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ANAMNESE

1. INTRODUÇÃO
O mais poderoso recurso diagnóstico do médico é a entrevista, Por esse meio
ele fica conhecendo os eventos cronológicos dos sintomas da doença do paciente.
Hipóteses diagriósticas são geradas e testadas à medida que se toma conhecimento
da história do paciente, levando à formulação dos diagnósticos, confirmados ou
refutados pelo exame físico e os exames complementares subseqüentes.
A entrevista tem uma importância considerável alémcda "coleta da história" ou
da "colheita de fatos médicos". É o princip,al meio para Oinício e o desenvolvimento
uma relação com o paciente. A entrevista é uma experiência em comum, com
objetivos para ambos os participantes. O paciente deve ser satisfeito em seu anseio
de quea pessoa prestando o atendimento médico não só seja profissionalmente
cOlJ1petente como também e§teja interessada nele como um indivíduo. Para o
médico, o objetivo primário é o de obter informações necessárias para estabelec~r
um diagnóstico e iniciar o tratamento apropriado. Este objetivo é realizaCfb
demoQstrango-se interesse pelo paciente e estando-se dispo~to a ouvir tanto
problemas médicos quanto pessoais. A demonstração franca de interesse do
médico vai contriq"uLrpara uma relação médico-paciente muito satisfatória.
A aparência e as respostas do paciente durante a entrevista são úteis ao
diagnóstico. O~xame físico se inicia no momento em~que o paciente é visto. Estuda-
se a aparência do paciente, seu estado emocional e suas limitações físicas e
mentais. É importante prestar bas!anfe atenção ao significado daspalavrase ficar
atento às indicações não-verbais. O próprio sentimento do médico de estar
constrangido, pouco à vontade ou infeliz muitas vezes se reflete na atitude do
paciente.
A entrevista, um poderoso recurso diagnóstico, vai muito além da coleta dos ..
fatos sobre a doença. Graças ao seu conheçimento e experiência, o m~dico delineia
sintomas e inter-relações sutis que muitas vezes não são reconhecidos pelo
paciente. Uní entrevistado r, há,bil percebe senfimelÍtos e circunstâncias °pessoáis
subjacentes à doença. Uma entrevista. conduzida com sensibilidade e interesse
ajudará ~cónstruir um sólido relacionamento entre o médico e o paciéhte.

2. PRINCíPIOSBÁSICOS DA OBTENÇÃO DA ANAMNESE


1. Motivaçãoe para ouvir o paciente, tendo consciência da importância da
~namnese e interessando-se genuinamente pelo paciente;
2. Evitar interrupções ou distrações;
3. Dispor de tempo para ouvir o paciente;
4. Não desvalorizarcprecocemente informaçõés;
5. _Não demonstrar sentimentos desfavoráveis como impaciênCia, irritação,
desprezo, tristeza;
6. Procurar~nãodiscutir sobre assuntos estranhos à moléstia como política,
religião, negócios, moral;
~ h. Conhecer e.-dominar as técnicas para a obtenção de anamoese;

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8.. Possuir conhecimentos teóricos sobre as moléstias: fisiopatologia, manifes-
tações clírJicas, história natural, posologia prevalente, efeitos da terapêutica.
9. Observar o comportamento.do pacieRte captando as me.nsagens não verbais.
1Q.J\tender aos pacientes como gostaria que você oucqualquer pessoa que ame
fossecatendida.

c
3. ELEMENTOS DA ANAMNESE
Para fins didáticos, as habilidades da entrevista médica são divididas em 5 áreas:
1. Observação ;,
2. Questionário
3"."
f Escuta
" .

4. Comunicação °NãoVerbal
5. Registro

3.1. Observação
Uma parte importante da' avaliação de qualquer paciente é a observação
cuidadosa. Uma grande quantidade de informação estará disponível se você treinar
para tornar-se um observador habilidoso. Podem os hábitos corporais indicar que
tipo de trabalho o indivíduo realiza? Existe dificuldade com a função motora? E com
a conversaçãó"'; memória e orientação? O paciente responde às perguntas de
maneira inapropriada à sua aparência geral? Neste, tipo de observação nós
estaremos avaliando elementos do bem estar ou de falta de bem estar do paciente
e talvez do seu estilo de vida'. Isto é diferente da comunicação não verbal. Na
comunicação não verbal' nó.s estamos interpretando o humor do paciente ou alguma
mensagem que ele esteja projetando.

