Você está na página 1de 268

DADOS DE ODINRIGHT

Sobre a obra:

A presente obra é disponibilizada pela equipe eLivros e


seus diversos parceiros, com o objetivo de oferecer
conteúdo para uso parcial em pesquisas e estudos
acadêmicos, bem como o simples teste da qualidade da
obra, com o fim exclusivo de compra futura.

É expressamente proibida e totalmente repudíavel a venda,


aluguel, ou quaisquer uso comercial do presente conteúdo.

Sobre nós:

O eLivros e seus parceiros disponibilizam conteúdo de


dominio publico e propriedade intelectual de forma
totalmente gratuita, por acreditar que o conhecimento e a
educação devem ser acessíveis e livres a toda e qualquer
pessoa. Você pode encontrar mais obras em nosso site:
eLivros.

Como posso contribuir?

Você pode ajudar contribuindo de várias maneiras, enviando


livros para gente postar Envie um livro ;)

Ou ainda podendo ajudar financeiramente a pagar custo de


servidores e obras que compramos para postar, faça uma
doação aqui :)

"Quando o mundo estiver unido na busca do


conhecimento, e não mais lutando por dinheiro e
poder, então nossa sociedade poderá enfim evoluir a
um novo nível."

eLivros .love

Converted by ePubtoPDF
A MONTANHA E O URSO

UMA HISTÓRIA DA COREIA

EMILIANO UNZER MACEDO


___________________________________________________

Catalogação na Publicação (CIP)


Ficha Catalográfica feita pelo autor
___________________________________________________
M141a Macedo, Emiliano Unzer, 1977 –
A Montanha e o Urso: Uma História da Coreia / Columbia
& San Bernadino, EUA: Amazon Independent Publishing,
2018.
237 p.: il. ; 23 cm
Inclui bibliografia.
ISBN: 9781983059841
1. Coreia – História. I. Título.
CDU: 94(519)
___________________________________________________

Copyright © 2018 Emiliano Unzer Macedo


Todos os direitos reservados.
ISBN: 9781983059841
Aos incansáveis coreanos.
(“Quando decorrem dez anos, até mesmo os rios e as montanhas mudam”)

(“Dragões emergem de pequenos riachos”)


INTRODUÇÃO
1 O DEUS E O URSO
2 A UNIFICAÇÃO E O SÁBIO DA MADRUGADA
3 O GRANDE ANCESTRAL E AS GRANDES OBRAS
4 O IRMÃO LEAL E O BOM VIZINHO

5 OS HERDEIROS DE CONFÚCIO
6 O REINO EREMITA
7 A TEMPESTADE

8 A FRATURA
9 A RECONSTRUÇÃO
EPÍLOGO
INTRODUÇÃO

A história da Coreia é ainda pouco conhecida pelo público


em geral. Muitas vezes a península coreana é referida como
réplica da civilização chinesa, ou como submissa aos
interesses japoneses. Apesar desse desconhecimento, a
Coreia atrai a atenção mundial com relação aos eventos
decorrentes da separação da península desde a Guerra da
Coreia entre 1950 e 1953. Ou como nos fascinamos diante
da riqueza e pujança da economia sul-coreana. Ou como
nossa curiosidade é despertada diante da reclusão do
regime norte-coreano.

Antes de tudo, deve-se entender que o passado coreano


foi todo próprio e singular. Rico e complexo, ao criar e
propor novas ideias e conceitos. Esse, portanto, é o objetivo
do livro, de introduzir essa complexidade histórica coreana.
Os coreanos atravessaram séculos de desafios e confrontos
nas suas fronteiras. Incoporaram valores chineses
confucionistas, mas foram além e propuseram uma revisão
dessa linha de pensamento. Criaram uma economia
vibrante na Coreia do Sul na segunda metade do século 20,
mas isso não eliminou a tendência autoritária do seu
governo. Conceberam um regime fechado e unipartidário ao
norte do paralelo 38, decorrente da inspiração stalinista e
que hoje perpetua-se na família dos Kims.

Ao longo dos séculos, vários grupos étnicos compuseram


a península coreana, e que moldaram a cultura e identidade
da região. Manchurianos, japoneses, chineses, além da
diversidade de coreanos que foram gradativamente
unificados e dominados a um reino a partir do século 10
com Goryeo. Depois das invasões mongóis em meados do
século 13, o reino coreano passará a se fundamentar em
novas bases, com a dinastia de Joseon (ou Choson). O
século 19 testemunhará a crescente ameaça de japoneses,
chineses e russos nas suas fronteiras. No século seguinte, a
península conhecerá a dominação colonial japonesa até o
fim da Segunda Guerra Mundial. E, depois da devastação da
Guerra da Coreia, em 1953, a península será fraturada em
duas.

O enfoque dessa obra será, em suma, apresentar uma


visão panorâmica histórica da Coreia, pautando-se nos
eventos políticos, com ocasionais ênfases sociais,
econômicas e culturais. Não foi descuidado o contexto
coreano, com a preocupação de ir além de suas fronteiras e
examinar os países da vizinhança no leste asiático. Essa
região durante muito tempo antes do século 19, apresentou
um cenário vibrante, criativo e próspero, muito advindo dos
contatos entre os povos da região e das possibilidades e
trocas comerciais e culturais. Foi nesse contexto que a
Coreia moldou sua singularidade. Cabe a nós termos a
sensibilidade e acuidade aos eventos históricos para
compreendermos esse contexto. Ao final, tenderemos a
valorizar mais a intrínseca unidade coreana do que a volátil
divisão em que resultou a península em meados do século
20.

A Coreia, em termos geográficos, ocupa uma península


no leste asiático. A região é rodeada por mares em seus três
lados: o Mar do Leste, o do Sul e do Oeste. Na maioria dos
mapas, o Mar do Oeste, ou Ocidental é chamado de Mar
Amarelo, e o do Leste, de Mar do Japão. Isso, naturalmente,
foi sempre contestado pelos coreanos, pois os termos
remetem a outras referências nacionais estranhas aos
coreanos. Esses mares vizinhos e a ligação terrestre ao
norte desempenharam papéis cruciais na história coreana.
Foi por esses caminhos que houve fluxo migratório,
comercial e cultural, geralmente mais vindo das terras ao
oeste para o leste. Mais para o leste, as ligações para o
arquipélago japonês se deram por navegações, o que não
elimina por completo a ligação marítima entre a China e a
Coreia, como houve na aliança em 660 entre o reino
coreano de Silla com a China da dinastia Tang. No outro
sentido, os japoneses invadiram a península coreana na
década de 1590 por meio naval. E episódios marcantes
navais se deram em 1894 e também em 1905 na guerra
entre japoneses, russos e chineses nos mares da região. Em
1951, durante a Guerra da Coreia, o General MacArthur
desembarcou no porto de Inchon para atacar as forças
norte-coreanas. O mar sempre foi elemento marcante para
a história coreana.

Foi também pelos mares que houve a prosperidade dos


reinos coreanos. Silla, durante dos séculos 8 e 9, dominou o
comércio os mares da região e o comércio com os chineses
e japoneses. Foi pelo comércio que comunidades e
migrações coreanas ocorreram, como o de comerciantes
que se estabeleceram na foz do Rio Yangzi, na China. A
partir da dinastia Joseon que se comprometeu a manter a
estrita e isolada lealdade à dinastia Ming na China no século
15 que a Coreia começou a rever sua atuação internacional.
A partir da segunda metade do século 20, a Coreia na sua
proção meridional, uma vez livre da dominação japonesa,
novamente retomou sua vocação marítima e internacional.
Os contatos no norte coreano consolidaram-se no duro jogo
dos interesses soviéticos e, depois, numa política
autossuficiente.

A topografia coreana é marcada por montanhas que


ocupam cerca de 70% de seu território. As partes ocidentais
apresentam largas planícies costeiras e vales férteis entre
as montanhas, enquanto a costa leste é marcada por áreas
agrícolas estreitas acompanhadas de altas cadeias
montanhosas. Essas cadeias correm do norte ao sul, e essa
espinha dorsal de península, referida como a Cordilheira de
Baekdu, tem origem na mítica motanha ao norte, suposto
local onde nasceu o fundador dos coreanos, Dangun. Os rios
correm em grande medida do leste para o oeste, e esses
incluem o Yalu, Chongchon, Taedong, Imjin, Han e Kum. As
exceções são os rios Naktong que flui para o sul e o rio
Tumen que flui para o leste a partir do Monte Baekdu.

O clima coreano é definido pela sua situação peninsular.


O arquipélago japonês protege a região coreana ao leste,
fazendo com que o clima seja mais influenciado pelas
regiões ao norte e oeste. No entanto, a Coreia não foge do
regime das monções que chega no norte do Leste Asiático.
Há um verão quente e úmido e inverno seco e frio. Durante
o inverno, ventos fortes do noroeste gerados pelas massas
continentais da alta pressão da Sibéria derrubam a
temperatura e umidade. No verão, as monções do oceano
trazem as chuvas, com cerca de 70% das precipitações
anuais ocorrendo geralmente em três meses ao ano, de
junho a setembro. Ocasionais tempestades, ou tufões,
podem ocorrer, mas seu impacto é suavizado pelas ilhas
japonesas ao leste. Foi o clima de monções que permitiu à
Coreia desenvolver o cultivo do arroz desde o século 8 a. C.
A expectativa das chuvas em abril e maio, marcou o
calendário agrícola coreano para os arrozais. No verão,
quente e úmido, o arroz cresce. Nos meses seguintes, de
setembro a outubro, o clima seco e frio predomina,
tornando imperativo a necessidade da colheita e
armazenagem contra as intempéries. Depois disso, no fim
do ano, o inverno predomina.

Em termo étnicos e linguísticos, os antecessores dos


coreanos vieram de migrações do nordeste asiático e norte
da China. Mas a principal evidência aponta para origens
culturais e da língua coreana não de chineses, mas de
falantes da família linguística altaica, tais como os
turcomanos, mongóis, tungus, manchus e japoneses. Uma
família completamente distinta das línguas chinesas. Outras
evidências apontam que as origens coreanas com relação
aos mitos e símbolos de totens de ursos e tigres remetem a
povos altaicos das estepes asiáticas. O culto desses
símbolos e mitos conjugam-se com a prática siberiana do
xamanismo e de objetos de valores simbólicos usados em
rituais como a espada e o espelho, algo que se pode
constatar também na história japonesa.

A influência chinesa, aparentemente, veio em momento


posterior, com a introdução da escrita, dos caracteres
chineses ou sinogramas, além dos ritos e ideais
cosmológicas, confucianas e budistas. Embora a origem da
língua coreana seja diferente da chinesa, a Coreia adaptou
os sinogramas para suas palavras e gramática. Essa forma
chinesa modificada, chamada de idu, foi reflexo da
prestigiosa influência que a elite coreana incorporou ao
entrar em contato com a cultura sínica. A unificação da
língua coreana em definitivo se deu com a expansão do
reino de Silla, que conquistou os reinos de Paekche e
Koguryo no século 7.

A escrita coreana acabou sendo elaborada a partir do


sistema chamado de hangul, elaborado sob o mando do rei
Sejong da dinastia Joseon, no século 15. A motivação para a
criação de uma escrita e alfabeto próprio foi permitir aos
coreanos lerem e entenderem as obras chinesas. Mas a
língua chinesa e seus caracteres permanceram por séculos
como sinal de prestígio e cultura no meio coreano. Somente
no século 19 foi promovido ampla campanha na Coreia para
a publicação de jornais e livros a serem escritos em hangul.
No período da dominação japonesa no início do século 20, o
hangul e o coreano foram gradativamente banidos nas
escolas e locais públicos. Após a Guerra da Coreia, a escrita
coreana voltou a ser valorizada, mas dada a divisão da
península após 1953, cada Estado coreano passou a ter
vocábulos e características diferenciadas ao longo das
décadas de separação. Para tanto, a Coreia do Norte refere
sua escrita não como hangul, mas como chosongul. Apesar
disso, as diferenças não são ainda tão marcantes, e não há
dificuldade de comunicação entre as duas partes coreanas.

O coreano guarda em si algumas variações dialetais a


depender da região da península. Mas a maioria das
variações se dá mais por questões de sotaques diferentes.
O coreano, para o mundo além do continente, é um grande
desafio. A romanização de seus caracteres permitiu ao
público ocidental ter maior compreensão vocal, mas a
variedade de seus fonemas e consoantes é ainda difícil de
ser dominado pelo estrangeiro. A romanização do coreano
foi elaborada desde o século 19, e o mais aceito e popular
foi o do Sistema McCune-Reischauer, criado em 1937. No
ano de 2000, esse sistema foi revisado para o mundo
ocidental. É nesse último sistema revisado que a maioria
dos termos coreanos do livro foram baseados, salvos em
termos conhecidos como Kim Il Sung (e não Gim Il Sung),
Park Chung Hee (e não Bak Chung Hee), entre outros. Os
nomes completos coreanos, como se constata, seguem a
tradição asiática, ou seja, primeiro o nome de família e
depois o de batismo. E isso também foi respeitado visando
evitar estranhamento ao leitor brasileiro e da língua
portuguesa.
1 O DEUS E O URSO

Os ecos mais remotos dos antepassados dos coreanos


remetem a povos que, aparentemente, migraram de regiões
setentrionais chinesas e das vastidões mongólicas. Isso se
deu num largo período que se estende desde 10 mil anos
antes de nossa era até por volta do primeiro milênio a. C.
Nesse processo, houve uma gradual expansão de artefatos
de cerâmicas, talvez os mais antigos do mundo que depois
se constatou no arquipélago japonês ao leste. Os antigos
habitantes caçadores, pescadores e coletores, os
pertencentes à uma cultura marcada por cerâmicas com
padrões feitos com pente, considerados do Período Jeulmun
( ) (c. 8000 – c. 1500 a. C.), foram deslocados ou
miscigenados à onda de povos advindos de outras regiões
asiáticas. Criando com isso uma cultura neolítica mais
elaborada, identificados nas crônicas chinesas como os
pertencentes às nações han, ye ou maek. Os estudiosos
hoje consideram que o povo coreano descende em grande
parte desses povos.

O bronze e o cultivo de arroz foram se estabelecendo nas


regiões coreanas e adjacências no primeiro milênio a. C. O
arroz parece ter vindo de regiões mais meridionais, pois o
cultivo do milhete (que depois originaria o trigo) era mais
comum no norte da China. O bronze, ao que parece, pode
ter advindo das proximidades chinesas, considerando o
estilo observado nos vasos chineses da época em adagas e
espelhos coreanos.

O antigo mito de fundação coreana se dá na figura de


Dangun (ou Tangun). Dangun ( ) é considerado o
fundador, uma espécie de rei e sacerdote de um reino
chamado de Choson (também chamado de Gojoseon),
localizado no noroeste coreano e partes da Manchúria mais
ao norte. Esse reino, evidentemente, depois serviu de
inspiração para uma futura dinastia coreana do século 14 d.
C. As narrativas mitológicas de Dangun se encontram na
obra Samguk yusa( , Memorabilia dos Três Reinos),
escrito por um monge budista, Il-yeon (1206–1289), no
século 13, à época das invasões mongóis. Esse monge
remete os contos a registros mais antigos que até hoje não
foram encontrados, como o Livro de Gogi ( ).

A história da origem de Dangun assim segue no Samguk


yusa. Ao tempo dos deuses, Hwanung ( ) queria viver no
plano dos homens ao que foi atendido pelo seu pai, Hwanin,
( ), Senhor dos Céus. Para descer dos céus à terra, foi
escolhida a Montanha Baekdu (“Montanha do Cume
Branco”, ), hoje na fronteira entre a Coreia do Norte e a
China. A Hwanin foi dado três selos celestiais e o mandou
para governar sobre toda a terra. Hwanin desceu com três
mil seguidores e depois declarou o local onde descendeu
como a Cidade de Deus (Sinsi, ). Depois de ser declarado
como rei celestial (Hwanung Chonwang), assumiu os
encargos de ensinar a agricultura, medicina, artes, leis e
moral. Isso tudo foi depois estimado por volta do ano de
2333 a. C.

Nas proximidades, habitavam um urso e um tigre que


depois passaram a suplicar a Hwanung para transformá-los
em seres humanos. Foi então que o rei celestial deu a
ambas criaturas um ramo de Artemísia sagrada, vinte
dentes de alho, e ordenou a eles evitarem a luz do sol por
cem dias. Os dois animais passaram então a comer a planta
e a evitar o sol. Depois de vinte e pouco dias, o urso, que
manteve fiel ao plano, depois virou uma mulher. O tigre, por
sua vez, impaciente e intempestivo, foi incapaz de seguir as
recomendações e permaneceu no seu estado bestial. Uma
vez mulher, essa passou a suplicar por um companheiro
para ter uma criança. Ao ouvir seus pedidos, Hwanung se
transformou num estado mortal e deitou-se com a mulher.
Ao que depois foi gerado um filho, Dangun.

Depois de crescido, Dangun tornou-se um homem repleto


de qualidades e liderança. Para sediar seu reino, fundou
uma capital em Pyongyang e chamou seus domínios de
Choson (ou Gojoseon). Anos mais tarde, Dangun mudou sua
corte para mítica cidade de Asadal e ali governou por mil e
quinhentos anos. Ao final de sua longa vida, Dangun
negociou seu reino com sucessores, passou a viver nas
montanhas como divindade.

Ao que parece, essa narrativa mitológica serve para


entendermos como um reino organizado se estabeleceu no
norte da península coreana antes de nossa era.
Considerando que não houve vestígios de nenhum amplo
reino centralizado até o 4º século a. C., a figura de Dangun
serviu ao propósito de legitimar os posteriores reinos
coreanos e na Manchúria, ao criarem uma narrativa que
remete ao passado longínquo e divino. Alguns estudiosos [1]
da história coreana fundamentam a narrativa de Samguk
yusa no seu devido contexto histórico. Argumentam que o
mito de Hwanung e seu descendência representaria a
migração de povos das cordilheiras Altai, da Mongólia. Esses
trouxeram consigo nova cultura e técnicas da agricultura,
ao que depois se difundiu entre os anteriores habitantes
aborígines da Manchúria e Coreia. Entre esses nativos,
alguns deles adoravam um deus em forma de tigre que
depois foram marginalizados. Outros, que adoravam uma
forma divina em forma de urso, foram incorporados e
assimilados a esses novos imigrantes. No que depois
resultou na consolidação de um estado da região, chamado
de Choson liderado por um líder com poderes sacerdotais,
Dangun. Estudos identificaram algumas nações siberianas e
na Manchúria que cultuavam o urso como animal sagrado.

Dangun foi depois sucedido por uma nova onda de


migração advindo do oeste, liderado por Kija, que
apresentou novidades civilizacionais. Nesse sentido, as
lendas podem nos ajudar a compreender o quadro de
migrações e assimilações no leste asiático nos últimos
séculos antes de nossa era. Os mitos de fundação
relacionariam-se nos séculos posteriores com os deuses
cultuados depois nos estados de Puyo, Koguryo, Kaya e Wa,
todos na região da península coreana, nordeste chinês e
arquipélago japonês.

O quadro de migrações e influências culturais também é


observado no uso do bronze, como indicam os achados
arqueológicos. Em regiões coreanas e manchurianas, há
adagas de bronze pertencentes à chamada cultura de
Liaoning do século 10 a. C., que apresentam formas
distintas das culturas siberianas da região de Ordos no
norte da China. E, com a introdução de técnicas agrícolas, o
arroz passou a ser cultivado desde o século 8 a. C. na
península coreana algo que, como dito, diferenciava-se das
regiões vizinhas que cultivaram o milhete e o trigo.

Foi também nos últimos séculos antes de nossa era que


um sistema de escrita advindos do oeste espalhou-se em
regiões coreanas e no antigo reino de Choson (Gojoseon). É
incerto qual sistema foi introduzido, mas é provável que
tenha sido aquele que acompanhou ondas migratórias
similares ao usado na escrita chinesa, ou seja, formas de
sinogramas.

Choson, como nome de estado político, aparece narrado


pela primeira vez em registros chineses no século 4 a. C.,
quando é referido as boas relações diplomáticas entre o
reino coreano e o estado chinês de Qi, na península de
Shandong (mapa). Mais tarde, nas narrativas chinesas,
Choson é referido como um reino localizado na próxima
península de Liaodong, na costa da Manchúria, e descrito
como um reino organizado e forte que ficava ao leste do
reino de Yan, durante o período dos Estados Combatentes
da historiografia chinesa (c. 475 a. C. – 221 a. C.). Foi
decorrente dos continuados conflitos com Yan que Choson
decidiu deslocar sua capital, Wanggeom-seong, mais para o
leste de Liaodong para o noroeste coreano no século 3 a. C.

Mapa: O estado de Qi em Shandong e a península coreana no século 4 a. C.


Por volta do início do século 2 a. C. houve turbulência na
região norte chinesa que afetou a península coreana. A
dinastia Qin chinesa (212 – 206 a. C.) entrou em colapso
com a ascensão da dinastia Han (206 – 220 d. C.), que
catalisou uma série de migrações de grupos étnicos han, ye
e maek para o norte e nordeste chinês nas proximidades do
rio Yalu. Nos achados arqueológicos, é possível distinguir na
região coreana, figuras de vestimentas e penteados que
remetem às esses novos povos, algo que certamente teve
consequências no reino Choson. O soberano Choson, ao que
a tradição narra, confiou a defesa e guarda de suas
fronteiras a aliados contra o crescente império chinês.

O reino Choson atravessou mudanças quando um desses


refugiados chineses da fronteira decidiu voltar-se contra a
capital de Choson e ocupar o trono em 194 a. C. Seu nome
depois ficaria conhecido como Wiman (r. 194 a. C. - ?) que,
uma vez no poder, decidiu manter a linhagem dinástica
coreana. Historiadores acreditam que Wiman governou
sobre um reino confederado de grupos étnicos do que
propriamente algo centralizado. Isso era típico da época na
região da Manchúria, península coreana e Japão.

Três gerações depois, embates começaram a se avolumar


com os chineses da dinastia Han, no que resultou na vitória
do imperador chinês Wu em 108 a. C. No seu auge,
portanto, toda a região norte coreana foi incorporada
diretamente ao império chinês da dinastia Han. Tratados de
paz foram logo estabelecidos, mas o reino de Choson,
embora submetido, permaneceu como um alerta para a
futura segurança da China da época, pela sua notável
organização e proximidade geográfica.

Assim se deu por quatro séculos até por volta de 313 d.


C. O norte coreano foi administrador pelos chineses de Han
a partir da cidade de Lelang (Nanggang em coreano) perto
de Pyongyang. Apesar da dominação, as evidências
arqueológicas apontam para traços culturais coreanos
bastante distintos dos chineses. Ao que parece, os chineses
mantiveram a administração de forma confederada e
autônoma, assim como era costume na região. Ademais,
temos que considerar que não havia ainda uma unidade
cultural nem mesmo entre os chineses, e assim foi também
entre os coreanos. Em outras palavras, não havia ainda à
época uma entidade homogênea e unificada coreana, mas
sim um quadro diversificado de grupos étnicos. Nada havia,
portanto, para nos referirmos como uma Coreia. As
fronteiras que hoje são evidentes no norte coreano, ao
longo do rio Yalu e Tumen, somente foram demarcados
tardiamente, no século 15 d. C.

