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MARTIN KEMP
Tradução:
MARCAINÊS DUQUE ESTRAOA
Aristóteles. Audição, Lato,paladar e olfato ficavam abaixo da vi- truir um espaçoa prior que podia depois ser preenchido com
são. O olho era o mestre analítico de todas as pesquisas visuais: objetos e figuras na escala exata, retratados segundo regras rela-
tivas à luz e à sombra. As figuras, motivos principais para a ilus-
O olho, do qual se diz ser ajanela da alma, é o principal meio tração de grandeshistórias, deviam ser pintadas com toda a
pelo qual o sensoscommünisjcentro coordenadordasimpres- perfeição anatómica e com sinais visíveis de personalidade
sões sensoriais] do cérebro pode contemplar na maior plenitude e emoções.Essemétodo de aliar procedimentos racionais com a
e magnificência o trabalho infinito da natureza, e o ouvido é o concepção imaginária de uma nova cena colocava a invenzione
em união íntima com a sciettza. A invenzione era definida como
segundo,tendo adquirido nobrezapela narração daquilo que o
a criação de algo novo, real ou plausível(numa paráfrase do gran-
olho viu. Agora, você não vê que o olho abraçaa belezado mun-
do? O olho comanda a astronomia; ele faz a cosmografial ele de orador Cícero,da antiga Romã), enquanto a scierlzaera um
guia a corrige todas as artes humanas; conduz o homem a várias corpo de conhecimentosbaseadosem princípios racionaise
regiões do mundo; é o príncipe da matemática; suas ciências são comprováveis. Num nível mais profundo, era uma aliança entre
as mais correias; ele medea distância e o tamanho das estrelas; alantasia (imaginação)e o intelZetto(o poder racional da men-
desvenda os elementos e suas distribuições; faz previsões de te). Em tudo isso, é importante ter em mente que os termos em-
Oolho
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3. Mapa de fmola
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7 EsMdo de manga para o braço direito da Virgem em Sant'Ana
a Virgem e o Menino
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De pé e em movimento
O que o autor chama de "reforma" de Galileu (1564-1642) foi a verihcação dinâmica que herdara
empírica de que a Tema se move. Disso decorreram os princípios da física di- Havia tambémcasosem que o movimento não diminuía.
nâmica, que ele também estudou e examinou em seusDiscursos(1638). A re- Um deles era a aceleraçãode um corpo que cai. Mesmosem
fonna introduzida por lsaac Newton (1642-1727) foi a descobertada gravita-
conseguir explicar o conceito de gravitação, Leonardo pelo me-
ção universal. (N.T.)
nos podia submeto-la à sua lei da proporcionalidade. Ele racio-
cinou que o corpo, ao cair, ganharia incrementos de velocidade livro 3 dos canais subterrâneos [vmel ;
de acordo com a lei da pirâmide invertida -- isto é, a velocidade livro 4 dosriosl
em cada estágio seria diretamente proporcional à distância per- limo 5 da natureza das profundidades;
corrida. A queda se daria de acordo com uma espéciede pers- livro 6 dos objetos [como obstácu]os ao f]uxo da águas
pectiva invertida, na qual algo se torna maior à medida que se limo 7 dos cascalhos;
distancia do ponto de partida. Outra anormalidade era o vórti- livro 8 da superfície da igual
ce, ou redemoinho, que ele observou se acelerar em direção ao livro 9 das coisas que se movem nela;
centro de revolução, e às vezes de maneira mais impetuosa. livro 10 dos meios de renovação dos rios
Nesse caso, a explicação estava na rápida concentração de {mpe- lido 11 doscondutos;
tus num círculo cadavez mais estreito, daí resultando que ele só livro 12 dos canais
poderia se esgotar em revolução furiosa, acelerando, em lugar livro 13 das máquinas movidas a água;
de desacelerardo modo normal. livro 14 de como a água ascende;
livro 15 das coisasconsumidas pela água.