3.2. Questionário
Há 6 tipos diferentes de perguntas:
PERGl..JNTAS ~BERT AS:São perguntas com ampla liberdade'para serem respon-
didas e não limitam mais que grosseiramente a área a ser questionada. Perguntas
abertascpermitem ao paciente responder com maior liberdade possível. O paciente
identifica os elementos de sua própria doença os quais deseja discutir inicialmente.
As respostas pbdem estar na'áreáfísica, na esfera emocional ou familiar. O paciente
tem liberdade para comunicar seus problemas sem qualquer influência introduzidas
por uma linha particular de pergunta. Exemplos: /lFale-me sobre a sua doença/l, /10
que você gostària de me falar?lI. Isto pode ser seguido pr: /lAlgo mais?1I ou /10 que
mais você desejaria contar-me? 11.

PERGUNTAS FaCADAS: ~qui o entrevistador define a área a ser questionada,


mas deixa ao paciente considerável liberdade para responder.Exemplo:/lDescreva
aedortorácicall. Aqui você define duas áreas: um sintoma, a dor, e a região do corpo,
o tórax. O paciente pode então responder: "Ela é uma dor aguda em queimação que
desce pela região anterior do meu tóraxll. Perguntas focaaaspodem também incluir
outras áreas que não os sintomas, por exemplo: /10 que você faz para viver? 11.

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PERGUNTASFECHADAS:Utilizadaspelo entrevistador quando se quer aprofundar
mais o conteúdo da discussão. É essencial para se captar pontos básicos da
entrevista, pois especificam mais os assuntos. Neste tipo de pergunta o entrevistado r
restringe a resposta a, que sabe, um sim ou não. Exemplos: fiA sua dor corre para
outra parte" do corpo?", fiO Sr. já notou a presença de sangue no vômito?"...
PERGUNTAS DE MÚLTIPLA ESCOLHA:o'uando os pacientes revelam-se incapa-
zes de descrever ou esclarecer seus sintomas, pod~mos ajuda-Ios com perguntas
de múltiplas escolhas. Exemplo: flSr. Ferreira! A sua dor é semelhante a uma
queimação, a uma pontada, a uma cólica... 'J.-.Aofazer tais perguntas, devemos ter
o cuidado de I}ão transmitirmos junto as opções, mensagens não verbais (Ex:
gestos) que surgiram ao paciente que temos que preferência por uma das opções.
PERGUNTAS DIRIGIDAS:O entrevistador acaba induzindo o paciente a uma
resposta, e implícito nesta, está a influência ou um valor mantido pelo éntrevistador.
Por exemplo: flVocê está sentindo-s~ melhor, ou não está?" ou flVocê tem tomado
as precauções que~lhe avis~i, não tem?"
PERGUNTAS COMPO,STASRealização de duas ou mais perguntas simultâneas,
sem dar t~mpo ao pacieQte para que possa responder à primeira ~ Uma s~rie de
perguntas ~eparadas ou umapergur},ta que exija resposta com múltiplo,s componen-
tes. Exemplo:~;/Conte-m,e sobre você, quaL~asLia idade, onde~você nasceu 'é o que
você faz para viver?"
Asoentr,evist?s ~e iniciam com perguntas gerais (ABERTAS) que determinam um
.:'"R'1enOli,"
Gontrole:;sobre-,?-:a'.fCanamnese'
e' secompletams c0me:perguntasi",espeQifícas
(FOCADAS e FECHADAS). Os dois últimos tipos de perguntas. Dirigidas e Compostas,
são definidos para esclarepimentos e são condenados. Eles não devem ser usadas.