A diversidade de povos e costumes coreanos foi notada


nas crônicas chinesas, como na Crônica dos Três Reinos
(Sanguo zhi, ) do século 3 d.C. Nesse livro, narra-se que
havia um reino chamado de Puyo, bem ao norte da
península coreana na região da Manchúria. Mais ao sul da
Manchúria ascendeu um reino chamado de Koguryo que
depois conquistou sua soberania plena dos chineses a partir
de 313 d. C. Ao leste, um outro grupo, Okcho, tinha
constituído num reino separado e, ao sul deles havia o povo
Ye (ou Yemaek) que viveram ao longo da costa oriental
coreana. Ainda mais ao sul, que permaneceu longe da
dominação chinesa de Han, tinha florescido três reinos
coreanos: Mahan, Pyohan e Chinhan (mapa). Esses três
povos (referidos por vezes como Samhan) foram os
prováveis ancestrais das posteriores dinastias coreanas,
pois foi de Chinhan que se consolidaria a gradativa união
coreana nos séculos posteriores. Entre os de Mahan, os
chineses relatam que não tinham nem mesmo uma língua
em comum e que eram mais um conjunto de pequenas
unidades de lealdades. Todos os três reinos no sul coreano
eram compostos em sua maioria por agricultores
espalhados entre terras férteis entre as montanhas e o mar,
sem sinal de muralhas. Pyonhan e Chinhan não contavam
com mais do que alguns milhares de grupos familiares. E
entre esses, conta-se que tinham o hábito de tatuarem os
corpos e deformarem as cabeças dos recém-nascidos
visando uma forma mais alongada do crânio. Em contraste,
o povo de Koguryo, mais ao norte, eram montanheses que
em boa parte desconheciam a agricultura. Por volta do
século 3, sua população deveria contar com algumas
dezenas de milhares de famílias, todas mais afeitas à
cavalaria e ao nomadismo.

Mapa: Os reinos coreanos no século 5 d. C.

Na perspectiva chinesa, a ordem considerava todos os


povos ao redor como periféricos ao seu senso de civilização.
Foi quando os chineses consolidaram o conceito de Mandato
do Céu (tianming, ; ) e quem controlava esse centro era
dito como Filho do Céu (tianzi, ). O primeiro imperador
chinês, Qin Shihuangdi (259 – 210 a. C.) proclamou-se
governante de tudo o que havia sob os céus (tianxia, )
depois de ter unificado os seis estados em guerra na China
de 230 a 221 a. C. Ele adotou um novo título, huangdi( ,
imperador), que tinha antes sido usado apenas para figuras
mitológicas e divindades da China antiga.

Uma vez conquistada toda a vastidão dos reinos chineses,


o imperador passou a considerar sua soberania sobre os
arredores no mundo asiático, a manter a ordem contra
possíveis ameaças. Assim, Qin Shihuangdi passou a
elaborar uma política de contenção e alianças visando as
suas fronteiras mais vulneráveis ao norte, dando alento à
uma série de fortificações e muralhas defensivas no que
séculos depois iria ser a Grande Muralha. Uma das nações
mais ameaçadoras aos chineses eram os xiongnus,
nômades que eram considerados como bárbaros na
percepção etnocêntrica chinesa da época. Outras nações
foram nomeadas de acordo com os pontos cardeais, Dongyi
(ao leste), Nanbam (ao sul), Beidi (ao norte) e Xiong (ao
oeste).

Após algumas décadas, a dinastia imperial Qin foi


conquistada pela dinastia Han, que durou quatro séculos.
No século 2 a. C., um dos imperadores Han, Wudi (156 – 87
a. C.) foi articulado e energético o suficiente para combater
e eliminar a ameaça dos xiongnus no norte e oeste das
fronteiras chinesas e passou então a voltar sua ambição
expansionista para o sul e leste. Uma vez feita a expansão
chinesa ao sul, chegando a estender-se ao que hoje é o
norte vietnamita em 111 a. C., Wudi, três anos depois,
voltou-se ao leste quando encontrou a formidável
resistência de Wiman de Choson, que acabou caindo
derrotado em 108 a. C. A ampla confederação tribal de
Choson não se mostrou centralizada o suficiente para conter
a invasão chinesa. Nessa região foram depois
implementadas quatro grandes regiões administrativas:
Lelang, Zhenfan, Lintun e Xientu. E uma numerosa migração
chinesa foi incentivada para ocupar efetivamente toda a
região nordeste do império de Han.

Lelang, conforme dito antes, foi um dos principais centros


administrativos chineses na região com a península
coreana. Esses centros prosperaram com o ativo comércio
entre as regiões e a costa do leste asiático. Funcionários
chineses e representantes da corte Han com frequência
provaram sua arrogância ao imporem um sistema de leis e
costumes confucianos sobre os antigos costumes de
Choson. Apesar das resistências, as modificações de Han
foram implementadas, o que não eliminou os constantes
ataques e pressões de nações coreanas vizinhas. Foi por
meio desses desgastantes ofensivas que os chineses
decidiram abandonar dois centros administrativos e se
concentrar em apenas um deles, Lelang, que acabou se
tornando no centro chinês mais periférico ao nordeste do
império Han.

O interesse chinês na região nordeste, entre os povos que


consideravam como Dongyi( ), passou com o passar do
tempo a considerar apenas a manter os laços comerciais e
tributários, até ao tempo em que a própria coesão e
unidade do império chinês da dinastia Han começou a
entrar num período de declínio e fragmentação no século 4
d. C. Foi nesse contexto que um dos reinos mais ao norte da
península coreana, o de Koguryo, chegou a investir contra a
cidade de Lelang em 313 d. C [2]. Após esses eventos, o
líder de Koguryo passou a ser referido com o título de rei
(wang, ).
A expansão de Koguryo, a bem da verdade, remeteu a
séculos anteriores na região da Manchúria e começou a
preencher gradativamente o vácuo de poder deixado com o
declínio da autoridade imperial chinesa. No século 2 de
nossa era, era visível os sinais de enfraquecimento dos
representantes de Han. Em 220, toda a região sul da
Manchúria foi conquistada por um povo nômade que tinham
se confederado num sistema de alianças chamados de
Xianbei. Por volta do ano 300, esses nômades começaram
efetivamente a controlar toda a região e cortaram toda a
ligação da península coreana com o restante da China. Foi,
portanto, a gota d’água apenas quando Lelang caiu em 313
para Koguryo. Talvez não seja exagero considerar esses
eventos históricos como determinante para o posterior
surgimento da nação coreana.

Em fins do século 4 e início do seguinte, a região nordeste


da China e do norte da península coreana tinha se
consolidado em dois reinos organizados e fortes. Um, mais
ao norte foi dominado por povos de Tuoba e Xianbei que
passaram a reinar sobre a dinastia Wei do Norte. Mais ao
sul, o reino de Koguryo fortaleceu-se no sul da Manchúria e
norte coreano. Ambos os estados foram regidos por povos
não-chineses, apesar de Wei do Norte ter uma considerável
população chinesa. Ademais, ambos os reinos tinham
absorvido substancialmente a cultura chinesa e o
confucionismo, sinizando o povo de Tuoba-Xiaobei. Entre os
de Koguryo, a influência se fez presente, embora em menor
medida e foram esses depois que levaram os valores
chineses mais para o sul da península coreana e, dali, para
as ilhas e arquipélago japonês, entre os povos denominados
à época de Wa. Em 372, Koguryo tinha fundado uma
academia de estudos de obras clássicas chinesas e, um ano
depois, passou a promulgar códigos de leis confucionistas.
Em 427, sob o rei Jangsu (r. 413 - 491), a capital de Koguryo
mudou-se mais para o norte do rio Yalu, hoje em território
chinês, nas proximidades de Pyongyang [3]. Deslocando-se
de suas bases mais ao oeste na península de Liaodong,
Jongsu e seu antecessor no trono, o rei Gwanggaeto, o
Grande (r. 391 - 413) tinha expandido o território de
Koguryo ao norte até o rio Songhua [4] e chegando a
controlar dois terços da península coreana.

Outro reino coreano proeminente foi Paekche (ou Baekje,


) que tinha sido fundado por um dos filhos do primeiro rei
de Koguryo, Jumong (r. 37 a. C. – 19 a. C.). A linhagem real
de Paekche, tal como Koguryo, buscaram traçar sua
ancestralidade ao de Puyo (ou Buyeo, ), um venerável
reino que tinha se estabelecido na Manchúria desde o
século 2 a. C. Paekche começou com a reunião de em torno
de 50 famílias na região de Mahan no sudoeste coreano.
Com o tempo, foi expandindo e consolidando seus domínios
na região. Os contatos com dinastias chinesas foram
primeiro registrados em 372 e, em 386, o regente de
Paekche, Jinsa (r. 385 - 392) recebeu o título dos chineses
de “Rei de Paekche” e “General Protetor do Leste”. O
antecessor no trono de Jinsa, Geunchogo (r. 346 - 375) tinha
expandido e controlado o reino de Paekche no seu auge
territorial, tornando-os particularmente valiosos aos
chineses que buscaram contrapor à hegemonia de Koguryo
ao norte.

Em fins do século 4, Paekche foi derrotado e reduzido


pelo reino vizinho de Silla. Nos séculos 5 e 6, Paekche
manteve duradouras e boas relações com dinastias
chinesas, principalmente das regiões meridionais, e foi o
período em que absorveu a sofisticada cultura chinesa. Ao
mesmo tempo, pelo acesso aos mares da península,
Paekche começou a manter contatos e comércio com
estados emergentes nas ilhas meridionais do arquipélago
japonês.
O terceiro reino coreano proeminente à época, Silla,
desenvolveu-se a partir de comunidades da região de
Chinhan no sudeste asiático. Esse reino, virado para a costa
leste da península, foi a mais remota e que demandou mais
tempo para desenvolver-se. Foi somente em 503 que os
líderes de Silla abandonaram os tradicionais títulos de
Maripkan, e assimilaram o título chinês de “rei” (wang). Em
520, Silla começou a promulgar uma série de leis de origens
chinesas e confucianas, claramente demonstrando a
influência advindo do oeste. Por volta de 535, no entanto,
há uma novidade, pois em Silla foi contornada a oposição da
corte e elite do reino com relação ao budismo, sendo esta
crença oficialmente endossada. Dez anos depois, por
regimento real, Silla começou a escrever a história oficial do
reino. Silla, no seu auge, em 576, chegou a dominar toda a
costa oriental da península coreana, muito resultado do
enérgico rei Jinheung (r. 540 - 576) quando este aliou-se a
Koguryo e derrotou o reino de Paekche através do rio Han
em 553. A estrutura social de Silla parece ter se consolidado
em torno de clãs proeminentes, com sobrenome de Kim
( ), Pak (ou Park, ) e Seok (ou Sok ou Suk, ), nomes até
os dias atuais presentes nas famílias coreanas. Até o século
4, os chefes de Silla regiam sobre um sistema confederado
e eram eleitos por consenso de um conselho de notáveis.

Esses três reinos coreanos foram o pano de fundo


histórico sobre o que depois iria se consolidar na Coreia a
partir do século 7. Todos os três tiveram significativa
influência chinesa, principalmente com relação aos assuntos
de Estado, política e leis. Há relatos de chineses de que
todos, sem exceção, sabiam de cor recitar os ensinamentos
clássicos chineses confucianos e seus discípulos. Apesar
disso, foi mantido algo que os distinguia dos chineses, na
língua e nos costumes. Cada reino manteve suas tradições
cerâmicas distintas [5]. Os monumentos funerários,
chamados de kobun, presentes nos três reinos demonstram
estilos diferentes atendendo a padrões regionais. Túmulos
de pedra apresentam murais pintadas nas suas câmaras em
Koguryo. As câmaras em Paekche são arqueadas, e em Silla,
os túmulos são de madeira recobertos por pedras.

Foi por volta da consolidação desses três reinos que


houve registros de povos que habitavam ilhas mais ao leste,
chamados de Wa. Principalmente de Silla, houve migração
de algumas comunidades da península para as ilhas
meridionais e ocidentais do arquipélago japonês nos
primeiros séculos de nossa era. Ainda mais recuado no
tempo, certamente houve a influência por migração dos
conceitos cerâmicos presentes na chamada cultura de Yayoi
no Japão no século 4 a. C. que compartilha as
características da cerâmica coreana da mesma época.
Ademais, há semelhança na língua japonesa antiga no norte
da ilha de Kyushu com a língua de Koguryo. E foram
imigrantes de Paekche que depois atravessaram os mares
ao leste de fins do século 4 ao 7 e depois influenciaram na
disseminação do budismo, no fortalecimento de líderes
locais do clã dos Yamatos e até mesmo nas técnicas
agrícolas e metalúrgicas como a forja de espadas [6].

O budismo adveio após uma série de interações através


das regiões ocidentais da China que lidavam com rotas para
a região do norte indiano, Paquistão e Afeganistão. Essa
religião, nascida na Índia, chegou aos domínios chineses por
volta do segundo século de nossa era, e teve grande apelo
por sua mensagem universal e não-exclusivista. Qualquer
um, em suma, poderia alcançar a iluminação espiritual, sem
distinções sociais, de gênero e etnia. Mas essa religião teve,
contudo, que lidar com as religiosidades anteriores na
China. Uma dessas era o Taoísmo, que oferecia uma
explicação e inserção cósmica do seu no universo, algo que
serviu de contraponto às limitações e abusos do sistema
confuciano oficial adotado pelo Estado chinês ao longo de
sua história. Se os ensinamentos de Confúcio e de seus
discípulos defendiam a ordem, a hierarquia, a obediência e
harmonia, o taoísmo, por vezes, buscava libertar o indivíduo
do constrangimento social e político para uma plena
realização pessoal.

Foi um monge budista da cidade de Dunhuang que


traduziu as escrituras budistas da escola Mahayana do
sânscrito para o chinês. Depois de longo tempo, esse
budismo começou a se ampliar na China em período de
instabilidades e desunião no século 4. Foram as dinastias de
nômades que abraçaram essa nova religião e a
promulgaram. Uma dessas dinastias, a de Qin (351 – 394)
foi entusiasta em promover o budismo, considerando suas
origens com os tibetanos, nação que cedo incorporou os
ensinamentos de Buda. E a partir disso, o budismo se
espalhou para outras partes da China e mundo asiático. Em
determinado momento, um monge budista, Sundo (ou
Shundao, em chinês), advindos do reino de Qin, foi para as
regiões orientais e chegou a Koguryo em 372. E ali
descobriu que as práticas xamanistas eram predominantes
entre os nativos. O rei de Koguryo, Sosurim (r. 371 - 384),
ficou fascinado e atraído com a nova religião que, além de
satisfazer suas curiosidades a respeito da ordem cósmica e
busca pela iluminação espiritual, acolheu os ensinamentos
do novo credo espiritual e tornou-o uma religião do Estado.
São decorrentes dessa decisão que as primeiras imagens e
estatuetas de Buda desse período, em bronze dourado,
usados como talismãs, são hoje encontrados em alguns
museus em Seul e no mundo.

A aceitação do budismo pelo rei de Koguryo condisse com


seu plano ambicioso de sistematizar seu governo em novos
termos burocráticos e ter maior apelo de integração social
no seu reino. Koguryo, anteriormente, era mais uma coleção
de clãs e lealdades que, com o budismo promovido, poderia
cimentar numa nova unidade político. Ademais, o budismo
poderia ofertar novas alianças e contatos internacionais,
indo além de sua localidade no nordeste asiático.
Juntamente com o budismo, o confucionismo foi adotado
pelos subsequentes governantes de Koguryo para
estabelecer um sistema hierárquico e burocrático do reino.
Tanto foi assim que foram estabelecidas academias
confucianas e, decorrente disso, instituídas carreiras para os
magistrados e funcionários do Estado, seja para
sistematizar e manter o funcionamento da máquina do
governo, seja para manter os registros e compilar a história
do reino. Portanto, o budismo e confucionismo serviram,
fundamentalmente, para estruturar e manter o nascente
reino coreano.

Isso não ocorreu apenas em Koguryo. Alguns anos depois,


em 384, o reino de Paekche implementou iguais medidas
quando foram decretadas como oficiais pelo rei Chimnyu (r.
384 – 385) os ensinamentos do monge indiano Marananta
(ou Malananda). E, mais tardiamente, também
institucionalizados por Silla em 527, um outro nascente
reino coreano, Kaya, e, mais ao leste nas ilhas meridionais
japonesas, por Wa em 584. Esse último reino, pela sua
distância geográfica da península, somente irá plenamente
reformar seu sistema político e jurídico após a Reforma
Taika feitas pelo príncipe Shodoku em 654.

O fato mais notável da região coreana se dá com uma


impressionante estela de sete metros de altura encontrada
perto do rio Yalu, na Manchúria, em que se comenta sobre
os feitos de um rei de Koguryo, Gwanggaeto (r. 391 – 413).
Foi sob o reinado deste que Koguryo expandiu suas
fronteiras a incluir boa parte do nordeste asiático, desde o
rio Sungari ao norte, o vale do rio Liao ao oeste, a costa
marítima ao leste e o rio Han ao sul. O nome Gwanggaeto,
na verdade, é um nome póstumo, um título que significa
“território em expansão”, demonstrando que o reino estava
em sua plena capacidade expansionista. Seu verdadeiro
nome era Yongsak, e foi durante esse período que Koguryo
incorporou várias entidades políticas menores coreanas e
manchurianas. Em 427, alguns anos depois da morte de
Yongsak, seu herdeiro, Jangsu (r. 413 – 491). Koguryo viveu
seus tempos de auge, e o rei decidiu mudar a capital do alto
rio Yalu para Pyongyang, um antigo centro usado pelo reino
de Choson e pelos domínios administrativos de Lelang.

A estela ainda descreve feitos impressionantes do reino


Koguryo. As expansões do nascente império coreano foram
em todos os pontos cardeais, e essas descrições coincidem
com os relatos coreanos compilados pela primeira vez em
forma escrita no século 12. Os primeiros avanços se deram
ao norte, sobre o universo de nações nômades para depois
se consolidar ao sul, sobre o reino de Paekche. Ao leste, o
reino de Koguryo submeteu vários tribos e, por fim, foi ao
oeste onde enfrentaram o resistente império confederado
de Xianbei (à época referidos como reino de Yan Tardio,
compondo este um dos 16 reinos fragmentados em que se
encontrava a China em fins do século 4), povo nômade de
etnia proto-mongol. Os confrontos mais duradouros se
deram contra Paekche e Xianbei. Paekche tinha sido o reino
mais poderoso e organizado da península coreana, mas
acabou rendendo-se ao rei Gwanggaeto em 396. Na virada
do século 5, Koguryo conseguiu o feito de derrotar novas
investidas de uma aliança do reino de Paekche, Kaya e de
Wa. Em 407, o rei de Koguryo lançou sua ofensiva mais ao
oeste, para garantir a plena segurança de suas fronteiras, e
conquistou a estratégica península de Liaodong. Pondo
termo às ameaças principais que poderiam vir do sul e do
norte e oeste.
A península coreana testemunharia mais uma ascensão
política notável a partir do século 6. Silla, um reino coreano
que tinha se consolidado na ponta sudeste, esse pequeno
reino inicialmente era de pouca expressão tal como a sua
vizinha, Kaya. A mudança dos ventos históricos começou
com uma confederação feita mais ampliada, a envolver
mais seis grupos clânicos, a ser regido por uma figura de
chefia e rei, cujas decisões eram submetidas a um conselho
de chefes. Esse sistema era designado como hwabaek. Com
o passar dos tempos, a figura do rei concentrou ainda mais
seu poder de decisão, consolidando a dinastia dos clãs dos
Kims e Paks em meados do século 4. Posteriormente, esse
sistema ampliou-se para organizar a sociedade de Silla em
hierarquias, com as famílias reinantes no topo e a
burocracia e mão-de-obra diversa nos níveis abaixo. Essa
hierarquia, influenciada em parte por ideais confucionistas
de ordem e respeito, era conhecida como kolpum,
“classificação óssea”. No qual o status era reservada para
aqueles que pertenciam a um grupo determinado por laços
familiares, de sangue, ou melhor, de osso. Aqueles que
tinham o “osso sagrado” (seonggol, ) poderiam almejar
às posições de comando do reino. Até meados do século 7,
somente os de “osso sagrado”, estritamente aqueles
descendentes dos Kims e Paks, poderiam suceder ao trono.
Os demais membros poderiam almejar outros cargos, desde
que pudesse ser comprovada as ligações familiares ou
aliados. Nesse sentido, foi garantido ao reino de Silla certa
coesão e homogeneidade à elite governantes, que com o
tempo foi incorporando as lideranças de outros estados
conquistados.

O budismo também se fez presente em Silla, apesar de


ter sido mais tardio do que ocorreu em Koguryo e Paekche.
Inicialmente, o apelo universal e irrestrito budista chegou a
apenas aos plebeus. Com o passar das décadas, no início do
século 6, o budismo começou a ser aceito entre membros
da elite de Silla. Em 527, o rei de Silla, Beopheung (r. 514 -
540), acabou oficializando o culto após o martírio do monge
budista Ichadon (ou Geochadon, , 503 – 527), figura
bastante popular e secretário do rei. A sua morte adveio,
conforme nos narram as crônicas budistas coreanas
compiladas no século 13, Ichadon manifestou um milagre no
momento de sua morte para impressionar e converter a
aristocracia de Silla. Conforme nos narra em maiores
detalhes a sua morte, sua profecia no momento de sua
execução foi cumprida. Toda a extensão da terra tremeu, o
sol escureceu, flores choveram dos céus e sua cabeça
cortada planou em direção às montanhas sagradas de
Geumgang, e leite jorrou abundantemente de seu corpo
decapitado. O presságio impressionou a todos os presentes
e isso foi considerado como uma manifestação dos céus, de
que o budismo deveria ser considerado como religião do
Estado. Todos, aterrorizados, passaram a lamentar pela
morte do monge que passou a ser considerado como mártir
pela causa da retidão, da moral e do bom comportamento
(imbuídos no amplo conceito budista de darma). Uma vez
declarada como oficial, o budismo em Silla cresceu
rapidamente que serviu como base de ordenamento e
coesão social do reino.

Algumas décadas depois, no mundo político, Silla


mostrou-se forte o suficiente para denunciar sua histórica
aliança com o reino de Koguryo, ao norte. E Silla passou a
procurar acordos mais vantajosos com o reino vizinho de
Paekche visando invadir e expandir às custas do pequeno
reino de Kaya. Em 532, Kaya foi em grande parte anexado
pelos dois reinos aliados. O avanço mais dramático de Silla,
contudo, se deu em 553, quando conquistou todo o vale do
rio Han que percorre o centro da península coreana. Após
esse feito, o rei de Silla, Jinheung (r. 540 - 576), mandou
erguer grandes monumentos para marcar suas novas
fronteiras. O que motivou o desagrado de Paekche que tinha
antes ocupado a região. Foi por isso que Paekche passou a
atacar Silla em 554, resultando na derrota decisiva do rei de
Paekche, Seong (r. 523 - 554). Muito do sucesso das rápidas
ofensivas de Jinheung se deve pelo eficaz uso em campo
aberto de sua cavalaria altamente disciplinada, chamada de
hwarangdo( ). Em 562, Silla finalmente anexou
totalmente o reino de Kaya, e passou então a comandar
toda a região central e costa oriental da península coreana.
Haveria ainda alguns séculos restantes em que Paekche,
Silla e Koguryo iriam se digladiar em conflitos e alianças a
competir pela hegemonia, mas seria Silla que,
eventualmente iria se sobrepor a todos no século 7.
2 A UNIFICAÇÃO E O SÁBIO DA MADRUGADA

Em fins do século 6, a China voltou novamente a se unificar


sob a dinastia Sui após quase três séculos e meio de
fragmentação de numerosos reinos. O novo império chinês
serviu depois de base para uma era mais duradoura de
unidade sob a dinastia Tang (618 – 907). Esse novo
ordenamento chinês teve consequências sobre os reinos
coreanos, cada qual buscou enviar emissários para a corte
Sui a renovar os laços diplomáticos. Dos três reinos
coreanos, Koguryo, Silla e Paekche, o mais setentrional, o de
Koguryo, apresentava problema evidente de fronteira e
ameaça ao nascente império chinês. Em 598, o imperador
Sui declarou guerra à Koguryo. Yangdi (r. 604 – 618),
governante chinês no início do século seguinte, seguindo
suas ambições expansionistas tentou invadir Koguryo por
três vezes a partir de 612. As consequências dessas
prolongadas campanhas revelaram-se onerosas e
desastrosas para a corte Sui que depois chegou ao seu fim
em 618.