O vórtice
Aqui, como em outras ocasiõesem que planeou a estrutura de
O fenómeno do vórtice tornou-se tema de intenso interesse pa- seus tratados, o ideal era o de um enciclopedista medieval, mas
ra Leonardo. Ele foi instintivamente levado a suas propriedades seus instintos para a complexidade e o inter-relacionamento dos
formais e sentiu-se atraído intelectualmente por suas extraordi- fenómenoscontinuamenteminavam o objetivo de uma síntese
nárias implicações para a dinâmica. Como movimento caracte- ordenada. Ele não queria, afinal, ser acusado de "compendiador'
rístico de um elemento"dentro de si mesmo" ou sqa, quando Ninguém que tivesse feito uma lista de 64 termos descriti-
ele não é removido para outra esfera --, o vórtice se manifesta vos da água em movimento poderia ser acusado disso. A lista
por toda a natureza. Dos três elementos naturalmente móveis, a começa: "ressalto, circulação, revolução, rotação, volteio, reper-
água era ao mesmo tempo o mais fácil de observar e o mais dra- cussão,submersão, encrespamento, declinação, elevação,depres-
maticamente inserido nas vidas humanas, tanto do ponto de vis- são, consumação, percussão, destruição...". O efeito é semelhante
ta construtivo quanto destrutivo. Leonardodevorou uma enor- a uma peça de uma aliteração poética, na qual o extravasamen-
me quantidade de observaçãoe especulaçãoao movimento da to verbal e a torrente de sons passam a assumir a natureza do
água turbulenta. A certo ponto, anunciou que definira "730 próprio fenómeno.O que ocasionouesseextravasamentofoi
conclusões sobre a água" em oito fólios do manuscrito conheci- um esforço mais limitado de chegar a definições precisas de pé-
do como Códigode l.eicester(de propriedadepor muitos anos lago (mar, grande lago), ./lume (rio), torrente (correnteza), caria-
dos condes de Leicester). Dedicou-sea põr alguma ordem no le (canal),Jonti(fontes), margíne(margem), riba (praia), lago
caoscrescente,imaginando um esquemapara esseplaneado li- (lago), paZüdi(pântanos), grotte (grutas), caveme (cavernas),
vro sobre a água: pozzi(poços), stagni(poças), baratri(abismos) e proceZle(tem-
porais). Cada termo é combinado com uma definição em uma
livro l da água em si mesmas ou duas sentenças,e ele se preocupavaparticularmente em di-
livro 2 do mar: ferenciar aquelesque podiam ter um duplo sentido. Então se
voltou para os processos:poZtlZamerlfi
e sürgimenti(borbulha- as enchenteseram uma ameaçaséria. Como "mestre da água'
mentos e afloramentos), sommergere (submersão), e ínfersega- consultado pelas autoridades de Veneza e Florença, Leonardo da
tione d'acque (interseção de águas), cada um com suas defini- Vinci lutou para conseguirreunir a teoria e a prática, aspirando
ções.Finalmente, mergulhavaem sua lista de 64 termos com o a comprovar por que os vórtices estavam acabando com as mar-
que pode ter sido uma sensaçãode crescente desespero, uma vez gense a mostrar como o poder inexorável da água em movimen-
que não forneceu definições detalhadasde nenhum deles. to deveria ser usado para a obtenção dos resultados desejados,
Suastentativas de categorizar e descreveras formas inten- em lugar de se opor à sua natureza. Contudo mesmo o mestre
samente complexas da água em movimento de turbulência lem- mais bem equipado ficava sem ação quando os elementos se mo-
bram um velho jogo de salão que consistia em desafiar alguém viam nas maioresescalas.Finalmente, nenhuma força humana
a descrever uma escada em caracol sem mover braços e mãos e foi de valia quando os ventos se desencadearam no ar, trazendo
sem outra ajuda visual. Ele não tinha esperançasde que as pa- água, pó, folhas, ramos e até mesmo árvores inteiras num caos
furioso de cacofonia visual
lavras servissem como veículos descritivos para um fenómeno
de tal complexidade, e sentiu que apenas seus desenhos pode-
riam fornecer explicações visuais adequadas . Que o ar escuro e triste sqa mostrado, castigado pela agitação de
Os mais complexos de seus estudos desenhados (Prancha ventos contrários e convulsionados, misturados com o peso da
6) não sãoalgo como fotografias miraculosasfeitas pelo olho. chuva incessante, e trazendo de roldão inúmeros galhos extirpa-
dos das árvores e misturados com incontáveis folhas. À toda vol-
mas representam uma síntese intrincada de observações e cons-
truções teóricas que não podem ser separadasumas das outras. ta podem-se ver velhas árvores arrancadas pelas raízes e desnu-
Eles apresentam a reconstrução dos "efeitos a partir das causas' dadaspela fúria dos ventos. As ruínas das montanhas podem ser
como disse em sua carta às autoridades da catedral, mas com vistas, esquadrinhadas pela correnteza dos rios, desabando sobre
a experiência direta dos efeitos sempre presenteem seu proces- essesrios e bloqueando os vales; os rios em declive explodem e
inundam muitas terras e seus habitantes.