3.3. Escuta
Habilidade em escutar é tão importante quanto em perguntar, sendo aquela
mais difícil de aprender. É desejável demonstrar interesse pela linguagem corporal
e pelo comportamento. Boas técnicas de escuta permitem ao paciente per:&::eber
se você escutou o que ele disse e o que ele queria dizer, Rermitindotami:>ém qLte
o pacie"nte corrijaCcouc°tnpleQ'lente suas informações.As habilidades ,específicas
são 6:
. CONFIRMAÇÃO:Também chama,da de facilitação. O médico utiliza-a quando,
através de postura, de ações ou d!3palavras,el)corajap paciente a dizer mais, porém
sem espeçificar o tópico. O próprio silêncio, quando atento, porém relaxado, é
facilitatLvp.Jnclinar-se para frente,-estabelecercontato visual dizendo flUh huh",
flContinue", flOkay", flCerto"...
SILÊNCIO: O silênqio Rode comportar muitos significados e indicações. Os
paciente,s ficam, com freqüência, silenciosos por curtos períodos, afimde organizar
seus pensamentos ou relembrar detalhes enquanto relatam a história da doença
atual.,,-Ne§se caso, o silêncio atento por parte do entrevistador costu.ma com>tituir
a melhqr resposta, seguida às vez:es4~oLum breve encorajamento para cqntiQuar.
Durante os períodos de silêncio, ..deve;-se ficar alerta para sinais> nãp verbais de
angústia. Os pacientes podem ficar ansiosos por es.tarem tenc!p dificuldade em
controlar suas emoçÕeS. Se for ocaso, trata-se quape invariavelmente de sentimen-
tos significativos que deveriam ser exteriorizados.
CONFRONTAÇÃO: Significa fazer uma observação sobre o comportamento,

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aparência ou história do paciente, sem que este tenha sido voluntário. Às vezes as
palavras do paciente são ambíquas ou suas associações obs"curas, e o médico que
pretende compreender o seu sentido terá que pedir esclarecimentos, como: "Você
disse te{cuma família muito unida, mas não contou-me na"da acerca de seus filhos.
Poderá explicar melhor?"
EMPATIA: É o compreeder dos sentimentos ou expressões do paciente sem,
com isso, projetar-se nele. O paciente, a medida que conversa com o médico, pode
externar (com ou sem palavras) sentimentos acerca daquilo que está embaraçando,
envergonhando ou tornando-o reticente. Esses sentimentos podem ser cruciais
para compreender a sua doença ou planejar o tratamento. O médico que puder
reconhece-Io e reagir aos mesmos, de maneira que demonstre compreensão e
aceitação, mo.stra empatia para com o paciente, fazendo com que ele se sinta mais
seguro e o encorajando a continuar. Exemplos: "Eu compreendo, isto deve ter sido
muito triste para você" ou "Você deve ter ficado muito desconcertado". As
respostas empáticas não são necessariamente verbais, por exemplo, oferecer um
lenço a um paciente que está chorando, é um tipo de empatia.
SUMÁRIO:É freqüentemente de muito valia para o entrevistador fazer breves
sumários do relato, do ponto de vista do paciente. Isto é essencialmente verdadeiro
nas seguintes circunstâncias:
1. Quando o paciente tenha relatado algo prolongado, confuso ou desconexo,
um sumário feito pode mostrar se o entrevistador captou os eventos importantes
e inter-relações da história.
2. Quando o entrevistador acredita ter investigado o suficiente uma área, um
sumário pode permitir que se mude confortavelmente para outro tópico.
3. É importante para que o paciel1te constate que o entrevistado r se encontra
interessado na sua história.
PARAFRASEAR OU INTERPRETAR: Em geral isto significa repetir ao paciente
algo que ele já havia dito, de uma forma direta e abreviada (redeclaração), ou refazer
a frase do relato do paciente com suas próprias palavras (interpretação). Parafra-
sear revela ao paciente que você entendeu o que ele disse, pode clarificar o que foi
dito ou pode servir para notificar ao paciente que você não compreendeu o que foi
dito.
A redeclarção é apropriada quando o paciente está contando uma história muito
prolongada ou complicada, podendo ser útil em trazer à tona fatos e sentimentos
importantes. Exemplo:
Paciente: "Para lhe falar a verdade, Dr., eu não estou bem."
Médico: "Não está bem?"
A interpretação é uma declaração que produz uma inferência ou que sintetiza
alguma informação através da perspectiva do entrevistador. Não é uma simples
observação. Exemplo: Após uma série de perguntas sobre as radiografias, o médico
se vira para o paciente e indaga - "O Sr. está formulando inúmeras perguntas acerca
das radiografias, está preocupado com elas?"