À época das grandiosas invasões chinesas, que fontes


chinesas indicam que envolveu mais de um milhão de
soldados mobilizados, um ministro de Koguryo, Eulji
Mundeok (? - ?) revelou seu brilho estratégico e militar na
resistência aos chineses. Suas vitórias decorreram do hábil
e preciso contra-ataque no recuo das forças chinesas ao
cruzarem o rio Salsu (hoje em dia, o rio Cheongcheon) em
612. Com esse feito, o general coreano tornou-se uma
figura heroica cultivada nos séculos posteriores.

A crise gerada no império Sui abriu oportunidades para


que outras lideranças chinesas se proclamassem
imperadores. Em 618, Li Yuan, um general tomou o trono
imperial e estabeleceu uma nova linhagem dinástica, a
Tang. E assim como no passado, os reinos coreanos, uma
vez considerando a estabilidade do novo poderio imperial
chinês, mandaram emissários. Koguryo, inicialmente,
apresentou-se como inofensivo e aberto aos bons contatos.
No entanto, pouco anos depois, sob o imperador Tang,
Taizong (r. 626 - 649), as relações entre as duas partes
azedaram decorrente dos planos ambiciosos da China sobre
as regiões periféricas do império. Depois de subjugar povos
túrquicos no oeste chinês em 630, a atenção do imperador
voltou-se para o leste, para Koguryo. Em 642, foram
erguidas uma série de fortificações na fronteira do reino
coreano frente aos chineses, sob a supervisão de Yeon
Gaesomun (603 – 666) que depois conseguiu eliminar seus
rivais políticos com um golpe de Estado e nomeou-se como
plenipotenciário do reino de Koguryo, tornando-se de fato o
governante.

A política de Yeon Gaesomun mostrou-se mais agressiva


não somente aos chineses, mas também aos outros reinos
coreanos ao sul. Reconhecendo o poder de Koguryo ao
norte, representantes do reino de Silla aliaram-se para
atacarem em conjunto o reino de Paekche. Mas essa busca
de aliança não durou muito, pois Koguryo buscou depois
aliar-se a Paekche, o que provocou a busca de aliança de
Silla com o império chinês Tang. Em 644, o imperador
Taizong, decidiu então enviar uma expedição contra
Koguryo que enfrentou duras resistências na península de
Liaodong que perdurou por anos. Taizong, cansado dos anos
de guerra, resolveu então retirar-se das linhas ofensivas e
passou a apoiar o seu aliado na península coreana, Silla, a
combater Koguryo.

O poderio ascendente em Silla se deu por um processo


interno de disputas pelo poder. Durante o reinado da rainha
Sondok (r. 632 – 647), membros da aristocracia hwabaek
tentaram dar um golpe mas que foi logo reprimida por
monarquistas liderados por Kim Chunchu (604 – 661) que
acabou se tornando na maior figura política de Silla da
época. Quando Sondok veio a falecer, sua herdeira, a rainha
Chindok (r. 647 – 654) foi a última linha dos monarcas que
seguiram o sistema do “osso sagrado” (seonggol). Nesse
meio tempo, conforme dito, Silla estava se comprometendo
cada vez mais com a China dos Tangs. Em 648, Kim
Chunchu foi enviado como emissário mais uma vez para a
capital chinesa, Changan. E voltou prometendo adotar todos
os protocolos, rituais e vestimentas cerimoniais chinesas na
corte de Silla, visando impressionar o imperador Taizong.
Tais gestos de respeito e compromisso sem reservas do
reino Silla resultou fortaleceram ainda mais a aliança entre
os dois reinos asiáticos.

No âmbito social e militar, Silla nos séculos 6 e 7


institucionalizou o hwarangdo (“Caminhos dos Cavaleiros
Florescentes”, ). Esse consistia basicamente num grupo
selecionado de membros jovens (nangdo) da elite coreana
que foram selecionados através da demonstração de
coragem, lealdade, respeito aos valores tradicionais e
versados nas artes e poesia. Cada unidade desses jovens
era liderado por um hwarang( ), membro das famílias
pertencentes aos “ossos sagrados”, como o foi Kim
Chunchu. Com frequência, monges budistas se juntaram a
esses grupos como conselheiros e guias espirituais. Tal
corpo disciplinado e motivado de jovens retrata bem o
espírito de Silla na época, cuja identidade nacional estava
florescendo e estimulado para eventuais conquistas na
península coreana.

O hwarang mais conhecido de Silla foi Kim Yushin (595 –


673), descendente de um rei de Kaya, que havia sido aceito
como membro dos “ossos sagrados” depois que o citado
reino de seu antecessor foi derrotado em 532. Foi Kim
Yushin que, no início do século 7, liderou um grupo de
hwarangdo, chamados de Yongha hyangdo (“Discípulos da
Fragrância da Flor do Dragão”) que acreditavam ser
escolhidos pelas divindades a realizar a conquista de toda a
península coreana. Foi com esse espírito de motivação que
Kim Yushin, que era cunhado de Kim Chunchu que chegou a
ocupar o trono de Silla em 654, assumindo o nome real de
Muyeol (r. 654 - 661).

Paekche, sentindo-se cada vez mais ameaçado e


cercado pelos reinos rivais de Silla e da China Tang, buscou
então assegurar novas alianças na região asiática. Koguryo,
aparentemente, apresentou-se dúbia e com certa lealdade a
Paekche, mas talvez temeram ainda mais rivalizar-se com a
China dos Tangs. Foi então que os governantes de Paekche
mandaram emissários mais para o leste, para o reino
consolidado de Wa sob os Yamatos nas ilhas japonesas que
depois firmou-se numa renovada aliança em 653. De 655 a
659, Paekche parece ter convencido Koguryo no norte a
mobilizar suas tropas, e os dois reinos começaram a
assediar as fronteiras de Silla. Como resposta, os
governantes de Silla solicitaram a ajuda da China. Os Tangs,
em 660, enviaram uma força naval de cerca de 130 mil
homens para o leste em direção à capital de Paekche da
época, Sabi (hoje, Puyo). Na linha oriental e terrestre, as
ofensivas ficaram sob o comando de Kim Yushin, Pumil e
Humchun a avançar com uma força estimada em 50 mil
homens. Ao que resultou numa das maiores batalhas
conforme descrita pelas crônicas históricas coreanas do
século 12, o Samguk sagi (“História dos Três Reinos”, ).
A batalha de Hwansanbeol. Nesses confrontos, foi narrado a
extremo auto-sacrifício do general de Paekche, Kyebaek (? –
660), que, ciente de seu destino e do reino, mandou
sacrificar toda sua família a evitar uma vida de escravidão.
Ao que depois liderou uma carga suicida de 5 mil guerreiros
contra a ofensiva de Silla. Derrotadas as forças de Kyebaek,
as forças aliadas de Silla e Tang chegaram a ocupar a
capital de Paekche depois de uma feroz batalha em 660, em
que foi morto o último rei, Uija.

O sucesso militar incitou a diferenças de planos entre a


China sob o imperador Gaozong (r. 649 – 683) e de Silla a
respeito do futuro da península coreana. Os chineses
almejaram estabelecer uma presença definitiva na parte
oriental da península, ao passo que Silla, consciente das
ambições de Gaozong, buscou consolidar seu domínio
coreano. De fato, embora as lendas conforme nos conta o
Samguk sagi que enfatiza as sábias decisões do rei Muyeol,
parece que o império chinês não conseguiu manter sua
presença no território Paekche, distante do território chinês
e cercado pelas forças terrestre próximas de Silla. Ademais,
os aliados de Paekche, os japoneses de Wa, haviam
chegado do mar a serem enfrentados. Ao fim dos
confrontos, membros da família real de Paekche buscaram
exílio nas ilhas japonesas e buscou nos anos seguintes
organizar a resistência contra as forças de ocupação de
Silla. Em 666, as forças de resistência de Paekche e das
forças navais japonesas aliadas foram definitivamente
derrotadas e foi dado o término de Paekche.

O império Tang, a bem da verdade, não tinha


simplesmente desistido de Paekche. Mas buscou algo mais
premente em suas fronteiras a assegurar sua segurança na
sua região nordeste. E o seu alvo foi o reino de Koguryo. Em
661, Gaozong organizou uma expedição de cerca de 350 mil
homens e pediu ajuda a Silla. O maior líder militar de Silla,
Kim Yushin conduziu suas tropas de suprimentos em direção
à capital de Koguryo, Pyongyang. No entanto, Pyongyang
revelou ser uma fortaleza inexpugnável, mesmo com um
cerco de suas muralhas de oito meses. Em Paekche, agora
derrotado e ocupado, o imperador chinês resolveu nomear
um governador local, gerando desgaste com os governantes
de Silla. Essa espécie de pax sinica na península coreana,
instituída pelos Tangs, aos olhos de Silla, revelou ser um
prenúncio de futuras mudanças na região.

As mudanças repentinas no status da região começou


com o falecimento do líder de Koguryo, Yeon Gaesomun (r.
642 – 666), em 666. Foi então aberta a oportunidade para
as ofensivas chinesas e de Silla. A morte do governante
abriu um vácuo de poder e incertezas de sucessão ao trono.
Em 668, Pyongyang, dividida e sem um claro comando, foi
fustigada e atacada. Os filhos de Yeon Gaesomun, incapazes
de se resolverem, caíram diante dos invasores. Pyongyang
foi ocupada e a hegemonia de Koguryo na região nordeste
asiática, nas fronteiras com a China Tang, esvaneceu. Após
a conquista de Koguryo e da submissão de Paekche, o
império Tang tentou estender sua dominação sobre toda a
Manchúria e noroeste da península coreana, tal como havia
sido feito pela dinastia Han no passado.

Em 669, o governo chinês estabeleceu na região


províncias administrativas em torno de Pyongyang com o
propósito de controlar os territórios fronteiriços. Esse
protetorado era um dos maiores do império chinês, que
revelou ser frágil e incerto pelas vivas resistências de outros
líderes perseguidos de Koguryo. Alguns desses haviam sido
presos e mortos, mas outros conseguiram fugir para
encontrar abrigo em territórios de Silla e até mesmo no
arquipélago japonês. Em vista disso, Silla, aproveitando-se
da inquietude ao norte da península, resolveu buscar
expandir seus domínios sobre Paekche. O que irritou os
Tangs, que responderam com pressões diplomáticas e
mesmo passou a ameaçar os familiares do rei de Silla que
viviam na capital Tang. Parecia que era inevitável a guerra
entre Silla e a China Tang na segunda metade do século 7.

Felizmente, para Silla, parecia que o destino era


favorável. O imperador Tang, Gaozong, estava mostrando-se
doente e a regência imperial passou para a imperadora Wu
(Wu Zetian, r. 690 - 705), que adotou uma política mais
pacifista. Ademais, houve a ascensão de outras ameaças
nas fronteiras chinesas no sudoeste, entre os tibetanos,
divergindo os recursos antes voltados à região nordeste da
China. Mesmo assim as forças de Tang foram formidáveis e
somente foram derrotados por Silla em 675 em batalhas ao
norte do rio Han e na costa ocidental coreana. Sendo assim,
o protetorado chinês no norte coreano deslocou-se de
Pyongyang para mais ao oeste, na península de Liaodong
em 676. Uma retirada de suas forças de ocupação da área e
um significativo avanço de Silla sobre toda a região norte
coreana. Silla havia tomado controle de toda a península e o
que restou dos antigos três reinos coreanos agora foram
feitas em províncias com suas capitais regionais. Kyongju,
na costa leste coreana, tornou-se a capital de toda Silla
expandida (mapa). Os antigos aristocratas de Paekche,
Koguryo e mesmo da pequena Kaya, do passado, foram
incorporados na classe dominante de Silla. Silla, nesse
sentido, foi a primeira expressão unificada da península
coreana.
Mapa: O reino de Silla no seu auge em 576 d. C.

A capital de Silla, Kyongju, rivalizava em pujança com a


cidade imperial de Xian da China e de Nara, no Japão, e foi
uma das cidades mais prósperas do leste asiático nos
séculos 8 e 9. A população foi estimada em torno de 200 mil
pessoas e seu habitantes iam desde aristocratas,
funcionários, sacerdotes, soldados, comerciantes, artesãos,
artistas e escravos. A maioria das habitações eram
abrigadas por telhados de azulejos decorados, e raramente
se via um telhado de palha como nos narra o Samguk yusa.
Os palácios reais eram cercados por jardins e lagos
planejados, e os templos budistas eram onipresentes.
Lamentavelmente, quase tudo foi destruído durantes as
guerras contra os mongóis no século 13 e, depois, contra os
japoneses em fins do século 16. Restaram apenas algumas
esculturas de pedra, e restos de relevos e estruturas de
palácios e templos. Mesmo assim, diante do que é
testemunhado e pelo primor dos detalhes artísticos, Kyongju
foi declarado como Patrimônio Cultural da Humanidade pela
Unesco no ano de 2000.

As crônicas reunidas no Samguk yusa nos dão detalhes


da vida cotidiana em Kyongju no século 9. Os templos eram
vibrantes nos seus cultos, e músicas fluíam nas ruas dia e
noite. Uma das canções mais célebres citadas é a “Canção
de Choyong” (Choyong ka), musicada no ritmo poético da
época conhecido como hyangga (ou saenaennorae). Os
versos cantados foram escritos em idu, que era o coreano
em caracteres chineses. De acordo com a lenda, na “Canção
de Choyong”, Choyong possuía dons mágicos, era filho do
Dragão do Mar do Leste e chegou à capital para servir ao rei
de Silla. Sendo assim, o rei deu-lhe um título e uma esposa.
Certa noite, ao voltar de uma festa, Choyong encontra sua
esposa sendo seduzida por um espírito maligno, chamado
de Demônio da Praga, metáfora para os males do mundo.
Choyong chega a perdoar a todos, mas com a promessa de
que o espírito nunca mais entrasse em nenhuma casa com
o retrato do herói na porta. A canção que Choyong declama
é tão encantador e belo que faz com que o espírito do mal
parta em paz:

Tendo me arrastado até tarde da noite

Na capital da lua,

Voltei para casa e na minha cama

Eis quatro pernas.

Dois eram meus;

De quem são os outros dois?

Anteriormente dois eram meus;


O que deve ser feito agora depois que foram tomados? [7]

(tradução nossa)

Na sociedade de Silla, o poder se estabeleceu num


sistema de impostos e trabalho prestado ao senhor de terra,
algo similar à corveia europeia. No topo da pirâmide social
havia os pertencentes ao “osso sagrado” (seonggol) que
ocuparam exclusivamente o trono real até o fim do governo
de Muyeol em 661. Após isso, outras famílias aristocráticas
puderam ter a perspectiva de ocupar o poder e altos cargos
de autoridade, como as famílias Bak e Seok da capital,
Kyongju. Para tanto, esses membros foram considerados
como “osso legítimo” (jingol, ) e passaram a governar o
reino quando promoveram uma série de reformas
administrativas e burocráticas a partir da segunda metade
do século 7. Essas reformas foram em grande parte
inspiradas no confucionismo, ideologia que busca assegurar
a lealdade e obediência ao monarca mantendo, nesse
sentido, a ordem e paz do sistema político. Em 682, o rei
Sinmu (r. 681 - 692) fundou a Academia Nacional (Gukhak),
de cunho confuciana, única instituição de ensino superior do
reino de Silla. Neste local, os alunos aprenderam os
clássicos confucionistas.

Apesar das reformas confucionistas implementadas ao


longo dos séculos 7 e 8, contudo, o sistema hereditário de
privilégios aos altos cargos, conforme os pertencentes à
categoria restrita dos “ossos” (kolpum ou golpum), manteve
restrita o acesso universal ao poder de Silla. De fato, Silla
era um reino aristocrático. Não importava o quão sábio e
talentoso de um indivíduo se não pertencesse aos membros
privilegiados. Poderiam ao máximo ser indicados aos cargos
logo abaixo dos “ossos legítimos” quando demonstrado sua
presteza e talento. Nesse sentido, os estudantes que
entravam na Academia Nacional foram aqueles não
pertencentes à elite dos “ossos”, pois esses não precisaram
demonstrar nenhum talento ou estudo para os cargos
máximos.

Outros membros ambiciosos partiram para outras


carreiras, como o sacerdócio budista, e outros foram para a
China dos Tangs a tentar ser aprovado nos exames
confucionistas universais. Um desses coreanos aprovados
na China foi Choe Chiwon (857 - ?) que depois se tornou
numa das figuras mais sábias de Silla. Ao voltar para sua
terra natal, no entanto, frustrou-se por não ter conseguido
reformar o sistema coreano de privilégios hereditários.
Desapontado, retirou-se para uma vida de eremita nas
montanhas. Muitos dos maiores sábios coreanos advieram
de famílias não-pertencentes à categoria dos “ossos
legítimos” ou “ossos verdadeiros”. Mas foi esse sistema
fechado que manteve a consolidação da unidade do reino,
apesar das pressões de reformas por aqueles
marginalizados como Choe Chiwon.

Talvez a consequência mais nefasta desse sistema


restrito e privilegiado foi a ineficácia dos ocupantes dos
altos cargos burocráticos. Durante as últimas décadas do
reino de Silla, no final do século 9 em diante, à época de
Choe Chiwon, estava evidente a crise e instabilidade no
poder, uma vez que foram mais de vinte reis a se
sucederem após períodos de luta e disputas entre as
famílias reinantes. Um dos episódios mais dramáticos
registrado no Samguk sagi, obra do século 12, é o da vida
de Jang Bogo (745 - 846), um talentoso líder guerreiro de
origens plebeias que depois ascendeu ao oficialato na China
Tang. Retornado a Silla, foi nomeado como comandante das
forças navais coreanas a combater os piratas nos mares da
região. Depois de ter estabelecido a ordem marítima, o
comércio entre a China e o Japão prosperou novamente, e
Jang Bogo, tendo ganhado o controle de uma ilha
estratégica na região, a de Cheonghae, acumulou fortunas.
Sua vida ambiciosa chegou ao fim quando tentou indicar
sua filha como rainha ao trono de Silla a se casar com o rei
Munseong (r. 839 - 857), filho de Sinmu, indo contra os
princípios do sistema de classificação por “ossos” (kolpum).
Irritado contra as convenções da tradição, Jang Bogo se
revoltou e depois foi morto em 846 por um enviado da corte
de Silla na sua ilha de Cheonghae.

No campo religioso, houve uma fusão das tradições


budistas dos três reinos coreanos em Silla. Esse reino, por
ter sido o último a se converter, abraçou com entusiasmo os
ensinamentos e mandou vários estudantes e monges ao
exterior para conhecer melhor as doutrinas do budismo
maaiano [8]. Foi essa vertente que chegou a dominar,
portanto, Silla no século 7, graças à ampla difusão de
textos, livros e estudos traduzidos do sânscrito para o
chinês. Nem por isso deixou de haver discussões
doutrinárias na península. Um dos maiores debates da
época envolveu o assunto de como cada pessoa nasce
disposta com as qualidades a atingir o estado espiritual que
Buda alcançou. Alguns criticaram essa visão, defendendo
que os seres humanos não nascem com essa disposição
fundamental para se tornarem Budas.

A maioria dos eruditos coreanos rejeitou essa ideia.


Entre os mais famosos destacou-se o mestre Wonhyo (617 –
686), que abraçou as várias tradições budistas coreanas e
lançou as bases sobre as quais iria se assentar o
maaianismo em Silla e também na China e Japão nos
séculos seguintes. Wonhyo, que significa “madrugada”,
nasceu numa família sem ligações aristocráticas. Seu brilho
na juventude era tamanho que ele nem precisou de mestres
antes de se tornar no principal sacerdote de um templo.
Certo dia, Wonhyo avistou algumas abelhas e borboletas,
voando de flor em flor, e sentiu disso um imenso desejo por
uma mulher. Considerando isso, o rei de Silla ofertou sua
filha viúva, a princesa Yosok. A caminho do palácio da
princesa, Wonhyo caiu num riacho e, assim que chegou ao
seu destino, a princesa mandou o mestre entrar para trocar
as roupas molhadas. Naquela noite, os dois compartilharam
a cama e que, mais tarde, nasceu um filho, chamado de Sol
Chong. O filho cresceu nos círculos mais altos da sociedade
e revelou extraordinária inteligência para as letras,
padronizando o chinês clássico para a língua coreana.

Wonhyo, tendo quebrado seu voto de celibato, trocou


suas vestes de sacerdote para roupas seculares, passou a
dedicar sua vida a compor poemas e músicas para melhor
ensinamento das virtudes budistas. Indo de aldeia a aldeia,
cantando, dançando e recitando, Wonhyo fez chegar sua
mensagem a milhares de pessoas, do mais humilde ao mais
nobre. Sua mensagem até os dias atuais ainda é recitada
por budistas coreanos. Apesar de seu comportamento
heterodoxo ser condenado pela tradição budista que
desencoraja a dança e canto, Wonhyo utilizou-se das suas
aptidões inerentes de comunicação e carisma como meio
voluntário (upaya) para buscar a salvação de todos os seres
vivos. Um dos episódios mais famosos de sua vida, narrado
no “Bebendo Água de uma Caveira”, remete a uma viagem
que ele fez para a China. No caminho, uma tempestade
irrompeu que o levou a buscar um abrigo numa caverna
subterrânea. No dia seguinte descobriu que o local onde
havia dormido era uma câmara funerária, e ele então se viu
incapaz de dormir lá pacificamente na noite seguinte.
Percebendo que as circunstâncias físicas não haviam
mudado, mas apenas sua mente a respeito [9].

Ao norte do reino unificado de Silla, o império Tang foi


incapaz de assimilar o território conquistado de Koguryo. Em
fins do século 7, povos nômades das estepes, khitans,
revoltaram-se contra o império chinês, reduzindo o alcance
de influência da dinastia Tang sobre todo o nordeste chinês
na área do rio Liao, onde muitos habitantes do ex-reino de
Koguryo haviam sido relocados. Um dos ex-líderes de
Koguryo, Dae Jung-sang (? - 690), agora enxergou a
oportunidade histórica e organizou uma ofensiva para o
leste através da vastidão da Manchúria a fim de fugir do
controle chinês e do reino coreano ao sul.

Esse estabeleceu-se no vale do rio Mukden em 696 e


fundou um reino chamado de Parhae (mapa) ( , Balhae ou
Pohai em chinês) e imediatamente mandou emissários para
Silla e a povos túrquicos nômades na Mongólia. Apesar de
se consolidar como um amplo reino no norte coreano,
muitos historiadores debatem se de fato foi coreano, pois
sua população era um composto de múltiplas etnias,
inclusive nômades das estepes e chineses. Para agravar
ainda mais, poucos registros foram feitos por esse reino, e
devemos contar com o que foi anotado por testemunhas de
Silla, Tang e do Japão. De acordo com esses poucos
fragmentos, o reino foi fundado por remanescentes de
Koguryo e de um povo chamado de Malgal, ancestrais dos
manchus. Acredita-se que os governantes a elite de Parhae
eram líderes do extinto Koguryo e o povo Malgal compunha
a base popular e grupos semiautônomos governados por
seus chefes locais submetidos à autoridade central de
Parhae.
Mapa: O reino de Parhae (Balhae) e Silla ao sul, século 8 d. C.

Parhae recuperou a maioria dos domínios antes


submetidos a Koguryo. O que gerou novas tensões na região
da Ásia oriental, que provocou novos diálogos entre Silla e a
China Tang. Parhae, considerando suas possibilidades,
sondou e buscou articular-se com o Japão dos Yamatos e
outros poderios autônomos além das muralhas e
fortificações chinesas. Incapacitada e limitada em seus
recursos, a China Tang aceitou inicialmente o status de
Parhae, no século 8, e consolidou assim a Pax Sinica na
região.