so de visualização. Eles possuem uma beleza extraordinária em
sua coreografia espacial do impetus. No caso, os espirais aquáti-
cos estão dançando não só a sua própria música, mas também o A série Desenhosdo dilúvio, que data da última fase de sua vida,
combina a análise distanciada e a imersão emociona! de um mo-
acompanhamento das bolhas esféricasde ar, que foram empur-
radas para baixo, para dentro do reino estrangeirodo líquido, do que é compartilhado apenaspelos grandesmestresdo inteZ-
letto e da farltasia.
antes de saltarem alegremente à superfície numa série de peque-
nas explosões. Em sua análise,a forma do vórtice pode ser resumida em
A interação humana com a água era complexa e vital ao dois componentes:a direção primária do movimento em linha
mesmo tempo, de um modo que perdemos de vista, em geral, no reta; e o movimento giratório que faz com que o elementoen-
tempo presente. Ela proporcionava a maior fonte de poder; seu contre sua própria massa. De modo característico, essaformula-
transporte de um lugar para outro, àsvezes pela criação de uma ção o faz lembrar de algo mais:
nascenteartificial, era questão de vida ou morte para os agricul-
tores (e para aqueles que apenasprecisam de um gole); o mane- Observe o movimento da superfície da água, que repete o do ca
jo da água nos rios e canais era um importante favor de renda; e belo, e que tem dois movimentos, um dos quais responde ao pe
se das mechas de cabelo e o outro à direção dos ondas; esta água
faz dois redemoinhos, que em parte respondemao ímpetosda
corrente principal, enquanto a outra responde ao movimento in-
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cidental de dellecção.
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Não só o cabelo: a configuração em hélice se insinua em to-
dos os fenómenos nos quais estão envolvidos os componentes
lineares e curvos. O movimento (ou caimento) da manga de
uma roupa, na qual uma camadafina, diáfana,cobre longitudi-
nalmente um forro mais pesado, se ergue e cai em uma série de
colinas e vales dispostos de modo helicoidal (Prancha 7). Quan-
do Leonardo da Vinci desenha A Estrela de Belém, as folhas de
uma planta prqetam-se de seu núcleo em curvas enroscadase
graciosas, que são talvez mais demonstrativas da filotaxia em es-
piral que qualquer planta em situação natural.
Tais fatos constituem lições necessáriasa quem desenha o
que pertence ao domínio do humano. Quando decidiu desenhar
uma cabeleira para a graciosa companheira deJúpiter, na pintu-
ra hoje perdida de l.eda e o cisne,ele elaborou suntuosas va-
riações artificiais de espirais indistinguíveis de cabelo e água
(Figura 8). Como para enfatizar a continuidade entre as coisas
artificiais e as naturais, os fios de cabelo, que escapam das mar-
gensfrontais da cabeleira e surgem pelasaberturas no centro das
B
volutas laterais, celebram a mesma tendência para encurvar-se :k
rais. Sendo ele quem era, sentia que devia desenhar a parte de
trás da cabeleira, para que a compreensãofosse total. Ele sem- 8. Estudo para a cabeleirade l.eda emLeda e o cisne
pre sentia como se tivessede responder a perguntas que iam WindsoC Roya[ Libral], ]25]6
além daquelas que inspiram diretamente as necessidadespráti-
cas de compor uma determinada imagem. Bem que os podero-
sos patronos deviam duvidar de sua capacidadepara terminar
alguma coisa num intervalo razoável de tempo -- embora, neste
caso, Leda tenha sido terminada, para aparecer como o bem
mais valioso da lista de Salase tornar-se um item estimado da sa-
la de banhos de Francisco i, em Fontainebleau. Seria irónico se
o ambiente aquático da suite de aposentosde Francisco tivesse
círculo. Leonardo da Vinci trabalhou infatigavelmente nessepro-
acelerado sua conclusão. blema e em outros enigmas envolvendo áreas curvilineares e
áreasdelimitadas por linhas rotas, adorando diversas estratégias.