3.4. Comunicação Não Verbal


Em qualquer interação entre indivíduos, uma grande quantidade de informa-
ções é comunicada não verbalmente. Consciente e inconscientemente nós nos

í:llr.<:n riA MAr!;r:;na


exprimimos e recebemos mensagens dos outros através da linguagem corporal.
Podemos,desenvolver consciência suficiente para perceber e interpretar adequada-
mente uma grande quantidade de informações. Podemos estar alertas para
situações nas quais as expressões 90 paciente ou linguagem corporal estejam
transmitindo uma mensagem diferente daquela que está sendo verbalizada. As
mensagens não verbais podem comunicar idéias, sentimentos e sensações, de
modo consciente ou inconsciente, através de lágrimas, rubor, gestos, postura,
expressões fisionômicas, mão t~êmulas,...
3.5. Registro
Uma entrevista bem realizada fornece-nos as informações básicas sobre o
paciente esua doença. A informação deve ser organizada e anotada de maneira que
seja intelegível tànto agora quanto para o futuro. Suas anotações médicas deverão
ser ordenadas, claras, concisas, acuradas e compreensíveis, para que outro membro
de sua equipe de cuidados médicos que entre em contato com os mesmos possa
entender o paciente e sua doença.

4. CONTEÚDO DA ANAMNESE
Durante a anamnese, o médico tenta captar os dados referentes ao estado de
saúde e demais dados do paciente que possibilitem um auxílio diagnóstico. Esta
coleta de dados segue a seguinte sistemática:
1 . Apresentação
2. Identificação
3. Queixa{s) Principal (is)
4. História Mórbida Atual
5. Sumário
6. Perfil Psico-Social
7. História Mórbida Pregressa
8. História Mórbida Familiar
9. Condições e Hábitos de Vida
10. Revisão de Sistemas
11. Agradecimento

4.1. Apresentação
Comoo em qualquer outro tipo de entrevista, anamnese deve ser iniciada com
uma apresentação entre o médico e o paciente. Essa parte da anamnese é muito
importante porque, se bem conduzida, favorece de imediato a relação médico-
paciente. Pontos básicos que deve constar:
- Cumprimentar o"paciente
- Introdução e identificação de você mesmo
- Propósito da visita e estimativa de tempo
3: Permissão do paciente
Exemplo de uma apresentação: "Bom dia Sr. Ferreira (o paciente estende a sua
mão e você cumprimenta-o). Eu sou Roberto Linhares, um estudante de Medicina da
PUC do Paraná. Estou aprendendo a entrevistar e gostaria de entrevistá-Ia para um
curso que estou fazendo. Isto levará de 25 a 30 minutos. Está tudo bem par o Sr?

r"r~n ria Marli,..ina


4.2. Identificação
Importante, pois fornece elementos passíveis de exploração semiológicas.
Abrange.Nários itens, que são:
NOME COMPLETO:Servirá para o arquivamento das observações sobre o paciente.
IDADE: É de grande importância, pois numerosas as doenças que se declaram
com maior freqüência numa determinada faixa etária.
SEXO:Seu registro tem valor para fins estatísticos, porque certas enfermidades
são mais freqüentes em determinado sexo. Exemplo: A Jitíase bilibar é muito mais
comum em mulheres; já a hemofilia é própria do homem.
COR: Como temos patologias que se relaciQnam com o sexo e com a idade,
temos também patOlogias predominantes em determinadas raças. Exemplo: A
...
anemia falciforme é própria de indivíduos de raça negra.
ESTADO CIVil: Importante na avaliação de estados emocionais do paciente,
bem como. compreender a estrutura familiar em que o paciente vive.
'"' PROFISSft:'O:A influência da profissão no aparecimento de doenças é incontes-
tável, devido ao grupo das chamadas moléstias profissionais (silicose, saturnismo,
vícios posturais,...). .

NACIONALIDADE: De importância na 'avaliação de alterações orgânicas e


funcionais decorrentes de usos, costume, alimentação, e de certas molestias
próprias de cada nação ou região.
RESIDÊNCIA:Tem importância no fato de que se encontram doenças com maior
freqüência em certas regiões do país e que em outras tem incidência escassa. Aqui
dá .-se maior valor as doenças endêmicas como esquitossomose, Chagas, malária,...