Um dos personagens mais notáveis dessa época do


século 8 foi um monge coreano que viajou por inúmeras
terras, através da China, Índia e além para estudar os
ensinamentos de Buda. Seu nome era Hecho (ou Hyecho)
(704 - ?). Em seu diário de viagem, Hecho fez inúmeras
anotações que retrata o amplo mundo budista em que vivia
[10]. No início do século 20, um explorador francês, Paul

Pelliot (1878 - 1945), descobriu uma série de cavernas de


Dunhuang, no oeste chinês, que guardava incontáveis
documentos, registros e pinturas do efervescente mundo de
trocas e viagens ao longo da Rota da Seda do século 8. Foi
nessas cavernas que foram encontradas os registros de
Hecho.

O comércio asiático era frenético, de acordo com os


achados e registros nas citadas cavernas. Houve
significativa demanda de produtos coreanos de Silla, desde
a ávida elite em Xian ao arquipélago japonês. Entre os
mercadores muçulmanos que comerciavam nas extensões
asiáticas mais ao oeste, os produtos coreanos eram
altamente apreciados. Os árabes, no século 9, acreditavam
que Silla era uma terra abundante de ouro. Além disso, os
finos têxteis e produtos fitoterápicos da Coreia eram
demandados, em contrapartida à sede coreana por seda,
pedras preciosas asiáticas e obras escritas chinesas era
evidente. Foi nessa demanda que a cultura da corte de
Tang, que revelou ser uma das idades de ouro nas artes e
conhecimento da história chinesa, floresceu entre os
círculos da corte e eruditos coreanos em Silla, mas também
em Parhae e no Japão. Essa rede comercial frutificou no
estabelecimento de comunidade de coreanos de Silla na
península chinesa de Shandong, e também mais ao sul, na
foz do rio Yangzi, chamada de Silla bang, nos séculos 8 e 9
[11].

As artes budistas floresceram nessa época em terras


coreanas. Foram incontáveis templos construídos nas
montanhas e em Kyongju, com amplos e decorados
santuários, pagodes, sinos e outros. Sob o budismo, foi
revelada toda a habilidade artística na arquitetura, escultura
e pintura com vibrante realismo e detalhe. Um dos locais
mais notáveis dessa efervescência cultural é no templo de
Bulguksa, ou “Templo da Terra de Buda”, e na gruta de
Seokguram, construídos em meados do século 8 sob
orientação do ministro de Silla, Kim Daesong (701 – 774).
Essas duas edificações nos revelam muito do ardor religioso
e do poder influente das famílias aristocráticas, assim como
o sofisticado senso estético na arquitetura e escultura dos
artistas coreanos da época.

Ambas estão localizadas nas montanhas orientais de


Kyongju, e foram consideradas como Patrimônio Cultural da
Humanidade pela Unesco em 1995. São dois marcos
históricos que influenciou a cultura coreana nos séculos
posteriores. Dentro da gruta de Seokguram, há uma estátua
de Buda Sakyamuni que fica a leste, de modo que encontra
primeiramente a luz do sul nascente. Pois os budistas
coreanos acreditavam que a Terra Pura, ou paraíso, ficava
em algum lugar sobre o Mar do Leste. Buda Sakyamuni é
cercado por maravilhosos relevos de pessoas iluminadas da
tradição maaiana, ou bodisatvas. Entre esses, o mais
notável é o de Avalokiteshvara (ou Guanyin em chinês), a
deusa da fé e compaixão no budismo maaiano.

No templo de Bulguksa, perdeu-se as estruturas originais


de madeira durante a invasão japonesa em fins do século
16. No entanto, restam dois magníficos pagodes de três
andares, cada um com cerca de dez metros de altura,
chamados de Seokgatap (“Pagode de Sakyamuni”) e
Dabotap (“Pagode dos Muitos Tesouros”). Eles possuem
contornos únicos entre os pagodes construídos pelo mundo,
pelas linhas retilíneas e quadradas de Seokgatap e das
delicadas curvas que decoram o Dagotap. A simplicidade de
Seokgatap representa a brevidade da ascensão espiritual e
enfatiza isso nas suas formas mais sóbrias e moderadas.
Dagotap, em contraste, pelas suas curvas e insinuações,
representa o lado mais lírico, complexo e esplendoroso da
vida.
3 O GRANDE ANCESTRAL E AS GRANDES OBRAS
Em fins do século 9 a península coreana atravessou uma
série de rebeliões camponesas e de crises políticas
desagregadoras. As rebeliões em boa parte foram
motivadas pelos altos impostos dos cobradores e senhores
latifundiários locais. A China igualmente conhece na época
similar tendência de crise, pondo termo ao período Tang,
resultando num contexto de turbulência e retração da Pax
Sinica no leste asiático.

Na península coreana, a desordem foi agravada com a


emergência de inúmeros líderes locais de grupos e exércitos
armados que competiram entre si pelo controle das
províncias do decadente reino de Silla. O que restou da
autoridade de Silla, ao que parece, foi efetivamente apenas
em torno de algumas famílias nos arredores da capital,
Kyongju. Esses líderes locais, referidos como senhores da
guerra do século 9 tiveram várias origens. Alguns eram
oficias do exército, outros eram comerciantes poderosos, ou
monges, bandidos ou membros da aristocracia local
desesperados em manter sua tradicional dominação. A
maioria desses ascendeu de posições sociais mais baixas e,
uma vez alcançado a posição de autoridade, passaram a se
referir como “senhor” ou mesmo “general”. Os aristocratas
locais, por sua vez, eram pertencentes a grupos
marginalizados do sistema de famílias privilegiadas dos
pertencentes aos “ossos” (kolpum).

A turbulência sociopolítica em fins do século 9 é


comparável aos distúrbios associados ao declínio de cada
período dinástico chinês. No sentido de que a autoridade
central se apresentou débil e desarticulada frente às
pressões desagregadoras das províncias do reino. Como na
China, lideranças locais se ergueram de bases regionais de
poder e lutaram entre si pela hegemonia na península
coreana. Com base nisso, muito se comparou a Coreia dessa
época de crise com o sistema feudal. De fato, havia relações
de obrigações militares e de impostos a ser observado pelos
camponeses e vilas nas propriedades de um latifundiário
que, por sua vez, era responsável pela ordem, proteção e
paz de todos. O risco maior dessa interpretação, contudo, é
de se comparar à experiência europeia com o contexto
asiático. Na história coreana, não houve relações
contratuais entre as partes como o foi entre os senhores
feudais europeus. Seria melhor, talvez, em caracterizar o
sistema coreano como um de senhorismo ou manorialismo,
conceitos mais amplos de relação entre as autoridades
locais e o campesinato.

Como situar historicamente o período de desagregação e


crise do reino de Silla? Alguns historiadores atribuíram a
esse período como uma espécie de Idade Média. O que,
novamente, nos traz riscos de excessiva analogia com a
experiência europeia. Atendo-se aos fatos históricos, não
houve nenhuma significativa mudança socioeconômica
coreana no período, embora houvesse sinais de crise da
autoridade central. Cabe ressaltar que, já em 918, houve a
ascensão de uma outra dinastia, a de Koryo, que depois irá
consolidar a unificação da península coreana.

Em momento derradeiro, Silla entrou em colapso com a


culminação de uma série de crises de membros e poderios
locais que contestaram a dominação exclusivas de
determinadas famílias privilegiadas aos altos cargos de
comando. Economicamente, as finanças estatais de Silla
foram erodidas pela recusa ou excessiva isenção de
impostos a determinadas classes sociais e instituições,
como a budista. Socialmente, o sistema de “ossos” (kolpum)
estava desmoronando, revelando as crises de lealdades e
questionamentos à autoridade tradicional.

Nesse contexto, na virada para o século 10, duas figuras


históricas se destacaram. Gyeon Hwon (867 – 936) e Gung
Ye (c. 869 – 918) que haviam se tornado nos mais
proeminentes senhores da guerra na península do período.
Gyeon Hwon era um oficial militar dotado de excepcional
senso de estratégia e comando e comandou seus homens
principalmente nas regiões provinciais do sudoeste coreano,
no antigo território de Paekche. Gung Ye, por sua vez,
começou como um líder de bandidos nas regiões centrais
que antes pertenciam ao reino de Koguryo. Visando
consolidar suas autoridades e reunir as lealdades locais,
ambos se proclamaram como reis de Paekche e Koguryo,
respectivamente. Para distinguir esses dois reinos do
período anterior, os historiadores nomearam essas novas
entidades políticas de Paekche Tardio e Koguryo Tardio. Ao
que aponta para o período desagregador da Coreia a
conviver com o que restou de Silla, no chamado Período
Tardio dos Três Reinos (892 - 936).

Os três reinos coreanos depois seriam modificados pela


ação de um líder que teria repercussões em toda a história
coreana. Wang Geon (877 – 943) veio da costa ocidental da
península e sua família tinha prosperado com o comércio
com a China. Nos anos finais de Silla quando unificada, ele
emergiu como um poderoso líder local. Com o advento dos
Três Reinos, Wang Geon juntou seus domínios com o reino
tardio de Koguryo, ao norte, e serviu como ministro do
general Gung Ye. Em 918, Wang Geon deu um golpe e
depôs o rei Gung Ye para fundar uma nova dinastia coreana,
a de Koryo (ou Goryeo, ), escolhendo como capital a
cidade de Kaegyong ou Gaegyeong (atualmente, Kaesong).
A escolha do nome da nova dinastia é reveladora, pois foi
uma forma abreviada de Koguryo, indicando a ambição de
Wang Geon em recuperar o vasto reino antigo do norte
coreano e Manchúria.

De fato, Wang Geon mandou construir Pyongyang, antiga


capital de Koguryo, que havia sido abandonada por Silla.
Renomeou-a de Sogyong, “Capital Ocidental”, e isso deu
uma notável presença estratégica no norte coreano. Com as
duas capitais localizadas em lugares auspiciosos visando
um longo reinado dinástico, Wang Geon assegurou uma
vantagem geográfica em Gaegyong na região central ao
longo do rio Yesong, ao contrário da distante cidade de
Kyongju de Silla e Wansanju, capital do reino tardio de
Paekche. A localização da capital de Gaegyong obedeceu
também aos preceitos budistas de geomancia, em que se
acreditava que havia uma profecia de que um sábio
receberia o mandato dos céus para ser governante a partir
do local indicado. Entronado e assegurado seu poder e para
seus descendentes, Wang Geon depois receberia o honroso
título de Taejo, “Grande Ancestral” (r. 918 - 943).

Apesar da consolidação do reino de Koryo, os sucessores


de Taejo tiveram problemas prementes nas fronteiras. Muito
se deu com a ação coordenada dos povos khitans (ou
kitais), ancestrais dos mongóis, que tinha fustigado os Tangs
e fundaram uma dinastia, a de Liao, que controlou um vasto
território que incluía boa parte do norte chinês no século 8.
Era imperativo aos khitans proteger o vale do rio Liao que
tinha sido controlado pelo reino de Parhae, cujo povo Malgal
tinha se rebelado e depois se juntado em lealdade aos
khitans. O momento derradeiro veio em 926, quando o reino
dos khitans atacou Parhae e pondo fim à sua autoridade na
região da Manchúria.

Os fugitivos de Parhae foram buscar se reagrupar e se


aliar ao novo reino de Koryo, acreditando que esse reino
seria o sucessor do antigo Koguryo. Wong Geon recebeu-os
e se simpatizado com suas causas, enxergando neles povos
com origens étnicas semelhantes, pertencentes ao vasto
grupo que seria depois identificado como os coreanos, os
hans, yes e maeks. As tensões entre os khitans e Koryo se
deram, portanto, em grande parte nessa perspectiva. Em
934, Wong Geon decidiu conceder títulos e sobrenomes
reais ao príncipe herdeiro do antigo reino de Parhae quando
esse chegou a Koryo junto com milhares de súditos.

Wong Geon se considerava como um unificador de todos


os povos coreanos, e os migrantes de Parhae foram apenas
um elemento na sua ambição política. Visando apaziguar os
demais líderes locais pela península coreana, Wang Geon
buscar casar-se com as filhas de poderosos senhores da
guerra e membros de famílias aristocráticas tradicionais.
Títulos monárquicos foram concedidos aos aliados locais,
assim como o sobrenome real. Em 935, o que restou do
reino tardio de Parhae foi conquistado pelo reino de Koryo, e
Wang Geon foi generoso com o seu rival derrotado, Gyeon
Hwon (r. 892 - 935), ao lhe oferecer apoio (mas também
lealdade e submissão) contra as pretensões de seu filho que
havia o traído, como foi narrado no Samguk sagi. Um ano
depois, a península coreana encontrava-se unificada sob o
trono de Wang Geon.

Mas talvez o maior legado de Wang Geon seja uma série


de prescrições ordenadas conhecidas como as Dez
Injunções (Sip Hunyo) sistematizadas ao final de seu
reinado. Elas foram dispostas visando antes de tudo a
fundamentar a nova dinastia, conforme o primeiro
ordenamento, e, no seu segundo enunciado, a respeitar as
reformas propostas por um monge budista da época
chamado de Toson (827 - 898)[12]. A nova ordem nas
injunções foi fundamental para consolidar o reino a partir do
século 10 em diante. Após a unificação e conquistas dos
vários reinos coreanos, o fundador da dinastia de Koryo
preocupou-se com a longevidade política de seus
sucessores, uma vez que o reino tinha se baseado em
alianças e privilégios negociados com múltiplas lideranças e
famílias aristocráticas locais. Era mister, pois, controlar as
tendências desagregadoras de Koryo no futuro. Das Dez
Injunções, cinco referem-se a como o rei deveria governar o
Estado [13]. E a primeira preocupação do rei Taejo (Wang
Geon) era buscar inspiração no sistema chinês aplicado às
características coreanas. Na quarta injunção, a admiração
pela cultura de Tang é revelada, mas deve-se buscar a
singularidade coreana

A preocupação era, em essência, buscar manter uma


ordem coreana inspirados no sistema chinês. Isso sem
descuidar das ameaças das fronteiras, os povos khitans das
fronteiras devem ser vigiados e seus costumes devem ser
evitados considerados como barbáricos [14]. Aqui, em
essência, temos a busca deliberado de expressar a
singularidade coreana, com inspiração chinesa e a
contrapor povos da fronteira.

De fato, o sistema de Koryo assemelha-se com o da China


de Tang. Como exemplo, em 958, o filho de Taejo e rei de
Koryo, Gwangjong (r. 949 – 975), institucionalizou o sistema
de exames como praticado na China, chamado de kwago.
Mas com modificações características aos coreanos. Embora
tivesse sido aconselhado por um enviado chinês à sua corte,
Ssangi, o sistema coreano de exames era aberto apenas aos
membros das famílias aristocráticas e elites locais, referidos
como hyangni.

Além disso, Gwangjong, tendo testemunhado diversas


lutas sangrentas pelas autoridades locais após a morte de
Taejo, decidiu promover políticas de reforma visando o
fortalecimento do Estado. Nesse veio, foi expandido o
confisco de escravos particulares de famílias aristocráticas a
servirem ao poder central, conforme aprovado em 956. E a
reorganização das forças militares a combater as ameaças
dos khitans. E não menos importante, houve a substituição
das autoridades locais, antes baseadas em líderes e
membros aristocráticos, por funcionários apontados pelo rei.
Era evidente, em suma, que o poder civil de Koryo começou
a fortalecer-se em detrimento dos poderios locais, e os
funcionários designados seriam fruto de um sistema de
méritos aprovados nos exames e não mais por herança
familiar. No aspecto militar, Koryo fortaleceu-se com
numerosos membros recrutados, muitos ex-escravos de
famílias aristocráticas locais. Assim, esse duplo aspecto,
civil e militar, comporia o sistema dual referido como
yangban ( ), “dois ramos”. Não é exagero enxergar nesse
sistema o fundamento do reino de Koryo.

Os descendentes de Gwangjong degradariam ainda mais


as autoridades das aristocracias locais, hyangni. Mas não
foram tão bem sucedidos, aparentemente, pois as
condições privilegiadas de estudo e acesso às obras
clássicas eram quase restritas a poucos com condições.
Ademais, houve a continuação de um sistema de
nomeações privilegiadas (um), a favorecer alguns membros
escolhidos pelo Estado. O sistema de yangban, assim,
consolidou em Koryo uma classe aristocrática não mais
hereditária familiar, mas de literati, conhecido como
munbol. As prebendas e salários de cada eram
determinados de acordo com um sistema chamado de chon
sikwa, conforme expressado na nona injunção. Esse sistema
dimensionava os ganhos e propriedades de cada um de
acordo com seu cargo e mérito [15].

A autoridade central do rei tinha seus limites e


contenções a buscar sempre a aprovação do povo, sejam
civis ou militares, conforme expressa a sétima injunção.
Com isso, Taejo previu que deveria haver ampla aceitação
do poder monárquico e, assim, a se legitimar pela aceitação
ampla de todos. Em 983, numa ordenação aprovada, foi
decidido que haveria contenções às tendências autocráticas
da autoridade do rei, com as questões vitais de Estado a ser
aprovada por um Conselho de Altos Ministros (Chae Chu).
Esse conselho participaria, efetivamente, das decisões mais
cruciais dos assuntos militares e legislativos, algo que foi
típico do sistema coreano em relação aos chineses.

Os problemas mais premente nas décadas iniciais de


Koryo foi, sem dúvida, com o reino dos khitans perto de
suas fronteiras ao norte. Koryo, de fato, buscou logo se aliar
com os chineses que tinham ascendido em nova dinastia no
norte chinês, o de Song, a partir de 960. Para o desagrado
dos governantes khitans que tentaram tudo para negociar
suas fronteiras com os coreanos e assim, conceder a esses
a atacar as regiões setentrionais chinesas. Diante da
postura de hostilidade de Koryo, os khitans atravessaram o
rio Yalu em 993 e invadiram as terras do reino coreano. Mas
esses foram logo detidos ao longo do rio Chong chon, e
depois voltaram suas prioridades com suas fronteiras
meridionais com os chineses. Muito dessa reviravolta,
aparentemente, foi obra de um brilhante diplomata de
Koryo, Seo Hui (942 - 998) que organizou uma
contraofensiva e depois negociou com as autoridades
khitans a cederem territórios ao longo do rio Yalu a permitir
o acesso privilegiado à estratégica península de Liaodong
que fazia fronteira com o reino chinês dos Songs. Seo Hui,
assim, anexou toda região do vale do Yalu e mandou
construir uma série de fortificações visando a proteção das
fronteiras de Koryo. Mas esses acordos não perdurariam
sem contestações. Em 1010, o rei dos khitans resolveu por
bem invadir toda a região negociada e chegou a saquear a
cidade de Gaegyeong (Kaesong), uma das capitais de Koryo,
somente se retirando depois que foi a ele prometida a
devolução de toda a península de Liaodong. Oito anos
depois, uma nova invasão dos khitans foi somente detida
pelas forças de Koryo graças ao talento do general Kang
Lamchan (948 – 1031), fazendo com que os khitans
desistisse definitivamente em tentar subjugar os coreanos.

A ordem prevaleceu entre o reino de Koryo e os khitans


nas décadas seguintes. No início do século 12, povos
jurchens, referidos como jins, sucederam os khitans na
região da península de Liaodong e todo o norte da China,
forçando a dinastia dos Songs a irem mais para as regiões
meridionais ao sul do rio Yangzi (ou Yangtzé), a fundar sua
nova capital em Jiangnin (atual Nanjing, ou Nanquim) em
1129. Apesar dessas convulsões, as relações entre Koryo e
a China dos Songs se aprofundaram. Os chineses
enxergaram os coreanos como aliados cruciais para conter
os jins, e os governantes de Koryo exploraram todas as
possibilidades dessa aproximação para aprofundar os laços
comerciais e culturais. Como consequência, houve
significativo aumento de comerciantes e comunidades
coreanas que viveram em cidades chinesas ao longo da foz
do rio Yangzi, assim como muitos chineses ao longo do rio
coreano de Yesong. As mercadorias mais demandadas dos
chineses eram principalmente sedas, livros, cerâmicas,
ervas medicinais, perfumes e instrumentos musicais. Em
troca, Koryo exportava ouro, prata, cobre e ginseng.

Foi por volta dessa efervescente época de contatos com


os chineses que floresceu a indústria da cerâmica coreana.
Essas valiosas peças de cerâmicas envidraçadas foram
inspiradas nas cerâmicas chinesas dos Songs desde meados
do século 10. Nos séculos seguintes, os coreanos
aperfeiçoaram sua própria produção, criando cores únicas
semitransparentes de tons azulados e esverdeados (pisaek,
“cor do martim-pescador”). Famoso pela sua beleza única,
foi demandado entre famílias aristocráticas chinesas e até
mesmo entre alguns comerciantes árabes que tinham se
assentado nas cidades portuárias coreanas.
Na sociedade de Koryo, a condição das famílias
privilegiadas da história coreana, antes baseadas no
sistema de “ossos” (kolpum), agora ampliou-se para várias
famílias com sobrenomes Kim e Paks. Há certamente um
motivo disso nas 29 esposas que o rei Taejo tomou para si, e
desses descendentes muitos depois uniram-se com líderes
locais pela península. Com o passar das gerações, a
tendência era somente aumentar o número de famílias com
esses sobrenomes, pelo prestígio e poder.

No terreno religioso, o budismo fez notável influência no


reino de Koryo. Isso é constatado nas Dez Injunções do rei
Taejo, em que é enfatizada a importância dos preceitos da
geomancia budista do monge Toson. Das dez injunções,
quatro demonstram o favorecimento às ideias budistas do
reino de Koryo. Os monges deveriam ser os administradores
dos templos e mosteiros, e esses deveriam ser respeitados.
Apesar do favorecimento explicitado, as construções
budistas deveriam ter um local propício indicado conforme a
geomancia. Isso, em essência, visa ordenar o número e
local das construções religiosas no reino, a considerar que
somente assim, a obedecer aos preceitos cósmicos, a
ordem e harmonia do reino de Koryo seria preservada. Tal
destaque às ordens budistas acarretou em consequências
sociais. Muitos filhos de famílias nobres começaram a
procurar o sacerdócio. No mundo da política, o budismo foi
considerado pelos governantes de Koryo como doutrina a
lhes favorecer em casos de conflitos com outros povos. E
como exemplo da devoção dos tempos, foi feita a
compilação e impressão da primeira versão da imensa
coleção dos ensinamentos de Buda no século 11, o Tripitaca
Coreano, como sinal de devoção a proteger contra os
khitans.

A corte de Koryo concedeu títulos e privilégios diversos ao


clero budista, incluindo isenções fiscais para templos e
mosteiros. Além disso, as instituições budistas tiveram
generosas doações de famílias poderosas e prósperas. Esse
sistema de privilégios e favorecimentos, ao final, minou a
própria base de arrecadação e poder do reino de Koryo a
partir do século 13. Nem todas as escolas budistas eram
favorecidas. Uma delas, a que enfatiza a meditação, a de
Seon (ou Son, ), foi especialmente promovida. Isso se
deveu em grande parte aos ensinamentos de Toson que
teve à sua influência sobre o rei Taejo. Em contraste com a
aristocracia de Silla que defenderam o conceito da
transmigração da alma a justificar a pureza dos
pertencentes ao grupo dos “ossos” (kolpum), Koryo buscou
defender mais o acesso universal da prática meditativa.

Outro fator foi a geomancia, evidenciada nas


recomendações do rei Taejo a todos a visitar a “Capital
Ocidental”, Pyongyang, e ali permanecer por recomendados
cem dias por ano. A cidade era considerada como
idealmente localizada, na correta distância entre as
montanhas e as águas. Isso, com o tempo, fez com que a
cidade prosperasse com as frequentes visitas de viajantes e
peregrinos coreanos. Por outro lado, a geomancia foi usada
contra os habitantes ao sul do rio Gongju (atual rio Geum),
violência essa que depois foi mantida por séculos na história
coreana, possivelmente por essa área ter apoiado
veementemente famílias aristocráticas ligadas ao poder do
reino de Paekche e, sendo assim, foco de resistência a
Koryo.