;Necessidade", "quantidade contínua" e As vezes pressentia que o prêmio estava bem ao seu alcance. an-
o primado da geometria tes de desaparecer
de novo no horizonte. O que emergiude
muitas de suaspáginasde improvisações geométricas foram for-
Governar tudo o que podemosver é um princípio primordial.
mas próximas às da natureza -- conchas e flores, especialmente.
Este é o princípio da "necessidade".Ele dita que a forma sem- A fim de explicar o desenho das formas na natureza, como
pre se adapte perfeitamente à função na natureza, sem insufi- determinadoem princípio pelo supremoCriador,os números
ciência ou redundância; compele cada força a se expandir no não pareciam proporcionar as soluções que Leonardo buscava.
modo mais direto que Ihe é disponível; prescreveque o mais Eles eram, a seus olhos, bons para contar e determinar propor-
simples desenho deve atingir um determinado fim; e deve ser ções em estática e dinâmica, mas a quantificação não era a prin-
respeitado por todo realizador de coisasartificiais. "A necessida- cipal preocupaçãoda sua ciência. Quando ele procurava saber
de é a dona e professora da natureza; a necessidade é o tópico e como as conchas assumem uma forma helicoidal. como as fo-
a inventora da natureza, a curva, a regra e o tema".
lhas e pétalas se originam das hastes, e por que uma válvula car-
A arquitetura universal da necessidadeé a geometria. Para díaca funciona com perfeita economia, a análise geométrica for-
entender o primado que Leonardo da Venciconfere à geometria, necia os resultados que desqava. Esse substrato geométrico do
precisamos perceber por que ele a reverenciavaacima de qual- desenho de Deus podia ser expresso diretamente na arte de
quer outra áreada matemática. Ele reconheceuque o número é Leonardo, fornecendo os fundamentos para o formato das coi-
importante e interessou-se muito pelas proporções numéricas sasque ele observavano mundo natural, e que desqava regis-
tal como expressas na música. Mas o número era, em última ins- trar do modo mais perfeito em desenhos,pinturas, esculturase
tância, inferior à geometria, uma vez que a aritmética dependia na arquitetura. Veremos isso ocorrer repetidamente nos capítu-
da "quantidade descontínua", enquanto a geometria lidava com los seguintes
a "quantidade contínua". O número era limitado a unidades se- A expressão suprema da majestade da geometria reside nos
paradas,e não o tipo de coisasque avançavadiligentemente, e cinco sólidos regulares (ou "platónicos") reverenciados na filo-
faltava-lhe a magia das proporções geométricas, que lidam com sofia e na matemática clássicas. Eles são os únicos corpos sóli-
superfícies, formas e espaço- Para Leonardo, havia algo superior dos compostos de polígonos idênticos e simétricos em torno de
na razão da diagonal de um quadrado (Vjn) se comparada a
seus vértices. São eles o tetraedro (quatro triângulos eqüiláteros,
uma razão do tipo 2:1. Ele sabia que a V2 não podia ser expres- ou sqa, a pirâmide), o hexaedro(seisquadrados,ou sqa, o cu-
sa aritmeticamente, uma vez que constitui o que chamamos de bo), o octaedro(oito triângulos eqüiláteros), o dodecaedro(12
número irracional. Não percebeu, contudo, que a razão mate- pentágonos) e o icosaedro (20 triângulos eqüiláteros). Eles po-
mática entre o raio e o diâmetro de um círculo (hoje designada
dem ser cortados -- quer dizer, fatiados simetricamente a partir
como a) era irracional, impedindo-o de calcular a quadratura dos vértices, de forma a se transformarem em sólidos gemi-regu-
do círculo -- isto é, de conquistar o antigo prémio para quem lares. Leonardo ficava particularmente fascinado quando a di-
criasse um quadrado absolutamente idêntico em área a um dado visão de dois poliedros diferentes resultava no mesmo corpo
semi-regular, ou "arquimediano". Por exemplo, as divisões do
dodecaedro e do icosaedro produziam um icosidodecaedro com-
posto por pentágonos e triângulos alternados (Figura 9).