4.3. ~Queixa (s) principal (is)


Na maioria das vezes o motivo da consulta refere-se à chamada Queixa Principal
ou Núcleo de Sofrimento Subjetivo do Paciente. Em outras ocasiões, a queixa
principal tem ul1Têconotação mais subjetiva, por exemplo, a percepção do aumento
de volume localizado,tumor ou erupção cutânea. Em palavras mais claras, a queixa
grinç:ip9lé o sinal e/ou sjntor)1a que o paciente refere no ato da consulta. A obtenção"
da queixa principaré, na Rfática, o início de entrevista, mas não da relação médíco-
pa~iente. Para obtê-Ia, fcaz-se~umapergunta aberta possibilitando uma abrangência
maior à resposta do paciente. Exemplo: JlSr. Ferreira, qual o motivo do Sr. estar aqui
no hospital?". Após o relato da (s) ~queixaJs) principal (is), o médico pergunta se
há algo mai~a dizer, estimulando assim, o relato do paciente. Definidas as queixas,
t<7' inicia-:s~ a construção da História Mórbida Atual.

~. 4.4. História mórbida atual


. p.componente mais importante da anamnese é a doença atual do paciente. Aqui
o médico tenta cónstruir a história da doença, desde o seu inicio até o momento
da consulta, com base na descrição detalhada e cronológica da (s) queixa (s)
principal (is) relatada (sf pelo paciente. Todos os sinais e/ou sintomas devem ser
estudados nos seus íntimos detalhes, segundo uma sistel11ática semiológica:
1°Deve se focar os sintomas e/ou sinais (um por um), deixando o paciente informar.
Exemplo: "Fale-me mais sobre.a sua dor de cabeça" ou "Descreva esse seu cansaço".
2a Tentar esttfnular o paciente perguntando se há algo mais a dizer.

r. <,rn ria AAarli~in~


3a Se a resposta for negativa, fazer perguntas fechadas tentando aprofundar mais
o conteúdo do sinal ou sintoma. Exemplo: "Existe algum fator que melhore esta dor?".
4a Novamente pergunta.-se se há algo mais a ser dito sobre o sinal ou sintoma.
Caso a resposta for negativa, passa-se a focar outro sinal ou sintoma. Se a resposta
for positiva, continua-se a exploração.
Abaixo apresentamos, pegando como exemplo uma queixa de dor:
SEDE: É o local onde a dor se inicia ou é mais intensa. Geralmente corresponde
ao órgão comprometido, muito embora, em algumas doenças a manifestação
dolorosa é a distância.
INICIO: Aqui englobando o tempo (hora, dia ...) e o modo. Exemplo: Dor
apareceu após a ingestão de alimentos ou uma dor que iniciou após uma
queda.
TIPO OU CARATER: É como a dor se manifesta, podendo ser de vários tipos:
aperto, cólica, pontada, estufamento,... O tipo é um dado de valor, porque
geralmente se relaciona com a fisiopatologia do processo mórbido. Exemplo: A dor
em pontada surge quando o doente tosse ou inspira profundamente é devido a
inflamação da pleura.
IRRADIAÇÃO: O interesse deste item reside no fato de que, em algumas
afecções a dor tem irradiação típica, o que facilita o diagnóstico.
INTENSIDADE: Este dado é de valor relativo, pois está na dependência da
sensibilidade pessoal de cada paciente. Saber se a dor é forte, moderada ou fraca.
FREOUÊNCIA: Estabelecer se ocorre uma ritmicidade no aparecimento do
sintoma. Pedir para o paciente precisar não só a duração do episódio, mas, como
também, o interValo entre eles e em que parte do dia tem a sua maior intensidade
e/ou início.
DURAÇÃO:Tem importância, pois de um modo geral as dores de maior traduzem
maior gravidade do processo mórbido. .