As rebeliões contra o poderio de Koryo advieram não


conforme previsto pela geomancia endossada por Taejo,
mas na capital e no norte. No início do século 12, Koryo
enfrentou invasões dos povos jurchens que tinham
destruído os khitans no reino de Liao e estabeleceram a
dinastia Jin (1115 - 1234). Pouco depois de ascenderem na
região, os jurchens expandiram-se mais ao leste e nordeste
em direção ao rio Tumen, pressionando os governantes de
Koryo a respeito de suas fronteiras. Em 1126, um grupo
favorável à dinastia Jin na corte de Koryo, liderado pelo
sogro do rei Injong (r. 1122 - 1146), tentou um golpe
palaciano que foi prontamente reprimido. Durante essa
turbulência dos eventos, um outro grupo político de Koryo
mais ao norte buscou tomar as rédeas do poder, inspirados
pelas ideias de um monge budista chamado de Myo Cheong
(? - 1135) que defendia uma ampla reforma política
baseadas apenas no budismo e a condenar os efeitos
nocivos das tradições confucianas no Estado [16]. Algo
revelador das tensões entres as duas tradições filosóficas no
reino coreano, uma de maior impacto político e institucional
conforme as tradições confucionistas, e outro de cunho mais
espiritual e societário como o budismo.

Os seguidores de Myo Cheong passaram a enfrentar a


dinastia dos jins no norte. E passaram depois a avançar em
direção à capital, Seogyeong (Pyongyang), pois
consideravam a outra capital, Gaeseong (Kaesong) como
degenerada de acordo com as interpretações geomânticas
do mestre. Esse movimento de insurreição dentro de Koryo
revelou uma corrente milenarista e buscava revitalizar o
reino a combater as forças ao norte da península. Em 1129,
o rei Injong aceitou as sugestões de Myo Cheong e passou a
permanecer em Pyongyang por 120 dias, em respeito às
antigas injunções do rei Taejo e buscando se conciliar com
os rebeldes que estavam assomando nas regiões do norte
do país. Além disso, o rei Injong mandou construir um novo
palácio real de acordo com as profecias geomânticas de
Myo Cheong que dizia que assim sendo feito no devido
local, o reino se tornaria um grande império que
conquistaria os jins e outros estados do leste asiático.
Naturalmente houve uma forte reação de membros da
aristocracia letrada que tinham estudado por anos os
preceitos confucionistas. Um deles, Kim Busik (1075 –
1151), liderou essas inquietações e se opôs contra a
realocação da capital, denunciando as ideias da geomancia
como ilusórias e oportunistas. Vendo-se incapaz de mudar a
capital do reino, Myo Cheong e seus seguidores
proclamaram então um novo reino, pretensiosamente
chamado de Grande Império Wi. E buscaram se refugiar na
cidade de Pyongyang em 1135. Kim Busik, ciente das
rebeliões e nomeado como comandante supremo das forças
de Koryo, suprimiu os rebeldes em 1136. Até 1142, Kim
Busik permaneceria como o mais influente membro do
Conselho de Altos Ministros de Koryo.

O duro realismo do Estado tinha subjugado as


resistências idealistas populares. Apesar de suprimida, o
sentimento popular coreano começava a questionar a
ordem e legitimidade do reino de Koryo. E muitos
consideravam os jurchens ao norte como sujeitos à plena
dominação pelos coreanos, ecoando os antigos domínios do
reino de Koguryo do século 5. A reação de Kim Busik e a
elite confuciana letrada em boa parte alienou-se dos
sentimentos gerais da nação.

Em meados do século 12, Kim Busik, talvez visando criar


uma base de legitimidade histórica do reino de Koryo,
mandou compilar uma obra que depois ficaria conhecida
como o Sanguk sagi (“História ou Crônica dos Três Reinos”),
que buscou recuar as origens de Koryo até o venerado reino
de Choson e de Silla nos seus tempos de auge. A
compilação foi inspirada na clássica obra historiográfica
chinesa de Shiji escrita por Sima Qian (145 a. C. – 90 ou 85
a. C.). A obra de Kim Busik almejou, em suma, corresponder
ao império chinês no reino de Koryo. O Samguk sagi, como
resultado, surgiu em 1145 como a primeira grande obra da
história coreana.

A dominação aristocrática de funcionários confucionistas


na esfera civil provocou reações de membros do corpo
militar. Oficiais militares, com frequência, durante as
guerras contra os khitans e jurchens, reclamaram por não
terem sido devidamente reconhecidos e promovidos pelos
seus méritos. Para agravar a situação, Koryo estabeleceu
que o comando militar supremo deveria estar nas mãos de
um funcionário civil nomeado, visando assim garantir uma
política mais pacifista e diplomática nos conflitos. No
contexto da Pax Sinica, em que as boas relações foram
mantidas entre os reinos asiáticos, essa política fez perfeito
senso. No entanto, com o agravamento das fronteiras e a
crise dinástica chinesa, os conflitos passaram a ser mais
frequentes e duradouros no século 12. Portanto, a classe
militar de Koryo sentiram-se cada vez mais discriminados e
desprezados por suas qualidades por uma classe letrada
privilegiada no aparelho do Estado.
Em 1170, vários oficiais militares descontentes
organizaram um golpe de Estado, chefiados por Jeong Jung-
bu (1106 – 1179). Foi o início de uma era de um século de
mando militar sobre o poder de Koryo (Musin Jeonggwon,
). O golpe foi dado num contexto de crise e desordem
evidentes no reino coreano, rompendo a tradicional
harmonia social. Várias lideranças militares tinham se
rebelado, assim como revoltas camponesas e populares.
Uma dessas, foi de escravos em 1198 na capital em
Kaesong que, embora reprimida, visou derrubar todo o
sistema estatal de Koryo instigada por um líder chamado de
Manjeok (? – 1198) [17].

Depois das instabilidades, ascendeu ao poder efetivo um


filho de general da família Choe, Chung-heon (1149 – 1219,
após ter conseguido pacificar as revoltas e afastar os seus
rivais em 1196. Uma vez no poder, o militar buscou
assegurar seu próprio corpo de guardas e iniciou um
período de 62 anos de mando militar em Koryo. Em suma,
um sistema de junta militar (chungbang) assumiu o
comando da autoridade coreana, apesar de terem sido
mantidas as tradições e famílias reais e aristocráticas. Mas
sob o domínio militar, alguns membros da classe de letrados
confucianos e monges budistas se refugiaram no interior,
em mosteiros, templos e abrigos naturais, e desenvolveram
uma tradição de escritos de questionamento da ordem
natural e desenvolvimento espiritual, longe da realidade
política e militar. Alguns outros letrados foram incorporados
ao novo sistema político, como Yi Kyubo (1168 – 1241) que
serviu como primeiro-ministro sob o regime dos Choes após
ter escrito uma obra que comparou a grandeza do antigo
reino de Koguryo com o estado atual do reino em que
serviu, na sua obra épica, “O Descanso do Rei
Dongmyeong” (Tongmyong wang pyon) [18].

A virada para o século 13 trouxe novas forças militares


nas fronteiras coreanas e chinesas advindas da vastidão das
estepes asiáticas. Nas primeiras décadas do século, um
líder chamado de Temujin (1165 – 1227) conseguiu reunir
todo o universo de clãs e nações dos mongóis e passou a
expandir as fronteiras na Ásia Central. No norte da China,
Temujin (ou Gêngis Khan) derrotou o reino da dinastia Jin
dos jurchens. Em 1219, os mongóis chegaram a propor uma
aliança com Koryo para juntos enfrentarem os khitans que
estavam se fortalecendo após a queda de Jin. Durante esse
período de negociações, as tensões entre os coreanos e
mongóis aumentaram após o assassinato de um enviado da
corte de Gêngis Khan que tinha ido cobrar um tributo
simbólico. Como resposta, em 1231, os mongóis assolaram
as fronteiras ao norte de Koryo e tomaram a capital
Gaegyeong (Kaesong). Após o qual o governo de Koryo teve
que reconhecer a soberania mongol. Os governantes da
família Choe, considerando a retirada mongol para a região
noroeste a fim de combater os khitans, decidiram por bem
organizar uma oportuna ofensiva a partir de 1232. No
mesmo ano, julgando que o norte coreano e a capital
encontravam-se vulneráveis demais, decidiram mudar o
centro político para uma ilha na costa ocidental, Kanghwa,
acreditando que os mongóis não teriam expressão naval.

As invasões mongóis, inevitavelmente, vieram ao longo


de quase quarenta anos, entre 1231 e 1270. E foram muito
além da ilha de Kanghwa, pois o interior da península foi
devastado e abandonado à própria sorte diante dos
cavaleiros nômades que saquearam e destruíram locais e
obras históricas coreanas, como a primeira versão do
Tripitaca Coreana. Diante do sacrifício que a população
enfrentou nesses anos de lutas, foram novamente reunidos
os ensinamentos de Buda e, depois de dez anos, foi
completada em 1251 uma segunda versão do Tripitaca em
mais de 80 mil placas de madeira. Essa versão ainda hoje
se encontra no Templo Haeinsa. E foi durante esse contexto
de crise que os coreanos, devido à gravidade e premência
dos tempos em que podia-se perder para sempre as suas
grandes obras literárias e budistas, aprimoraram a
impressão metálica móvel com mais de dois séculos antes
de Johannes Gutenberg.

As agressões mongóis se arrastaram sobre o regime


militar dos Choes, e isso acarretou em pressões sociais e
financeiras sobre toda a península coreana ao longo do
século 13. Embora a capital de Koryo estivesse numa ilha,
havia limites de arrecadação fiscal que era originada nas
propriedades no continente. Em 1258, uma revolta nos
círculos do poder dos Choes estourou numa tomada do
poder por outros militares descontentes, pondo termo ao
governo de 62 anos dos Choes. Esse novo regime, com
visão mais pragmática, logo enxergou as vantagens em
abrir negociações com os mongóis, na postura conciliatória
de um governador regional, Kublai Khan (1215 – 1294).
Kublai viu essas possibilidades como uma maneira de
ganhar vantagem política sobre os seus rivais pela sucessão
ao poder mongol na década de 1250. Nessa empreitada, o
príncipe de Koryo foi à capital mongol, Karakorum, e aceitou
todas as condições propostas que manteria a monarquia no
poder e a imediata retirada das forças mongóis da
península, em troca de irrestrita lealdade política e militar.

Firmado o tratado de paz, os militares coreanos passaram


a lutar para restabelecer o poder da monarquia em Koryo e
a afastar aqueles ligados ao regime dos Choes. Em 1270, a
antiga capital de Koryo foi restabelecida saindo da ilha de
Kanghwa. Houve viva resistência de apoiadores do antigo
regime coreano, principalmente aqueles pertencentes à
guarda do líder dos Choes que depois se refugiaram as ilhas
do sul coreano até serem suprimidos em 1273. Assim, a
continuada guerra contra os mongóis se encerrou na Coreia.

Kublai Kahn, que tinha recebido uma educação com


fortes teores chineses desde a sua juventude, ascendeu ao
trono imperial chinês e proclamou uma nova dinastia, a
Yuan, em 1271. Três anos depois, Koryo tornou-se um reino
subordinado ao da China Yuan, estabelecendo uma série de
alianças e casamentos entre as famílias reais dos dois
reinos. Sob a soberania de Yuan, Koryo concedeu amplos
territórios no nordeste para a administração direta chinesa.
Além disso, no mesmo ano de 1274, Koryo relutantemente
concedeu forças terrestres e principalmente navais para
uma expedição organizada contra o Japão. A primeira
tentativa de invasão de Kublai Khan às ilhas japonesas deu
terrivelmente errado, com boa parte da frota naval
aniquilada por tufões que o regime do xogunato de
Kamakura do Japão à época considerou como de origens
divinas, kamikaze [19].

A obstinação do imperador Yuan não terminou por aí.


Depois de ter conseguido subjugar rebeldes chinês no sul
remanescentes dos antigos Songs em 1279, Kublai decidiu
no ano seguinte a preparar uma segunda expedição contra
o Japão. Em 1281, as forças combinadas de Yuan e de Koryo,
entre outros aliados e mercenários, voltaram-se contra o
arquipélago japonês [20]. Dessa vez, igualmente, as forças
da natureza foram dizimadas por tufões e ventos fortes
sazonais após terem permanecido meses no mar. A
mobilização e os recursos exigidos nessas duas expedições
de Kublai atingiu o reino de Koryo consideravelmente.

Sob o domínio de Yuan, o povo coreano tinha que


entregar uma enorme carga tributária, que incluía prata,
ouro, ginseng, ervas medicinais entre outros. Ademais,
produtos artesanais e mulheres entravam também na cota
exigida pela corte de Yuan, atendendo ao costume
aristocrático mongol de poligamia. No reino coreano, diante
da proeminência dos mongóis, todos aqueles ligados ou
aliados tinham uma série de privilégios, com muitas famílias
aristocráticas coreanas a manter laços matrimoniais com
mongóis. Nas províncias coreanas, os grandes latifúndios
concentraram-se ainda mais com a nova aristocracia ligada
aos Yuans que mantiveram privilégios fiscais em detrimento
daqueles não colaboradores do poder. Em cima de muitos
excluídos desse sistema, fermentou-se ideias nacionalistas e
anti-mongóis ao longo do tempo a partir de fins do século
13.

Embora dominados pelos Yuans, a economia e comércio


coreano floresceu com a nova ordem asiática consolidada
pelos mongóis. O crescimento não se deu apenas em
escala, mas também na diversidade de novas demandas e
produtos. Pelo mundo dominado pelos mongóis, abriram-se
vias de acesso ao mercado muçulmano. O algodão que
havia se espalhado na China no século 13 foi trazido de lá
para a Coreia por Mun Ikchon (1329 – 1398) que passou a
cultivá-lo com grande sucesso em solo coreano a partir de
1364. Isso provocou uma séria de mudanças na produção
têxtil coreana, na época em que prevalecia os tecidos de
seda e cânhamo. Os Yuans tinham adquirido o
conhecimento da pólvora, inventada pelos chineses em
tempos anteriores. Essa tecnologia, embora
cuidadosamente mantida em segredo pelos Yuans, foi
depois aprendida por coreanas que, conjugado com o
avançado conhecimento metalúrgico, passaram a produzir
excelentes canhões no século 14 pelas mãos do inventor e
militar Choe Muson (1325 – 1395). Esse novo armamento
coreano foi plenamente usado contra as invasões de piratas
japoneses (wakôs ou waegus em coreano, ) na península
no referido século, como na Batalha de Jinpo de 1380 [21].

Novas técnicas agrícolas também se espalharam pela


Coreia, como a irrigação e aragem profunda por meio de
livros de cultivos de arroz vindos da China Yuan.
Possivelmente isso explica o considerável aumento
populacional coreano a partir do século 14, juntamente com
uma queda na taxa de mortalidade infantil ligado aos novos
conhecimentos medicinais das plantas. Pois houve um
incremento no número de publicações sobre os estudos
medicinais nas mãos dos letrados hyangni coreanos. As
mudanças dos tempos também repercutiram no mundo
espiritual. O budismo, associado aos tempos decadentes do
passado coreano, passou a ser cada vez mais ignorado pela
nova elite coreana que passou a valorizar novamente os
estudos confucianos. Essa retomada tinha sido revitalizada
por um estudioso chinês da dinastia Song, Zhu Xi (1130 –
1200) que buscou uma nova e revigorante interpretação dos
clássicos confucianos a contrapor-se à metafísica budista.
As obras de Zhu Xi tiveram ampla repercussão na capital
dos Yuans e tinham sido trazidos para a península coreana
em 1290 por eruditos como An Hyang (1243 – 1306) e Yi
Chehyon (1287 – 1367) [22].
4 O IRMÃO LEAL E O BOM VIZINHO

A morte de Kublai Khan em 1294 engendrou uma série de


disputas pelo trono imperial chinês dos Yuans, afrouxando a
dominação e controle sobre outras áreas asiáticas. Já em
meados do século 14, a China começou a entrar num
período de declínio e fragmentação da sua unidade política,
e foi ocupada pelas suas fronteiras por novos povos que
visavam o poder. No sul da China, um líder chamado Zhu
Yuanzhang fundou uma nova dinastia, a Ming (1380 – 1644)
visando restaurar a antiga glória dos tempos Tang e a
expulsar os povos bárbaros como os mongóis de Yuan. Para
a perspectiva de Koryo, a desordem no leste asiático
revelou uma oportunidade de recuperar sua plena
independência e soberania.

Diante da desordem nos anos finais do império chinês, o


rei Kongmin (ou Gongmin) (r. 1351 – 1374), último soberano
coreano que foi endossado pelos chineses Yuans, perseguiu
todos aqueles ligados ou aliados aos chineses e buscou
rapidamente estabelecer novas relações diplomáticas com
os Mings. Nesse sentido, Kongmin recuperou a autonomia e
boa parte dos territórios a nordeste que estavam sob a
direção dos Yuans.

No âmbito interno, Kongmin, além de afastar a antiga


elite pró-mongol, buscou restaurar os cargos oficiais para
aqueles da antiga aristocracia que haviam sido aprovados
nos exames civis e determinados a defender a ideologia
renovada do neoconfucionismo. Os problemas externos
persistiam. Chineses rebeldes, chamados de Turbantes
Vermelhos (em chinês, Hongjīn Qiyi, ), e piratas
japoneses atacavam nas fronteiras ao norte e sul no século
14. Em determinado momento, os Turbantes Vermelhos
chegaram a avançar da península de Liaodong e a saquear
a capital coreana em Kaesong [23], enquanto levas de
japoneses avançaram da costa para o interior.

Houve resistência de poderosas famílias aristocráticas


contra os planos de reformas políticas de Kongmin que, em
último momento, explica o seu assassinato em 1374, aos 44
anos de idade. Para a posteridade, Kongmin será lembrado
pelo seu excepcional talento artístico e caligráfico.
E foi nesse cenário de guerras e conflitos que emergiram
duas figuras militares, Choe Yeong (1316 – 1388) e Yi Song-
gye (1335 – 1408). Ambos revelaram ter grande senso
estratégico, mas diferiram nos seus planos políticos para o
reino coreano. Choe Yeong descendia de uma próspera
família aristocrática e sempre insistiu numa rápida e
decisiva invasão ao norte, na península de Liaodong, para
impor a segurança nas fronteiras contra os chineses. Isso,
todavia, iria contra a dinastia chinesa Ming, algo que
desagradava a Yi Song-gye, crescido nas regiões
nordestinas e ciente do complexo e frágil equilíbrio de
forças. Assim, as duas ideias contrastantes representavam
os dois veios ideológicos coreanos da época, uma de cunho
mais nacionalista e idealista, e outro mais realista e
globalista.

Ganhando proeminência ao poder logo após a morte do


rei Kongmin, Choe Yeong lançou ofensivas para a Manchúria
em 1388. Yi Song-ye, reagiu e usou essa expedição como
pretexto de uma rebelião a ser condenada e a perseguida.
No verão do mesmo ano, Yi Seong-gye desceu das regiões
norte e atravessou o rio Yalu para chegar à Kaesong com
seu exército. A capital e boa parte dos funcionários
neoconfucianos da elite receberam o novo comandante
como herói a renovar o reino em turbilhão. As esperanças
era de que Yi Seong-gye iria erradicar a corrupção e o
sistema de privilégios das famílias aristocráticas. De fato, Yi
Seong-gye, uma vez no poder, passou a implementar uma
séria de reformas agrárias em 1391, apoiado por oficias
neoconfucionistas. Foram implementadas leis fundiárias, em
que as propriedades de terras foram classificadas e
designadas a proprietários de acordo com o que poderia ser
tributado. Assim, o Estado poderia afastar o poder e riqueza
das tradicionais e rivais famílias aristocráticas, aumentar
seu poder de tributação e ter maior controle e poder sobre
quem era o proprietário, o fiscal e a mão-de-obra militar e
civil. Isso se deu em cima de um cenário de desordem
coreana nos anos anteriores, em que muitas propriedades
eram controladas por aliados aos mongóis, ou a instituições
religiosas budistas isentas de impostos (nongjang) [24].

Essas reformas foram amplamente defendidas pela classe


de neoconfuncianos no aparelho do funcionalismo estatal,
conhecidos como sadaebus. Sob essas leis, os reformistas
pretendiam redistribuir todas as terras de acordo com um
novo sistema hierárquico burocrático, a excluir a antiga
classe aristocrática. Os antigos templos e mosteiros e toda
a classe budista, beneficiados no passado por terem sido
aliados à dinastia Koryo, também foram alvos dessa
reorganização, passando a ser objeto de cobranças fiscais e
vistos como decadentes e corruptos.

Entre os mais proeminentes neoconfucionistas da época


destacou-se Jeong Mong-ju (1337 – 1392). Nascido em
família aristocrática, esse erudito defendia a reforma do
Estado a combater as mazelas e privilégios do passado e
passou a valorizar o corpo burocrático selecionado pelos
rigores dos exames de admissão. Como Yi Seong-gye, era
anti-budista e realista na política externa e entendia que
somente uma paz com os chineses da dinastia Ming poderia
fornecer ordem para a consolidação do reino coreano. No
entanto, o erudito se opunha à mudanças dinásticas na
península coreana, ideia apoiada entre os partidários de Yi
Seong-gye. Pois acreditava no princípio confuciana de
wangdo (princípio do soberano, da retidão) [25] que proibia
qualquer ato de deslealdade dos súditos diante da
autoridade do rei. Sendo assim, foi opositor de qualquer
golpe a favor do grupo de Yi Seong-gye e de mudança
dinástica. Derradeiramente, Jeong Mong-ju foi calado e
assassinado em 1392 por cinco homens num banquete em
Kaesong. Suas convicções e lealdade ainda ecoam nas
linhas de seu mais conhecido poema coreano (sijo),
Dansimga (“Canção da Lealdade”):

Embora eu morra e morra novamente por cem vezes,

E se meus ossos se transformam em pó, e se minha alma permanece ou


não,

Sempre fiel ao meu Senhor, como esse coração vermelho pode


desaparecer?

(tradução nossa) [26]

Outra figura foi um filho de Yo Seong-gye, Yi Bang-won


(1367 – 1422), que serviu também como funcionário do
Estado e era um literato neoconfuciano. Mas sua lealdade
antes se dirigiu ao seu pai e contribuiu grandemente para a
mudança dinástica, acusando os oponentes políticos e
confrontando os argumentos contrários fundamentados de
Jeong Mong-ju. Defendia que as mudanças deveriam ocorrer
quando há injustiça e desordem no reino, fundamentado
nos escritos confucianos. No plano político, adveio o
momento decisivo em 1392. Foi quando as forças e
partidários de Yi Seong-gye ocuparam a capital e
destronaram-se o rei Gongyang (r. 1389 - 1392) que fugiu
para a cidade de Wonju (e depois onde seria assassinado
juntamente com todos de sua família). Apoiado por
neoconfucianos reformistas e militares, Yi Seong-gye foi
entronizado em 5 de agosto de 1392 como o primeiro rei da
dinastia Joseon (ou Choson), sob o venerável nome de Taejo
(r. 1392 - 1398).
Mapa: O reino de Joseon no início do século 15 e sua capital Hanyang.

Embora os eventos tenham sido dramáticos, não houve


significativas perdas humanas e conflitos. A dinastia
provaria ser uma das mais longevas da história asiática,
pois teria seu termo apenas em 1910. E seu nome, Joseon,
foi decidido após consultas com eruditos neoconfucionistas
coreanos e chineses, nome que remetia ao antigo reino de
Dangun, o lendário fundador do primeiro reino coreano
situado no terceiro milênio antes de nossa era. Em 1394, a
capital da nova dinastia foi mudada para Hanyang
(“Fortaleza no rio Han”, ), na região central da península
coreana e perto da foz do rio Han [27], abandonando-se a
antiga Kaesong. Em dias atuais, uma vibrante megalópole
de 20 milhões de habitantes, Seul. Há relatos de que
quando fundada, demorou-se anos para cercar com
magníficas muralhas de 17 km de extensão e 6 metros de
altura cujas quatro entradas apontavam para os pontos
cardeais. Atrás dos muros, tudo foi construído conforme um
planejamento urbano e respeitoso aos princípios da
geomancia do feng shui [28].

