No início do século XX, todos os exércitos mantinham, ainda, forças substanciais de
cavalaria, discutindo-se se a sua função deveria ou não passar a ser, meramente, a de infantaria montada, a função histórica dos dragões. Depois da sua experiência na Guerra dos Bôeres - na qual os comandos a cavalo bôeres, desmontando para combater, provaram ser superiores à cavalaria regular - o Exército Britânico abandonou o uso operacional da lança - retomando-o em 1908 - e deu uma nova ênfase ao treino para ações desmontadas. Também os Russos, entre 1881 e 1910 converteram todos os seus regimentos de hussardos, lanceiros e couraceiros em dragões, treinados para atuar como infantaria montada - estes regimentos retomaram as suas designações, uniformes e funções históricas em 1910. Em agosto de 1914, todos os exércitos combatentes ainda mantinham números substanciais de cavalaria e a natureza móvel das batalhas iniciais da Primeira Guerra Mundial, tanto na Frente Ocidental como na Oriental permitiram um número de ações tradicionais de cavalaria, ainda que menores e mais escassas do que nas guerras anteriores. A cavalaria do Exército Alemão, ainda que mantendo uniformes coloridos e tradicionais em tempo de paz, adotou a prática de atuar, apenas como apoio à infantaria, caso a mesma encontrasse uma resistência substancial. Estas táticas cautelosas foram alvo de escárnio por parte dos seus oponentes mais conservadores, mas provaram-se apropriadas à nova natureza da guerra.
Dragões austro-húngaros na Primeira Guerra Mundial
A partir do momento em que as frentes de batalha se estabilizaram, uma combinação de arame farpado, metralhadoras e espingardas de repetição, provou ser mortífera para as tropas a cavalo. Durante o resto da guerra, na Frente Ocidental, a cavalaria deixou, praticamente, de ter qualquer papel a desempenhar. Os exércitos combatentes, desmontaram as suas cavalarias e usaram-nas noutras funções, como infantaria, metralhadoras e ciclistas Algumas unidades de cavalaria, contudo, foram mantidas a cavalo, na retaguarda das linhas, como uma reserva para contrariar um seu eventual rompimento, que tardou a acontecer. Só os carros de combate, introduzidos na Frente Ocidental a partir de setembro de 1916, conseguiram obter o rompimento das linhas, mas não tinham a autonomia para o explorarem. Como as tropas a cavalo eram demasiado lentas e vulneráveis para acompanhar eficazmente o carro de combate, as mesmas nunca conseguiram obter um papel significativo na guerra mecanizada, levando a que, no planeamento de forças do pós-guerra, ela fosse substituída por forças baseadas meios mecânicos, sobretudo blindados. Muitas das unidades de cavalaria irão ser convertidas para este tipo de forças, mantendo, algumas das quais, as suas designações tradicionais ligadas à cavalaria. Nos espaços mais amplos da Frente Oriental, continuou a ser travada uma forma mais fluída de guerra, mantendo-se a necessidade do uso das tropas a cavalo. Sobretudo nos meses iniciais da guerra foram travadas várias ações a cavalo, de grande envergadura. No entanto, mesmo aí, a necessidade de manter grandes unidades a cavalo, impôs um elevado custo sobre as linhas logísticas, que não era compensado por grandes ganhos estratégicos. No Médio Oriente, as forças a cavalo, tanto aliadas como turcas, continuaram a ter um papel importante - ainda que, sobretudo como infantaria montada - sobretudo nas grandes áreas desertas. Período entreguerras Cavalaria polaca, no período entre guerras
Unidade de reconhecimento de cavalaria alemã, com
blindados SdKfz 231 e SdKfz 232, no período entre-guerras Uma combinação de conservadorismo militar e de restrições económicas evitou que as lições da Primeira Guerra Mundial fossem, imediatamente, postas em prática. Apesar da acentuada redução de unidades a cavalo na maioria dos exércitos ocidentais, ainda se pensava que as tropas montadas iriam desempenhar um papel determinante na guerra futura. A cavalaria foi extensivamente usada na Guerra Civil Russa e na Guerra Polaco-Soviética. As guerras coloniais em Marrocos, Síria e Índia deram oportunidade ao uso da cavalaria contra inimigos sem armamento moderno. Durante a década de 1930, o Exército Francês experimentou a integração de unidades de cavalaria montadas e mecanizadas, em grandes unidades mistas. Os regimentos de dragões foram convertidos em dragons portées - infantaria transportada em camiões e motorizadas - e os couraceiros em unidades blindadas. As unidades de cavalaria ligeira (caçadores a cavalo, hussardos e spahis) mantiveram-se a cavalo. A teoria era a de que, grandes unidades mistas, poderiam usar as vantagens do cavalo e do blindado, conforme as circunstâncias. Na prática, verificou-se que as tropas a cavalo não dispunham da velocidade suficiente para acompanhar as velozes tropas mecanizadas. Os exércitos britânico e dos Estados Unidos decidiram pela mecanização total das suas unidades a cavalo, tendo esse processo praticamente concluído no início da Segunda Guerra Mundial. No caso do Exército Britânico, os antigos regimentos de cavalaria - agora mecanizados, mas mantendo as suas designações tradicionais - juntaram-se ao Corpo Real de Tanques da infantaria, constituindo uma nova arma blindada designada "Royal Armoured Corps" (Real Corpo Blindado). Segunda Guerra Mundial No início da Segunda Guerra Mundial, praticamente só os exércitos britânico e norte- americano estavam, quase totalmente, motorizados. Os restantes exércitos (inclusive, e ao contrário do mito, o Exército Alemão) ainda utilizavam o cavalo, em grande escala, para as mais variadas funções, desde as de transporte logístico às de combate. No entanto, apesar da maioria dos exércitos manter ainda unidades de cavalaria, as grandes ações a cavalo restringiram-se, essencialmente, às campanhas da Polónia e da União Soviética. Um mito que se tornou popular é o de que os lanceiros polacos carregaram, a cavalo com as suas lanças, sobre os carros de combate alemães durante as operações de setembro de 1939. Este mito nasceu da má interpretação de um único combate, ocorrido a 1 de setembro perto de Krojanty, quando dois esquadrões do 18º Regimento polaco de Lanceiros tentava atacar a infantaria alemã, quando foi apanhada em campo aberto, pelos carros de combate inimigos. As duas razões principais para o desenvolvimento deste mito, foram a falta de veículos motorizados no Exército Polaco, que o obrigava a usar cavalos nas mais diversas funções - inclusive no reboque de armas anticarro - e o fato da cavalaria polaca, por diversas vezes, ter ficado encurralada pelos carros de combate alemães, não lhe restando outra alternativa senão tentar lutar com eles, para escapar - essa luta seria, portanto, não uma ação intencional, mas uma ação de desespero.
Durante a II Guerra, ambos os lados se valeram tanto
das unidades de cavalaria com tração animal, quanto das mecanizadas
Cavalaria britânica, equipada com carros de
combate Crusader na Segunda Guerra Mundial Será mais correta a referência a "infantaria montada" do que a "cavalaria", já que os cavalos eram usados, primariamente, como um meio de transporte, para os quais eram especialmente adequados, dado o mau estado das estradas polacas. Outro mito, refere-se à cavalaria polaca como armada com sabres e lanças. Na verdade, em 1939, as lanças já só eram usadas como arma cerimonial, sendo a carabina a principal arma do soldado de cavalaria polaco. Realmente, o equipamento individual de campanha incluía um sabre - talvez por tradição - mas, em caso de combate, o soldado de cavalaria polaco, certamente daria preferência ao uso da sua carabina e baioneta. Além disso, a ordem de batalha, de uma brigada de cavalaria polaca, incluía - além dos soldados a cavalo - metralhadoras ligeiras e pesadas, armas anticarro e antiaéreas, artilharia, veículos blindados de reconhecimento e carros de combate ligeiros Nos estágios mais avançados da guerra, já só a União Soviética mantinha, ainda, números substanciais de unidades a cavalo, algumas combinadas com unidades mecanizadas. A vantagem desta abordagem era que, na exploração, a infantaria montada podia acompanhar o avanço dos carros de combate. Outros fatores a favorecer a manutenção de unidades a cavalo incluíam a elevada qualidade dos cossacos russos e de outras forças a cavalo e a falta de estradas adequadas a veículos motorizados. Outro fator importante era o de que a capacidade logística necessária para apoiar grandes forças mecanizadas excedia a necessária para apoiar tropas a cavalo. Além da Alemanha, também a Roménia, a Hungria e a Itália participaram, com forças de cavalaria, na invasão da União Soviética. Apesar da maioria das unidades de cavalaria terem sido extintas ou reconvertidas, depois da retirada da