FATORES DE MELHORA OU PIORA: O reconhecimento da influência destes


fatores sobre determinado sintoma pode fornecer informações para o diagnóstico ---

e a conduta terapêutica. Tentar conseguir com o paciente, manobras, posi_ções'


que aliviam a dor e em contrapartida, situações que pioram esta dor. Exemplo: Na
angina do peito é clássica a melhora da dor com o repouso e a sua piora com o
exercício.
SINTOMAS ASSOCIADOS:Ouase sempre estão na dependência de reflexos
víscero-viscerais associados a reações de ordem psicológica. É o que acontece, por
exemplo, na cólica nefrética, onde freqüentemente estão associados vômito, a
sudorese, a palidez e a ansiedade.
EVOLUÇÃO: É muito importante tentar caracterizar se houve alguma mudança
nas carqcterísticas dos sintomas, durante o espaço de tempo que decorre desde
o início do sintoma até a entrevista. Com a evolução bem detalhada, o médico pode
notar se há um caráter cíclico na doença.
Caracteres propedêuticos mais importantes de outros sinais ou sintomas:
10 VÔMITO: Início, intensidade (volume vomitado), aspecto (coloração, cheiro,
presença de corpos estranhos, presença de muco ou sangue,...), freqüência dos
vômitos, evolução, fatores que melhoram ou pioram, sintomas associados.
20 ESCARRO: Início, intensidade (volume de secreção), aspecto (coloração,
cheiro, presença de corpos estranhos, presença de sangue,...), freqüência dos

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escarros, evolução, fatores que melhoram ou pioram, sintomas associados.
3° FEBRE:Início;-intensidade (medição de temperatura), freqüência dos surtos
febris, evolução, fatores que melhoram ou pioram, sintomas associados.
4° EMAGRECIMENTO: Início, intensidade (pesagem do paciente), exploração dos
hábitos alimentares do paciente, evolução, fatores que melhoram ou pioram,
sintomas associados.

LEMBRETES:
. Ter uma idéia precisa do conjunto de circunstâncias que marcaram o início dos
sintomas, tais como: mudança de vida, fatos psicológicos, contatos com °4tros
pacientes, com animais; uso de novos medicamentos, cujas conotações de ordem
I
etiológica poderão ser fundamentais ao esclarecimento diagnóstico.
~I Deve-se ter o ~cuidado de sempre questionar se sintomas semelh~ntes aos
atuais já ocorreram no passado, para detectar afecçÕes crônicas qqe evoluem em
J
surtos, como a febre reumática e o hipertireoidismo.
Importa tembrarflue, às vezes, os dados negativos têm valor iguaLaos positivos
para o X{1ciocínioclínico. É o que se observa nos partadores de câncer brônquio, que
têm escarro hemQptóico (com sangue), mas que não apresentam febre, o que
I
facilita o diagnóstico diferencial com as pneumopatias agudas (pneumonia) ou
[. crônicas (tuberculose pulmonar), as quais, alél"Qdo escarro hemoptóico, temos'-a
presença de febre.
Estabelecer a seqüência cronológica de aparecimento dos sintomas, fato de
importância fund,amental na apálise comparativa com a história natural de d'oenças
conhecidas. ~

4.5. Sumário
Nesta parte da anamnese, o médico vai fazer um breve relato ao paciente, em
cronologia, da Ilistória Mórbida Atual obtida. Após o relato, peegunta-se ao paciente
se ele~não tem algo "a acrescentar ou alterar. Um sumário bem feito indica ao
pacienteque~ o médico,; escutou cuidadosamente e que' está interessado em um
entendimento dos fatos que o paciente relatou. É um bom espaço para fortalecer
o relacionamento médico-paciente.

4.6. Perfil psico-social .

Jr Para se conseguir dados sobre o perfil psico-social do paciente, não é suficiente


J ouvir o que dizem, mas também é necessário notar o que omitem ou transmitem
através de mensagens não verbais. tAobtenção do perfil não é tarefa simples pois, não
.' raro, o paciente se envergonha de suas condições sócio-psicológicas ou teme a reação
do r1J~dic? perante elas. No mínimo, dentro.do conteúdo a ser pesquisado, temos:
FAMILlA:Saber quantos moram com o paciente, qual o relacionamento entre os '

familiares e dele com os familiares.


TRABALHO: Qual o tipo, se já teve outro empregos e quais, relacionamento com
os outros trabalhadores.
ESTUDO: Até onde cursou.
SITUAÇÃO ECONÔMICA:Tentar p.osicioná-Io na pirâmide social, sem contudo

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discriminá-Io. Exemplo: "Como você se sente em relação ao seu salário?".
PONTO DE APOIO: Procurar a pessoa com quem o paciente tenha melhores
relações, sendo nos momentos de tristeza ou alegria.
SOBRECARGA:Tentar compreender de que maneira a doença ou a hospitalização
está afetando o seu lado social e psicológico.
DIA TíPICO: Pedir para o paciente descrever um dia normal de sua vida, desde
a hora de acordar até se deitar.