Uma vez no poder, o rei Taejo buscou conselheiros e


ministros para ampliar e consolidar suas reformas no
Estado. O mais influente desses, até 1398, foi Jeong Dojeon
(1342 – 1398), um fervoroso neoconfucionista e anti-
budista. Uma vez nomeado como o principal ministro no
Conselho de Estado, instância de poder logo abaixo do
monarca, buscou implementar um sistema que seguisse os
preceitos clássicos da obra confuciana Zhou Li (“Os Ritos
Zhou”). Jeong Dojeon acreditava que somente um sistema
político baseado no pleno poder soberano do rei, a ser
apoiado por uma classe de letrados treinados nos ritos e
pensamentos neoconfucianos, poderia ser o ideal. E
enfatizava nisso que o monarca deveria ter seus deveres
com a ordem cósmico e dos céus, a ser correspondido por
seus súditos em forma de dedicação, obediência e lealdade,
tal como numa relação de pai e filho.

Com tal ardor visionário, seria natural supor que teria


oponentes no poder. E foi assim que se tornou vítima fatal
no processo de sucessão ao trono real, quando apoiou um
outro substituto ao trono rival a Yi Bang-won, ou Taejong (r.
1400 - 1418), que se tornou no terceiro soberano da
dinastia.

Não obstante a visão de Jeong Dojeon, os ideais


neoconfucionistas foram na maioria realizadas no processo
de sucessão e de poder em toda a dinastia. Numa
perspectiva atual, a dinastia Joseon foi um Estado
monárquico autoritário, cujo poder concentrava-se em torno
da figura do rei e de seus mais altos funcionários públicos,
conhecidos como yangbans ( ). O monarca exercia
autoridade absoluta sobre seus súditos, mas delegava,
assim como na visão de Jeong Dojeon, o exercício da
autoridade à classe de burocratas aprovados nos disputados
exames públicos (kwago ou gwageo, ). Nas províncias,
havia uma elite local (hyangni) que foi destituída da sua
antiga condição de classe senhorial de terras, e que serviam
como subordinados ao serviço dos magistrados yangbans
locais enviados da capital. Para evitar poder excessivo, cada
magistrado tinha um tempo de mandato limitado no local.

A mobilidade social era limitada entre várias formas.


Além do duríssimo sistema de exames públicos a ser
aprovado, excluía-se da condição de candidatos os
concubinos e seus descendentes. E havia escolas
especialmente preparatórias para os candidatos, cujos
custos de estudo e tempo de dedicação restringia,
efetivamente, os exames apenas a uma elite na capital e
nas províncias. Uma vez aprovado no kwago, o funcionário
deveria jurar lealdade e dedicação ao monarca, que
delegaria as suas funções e ganhos de acordo com sua
hierarquia burocrática. No período inicial da dinastia Joseon,
havia apenas estimado 10% da população como yangbans.
E esses poderiam depois seguir carreira civil ou militar, de
acordo com as predileções e necessidades do momento.

Esse sistema de funcionalismo perdurou até o início do


século 20, ordenando e sustentando toda a estrutura do
Estado e autoridade. A condição do yangban era de
prestígio e sua fama atingia toda sua família e vila. Tal como
na China, era comum casos em que vizinhos e próximos
fossem pedir e pleitear algo para familiares desses notáveis
membros. No alto escalão burocrático, os apontamentos
pessoais e políticos eram mais evidentes. Muitos altos
oficiais eram escolhidos por grupos civis e militares que
disputavam a preferência do monarca. Como exemplo,
havia uma longa lista de membros de yangbans que
esperavam suas recompensas e promoções por méritos e
senioridades, conhecidos como kongsin. E essas listas eram
priorizadas de acordo com as mudanças políticas do
Conselho de Estado e do rei. Apesar desse sistema de
favorecimento, o funcionário médio e iniciante tinha
liberdade para exercer suas funções sem interferências de
cima, e possibilidade de se dedicar às letras e artes, assim
como o mandarinato na China. Na figura do rei, a dedicação
aos registros e crônicas de estudiosos confucianos do
Estado garantiram a detalhada anotação de suas obras e
feitos para a posteridade. Esses registros seriam compilados
na grandiosa obra, “Anais da Dinastia Joseon”, que ainda
hoje existe graças ao seu cuidadoso armazenamento
através dos tempos, em inúmeros volumes desde 1413 até
1865, um dos maiores tesouros nacionais da Coreia.

A figura do líder ideal confucionista por vezes foi


correspondida por alguns soberanos de Joseon. O quarto rei,
conhecido como Sejong, o Grande (r. 1418 - 1450)
certamente foi um deles. Entronizado em 1418, Sejong
consolidou a ordem e grandeza do reino coreano, numa
época em que a China dos Mings se estabeleceu em todo o
leste asiático, e as boas relações com os chineses foram
mantidas e reforçadas, além da natural afinidade ideológica
confuciana. Sejong se beneficiou por ter tido um antecessor,
o rei Taejong, que eliminou os impedimentos e rivalidades
políticas. Ademais, Sejong teve experientes e veteranos
oficiais e funcionários como conselheiros e ministros.

Na política externa, Sejong avançou ainda mais ao norte,


entre os povos jurchens, ancestrais dos manchus, e ali
estabeleceu uma série de fortes e postos de observação.
Isso decorreu de sua eficiente política militar e de
segurança, que buscou favorecer as opiniões nacionalistas
de seus conselheiros mais graduados, além de ter
fomentado incentivos para inovações técnicas no campo
bélico como na inovação de canhões e meios mais
eficientes de armas de flechas, morteiros e armas de fogo. A
ofensiva coreana ao norte foi coroada de sucesso depois
das campanhas do general Kim Jongseo (1383 - 1453) que
empurrou as fronteiras até o rio Songhua.

Em maio de 1419, Sejong, sob o conselho e orientação de


seu pai, Tejong, organizou uma ampla frente ofensiva ao sul,
chamada de Expedição de Gihae Oriental (em japonês,
Invasão de Ôei), com o objetivo de desarticular a ação de
piratas japoneses a partir da ilha de Tsushima. O resultado
foi mais de 200 japoneses mortos e mais de 100 feridos,
com estimativas um pouco maior do lado coreano. Em
setembro, a trégua adveio e foi assinado o tratado de
Gyehae, ao que o reino coreano conseguiu o pagamento de
tributos o líder (daimiô) e sua clã de Sô da ilha de Tsushima.
Em troca, os coreanos prometeram manter as relações
comerciais entre o Japão e a Coreia [29]. Após esse tratado
firmado, e com as relações cordiais mantidas com a China, a
política coreana fundamentou-se no preceito confucionista
de Mêncio (372 a. C. – 289 a. C.), sadae gyorin ( ),
“relações de respeito aos grandes e boa vontade com os
vizinhos”. Em outras palavras, respeito à China, e política de
boa vizinhança com o Japão, os jurchens e as ilhas
meridionais de Ryukyu e além no Sudeste Asiático. Foi esse
princípio que serviu de base para a política externa coreana
durante os próximos séculos.

Para fomentar a cultura, as artes e o conhecimento,


causas demandadas pela classe dos neoconfucionistas no
corpo dos funcionários e na corte, o rei Sejong promoveu a
criação de institutos de debates e estudos, o Chipyonjon
(“Simpósio dos Dignos”), em que as mais capazes e
brilhantes mentes coreanas se reuniram com frequência.
Um dos resultados mais notáveis desses encontros foi a
criação de um sistema de escrita alfabética coreana de 26
letras, o hangul, em 1446. Embora guardasse o venerado
respeito à escrita chinesa que foi mantida como sinal de
status e erudição, o hangul foi proclamado pelo rei Sejong
visando facilitar o acesso às letras pelas pessoas e criar
uma fonte de identidade coreana. No veio entusiástico das
reformas culturais feitas, Sejong escreveu e publicou
inúmeros livros em hangul, muitos deles de traduções de
obras clássicas chinesas sobre o confucionismo, budismo,
ritos, ética, agricultura e sericicultura (criação do bicho-da-
seda). As publicações floresceram diante das melhoras
notáveis da impressão metálica. No campo dos estudos,
foram aprimorados os estudos astronômicos, instrumentos
de medição e cálculo pluviométrico e de observação. Tudo
isso estava relacionado ao vivo interesse de Sejong em
promover e melhorar a agricultura coreana. E, de fato,
parece que a população coreana aumentou para cerca de 5
a 6 milhões de pessoas no século 14.

Apesar desses avanços, o sistema de tributação do reino


de Joseon apresentava problemas notáveis. Muitos
membros da sociedade começaram a ser isentos de
cobranças. A classe dos yangbans tinham um pesado
tributo que era repassado à classe camponesa de suas
propriedades. E quase um terço da população era de
escravos, os nobi, tanto do Estado quanto particulares, que
não tinham condições de serem cobrados além de suas
pesadas obrigações.

O trono coreano em 1452 passou para Danjong (r. 1452 –


1455) que reinos por apenas três anos antes que seu tio
ambicioso tomasse o poder monárquico da dinastia de
Joseon. Suyang (1417 – 1468), no seu processo de tomada
do trono, rebaixou a condição de Danjong para príncipe e
depois mandou um irmão seu assassiná-lo juntamente com
seis membros partidários de sua causa da classe letrada
neoconfuciana. Suyang, uma vez como rei, passou a ser
postumamente referido como rei Sejo (r. 1455 - 1468), e seu
reinado passou por grandes questionamentos de lealdades.
Apesar disso, Sejong mandou compilar e codificar as
legislações anteriores num novo código, o Kyongguk taejon.
Esse código estruturou o Estado e a os estamentos sociais e
econômicos da monarquia, baseados nos escritos
neoconfucianos e a favorecer a classe de letrados dos
yangbans.

O golpe dado por Sejo foi motivo de acirrados debates e


conflitos entre a classe confuciana, que acabou se
polarizando em dois campos partidários: aqueles que
apoiaram o golpe defendendo o princípio da prevalência do
poder a prevalecer sobre a fragilidade do poder do
soberano, contra aqueles que defenderam o princípio da
regra de direito, que enfatiza a legitimidade a não ser
rompida e descontinuada por golpes. Entre esses dois
grupos opostos, seis eruditos partidários do rei deposto,
Danjong, foram perseguidos e mortos em 1455. Esses
passaram a ser referidos como os “Seis Lealistas
Martirizados” (sayuksin) e os outros seis eminentes eruditos
contrários que sobreviveram ficaram conhecidos como os
“Seis Lealistas Vivos” (saenggyuksin).

Esses dois grupos de lealistas, com o passar dos tempos,


passaram a se tornar figuras históricas de inspiração para a
defesa da monarquia de Joseon. Em fins do século 14, um
novo grupo de letrados yangban, simpatizantes dos lealistas
martirizados, passou a defender com maior vigor o princípio
do governo pelo direito, e a acusar as tomadas do poder por
golpe como o fez o rei Sejong. Muitos desses eram de
classes ascendentes, ingressos na classe dos yangbans, e
distantes das tradicionais famílias coreanas. Isso reflete a
mudança da política educacional coreana no século 14, que
permitia mesmo nas províncias e distante da capital a
candidatos alcançar o status de funcionário por meio do
mérito nos exames admissionais. A grande parte desses
ingressantes vieram das regiões distantes do sul da
península, e se inspiraram nos versos de lealdade escritos
por Jeong Mong-ju. Essa nova geração, de origens mais
humildes das províncias e do campo, passou a ser chamada
de sarim, ou letrados rústicos.

A contrapor os membros do sarim, havia aqueles dos


letrados que eram mais conservadores e defenderam o
direito da tomada do poder pela força, sublinhando a
necessidade de um forte líder em tempos de crise e
desordem. E foram membros desses últimos, mais atuantes
na corte e na capital que passaram a denunciar e perseguir
os membros sarim em uma série de expurgos em 1498,
1504, 1519 e 1545. Foram mais de 1500 literatos purgados,
isso de acordo com um historiador sarim que acabou ele
mesmo sendo destituído de seu cargo público. E
pertencente à mesma classe dos letrados rústicos, Jo
Gwangjo (1482 – 1520), tentou defender a ampla reforma
do Estado de Joseon a buscar as puras virtudes confucianas
sem privilégios e partidarismos (seonbi). Essas tentativas de
reformas frustradas e mantido o sistema de privilégios a
favor dos partidários do rei acabou resvalando para
rebeliões nas camadas marginalizadas e no campo. Um
desses líderes do interior, Im Kkeokjeong (? – 1562), filho de
açougueiro, organizou exércitos de leais, escravos, rebeldes
e bandidos, que fustigaram e roubaram de viajantes
abastados nas estradas do interior [30].

Alguns grupos de yangban pertencentes ao sarim, os


letrados rústicos, abandonaram qualquer pretensão política
e foram morar no interior, escrevendo, ensinando e
estudando em locais remotos ou em grupos organizados
chamados de seowon ( ), espécie de escolas e mosteiros
neoconfucionistas. Primeiramente fundado em 1542 na
instituição do Sosu Seowon, essas instituições depois
cresceram em grande número para mais de uma centena ao
final do século. Há relatos de que havia mais de mil desses
no século 19. E acabaram com o tempo se tornando nas
bases de poder dos intelectuais sarim pela Coreia. Apesar
de ter um apelo da erudição e da construção crítica, muitos
estudiosos dessas instituições se voltaram para questões
metafísicas, a buscar os princípios cósmicos e da inserção
humana na natureza, para longe do mundo social e político.
Nesse veio de efervescência neoconfucionista, surgiram
várias figuras proeminentes intelectuais no reino coreano.
Entre eles, três se destacaram, referidos pelos seus
pseudônimos: Hwadam (1489 – 1546), Toegye (1501 – 1570)
e Yulgok (1536 – 1584). O primeiro deles enfatizou nos seus
estudos a primazia da força material, qi( ) em chinês.
Toegye, por sua vez, defendeu o primado do princípio, li( )
em chinês. E Yulgok buscou sintetizar as ideias dos dois, a
contrapor a força dos princípios contra os da ordem
material, uma força de síntese entre o idealismo e realismo
no plano filosófico. E foram em cima dessas diferenças que
boa parte da militância intelectual e política se deu até o
século 19 na península coreana. Gerações de membros dos
yangbans, de origens diversas e aprovados nos exames de
admissão, organizaram-se em sociedades e grupos
literários, pundang, cada qual a defender suas convicções. A
partir de 1575, essas divisões começaram a se manifestar
na capital do reino, basicamente se polarizando em torno
dos chamados “ocidentais” e “orientais” pela localização de
suas sedes em Hanyang. A maioria dos “orientais” eram
defensores dos princípios (li) acima das forças materiais,
como argumentou Toegye. Os “ocidentais”, por sua vez,
seguiram a força sintética de Yulgok, a combinar o li com
qi. A partir da morte de Yulgok, em 1584, os partidários de
Toegye passaram a predominar, e depois com o crescimento
de sua escola, a disputarem a primazia intelectual e política
coreana até a segunda metade do século 19, precisamente
em 1871 pelo rei Daewon-gun (r. 1863 - 1873), quando os
vários seowons foram declarados ilegais e vistos como
antiquados e ameaçadores ao poder coreano.
Nos anos finais do século 16, a ascensão de outro
ambicioso líder guerreiro nas ilhas japonesas ao leste trouxe
consequências para a península coreana. Toyotomi
Hideyoshi (1536 – 1598) fez sua notável carreira ao
subjugar os seus rivais pelo controle efetivo da maior das
províncias japonesas. Satisfeito seu apetite no âmbito
interno, Hideyoshi então projetou seus planos para o outro
lado do Estreito de Tsushima. Uma das razões para as
invasões sobre a Coreia foi a demanda crescente do
mercado japonês de grãos, linho e algodão coreano, além
dos estimados artesanatos como as cerâmicas
envidraçadas. Para tanto, Hideyoshi passou a exigir do reino
Joseon uma retomada maior do fluxo comercial, algo que
tinha sido restringido há décadas depois da ação de piratas
japonesas na costa meridional coreana. A resposta
desinteressada das autoridades coreanas provocou a ira e
expedições começaram a ser organizadas a partir de 1592.
Além disso, havia a consideração do rei de Joseon em
consultar as autoridades chinesas Ming, já que mantinha
com eles as devidas relações tributárias. Assim, Hideyoshi
mobilizou cerca de 200 mil homens na primavera do
referido ano, ano chamado de “Imjin” de acordo com o
calendário chinês, e as tropas japonesas sob o comando de
Konishi Yukinaga, começaram a desembarcar em Pusan (ou
Busan) na costa meridional coreana [31].
De fato, o reino coreano não estava preparado para os
eventos da guerra, pois há décadas vivia no sistema de paz
ordenado pelas autoridades chinesas no leste asiático. A
classe dos yangbans e os escravos estavam isentos do
serviço militar, e os camponeses e plebeus pouco treinados
e desmotivados. Por contraste, os japoneses eram
veteranos de combate depois de anos de guerra civil no
período chamado de Sengoku Jidai, “Período dos Estados
Beligerantes” (c. 1467 – c. 1607) na história japonesa [32].
Apesar de terem o pleno domínio da produção de canhões,
o lado coreano pouco ofereceu de resistência inicial. Apenas
três semanas depois de Pusan, os japoneses já tinham
ocupado a capital, Hanyang, que provocou a fuga do rei e
sua corte para perto da fronteira com a China no rio Yalu.
Desesperado, o rei coreano Seonjo (r. 1567- 1608) foi
buscar então ajuda do imperador Ming para pedir reforços e
apoio. Depois de meses de hesitações, os chineses
mobilizaram-se para a fronteira norte coreana. Isso ainda se
deu depois dos japoneses terem avançado ainda mais ao
norte de Hanyang e saqueado a cidade de Pyonggyang em
julho de 1592 e ocupado todo o nordeste da península [33].
Depois de algumas batalhas inconclusivas, o lado japonês
ofereceu propostas de cessar-fogo, exigindo condições
duras de paz. Os termos foram prontamente rejeitados
pelos representantes coreanos, pois rejeitaram a presença e
controle de japoneses nas estradas e no interior coreano.
Foi nesse sentido que a classe de letrados dos yangbans,
parte deles sarim que viviam e atuavam no meio
interiorano, passaram a organizar com milícias locais forças
de guerrilhas voluntárias. Embora não fossem treinados
como a classe dos samurais japoneses, esses guerrilheiros
coreanos demonstraram um notável senso de lealdade
confuciana para o rei coreano e contra os invasores.
Não foi somente em torno dos guerrilheiros que se deu a
resistência coreana. A frente marítima foi notavelmente
organizada por um dos comandantes da Marinha na costa
sul, que desempenhou papel decisivo contra a situação de
emergência coreana. O almirante Yi Sunsin (1545 – 1598),
apesar de nunca de ter tido antes experiência no mar, foi
depois comparado a grandes líderes navais na história como
o almirante inglês Horatio Nelson (1758 - 1805). Visando
conter as frequentes incursões de piratas japoneses, ele
passou a usar navios inovadores de guerra, feitos de
madeira e ferro, depois chamados de Navios Tartaruga
(geobukseon, ). Essas embarcações foram usadas em
várias ocasiões desde o século 15 ao 19 na história coreana,
e eram característicos por serem revestidos com placas de
ferro e munidas de canhões.
Considerando que as tropas japonesas dependiam das
linhas de suprimento ultramarinas para abastecimento, as
batalhas navais do almirante Yi, ao almejarem os navios
japoneses durante as invasões de Imjin, foram
determinantes. Nas batalhas inicias, como as de Okpo e de
Sacheon (1592) o almirante Yi conseguiu atrair a frota
japonesa para baías estreitas da costa sul da península.
Depois do seu sucesso em batalha, foi nomeado em 1593,
como nomeado como comandante das forças navais
coreanas de várias províncias meridionais. De fato, as
proezas de Yi foram tão impressionantes que mesmo os
japoneses, na Guerra Russo-Japonesa de 1904-1905
realizaram rituais cerimoniais a ele como um deus da guerra
antes das batalhas no Estreito de Tsushima que aproxima a
península do arquipélago japonês.
As mudanças na Guerra Imjin começaram a mudar nos
meses iniciais de 1593, quando os chineses enviaram tropas
em grande escala para reconquistar as cidades coreanas de
Pyongyang e Hanyang. Após impasses e campanhas
desgastantes para as forças japonesas, fustigadas pelas
guerrilhas e vendo privadas do suprimento naval,
apresentaram possibilidades de negociações. No verão de
1593, foi declarada uma trégua entre as partes conflitantes.
A ajuda primordial dos chineses Mings não seria esquecida
pelos coreanos. Mesmo assim, a condição de paz não
satisfez por completo nem a ambição de Hideyoshi, nem os
Mings reconheceram o poderio crescentes dos japoneses
sobre os coreanos, considerados como tradicionais parceiros
e aliados tributários.
Depois de quatro anos, em 1597, as negociações ainda
estavam pendentes. Para os generais japoneses, Yi Sunsin,
agora comandante supremo de todas as forças navais
coreanas, era considerado com respeito e temor. Para tentar
contornar o almirante, os japoneses chegaram a enviar
espiões para fornecer-lhe informações e pistas erradas da
localização das forças invasoras japonesas. Dotado de senso
militar e veterano de guerra, Yi soube não confiar nas fontes
passadas, e foi considerado por muitos da corte de Joseon
como desprovido de bom senso e, assim, foi destituído de
seu cargo de comandante. As consequências disso foram
evidentes, a marinha coreana passou a apresentar claros
problemas de comando e coordenação de sua frota. Sem
comando, os navios japoneses passaram a desembarcar na
costa coreana, resultando em avanços terrestres japoneses
contra as forças chinesas e coreanas.
Ciente da grave situação, a corte coreana voltou atrás e
nomeou Yi Sunsin novamente como comandante supremo
da Marinha. Yi, uma vez de volta ao cargo e conhecendo o
número de navios em operação buscou fazer o impensável.
Tinha apenas 12 navios de guerra sob seu comando a
enfrentar mais de 50 dos japoneses. A batalha naval de
Myeongnyang ocorrida em fins de outubro de 1597 talvez
seja considerada como uma das mais heroicas da história.
Diante das condições adversas e com inferioridade
numérica, Yi conseguiu fazer uso do conhecimento
geográfico das baías e estreitos da costa sudoeste coreana
para enfrentar os japoneses em mar. Os relatos históricos
em tempos posteriores não entram em consenso sobre os
números japoneses. Mas o fato é que Yi Sunsin enfrentou
um adversário superior em número e conseguiu a proeza de
ter vencido com todos os seus 12 navios, concentrados em
pontos estratégicos em passagens estreitas e no
conhecimento das correntezas. Após algumas semanas, e
com a aproximação do inverno, os japoneses aceitaram com
humilhação a derrota naval. A vitória de Yi Sunsin permitiu
as forças terrestres chinesas e coreanas avançar e atacar os
soldados japoneses na península [34]. No ano seguinte, em
1598, Hideyoshi chegou a falecer, e não houve mais
nenhum plano das autoridades japonesas de invasão
coreana.
A Guerra Imjin, ao final, devastou boa parte da Coreia de
Joseon, causando milhares de mortos e dezenas de milhares
de prisioneiros além de incontáveis templos, mosteiros,
palácios e tesouros culturais destruídos ou pilhados. Nesse
quadro desolador, houve uma intensa troca e interação
populacional entre coreanos, chineses e japoneses como em
poucas ocasiões na história do leste asiático. Estimados 200
mil japoneses e aproximadamente o mesmo de chineses
passaram pelo solo coreano. Muitos soldados Ming, por
exemplo, se estabeleceram na península e casaram-se com
a população local, formando gerações posteriores de
descendentes. Muitos prisioneiros de guerra japoneses
depois naturalizaram-se e também formaram vínculos com
comunidades coreanas. E muitos coreanos, nessa grande e
trágica empreitada da guerra, deslocaram-se e se
assentaram no exterior. Dezenas de milhares foram trazidos
e refugiaram-se no arquipélago japonês, muitos como
prisioneiros, sendo que alguns inclusive desses tornaram-se
escravos e depois foram negociados com mercadores
portugueses em fins do século 16 [35].
Entre esses coreanos expatriados no Japão, muitos foram
depois valorizados pelo conhecimento erudito e artesanal
pelos senhores da guerra japoneses (daimiôs) que os
recompensaram com cargos e generosos estipêndios. O
renascimento neoconfuciano japonês do século 17 em
grande parte se deve a eruditos e letrados coreanos que se
tornaram professores e tutores da classe aristocrática. Isso
gerou curiosidade e demanda maior por obras e estudos dos
clássicos dos pensamentos de Confúcio e seus seguidores,
além do conhecimento renovado em agricultura, astronomia
e medicina botânica. O conhecimento da imprensa coreana
certamente influenciou o alastramento de publicações
japonesas.
Entre os artesãos coreanos, foram particularmente
valorizados os ceramistas. Há muito existia o gosto nipônico
pelas cerâmicas envidraçadas coreanas e chinesas entre as
classes privilegiadas, e isso foi objeto de ganância entre os
produtos pilhados dos piratas japoneses. A demanda por
essas obras foi incrementada com a popularização do
budismo zen que apreciava as peças de cerâmica nas suas
cerimônias, especialmente a do chá, o chadô( ). Foi
decorrente disso que ceramistas coreanos deixaram como
herança indústrias e técnicas de fabricação entre seus
descendentes no norte da ilha de Kyushu que,
posteriormente, iria frutificar na produção das belas
porcelanas Arita [36]. Curiosamente, enquanto aumentava a
demanda e apreciação dos tradicionais vasos cerâmicos
envidraçados azul-esverdeados pelos japoneses, na
península coreana o gosto começou a apreciar mais as
cores amareladas e cinzentas em porcelanas brancas
(baekja) a atender o interesse da classe yangban da
dinastia Joseon. Essa mudança talvez se explica por atender
aos preceitos confucianos da frugalidade e sobriedade [37].
Passados aproximadamente meio século, em meados do
século 17, os jurchens na fronteira norte da península
coreana começaram a consolidar e expandir sua presença
na região da Manchúria e partes do norte da China.
Depreende-se disso que a dinastia Ming se encontrava
fragilizada e dividida politicamente, algo que amplificou as
ações de lideranças rebeldes no âmbito interno e nas
fronteiras. Ao oeste, povos muçulmanos passaram a se
rebelar sob o comando de Milayin e de Ding Dougong contra
o governador regional da província de Gansu e chegaram a
ocupar a capital, Lanzhou em 1646 [38]. Apesar dos dois
líderes chineses muçulmanos terem sido capturados, novas
rebeliões estouraram em 1650 resultando em consideráveis
baixas. Ao sul, os rebeldes chineses foram inspirados a
fundar uma nova linha dinástica Ming, a costa chinesa foi
controlada por um talentoso pirata chamado de Zheng
Zhilong (1604 - 1661) cujo filho, Zheng Chenggong (ou
Koxinga), foi adotado pelo imperador local e que depois
fundou um reino chinês separado na ilha de Taiwan em 1661
graças à sua vitória sobre os holandeses.
Os problemas dos anos finais da dinastia Ming foram
ainda mais sérios nas suas fronteiras ao norte. Os jurchens,
agora referidos como manchus, tinham conquistado a
península de Liaodong em 1616 sob a liderança de Nurhaci
(r. 1616 - 1626) que proclamou o reino tardio de Jin,
ecoando a antiga soberania. Feito isso, Nurhaci se
encontrou na posição de avançar contra o império Ming que
estava em decadência. Na corte coreana, o grupo dos
yangbans mais pragmáticos dominaram as decisões
políticas e conseguiram a atenção do rei Yi Hon (r. 1608–
1623) e passaram a adotar uma postura de neutralidade em
relação aos conflitos dos manchus e os Mings. Em 1623,
houve um golpe de poder e foi entronizado o rei Yi Jong
(postumamente chamado de Injo) (r. 1623–1649) que
passou a apoiar aqueles partidários neoconfucionistas mais
ortodoxos que insistiam na lealdade irrestrita aos Mings.
Com isso foi criada a situação que Nurhaci usou como
argumento para as invasões dos manchus ao reino coreano
em 1627.
Os eventos na China tornaram-se terminais para o
império Ming quando em 1636, o filho e sucessor de
Nurhaci, Huang Taiji (r. 1626 - -1636; 1636 - 1643)
proclamou sua dinastia como verdadeira sucessora do
império chinês e a renomeou como Qing, “Pura”. Diante
disso, as autoridades coreanas inicialmente se recusaram a
reconhecer a nova soberania e suserania chinesa. E assim
tiveram que enfrentar novas invasões de centenas de
milhares de manchus, mongóis e aliados em 1636. Em cinco
dias, a capital coreana, Hanyang foi ocupada e rendida às
forças invasoras que provocou a fuga do rei Yi Jong e de sua
corte para as montanhas nas cercanias em Namhansan.
Depois de um mês e meio, o rei coreano decidiu se render
e, humilhado, se prostrou por nove vezes em frente ao
imperador manchu, Huang Taiji, e se declarou como vassalo
(ou irmão menor, sadae) da nova dinastia chinesa na
assinatura do tratado de Samjeondo [39].
A Guerra Imjin e as invasões manchus trouxeram
consequências profundas no reino coreano da dinastia
Joseon. As devastações da guerra foram assinaladas, mas a
maior mudança política se deu na China, onde a dinastia
Ming caiu diante dos manchus em 1644. No Japão,
igualmente, houve mudanças políticas centralizadoras
desde a morte de Toyotomi Hideyoshi em 1598. Suas ações
esgotaram os recursos do Estado e enfraqueceu
consideravelmente sua rede de lealdades, permitindo a
ascensão de um outro líder japonês após a batalha de
Sekigahara em 1600 que estabeleceria uma dinastia de
xoguns (bakufu) no Japão, Ieyasu Tokugawa (1543 - 1616)
[40]. Em termos de política externa, o reino coreano