União Soviética, a Alemanha manteve até ao final da guerra, algumas unidades a cavalo das SS e de aliados cossacos. No Extremo Oriente, unidades a cavalo do Exército dos Estados Unidos ainda combateram os Japoneses, nas Filipinas. O 26º Regimento de Cavalaria dos EUA (Philippine Scouts) combateu a cavalo durante a retirada para a península de Bataan, até ser destruído em janeiro de 1942. A última grande unidade a cavalo do Exército dos EUA, a 2ª Divisão de Cavalaria, foi apeada em março de 1944. A última carga tradicional de cavalaria, confirmada, da história, a carga da cavalaria Savoia em Izbushensky,[1] ocorreu em agosto de 1942, levada a cabo pela unidade do Corpo di spedizione italiano in Russia (Corpo Expedicionário Italiano da Rússia). O Reggimento "Savoia Cavalleria" (3º) carregou, com sucesso, sobre as forças soviéticas.[1] Depois da Segunda Guerra Mundial
Cavalaria do Ar dos Estados Unidos na Guerra do
Vietname No início da década de 1950, quase todos os exércitos europeus tinham motorizado ou mecanizado o que restava das suas unidades a cavalo. O Exército Soviético, no entanto, manteve divisões a cavalo até 1955 e, ainda em 1991, mantinha um esquadrão independente a cavalo no Quirguistão. O Exército Suíço foi o último exército moderno ocidental com unidades operacionais a cavalo, mantendo-as até 1972. As unidades a cavalo mantiveram-se, no entanto, até mais tarde nos países da América Latina. O Exército Mexicano manteve vários regimentos a cavalo até final da década de 1990. O Exército do Chile manteve cinco desses regimentos até 1983, que eram usados como tropas de montanha a cavalo. Várias unidades blindadas e mecanizadas de muitos exércitos mantém a designação histórica de "cavalaria". O Exército dos EUA também criou a "cavalaria do Ar" - constituída por unidades equipadas com helicópteros. O termo "cavalaria do Ar" foi adotado por outros exércitos mas agora foi substituído, na maior parte dos casos, pelo termo "assalto aéreo". Apesar das modernas unidades de cavalaria terem relação com antigas unidades a cavalo, nem sempre esse é o caso. A mística da cavalaria fez com que, por exemplo, a Força de Defesa Irlandesa - que nunca teve unidades operacionais a cavalo, desde a sua formação em 1922 - inclua um "corpo de cavalaria" equipado com veículos blindados. Algumas guerras de guerrilha na segunda metade do século XX e no XXI levaram ao reaparecimento de unidades de combate a cavalo, mesmo nos exércitos mais modernos. Esse reaparecimento deveu-se à eficácia das tropas a cavalo no combate contra os guerrilheiros em terrenos difíceis e com poucas estradas. Os principais exemplos de emprego desse tipo de tropas - sobretudo, como infantaria montada - ocorreram no Afeganistão, na Rodésia e em Angola. O Exército Português criou, experimentalmente, um pelotão a cavalo, para operar no Leste de Angola, em 1966, que obteve tanto sucesso que foi expandido para uma força de quatro esquadrões, conhecida por os "Dragões de Angola". Os Dragões de Angola operavam como infantaria montada em patrulhas e em perseguição de guerrilheiros, muitas vezes em cooperação com forças transportadas por helicóptero que eram lançadas na retaguarda do inimigo, que ficava assim cercado entre os dragões e aquelas. Cada dragão estava armado com um fuzil de assalto - para combate desmontado - e com uma pistola - para combate a cavalo. Um sistema semelhante foi adotado pelos Rodesianos, com a criação da sua unidade de elite a cavalo Grey's Scouts, em 1975. As tropas especiais dos Estados Unidos têm usado unidades a cavalo no Afeganistão. Unidades a cavalo, essencialmente cerimoniais, são, atualmente, mantidas pelos exércitos ou forças militarizadas da Argentina, Brasil, Bulgária, Chile, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos da América, França, Índia, Itália, Jordânia, Marrocos, Nigéria, Suécia, Países Baixos, Paquistão, Paraguai, Peru, Polónia, Portugal, Reino Unido, Senegal e Venezuela. A Federação Russa reintroduziu, recentemente, um esquadrão a cavalo cerimonial, fardado com uniformes históricos. Hoje em dia, o 61º Regimento de Cavalaria do Exército Indiano, é a última unidade permanente a cavalo, não cerimonial, do mundo.
Reconstituição da cavalaria suíça de 1972.
Forças especiais dos Estados Unidos a cavalo no Afeganistão.
Um carro de combate M1A1 Abrams da cavalaria norte-americana, no Iraque (2004).