PARTE 2

4.7. História mórbida pregressa


Neste item, investigaremos sobre eventos passados que possam ajudar a
estabelecer a etiologia do processo mórbido atual. Além do que o paciente revelar,
devemos, no mínimo, indagá-Io sobre:
DOENÇAS PRÓPRIAS DA INFÂNCIAApós a resposta do paciente, o médico cita
mais algumas doenças como ~sarampo, caxumbo, variceLa, rubéola, coqueluxe...
DOENÇAS INFECCIOSAS:Como hepatite, meningite, febre reumática...
INTERNAMENTO: Perguntar se o j)aciente já esteve internado alguma vez,
sabendo qual o motivo e o tempo de internamento.
INTERVENÇÕES CIRÚRGICASOuestiona-lo sobre cirurgias que ele tenha sofrido.
Tentar especificar o motivo de operação.
ALERGIA: O médico deve indaga-Io sobre manifestações alérgicas (rinite,
urticária, eczema...) que ele possa ter e também, questiona-Io quanto a reações
alérgicàs a medicamentos.
TRAUMATISMOS:Perguntar sobre possíveis acidentes ou fraturas.

4.8. História mórbida familiar


Tem interesse para complementar a hipótese clínica formulada, porque há doenças
congênitas, como a sífilis; hereditárias, como cOdiabetes e certas anemias hemolíticas;
de caráter familiar, como a hipertensão essencial e a asma; e outros que se transmitem
por contágio domiciliar, como a tuberculose. Investigar também, a presença de casos
de neoplasiãs nos familiares, devido a indícios de fa-tor genético em certas neoplasias.
Por essa razão, deve-se indagar sobre as condições de saúde do cônjuge e dos
familiares. Em relação aos falecidos, saber, se possível, a causa da morte.

.
4.9. Condições e hábitos de vida
Neste item, o médico procura uma complementação dos dados já obtidos,
tentando visualizar possíveis fatores coadjuvantes ou desencadeantes. Deve-se
investigar, no mínimo, sobre:
HÁBITOS ALlMENTARES:Precisar as condições alimentares habituais, tanto na
qualidade (o que?) como na quantidade (quanto?).
CONDiÇÕES DE MORADIA:lndagar ao paciente se a casa é de alvenaria ou
madeira, condições de saneamento básico (água, esgoto), luz...

Curso de Medicina
TABAGISMO: Precisar o tempo, quantidade diária e o tipo (cigarro comum,
palha, cachimbo...). O médico deve ter muito cuidado com suas palavras, para não
julgar ou agredir o paciente.
-
BEBIDAS ALCOÓLlCAS:As bases são as mesmas do tabagismo,perguntando
-

sobre o tempo. de uso, quantidade diária e o tipo de bebida. Da mesma maneira,


cuidado com as palavras. .

MEDICAMENTOS:Deve-se dar atenção especial indagando o paciente sobre o


ctipo, dose, respostas terapêuticas e reações indesejáveis.
UTILlZAGÃO DE DROGAS TÓXICAS;L\qui prestamos atenção em drogas não
medicamentos, como cpcaína, maconha... O médico ~deve evitar uma pergunta
como "Você faz uso de droga?" e,sim preferir "Vocêjá teve contato com drogas?".
Todo cuidado é pouco, evitando .assim alterações negativas no relacionamento
médico~-pacientEt. Caso"a resposta for positiva, deve-se tentar especificar o tipo,
quantidade e o tempo de uso.
EPIDEMIOLOGIA:Questioná -10 sobre doenças endêmicas como malária, Cha-
gas e esquistossomose. Não só perguntar se conhece, mas também se já teve
contato. Caso p paciente não consiga responder, por falta de conhecimento,
deve-se usar termos mais populares como "Bicho Barbeiro (Chupança)", "Lagoa
de Coceira",...