Leonardo ficou diretamente enredado pela intrigante mate-
mática e as belezasformais dos corpos regulares e semi-regula-
res quando colaborou com o matemático Luca Pacioli, que che-
gou à corte dos Sforza em 1496. O principal projeto dos quatro
anos de Pacioli em Melão era o tratado De divina proporcione
(Sobre a proporção divina), o qual discorria sobre a geometria
dos cinco sólidos considerandoque elespodiam ser relaciona-
dos com a chamada razão divina (também chamada de razão áu-
rea). Esta é a razão (em números irracionais) que resulta quando
uma linha é dividida de tal forma que a parte mais curta estápa-
ra a porção maior assim como a parte maior está para o todo.
A razão divina não podia ser expressa em termos das "quantida-
des descontínuas" dos números. Embora Leonardo não conce-
desse a essarazão qualquer status privilegiado acima das razões
geométricas, ele sem dúvida ficou encantado com as "quantida-
des contínuas" envolvidas no desenho dos sólidos. Fez para
Pacioli uma série de ilustrações, conhecidas em dois manuscri-
tos e publicadas em primeira ediçãoem 1509.
O que Leonardo da Vinci concebeu foi um caminho alta-
mente habilidoso para mostrar os sólidos em perspectiva, siste-
maticamente sombreados como se fossem objetos reais, e não
diagramas geométricos. Ele também inventou um meio de evi- g- BaseacZa
na Versão esquemática de um icosaedro, de Leortando.
denciar as configurações espaciaisdessessólidos sob a forma de em De divine proporcione. FZormça(PagartiusPagarias), ]509
esquemas, em que cada face era tratada como uma janela emol-
durada. As ilustrações testemunham seus dotes para a visualiza-
ção espacial. Fica evidente, em outras folhas de desenhos nas
quais experimenta diferentes configurações e divisões, que ele
era capaz de praticar essageometriatridimensional dentro de
sua cabeça, pensando os corpos como se fossem objetos reais e
concretos. Leonardo se mostrava mais fascinado ainda pelo que
chamava de "transformação" -- ou seja, quando um dado volu-
me de material numa forma definida era rearrumado em outra
forma. Um belo exemplo, caracteristicamenteinesperado, é sua
descobertade que, quando um cubo em material maleável é
comprimido firmemente ao longo de um eixo perpendicular a
uma das faces -- por exemplo, um cubo de cera pressionado
por uma placa de vidro colocada sobre ele --, acaba se transfor- -lç+''u-'v,4 4'1rNAm..
mando num cilindro chato. Ainda a quantidade contínua!
Leonardo da Vinca sustentava que tudo se move em um es-
.«.lq,.à ,*-.}T'~':«
paço contínuo, e que essemovimento não pode ser desmembra- $. «õ «i4 .«,'X..:,~ .b',?
do em etapas separadaspor números. Olhando para a figura
humana, ele viu como o sistema composto de dobradiças nas
juntas principais dos ombros, cotovelos, quadris ejoelhos resul-
tava numa série de extremidades orbitantes, como os epiciclos
que haviam sido inventados para salvar o modelo ptolomaico de
céus em movimento giratório. É uma visão que podemos razoa-
velmente descrever como cinematográfica. Podemos perceber
que Leonardo teria adorado ver seusdesenhosse moverem, e às
vezes, como em seus sucintos esboçosde um homem martelan-
do (Figura 10), ele chega o mais perto possível do efeito de uma
sequência contínua
.r''b
De certo modo, a "quantidade contínua" serve como metá-
io. Pequenos esboços de um homem martelando. Win(ZsocRoyal
fora perfeita para o sistema de pensamento pessoal de Leonardo Líbrary, ]9]49-52v
da Vinca. Ele nunca olhou para nada sem pensar em alguma
coisa mais. Tudo existia numa continuidade de causae efeito,
sob o comandoda necessidade,a qual, longe de causarunifor-
midade entre as coisas criadas, resultava na variedade mais as-
sombrosa de formas adequadas a executar funções incontáveis
em qualquer canto do mundo natural.