posicionou-se como vassalo e tributário da nova China dos


Qings (manchus), e o Japão buscou cada vez mais restringir
os contatos com os estrangeiros a partir dos decretos de
1635 (sakoku) na província meridional de Satsuma e da ilha
de Tsushima. E foi pelo representante desta última ilha o
único contato oficial permitido por séculos entre a corte
coreana e as lideranças japonesas, na cidade portuária de
Pusan [41]. Estava implícito nas relações com os japoneses,
portanto, que os coreanos eram os mais próximos e
legítimos herdeiros dos valores confucionistas e precedência
nos protocolos de Estado, visto que o rei coreano seria
recebido na capital do xogunato, Edo (atual Tóquio),
enquanto o maior representante japonês, o senhor de
Tsushima, apenas num bairro da comunidade mercantil
japonesa de Pusan. Nesse veio, os coreanos, até mesmo a
desconsiderar os manchus como bárbaros diante dos
tradicionais valores chineses dos Mings, começaram a se
considerar como os únicos e legítimos herdeiros civilizados
no leste asiático a partir de meados do século 17.
5 OS HERDEIROS DE CONFÚCIO

O restante do século 17 após as invasões manchus e o


seguinte século são em geral considerados como de paz e
estabilidade coreana. A fronteira com a China dos Qings, ao
norte, foi negociada estabelecida ao longo dos rios Yalu e
Tumen, tal como se encontra nos dias atuais. É significativo
o fato do governo coreano ter erguido um monumento de
fronteira em 1712 [42] um monumento às origens mais
remotas da nação no venerado Monte Baekdu. Embora
carregado de simbolismo, a fronteira ainda seria motivo de
discordâncias entre os dois governos nos séculos seguintes.
Outros eventos internos e externos tiveram repercussão no
reino de Joseon, embora isso seja considerado à luz de que
houve notável recuperação e crescimento econômico e
social até as conturbações em fins do século 19.

Os debates políticos durante o reinado de Hyojong (r.


1649 - 1659) se deu mais em torno sobre rituais
confucianos apropriados a respeito do período do luto de
ancestrais (jesa, ) . Embora pareça trivial, esses debates
provocaram nos tribunais vivas discussões entre os
letrados, alguns deles entendendo que o soberano deveria
observar três anos de luto e de guarda diante da morte de
um de seus familiares. Outros argumentaram a favor de um
ano de luto como apropriado.

Os debates polarizaram-se em torno de duas figuras


acadêmicas da classe yangban. Um deles, Song Si-yeol
(1607 – 1689) e seus correligionários, referidos como os
“ocidentais”, a favor da brevidade do luto. Outros,
“sulistas”, defenderam com argumentos um período mais
prolongado, e foram esses que venceram nos tribunais o
debate, representados por Heo Mok (1595 – 1682). Assim,
foram garantidos nos próximos anos os cargos mais
influentes para membros dessa segunda escola
neoconfuciano coreana.

A profundidade do impacto dessa controvérsia ritualística


amplificou-se para a sociedade na segunda metade do
século 17. Pois os questionamentos das obrigações e rituais
aos ancestrais - codificados e promulgados no código de leis
Gyeongguk daejeon ( ) desde fins do século 15 -
envolveu o papel da família, das responsabilidades dos
filhos e herança. Como exemplo, era entendido pelos textos
confucionistas que os antepassados são responsabilidade
apenas do primogênito (jangja, ), e a ele cabia a
herança. Mas havia a prática coreana, mais igualitária, de
dividir a herança familiar entre todos os filhos e filhas, e as
cerimônias de respeito aos ancestrais cabia a todos numa
base rotativa. Os problemas começaram a se tornar
evidentes no século 18 quando poderosas famílias
começaram a questionar os costumes nos tribunais
coreanos. Se a herança caberia, por direito e tradição dos
textos, ao filho mais velho, por que os outros filhos teriam
os encargos das cerimônias dos falecidos? Ou por outro
lado, se a herança fosse dividida, por que a
responsabilidade fúnebre era exclusiva da primogenitura?
Alguns começaram a questionar se as filhas deveriam fazer
parte das heranças, e de que essas inovações dos costumes
coreanos ao longo dos séculos era sinal de que a nação
tinha se degenerado do caminho dos sábios confucianos da
antiguidade.

As implicações dessas mudanças começaram a afetar o


recebimento das propriedades da família para as filhas, que
passaram a ter direito a apenas um terço, e depois de
algum tempo, nenhuma da parte da herança. A partir de
textos de espólio e patrimônio dos séculos 17 e 18, indica-
se que as mulheres não teriam mais responsabilidades a
respeito das obrigações funerárias dos antepassados,
aliviando-as, mas também as privando dos direitos [43]. Nas
gerações subsequentes, isso também afetou o processo de
herança para os filhos. Entendia-se que somente aos filhos,
masculinos, teriam direito à herança familiar, o que
provocou uma tendência de adoção em caso de inexistência
de um herdeiro legítimo. Adotava-se, em suma, um primo,
sobrinho ou alguém próximo da linhagem para tal. Até a
segunda metade do século 17, os herdeiros poderiam vir da
família maternal ou paternal, mas isso passou a ser
exclusivamente patrilinear na história coreana. Diante disso,
os casos de adoção chegaram a 15% da população coreana,
apontando a escala e o massivo costume de adoção [44].

Outros aspectos da atitude patrilinear baseadas no


confucionismo passaram a repercutir na sociedade coreana.
As noivas recém-casadas deveriam agora mudar para a
família do noivo depois de presentear o dote de casamento.
Na nova família, a noiva, sua família e suas filhas perderiam
todos os direitos de herança, e até mesmo o uso do
sobrenome era sempre originado do elemento masculino da
família, visando assim resguardar os direitos da herança.
Nesse sentido, sobrenomes começaram a predominar em
várias vilas e localidades coreanas. Isso era ainda mais
corrente entre aquelas famílias tradicionais de yangbans, e
entre famílias mais simples que emulavam as classes
superiores visando ligar-se a familiares poderosos e
influentes.

Foi por esse motivo que os documentos genealógicos


coreanos se tornaram tão importantes no século 18, pois
tinham o objetivo de justificar por linhagem patrilinear os
direitos de herança e posse. Esses documentos apresentam
somente as descendências masculinas, com poucos ou
nenhum detalhe das esposas e filhas que, em casos, sequer
são registradas com sobrenome da família do noivo. Ou
então eram referidas apenas como “esposa de”, “mão de” e
“filha de” [45]. Os clãs e famílias coreanas, em outras
palavras, passaram a adotar um sistema conservador e
estritamente patrilinear, e membros da linhagem feminina
eram ignorados ou escassamente registrados. Era comum,
pois, descendentes das filhas de um eminente membro da
família sequer considera-los como netos, referindo-se a
esses como oeson, “netos de fora” [46].
Essa estruturação familiar e societária coreana, de
heranças, adoções, casamentos e genealogias, refletiu o
quadro de mudanças maior que estava em andamento em
fins do século 17. As causas dessas mudanças ainda devem
ser estudadas, mas a base ideológica adveio do
renascimento confucionista no reino coreano da época, ou o
neoconfucionismo, que ganhou destaque e força na política
e sociedade desde o século 14. Outro aspecto a observar
foram as pressões populacionais que a Coreia começou a
sofrer com o crescimento vegetativo no século 17,
chegando a um ponto de saturação, e empurrando os
limites da produtividade da terra. Isso, evidentemente, teve
as consequências sobre questões familiares, clânicas e
heranças.

Subjacente à preocupação com os devidos rituais e


interpretação dos estudos confucianos em fins do século 17
estava o fato de que a dinastia Ming da China havia caído e
substituída por outra dinastia considerada como não-
chinesa e bárbara aos olhos dos letrados yangbans e corte
coreana. Frente a isso, a Coreia dos Joseon passou a se
considerar como os verdadeiros herdeiros confucianos, e
isso orientou toda a sua série de reformas sociais e políticas
nos séculos 17 e 18. A identidade coreana da dinastia
Joseon fundamentou-se a partir disso [47].

No plano político, a Coreia atravessou um considerável


período de estabilidade no século 18, com apenas três reis
soberanos. O primeiro deles governou por quase 45 anos,
Sukjong (r. 1674 - 1720) sendo sucedido brevemente por
Gyeongjong (r. 1720 - 1724), e seu sucessor, por 52 anos,
Yeongjo (r. 1724 – 1776). Este último foi o mais longevo da
dinastia Joseon. Yeongjo provou ser notável no trono e como
soberano da Coreia que deixou sua marca pelos seus
persistentes esforços a reformar o sistema de tributação do
reino, governar pela ética confuciana, e minimizar e
reconciliar a luta entre as facções políticas e dos yangbans
sob sua “Política da Harmonia Magnífica" (Tangpyeong,
). Sua genuína preocupação com suas virtudes
confucianas e seus súditos ficou gravado nos “Anais da
Dinastia Joseon” na página referente ao dia 27 de julho de
1728:

Oh céus! Nós tivemos inundações, secas e fome nos últimos quatro anos
por causa da minha falta de virtude (...) Como meu pobre povo pode
manter seu sustento sob tais dificuldades?

Apesar de suas virtudes sinceras, o reinado de Yeongjo


foi marcado por dois eventos de magnitudes diferentes. Um
deles, de menor impacto histórico, foi quando sucedeu seu
meio-irmão, Gyeongjong, que tinha morrido sob
circunstâncias suspeitas em 1724. Decorrente disso,
surgiram suspeitas de seu envolvimento na morte, mas o
caso nunca chegou a ser esclarecido e provado. O segundo
evento foi mais dramático. Os dois filhos e herdeiros de
Yeongjo provaram ser limitados e incapazes ao trono. Um
deles morreu jovem, deixando o outro que ficou conhecido
como príncipe Sado (1735 – 1761). Sado, aparentemente,
sofria de transtorno mental, seu comportamento era
mercurial e imprevisível. Descarregava sua frustração nos
subordinados que, por vezes, resultavam em mortes. Seu
comportamento era lasciva e era frequentemente reprimido
por suas escapadas à noite e certa vez, até a cidade de
Pyongyang em 1761 [48].

Yeongjo, determinado a retificar o comportamento de seu


filho, tentou instilar nele o conhecimento dos clássicos e
virtudes pregadas pelo confucionismo. Depois de anos de
esforços infrutíferos, o monarca decidiu agir da maneira
mais extremada, visando conservar o respeito e
continuidade dinástica, matar seu filho. Pois tinha em vista
seu neto que de fato se tornou seu sucessor à altura das
expectativas, Jeongjo (r. 1776 – 1800). A morte de Sado
ficou gravado para a posteridade conforme os relatos de
sua esposa, a princesa Hyegyong (1735 - 1816). No fatídico
dia, Yeongjo vestiu seu uniforme militar e foi ao palácio de
seu filho em agosto de 1761. O pai exigiu mais uma vez
promessas de retidão, mas logo se viu contrariado. Dias
depois, Yeongjo pediu a Sado que conservasse a honra da
família e cometesse suicídio, pois o valor confuciano preza,
acima de tudo, a suprema lealdade filial e obediência aos
superiores. Com a recusa do filho, o rei então chamou seus
guardas e trancaram o príncipe num baú de madeira. Oito
dias depois, Sado veio a morrer [49]. Com isso, foi evitado a
morte de um membro da família real por derramamento de
sangue e contato corporal, conforme ditava a tradição
coreana.
O século 18 testemunhou uma mudança entre a classe
dos literatos, normalmente aqueles marginalizados e não
ocupantes dos cargos mais influentes do reino de Joseon.
Esses passaram a defender uma reforma do pensamento
neoconfuciano tal como se consolidou entre a elite coreana,
que tinha buscado mais as questões ritualísticas e
metafísicas. A contrapor isso, surgiu a escola silhak( ),
“aprendizado prático”, que tinha se baseado nos escritos de
Yu Hyeongwon (1622 – 1673) e Yi Ik (1681 – 1763). Esses
estudiosos propuseram uma ampla reforma das práticas e
normas confucianas que tinha estruturado o governo. O
primeiro pensador enfatizou um novo sistema de seleção e
recrutamento nas instituições educacionais, e que os
exames deveriam ser mais focados em assuntos
administrativos práticos, e não apenas a se basear em
obras clássicas confucianas [50]. Apesar de popular entre os
críticos e inovadores membros do silhak, essas reformas
não foram implementadas no sistema coreano.

Apesar dos obstáculos do sistema que tendia a preservar


as tradições, o rei Jeongjo em 1776 criou uma academia
real, o Kyujangkak, nas dependências dos jardins secretos
do palácio real em Kurnwon. E para aconselhá-lo para
gerenciar a instituição superior chamou um eminente
membro da escola silhak, Jeong Yakyong (1762 – 1836),
também conhecido como Dasan. Esse estudioso, uma vez
se vendo no seu influente cargo, passou a implementar o
ensino do conhecimento científico e técnico ocidental,
especialmente a engenharia civil que era tema de sua
fascinação e curiosidade [51]. Isso se deu num contexto
histórico em fins do século 18, pela crescente presença de
estrangeiros na China que deu acesso às obras e estudos
ocidentais por meio de representantes letrados coreanos na
corte em Pequim. Mas talvez o maior legado de Dasan foi a
sua ativa supervisão da construção do forte de Hwaseong
em Suwon, construído entre 1794 e 1796, uma obra de
engenharia coreana inovadora e fortemente influenciada
pelos novos conhecimentos científicos da época [52].

As transformações sociais se deram também em outras


áreas. No final do século 17, houve um crescimento e
prosperidade das atividades comerciais e,
consequentemente, da classe mercantil. Se antes as trocas
comerciais do reino eram basicamente in natura, ou seja,
escambo, as reformas monetárias e tributárias feitas na
Coreia, os mercados pelo país cresceram em atividade e
escopo. Ligados aos mercados, as estradas e portos
amplificaram ainda mais os acessos e mercadorias em
troca, alcançando as origens produtivas das mercadorias no
interior ou exterior. A moeda dinamizou ainda mais as
transações, e possibilitou maior poder de tributação do
Estado. Assim, grandes centros comerciais começaram a se
estabelecer, como em Kaesong, Pyongyang, Uiji e Tongnae.
Esta penúltima, localizada ao longo do rio Yalu, e a última no
sudeste da península prosperam com os contatos feitos com
os manchus e japoneses, respectivamente.

Antes do século 17, a atividade comercial e tributária era


feita com base do escambo, em bens como arroz, tecidos,
ouro, pele e até ginseng. Em 1678, o governo decidiu
fabricar moedas padronizadas de cobre, baseadas no
sistema chinês, mas com um sistema independente.
Eventualmente, em fins do século 18, as trocas monetárias
coreanas se consolidaram de forma soberana. Assim, o valor
da moeda passou a ser a medida das riquezas e da
tributação a ser taxada. Essas taxas passaram a ser
calculadas não mais nas dimensões das propriedades de
terra, mas na sua capacidade produtiva. Foram então
reformuladas as classificações fundiárias do reino, em cinco
níveis, a depender da fertilidade de cada unidade agrária.

Essas reformas fundiárias foram fruto de uma ampla


reforma tributária feita em fins do século 17, chamada de
taedong, que buscou padronizar e simplificar os impostos
[53]. Em meados do século 18, o sistema obrigatório de

trabalho agrário, semelhante à corveia, foi revisto e as


horas de trabalho foram uniformizadas e tornadas mais
justas. Devido às essas reformas, a indústria artesanal
prosperou. E assim a capacidade de arrecadação tributária
do governo ampliou-se. Matérias-primas, produtos e
serviços poderiam agora ser comprados com moeda,
gerando crescimento no mercado privado interno, desde
armas até roupas. O trabalho artesanal passou a contratar
mais funcionários remunerados, assim como nas minas de
mineração que passaram para mãos privadas desde fins do
século 17. Um mineral em particular prosperou
enormemente, a prata, pela demanda do mercado chinês.

Na agricultura, houve crescimento de rendimento nas


plantações de arroz com a introdução de novas técnicas e
espécies mais produtivas e resistentes ao clima e pragas. E
com isso, a população coreana aumentou em número.
Estudos populacionais da época estimam que em meados
do século 17, a totalidade de coreanos era em torno de 8 a
9 milhões de pessoas, pulando para entre 13 e 14 milhões
em meados do século 18 [54] apesar das frequentes
epidemias de malária, sarampo, varíola assim como a fome
decorrente de surtos e quedas de colheitas [55].

A sociedade coreana de Joseon em geral era composta


por estratos sociais com base nos princípios do
neoconfucionismo [56], e a mobilidade era bastante
incomum. Havia no topo os yangbans, e depois logo abaixo
chungin (“pessoas do meio, classe média”, ), yangin
(“plebeus”) e cheonmin (“pessoas vulgares ou comum”,
), que também incluía os servos e escravos (nobi, ).
Esses status eram hereditários e os casamentos entre as
categorias eram raras ou desconsideradas como não-
oficiais. A imobilidade maior era mais estrita na medida em
que se subia de status social, sendo quase impensável a
entrada de pessoas comuns ou escravos de serem
yangbans. Plebeus poderiam, teoricamente, prestar os
exames de admissão à classe dos letrados, mas os custos e
tempo de dedicação aos estudos de admissão. E mesmo se
fosse aprovado, seria necessário fornecer sua linha
genealógica, a qual uma família plebeia não teria registro.

As guerras e o crescimento dos mercados e cidades


provocaram mudanças nesse rígido sistema social. Entre os
nobi, após as guerras contra os japoneses e manchus nos
séculos 16 e 17, muitos se viram libertados por terem
prestado serviço militar. Ademais, houve série de leis foram
implementadas entre 1669 e 1731 que libertava os filhos de
mães comuns, mesmo se o pai fosse um nobi [57]. Isso, com
o tempo, diminuiu consideravelmente os escravos e servos
da sociedade coreana ao longo dos séculos 18 e 19, com o
fim oficial da escravidão vindo a acontecer somente em
1894.