OBSERVAÇÃO
Nos diversos tópicos dos itens: perfil psico-social, história mórbida pregressá,
história mórbida familiar e condições e hábitos de vida, o médico deve fazer primeiro
uma pergunta focada (o que o Sr. poderia me falar sobre...). Tendo a resposta do
paciente, o'médico pode iniciar as perguntas fechadas, contemplando assim todo
o conteúdo.-

4.10. Revisão de sistemas


Tem a7 finalidade princjpal de evitar flue fatos fundamentais da história
médica do paciente, que não. foram detectados durante a história da molés,tia
atual ou pregressa, passem despercebidos. Freqüentemel)te, após esta pesqui-
sa, surgem novos dados que tornam possível a formulação de hipóteses
diagnósticas. Antes de se ipiciar tal revi~ão convém explicar ao paciente o seu
propósito.
Deve-se~eguir uma seqüência lógica e progressiva, da cabeça aos pés. É
aconselhávej anotar dados positivos e negativos, atitude esta que auxilia no
diagnóstico diferencial. Abaixo colocamos um exemplo de revisão de sistemas:
- Çabeça: Traumatismo, cefaléias, tonturas, convulsões,...
- Olhos: Lacrimejamento, diplopia (visão dupla), inflamações, edema palpebral,...
- Ouvidos: Dor, alterações da audição, secreção,...
- .Nariz: Alterações da olfação, coriza, epistaxe, obstrução, dor sobre os seios
da face,...
- Boca e Faringe: Inflamações, salivação, ulcerações, sangramentos, dentes,
dor à deglutição,...
- Pescoço: Sintomas de hiper ou hipotireoidismo, assim como alterações no
local da glândula tireóideo..

Curso de Medicina
- Aparelho Respiratório: Dor torácica, dispnéia, tosse, escarro, hemoptise,...
- Aparelho Circulatório: Dor ou desconforto pré-cordial, palpitações, cianose,
pressão arterial, edema,...
- Aparelho Digestivo: Digestão e apetite, odinofagia, disfagta, eructação, ritmo
intestinal e número de evacuações por dia, características das fezes, presença de
diarréia ou melena,...
- Aparelho Genitourinário: Disúria, dor, polaciúria, olagúria, características da
urina, função sexual no homem e na mulher; na mulher:ciclo menstrual, menopausa,
dismenorréia, prurido vulvar, corrimentos e gestações; em ambos os sexos:
doenças venérias, caracteres secundários,...
- Sistema Osteoarticular: Dor articular, inflamações, limitações da movimenta-
ção, deformações,...
- Sistema Tegumentar: Eritema, erupções, prurido cutâneo, pigmentação,
alte~ação dos fâneros (pêlos e unhas},...
- Sistema Neuromuscular: Memória, tremores, marcha, crises convulsivas,
sensações parestésicas, anestesia, paralisias, atrofias,...
- Mamas: Corrimento, tumores, sangramento, dor, variação de tamanho,
percepção de, nódulos,...
- Outrqs-: Emagrecimento, cicatrização, alterações do sono,...

OBSERVACÕES , . /
-
É necessário, antes de se"'fazer as perguntas fechadas (citando alterações ou
funções), fazer uma pergunta focada em cada tipo, permitindo assim uma livre
resposta por parte do paciente. Exemplos: fJEquanto aos olhos, o que o Sr. poderia
me dizer?" Após a resposta do paciente, o entrevistador deverá fazer as perguntas
fechadas.
Convém ao médico es clarecer todos ou pelo menos a maioria dos pontos sobre
os diversos tópicos, porém, para fins de aprendizado, o estudante deve questionar
sobre, pelo menos, dois pontos em cada um dos tópicos. Acima, junto aos tópicos,
foram citados alguns pontos que podem ser esclarebdos. A "sensibilidade de
estudante é muito importante para que ele escolha quais os pontos mais interes-
santes a serem investigados, tudo na dependência da história mórbida atual do
paciente.
Quando um sinal ou sintoma já foi explorado na história mórbida atual, convém
utilizar o seguinte: fJSr. Ferreira, além da dor, algo mais lhe chama a atenção na
cabeça?". Assim o entrevistador evita a repetição e ainda mantém a seqüência
fazendo uma pergunta focada.

4.11. Agré;!decimento
Para iniciar o final da entrevista, você deve agradecer pela cooperação. Lembre-
se, vocêé um estudante e não pode opinar sobre a conduta ou terapêutica adotada
pelo médico e muito menos prometer que o paciente vai melhorar.

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