro caso temos a
monarquia ou realeza, no segundo a aristocracia, e no terceiro a democracia.
A verdade é que nenhuma destas formas por si só é benéfica, embora cada uma delas
tenha alguma coisa para oferecer:
os reis têm o amor que dedicam aos seus súbditos, a elite tem para oferecer uma
sabedoria superior na condução dos negócios públicos, e o povo tem para oferecer a
liberdade. Tudo isto tem de ser combinado, porque cada uma destas formas de governo,
tomada separadamente, tem vários inconvenientes.
A monarquia é inconveniente, porque se presta a toda a espécie de abusos; e basta o
abuso de um só rei para que o povo comece a detestar o próprio regime monárquico.
Quanto à aristocracia não é um governo conveniente, uma vez que tende a ser o governo
dos ricos, o governo de pessoas que pelo seu nível de vida estão muito afastadas das
necessidades do povo e procurarão exercê-lo apenas no seu interesse. Quanto à
democracia, ela é o pior de todos os regimes, pois quando entregue a si própria, a
multidão com os seus apetites, a sua cegueira, os seus abusos de poder é o pior de todos
os tiranos, e acrescenta que o excesso de liberdade prepara a servidão para um povo
livre.
Então CICERO chega à conclusão de que a melhor constituição é aquela que reúne em
harmonia os três modos de governo. É necessário o princípio monárquico para que haja
uma afirmação de poder; é necessário o princípio aristocrático para que haja lucidez e
conhecimento no tratamento dos negócios públicos; e é necessário o princípio popular
para que haja liberdade e justiça para o povo.
Cícero também faz distribuir as funções públicas por outros órgãos do Estado o
magistrado supremo (cônsul), a assembleia deliberativa (senado) e os órgãos
encarregados de administrar a justiça (tribunais). CICERO não se limita a preconizar
essa distribuição dos poderes do Estado por diferentes órgãos, vai mais longe e alega
que é necessário que o Governo tenha suficiente poder, que o Parlamento tenha
suficiente autoridade e que o Povo tenha suficiente liberdade. Ora, esta afirmação não
só é uma nova maneira de apresentar a teoria do regime misto, mas também uma forma
que associa a repartição do poder governativo por órgãos diferentes do Estado.
sociais.
CAPÍTULO IV
O líder e homem de Estado.
Como se verifica, um dos elementos que CICERO acrescenta à teoria de ARIS-
TÓTELES sobre a melhor forma de governo é a necessidade de um magistrado
fundamental, de um líder, de um homem de Estado que governe o país. Além do Senado
e do Povo, terá pois de existir um magistrado que possua e exerça o poder
individualmente (na altura era, em Roma, o Cônsul). Ora bem, a função do magistrado é
representar o povo, sustentar a dignidade e a honra do país, executar as leis, respeitar os
direitos de cada um, e cumprir as obrigações confiadas à sua lealdade.
O que mais importa é a forma como CICERO sublinha a necessidade de o magistrado
obedecer às leis. E é muito curiosa a relação que ele estabelece entre o magistrado e a
lei. Há uma frase célebre em que diz: "o magistrado é a lei que fala, a lei é o magistrado
mudo, portanto o magistrado está abaixo das leis.
O papel da lei é de que se destina a assegurar a liberdade dos cidadãos e, portanto, a
limitar o poder e a autoridade dos magistrados, nós somos os servos da lei, para que
todos possamos ser livres.
CICERO não está, com isso, propriamente a defender a existência dum ditador ou dum
monarca, porque ele afirma expressamente que o magistrado deve também obedecer às
leis, respeitar os direitos do Senado e a liberdade do Povo e procurar sobretudo
conseguir uma vida feliz para o seu povo.
CAPÍTULO V
O combate contra a tirania.
Durante toda a sua vida, CICERO, foi um combatente contra a tirania, sempre que um
tirano toma o poder em Roma, CÍCERO opunha a ele, falando abertamente, nos
tribunais e no Senado, contra o ditador.
O seu primeiro grande discurso político como advogado é o discurso político contra
VERRES, acabando por lhe destruir por completo, dai à expressão "texto verrinoso". E
o seu último discurso, aquele que o levará a ser assassinado, é contra MARCO
ANTÓNIO, um ditador, que roubou ao povo a sua liberdade e se apropriou dos direitos
do Povo e do Senado.
A segunda crítica contra MARCO ANTÓNIO termina de uma forma profética. Diz
CÍCERO que (ele) não tem receio de que, por falar contra a tirania, possa vir a sofrer
perigo a sua vida". Pelo contrário, diz ele, de bom grado ofereceria o meu próprio corpo
se a minha morte pudesse redimir a liberdade do meu país. E acrescenta: depois de todas
as honras com que fui cumulado, Senadores, depois dos feitos que pratiquei, a morte
realmente até me parece desejável. Peço apenas duas coisas: uma, é que ao morrer possa
deixar o povo romano livre, os deuses imortais não poderiam conceder-me maior
presente. O outro é que nenhum homem possa deixar de corresponder com os seus
serviço às necessidades da nossa pátria!
Ora esta frase é profética, na medida em que é justamente por este conjunto de discursos
contra MARCO ANTÓNIO que CICERO acaba por morrer, pagando com a própria
vida ao ousadia de ter combatido tão vigorosamente contra a tirania que se tinha
instalado em Roma.
CAPÍTULO VI
CÍCERO e o Direito Natural.
Fora de uma ideia de um direito natural, anterior e superior à lei positiva e que serve
para avaliar da validade, da justiça, da moralidade da lei positiva, que provem da
ideologia grega, CÍCERO deu á ideia de direito natural uma expressão concreta em
fórmulas de tal maneira rigorosas do ponto de vista filosófico, e de tal maneira belas do
ponto de vista literário, influenciando assim os seculos seguintes.
É no tratado De República que CICERO diz de forma sugestiva que "Existe pois uma
lei verdadeira, que é a reta razão, conforme à natureza, presente em todos os homens,
constante e sempre eterna. Esta lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos, e
proíbe-nos o mal desviando-nos dele. A essa lei nenhuma alteração é permitida, e não é
lícito revogá-la no todo ou em parte. Ela é uma só e mesma lei, eterna e imutável, que
rege todas as nações em todos os tempos. Para a ensinar e prescrever a todos há um deus
único pertence-lhe a concepção, a deliberação e a aplicação dessa lei. Quem não
obedecer a essa lei ignora-se a si mesmo e, por ter desconhecido a natureza humana,
sofrerá o maior castigo, mesmo que escape a outras sanções".
CICERO antecipou todas as características que os autores posteriores haveriam de dar
ao direito natural, a saber, existe uma ordem natural, que foi criada por Deus, descoberta
pela razão humana, dela resulta um direito natural, que impõe direitos e deveres aos
homens, e que estes têm de acatar sob pena de desrespeitarem a própria natureza
humana; os principais imperativos decorrentes do direito natural são universais, eternos
e invariáveis.
CICERO defende a existência de uma Humanidade e da dignidade do ser humano, a
igualdade de todos os seres humanos do ponto de vista jurídico, e portanto a igualdade
de direitos, que expressamente afirma.

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