Apesar dessas mudanças, a classe yangban tentou


manter seu status exclusivo e privilegiado dos outros. Ao
contrário da China e de outras nações do leste asiático, a
Coreia de Joseon discriminava aqueles nascidos de esposas
secundárias ou concubinas, chamados de soja [58]. Essa
singular discriminação havia sido iniciada no reinado de
Taejong no início do século 15 que tinha lutado pelo trono
contra seu meio-irmão. Assim, a tradição real considerava
apenas uma esposa oficial para efeitos de herança ao trono,
embora as relações extramaritais fossem liberadas. Isso foi
estendido para as classes privilegiadas da sociedade como
os yangbans. Considerando que os sojas eram, portanto,
excluídos dos direitos da família, esses filhos ilegítimos não
poderiam provar sua linhagem genealógica e, portanto,
impedidos de assumirem postos oficiais mesmo se
aprovados nos exames.

O crescimento da economia coreana nos séculos 17 e 18


provocou um aumento e prosperidade da classe mercantil,
plebeus, que poderiam casar-se com membros de famílias
de yangbans e inserir-se na linhagem genealógica,
possibilitando assim acesso aos exames de admissão aos
cargos oficiais (gwageo). Por consequência disso, na virada
do século 19, a classe yangban que era estimada em torno
de 10% da população coreana aumentou para mais de 50%
na virada do século 19. E houve notável inchamento da
classe média, chungin, composta por médicos, advogados,
astrônomos e intérpretes e pequenos burocratas. Isso se
deu num contexto de crescimento urbano e com os sojas
que não conseguiram adentrar a classe yangban. Foram os
chungins que foram os maiores defensores das novas ideias
advindas do conhecimento ocidental que iria se tornar
evidente no século 19.

Esse dinamismo social, naturalmente, refletiu-se nas


artes e literatura coreana. No campo da literário, houve a
notável figura do escritor e intelectual Heo Gyon (1569 –
1618) que buscou nas suas linhas uma nova sociedade
confuciana a combater os vícios e privilégios da realidade
coreana. Conta-se que foi esse o autor do clássico, “A
História de Hong Gildong”, em que o personagem principal,
um soja, ou seja um filho ilegítimo, luta e anseia por justiça
possivelmente inspirado na figura do século 16, Im
Kkeokjeong [59]. Outro autor em meados do século 18, Bak
Jiwon (1737 – 1805) expôs com igual veemência a hipocrisia
dos yangbans no seu livro “A História de Ho Saeng” que
conta as experiências amargas da classe humilhadas dos
comerciantes frente às arrogâncias dos letrados. Um livro
que teria grandes consequências para a literatura coreana
foi um romance escrito em hangul de autoria anônima, “A
História de Chunhyang”. A obra conta a paixão de uma
jovem filha de uma concubina por um membro yangban de
uma tradicional família de magistrados [60]. As linhas mais
comoventes mostram a lealdade e integridade da jovem
frente às inconstâncias do amado e das pressões
conservadoras da sociedade coreana. Ao final, os dois se
casam refletindo os ventos de mudança que estava
tomando a dinastia Joseon em fins do século 18. Essa
história depois teria larga repercussão no teatro coreano,
pansori ( ).
O século 18 testemunhou um renascimento cultural
coreano. Novas tendências e escolas de filosofia e literatura
ecoaram as mudanças dos valores e questionamentos na
sociedade. Nas artes, a pintura coreana passou a enfatizar o
retrato de paisagens coreanas, em vez daquelas
tradicionalmente copiadas das paisagens do sul da China
que tinham se tornado cânone artístico desde a dinastia
chinesa Song do século 10. Um dos mais celebrados artistas
desse veio foi Jeong Seon (1676 – 1759) que retratou a
beleza única de Kumkangsan (ou Geumgangsan),
“Montanhas de Diamante”, e de outras paisagens naturais
coreanas [61]. Também no campo da pintura, destacou-se
Gim Hongdo (1745 – 1806 ? 1814?), conhecido como
Danwon, que pintou sublimes obras realistas em fins do
século 18. Foi pelas suas mãos que foram feitos retratos
oficiais dos membros da realeza da dinastia Joseon, e
igualmente de cenas cotidianas, desde estudantes,
trabalhadores, mulheres e diversas cenas da natureza [62].
6 O REINO EREMITA

A ordem internacional no leste asiático no século 19


apontava para mudanças. Estrangeiros começaram a
pressionar a abertura dos portos e entrada de
representantes na costa chinesa e japonesa. Na China, a
assinatura do Tratado de Nanquim em 1842 que deu termo
à Primeira Guerra do Ópio (1839 – 1842) sinalizou a
fragilidade da corte dos Qings frente aos ocidentais. Na
ótica dos Joseons, que desde 1636 reconheceram-se como
aliados nominalmente tributários dos chineses, o evento foi
significativo, pois as notícias chegaram através dos
enviados à corte em Pequim. Ao Japão, a Coreia tinha
restringido os contatos com o xogunato dos Tokugawas
desde 1609, somente permitido através do senhor local de
Tsushima que pagava tributo nominal aos coreanos. Em
1854, mesmo o Japão foi forçado a abrir seus portos para os
EUA após ter sido pressionado pela frota do Comodoro
Matthew C. Perry (1794 - 1858).

Os eventos iniciais de mudanças no leste asiático


desdobraram-se para ainda mais nas proximidades do reino
coreano. Em 1858, a China dos Qings cedeu, envolvida na
repressão dos rebeldes Taipings, províncias costeiras de seu
império a nordeste para a Rússia sob a pressão do Conde
Muraviev, dando a esse país acesso marítimo das extensões
siberianas. E, assim, estendendo as fronteiras russas com a
península coreana através do rio Tumen. Isso foi
concretizado após a assinatura do Tratado de Aigun, que
revistou a fronteira russo-chinesa estabelecida desde o
Tratado de Nerchinsk de 1689 [63]. Apesar disso, a Coreia
ainda se encontrava isolada dos ocidentais, tanto em
termos diplomáticos como geográficos. A leste, o
arquipélago japonês, e ao sul e oeste pelo império chinês,
fez com que os interesses imediatos dos ocidentais se
concentrassem nesses dois governos, que adiou os contatos
ocidentais com a corte Joseon por mais algumas décadas
até fins do século 19.
O reino coreano, diferentemente do Japão que tinha
negociado uma tímida presença de legações portuguesas e
holandesas desde o século 16, historicamente havia
restringido seus contatos com o contato ocidental,
restringido seus acessos portuários a representantes oficiais
japoneses e chineses. Na ótica ocidental, isso criou a
percepção de que a Coreia era uma espécie de “reino
eremita”, isolado e subordinado ao império chinês e adepto
aos preceitos confucionistas pela sua corte de funcionários
letrados, yangbans. Apesar disso, a influência ocidental
começou a se fazer sentir no reino coreano. Grande parte
disso se deveu a mercadores e representantes coreanos na
capital chinesa, que trouxeram de volta livros, ideias e
produtos ocidentais desde o século 18 [64]. Uma dessas
inovações foi o catolicismo, presente na China na presença
de missionários estrangeiros. Isso revelou-se singular, pois a
entrada dessa influência na Coreia, ao contrário das outras
nações no leste asiático, se deu por via indireta, através de
contatos chineses, e passou a ser mais gradativo e menos
impositivo.

A bem da verdade, o catolicismo foi introduzido entre os


coreanos aos poucos estendendo-se desde fins do século 16
por livros traduzidos ao chinês em Pequim [65]. Pela
dinâmica gradual e estendida ao longo do tempo, os
coreanos passaram a absorver e reinterpretar esse novo
“aprendizado ocidental” (seohak, ), não como uma forma
impositiva de dogmas religiosos, mas como um conjunto
filosófico a rever e repensar a ortodoxia neoconfucionista do
reino Joseon. Portanto, as ideias ocidentais e o catolicismo
foram antes de tudo objeto de interesse de estudiosos
coreanos que depois passaram a propagá-los na sua terra
nativa.

Nessa conjuntura, destacou-se a figura de um dos


primeiros coreanos convertidos ao catolicismo, Yi Sung-hun
(1756 – 1801), batizado em 1784 por um missionário
ocidental em Pequim. Ao voltar para a Coreia, seu ardor
religioso e heterodoxia filosófica atraiu seguidores entre
yangbans descontentes com a tradição, intérpretes,
comerciantes, médicos e membros da classe média
(chungin). Com o crescimento desses, os oficiais do governo
passaram a pleitear nos tribunais meios de suprimi-los,
invocando a tradição e costume de proibição de contatos
não-oficiais com o estrangeiro. Diante disso, foi proclamada
em 1785, com os pedidos do inspetor geral Yu Ha-won, uma
lei de impedimento ao espalhamento do credo católico
considerado como herético à ortodoxia coreana e à
importação de livros católicos e similares do pensamento
ocidental [66]. Além disso, surgiram acusações de
negligência dos cultos de ancestrais por alguns católicos
coreanos que foram ameaçados de pena de morte.

Essa reação conservadora do governo coreano indicou a


crise que o sistema ortodoxo neoconfuciano começou a
revelar no início do século 19. Houve um movimento de
puristas neoconfucianos, referidos como wijong choksa
(“defesa da ortodoxia, rejeição da heterodoxia” ou “defesa
dos ensinamentos legítimos de Confúcio, rejeição dos falsos
ensinamentos”) que repudiaram qualquer influência
estrangeira. Isso se combinou com a dominação de
elementos conservadores de yangbans no governo coreano
que decidiram por decreto em 1801 a perseguir e matar os
convertidos católicos (“Perseguição Sinyu”, ),
resultando na morte de mais 300 coreanos, muitos
pertencentes à críticos e oposicionistas do sul da península.
Esse ato marcou historicamente o reino coreano, com uma
elite conservadora e coibir qualquer manifestação
estrangeira suspeita [67]. E isso ampliou-se para uma
política de Estado referendado pelo monarca Sunjo (r. 1800 -
1834) – que à época tinha apenas 11 anos de idade - e
influenciado pelas convicções de sua bisavó e regente, a
rainha Jeongsun (1745 - 1805).

Apesar da curiosidade e inquietação de setores da


sociedade coreana pelos novos conhecimentos revelados
nos livros e estudos ocidentais, o reino de Joseon tomou a
crucial decisão de impedimento. Tendo isso em mente, as
demandas por reformas e inovações no reino coreano
passaram a ser desencorajados ou mesmo condenados. Em
contraste, as ideias de inovação passaram a se alastrar em
movimentos e grupos clandestinos, e muitos desses tinham
contatos com os estrangeiros como comerciantes e figuras
marginalizadas da sociedade.
A tradição ortodoxa e seu sistema de privilégios a
poucos pelos yangbans passaram a ser alvo de denúncias e
ódio da população em geral. E isso explodiu em revoltas
populares abertas contra uma monarquia vista como
corrupta e atrasada. Em 1811, um candidato a yangban que
tinha sido reprovado nos exames admissionais, Hong
Gyong-nae (1780 – 1812), liderou um grupo de fazendeiros
e camponeses no noroeste da península e chegaram a
tomar o controle de um forte da região, o de Jeongju. Após
cinco meses, as forças do governo suprimiram a rebelião
[68]. Decorridos quase 50 anos, outra grande rebelião

ocorreu em Jinju em 1862, conhecida como a Rebelião


Imsul. As causas desse descontentamento vieram dos
abusos e irregularidades dos arrecadadores fiscais,
provocando a indignação de camponeses e plebeus [69]. As
revoltas depois se espalharam para mais de 70 cidades e
vilas, e foram tomadas muitas propriedades, seus estoques
de comida e a prisão de alguns membros do governo, como
o yangban magistrado, Baek Nakshin.

O reinado de Cheoljong, o 25º rei da dinastia Joseon


terminou com sua morte em 1864, sem deixar um herdeiro.
Diante disso, houve momentos de indecisão sucessório, e os
grupo de altos funcionários conservadores, pertencentes ao
chamado grupo dos “Patriarcas”, originados em boa parte
da região de Andong do clã dos Kims, clamaram para que
fosse apontado um membro de seu clã que
tradicionalmente ocuparam o trono. A decisão sucessória,
por direito, cabia à rainha viúva mais velha, Sinjeong (1809
- 1890), que por pertencer a outro clã, apontou como
herdeiro um de seus familiares de 11 anos, o príncipe
Gojong. Para reger em nome do jovem príncipe, foi
escolhido o príncipe Heungseon – recebendo assim o título
de Daewongun (“Grande Arquiduque”) – que assumiu o
controle do reino de 1863 a 1873 até a maioridade do
herdeiro.

Heungseong foi, portanto, o rei de fato de Joseon


durante um período crucial de sua história. Nascido na
família real e forte adepto do neoconfucionismo, esse
regente sempre tinha se indignado com as práticas abusivas
e corrompidas do passado, em especial contra os
privilegiados membros do clã dos Kims de Andong. Ao
chegar ao poder, o Daewongun passou então a conter a
influência proeminente daquele clã, e assim concentrou-se a
minar as bases do poder da classe yangban pelo reino. Para
tanto, nomeou pessoas com reconhecido talento e mérito
da classe dos plebeus e de letrados que tinha sido
marginalizado do poder, como aqueles originados do sul da
península.

Assim, o regente ganhou cada vez mais popularidade


entre as classes populares e dos camponeses, ainda mais
quando promoveu uma ampla política de financiamento e
empréstimo para o plantio de grãos nos campos, a conter as
rebeliões do passado coreano. A fim de ganhar mais
popularidade popular, Heungseong empreendeu a
ambiciosa tarefa de restaurar o Palácio de Gyeongbok
(Gyeongbokgung), um dos maiores palácios dos Joseons,
que tinha sido destruído durante a Guerra Imjin de fins do
século 16. Para custear tal empreitada, o regente passou a
taxar os yangbans, que até então tinha gozado de
considerável isenção fiscal. E passou a recorrer a doações
privadas para cobrir as despesas, e mobiliou ampla força de
trabalho das províncias.

No aspecto externo, o reino coreano começou a ser alvo


de interesse internacional. Um dos primeiros contatos
registrados de ocidentais se deu por acidente de um navio
mercante britânico, em 1832, cuja tripulação chegou a
desembarcar na costa ocidental coreana e chegou a ser
hospedada e mandada de volta às embarcações quando
reparados os danos. Nas décadas seguintes, outras
embarcações de ocidentais passaram a ocorrer na costa
coreana. Muitos desses estavam determinados a fazer
contato duradouro com as autoridades, mas desconheciam
a prática tradicional coreana de remeter os contatos com
estrangeiros para a corte em Pequim, a respeitar sua
condição de reino tributário. Decorrente disso, os ocidentais
na Coreia foram sistematicamente evitados ou rejeitados.

No verão de 1866, um navio mercante dos EUA,


Surprise, naufragou perto da costa noroeste e sua tripulação
foi resgatada com a devida hospitalidade. Depois de
tratados, os oficiais coreanos devolveram-os à China. Dois
meses depois, em julho, outro navio americano, General
Sherman, vindo do porto chinês de Tianjin e armado com
canhoneiras, penetrou o rio Taedong até alcançar a cidade
de Pyongyang em busca da abertura do mercado e
comércio [70]. Desta vez a população coreana reagiu,
incendiando a embarcação e matando sua tripulação. Um
dos magistrados de Pyongyang, Bak Gyusu (1807 – 1877),
acreditou que a embarcação tinha violado a ordem
tradicional coreana ao invadir o território do reino sem antes
ter obedecido ao processo diplomático.

O Daewongun não tinha experiência nem conhecimento


suficiente da política internacional quando esse incidente
ocorreu, e considerou qualquer presença estrangeira como
fonte em potencial de agressão e ameaça. Ao invés de ter
feito o contato direto com os americanos, o regente coreano
seguiu a tradição de respeitar a suserania chinesa nos casos
de contatos estrangeiros. Sua política refletia a percepção
da classe yangban defensores dos preceitos
neoconfucianos. Visando preparar-se e combater futuros
enfretamentos, Heungseon passou a erguer vários avisos
inscritos em estelas de pedra avisando a população a evitar
negociar com os ocidentais e combatê-los [71].

Nesse sentido, o regente coreano passou em 1866 a


perseguir qualquer estrangeiro e ideias ocidentais no reino
Joseon. Assim, foi decidido novamente reprimir com vigor o
catolicismo que tinha crescido em número de adeptos para
em torno de 23 mil, graças à atuação de alguns padres
jesuítas franceses [72]. Na repressão adotada, cerca de 8 mil
coreanos convertidos e nove missionários franceses foram
executados diante dos tribunais coreanos, no episódio
conhecido como a “Perseguição Pyong-in” (Pyongin pakhae).
Como resposta à notícia, o imperador francês, Napoleão III,
decidiu retaliar e mandou no outono de 1866 uma frota
naval de sete navios de guerra sob comando do almirante
Roze a invadir e ocupar a ilha de Kanghwa que protegia a
costa da capital do reino [73]. Como resultado, as forças
francesas ocuparam e saquearam os valores da ilha e,
durante o mês de posse da guarnição coreana, exigiram a
pronta punição daqueles responsáveis pela morte dos
missionários franceses.

Apesar do sucesso ofensiva sobre a ilha, os franceses


não conseguiram enfrentar as forças defensivas coreanas
de canhões nas fortalezas nas redondezas. Com o resultado
da retirada dos franceses sem qualquer acordo diplomático
feito. Com isso, foi criada a impressão de que os coreanos
poderiam resistir à presença dos ocidentais. Em 1871, cinco
anos depois do incidente do navio americano, o General
Sherman, o governo dos EUA passou a exigir a abertura
forçada da Coreia para o comércio. Foram enviados o
representante dos EUA em Pequim, Frederick F. Low, e o
comandante da frota de cinco navios de guerras, o contra-
almirante John Rodgers. Excessivamente confiantes, os
navios americanos adentraram o rio Taedong que passou
por uma ampla fortificação de suas margens depois da
invasão francesa. Assim, as baterias coreanas abriram fogo
contra os americanos que, embora tivessem tomado o
controle de alguns fortes, não conseguiram impor derrota
decisiva sobre a defesa coreana.

Encorajados pela aparente vitória sobre os franceses e


americanos, as autoridades coreanas sob a regência de
Heungseon passaram a reforçar as ideias tradicionais de
relações com o leste asiático. No entanto, o Japão tinha
atravessado um febril período de mudanças desde a
abertura de seus portos em 1854. Com a ascensão do
imperador Meiji, em 1868, os japoneses passaram a
reconsiderar a limitada relação com os coreanos que era até
então feito exclusivamente pelo senhor (daimiô) de
Tsushima desde 1609, a quem os coreanos trataram, pelo
protocolo estabelecido, como subordinado. O Japão Meiji
começou a exigir novos acordos nessa relação, a refletir os
princípios do direito internacional originados dos ocidentais.
Ao tomar conhecimento das mudanças políticas e jurídicas
do reino japonês, o Daewongun começou a considerar o
reino japonês não mais como nação vizinha, mas como
parte dos “bárbaros ocidentais”, assim juntando-os aos
outros estrangeiros. Em suma, a política de Heungseon
passou a ser cada vez mais antiocidental e, em igual
medida, anti-japonesa.

Em 1874, o regente foi obrigado a se retirar do poder


pois o legítimo herdeiro, o príncipe Gojong, tinha alcançado
a maioridade. Essa mudança no trono veio com as
denúncias feitas por um yangban, Choe Ik-hyeon (1833 –
1906) que passou a criticar toda a política do regente
anterior que tinha isolado excessivamente o reino coreano.
Com isso, e com a ascensão do novo rei, a influência de
Heungseong e seus partidários começou a gradativamente
diminuir na esfera política coreana a partir do último quarto
do século 19. O rei, postumamente referido como Gojong (r.
1874 - 1897), acabaria sendo dominado por membros de
sua família de parentesco de sua esposa, a rainha Min (1851
– 1895) [74].

O novo rei coreano estava ansioso em demonstrar a


condição invicta do reino frente aos estrangeiros. Isso, no
entanto, colidiu com a crescente ambição japonesa que, em
1874, mandou uma carta à corte de Joseon demandando
abertura do mercado coreano. Os termos da carta não
respeitaram mais o conceito de iguais, de nações vizinhas
(gyorin), mas refletiu as mudanças políticas japonesas
baseadas no direito internacional. Esse movimento nipônico
ia muito além, enfatizando o militarismo e expansionismo,
conforme o slogan propagado à época, “nação rica e nação
forte” (fukoku kyohei). Ademais, havia muitos japoneses
que passaram a defender a conquista da Coreia (seikaron),
mas essa postura radical tinha sido derrotada por políticos
moderados. Portanto, ao invés de uma ofensiva militar, foi
escolhido uma ação diplomática no envio da carta.

O rei Gojong tinha herdado um reino razoavelmente


autossuficiente e estava disposto a reformar a nação. No
início de seu governo, o jovem rei ainda estava livre das
influências da rainha Min e de seus familiares. Assim, o rei
nomeou como um dos seus principais conselheiros Bak
Gyusu, político experiente e responsável pelo
enfrentamento ao navio americano General Sherman em
1866. Anos depois, Bak Gyusu, elaborou uma política
externa mais aberta e modernizadora, a acompanhar as
mudanças internacionais em fins do século 19. Isso
decorreu de seus anos de experiência como representante
em Pequim, e a considerar a atuação dos estrangeiros na
China. Essa linha condisse com a curiosidade de Gojong em
saber mais a respeito dos acontecimentos na China e no
exterior. Gojong chegava a ler avidamente os relatos de
Pequim a respeito da política chinesa em buscar reformar e
modernizar sua capacidade industrial e tecnológica.

A corte de Joseon, contudo, não compartilhava o mesmo


entusiasmo. Muitos, da ala conservadora e tradicionalista,
não aceitavam a mudança de postura dos japoneses. Bak
Gyusu e seus partidários, assim como o próprio rei,
compreenderam a mudança da realidade política no leste
asiático. Eventualmente, o Japão na Era Meiji passou a exigir
as condições que potências estrangeiras tinham feito sobre
a China e o Japão em meados do século 19. Para persuadir
as autoridades coreanas a renunciarem da condição de
tributário do império chinês, além da abertura de três portos
aos navios japoneses e extraterritorialidade em solo
coreano, em 20 de setembro de 1875, o navio de guerra
japonês, Unyokan, se aproximou da ilha de Kanghwa. Ao se
aproximar da ilha, a bateria de defesa coreana disparou
tiros de advertência, ao que os japoneses consideraram
como pretexto para a invasão. Seguiram mortes de
soldados coreanos e a captura de mantimentos, armas e
pólvora. Esse incidente resultou na assinatura do Tratado de
Kanghwa em 26 de fevereiro de 1876. Foi o primeiro tratado
assinado com o reino coreano nos moldes do direito
internacional.

Intimidade, a corte coreana inicialmente comportou-se


de maneira indecisa e, após hesitações, aceitou a
contragosto os termos desiguais impostos no tratado, em
nome da “amizade, comércio e navegação” conforme
consta no documento. Assim, o Japão conseguiu
orgulhosamente agir de maneira imperial no leste asiático,
e demonstrou desafio à tradicional ordem asiática em torno
da dinastia chinesa. Na Coreia, as autoridades passaram a
considerar as mudanças dos tempos, e a privilegiar as boas
relações com um Japão em franca transformação. Na ótica
dos chineses da dinastia Qing, o ato japonês foi visto como
uma provocação e ameaça nas suas fronteiras no nordeste
e na Manchúria. O vice-rei chinês, Li Hongzhang (1823 –
1901), principal arquiteto da diplomacia chinesa no século
19, concebeu uma estratégia de conter o avanço nipônico
no continente asiático, convencendo as potências ocidentais
a estabelecerem relações diplomáticas com a Coreia e
reconhecerem o reino como tributário dos chineses. Nesse
intuito, foram enviadas de Pequim cartas secretas ao rei
Gojong, exortando-o a aceitar essa política e a promover a
abertura e comércio com o Ocidente.

Em 1880, um diplomata chinês, Huang Zunxien,


entregou um documento a um representante coreano em
Tóquio, Kim Hongjijp (1842 – 1896). Intitulado “Uma
Estratégia para a Coreia” (Chaoxian celue), os chineses
aconselharam a corte coreana a fortalecer sua política
externa aproximar-se da China, e coordenar-se com o Japão,
aliar-se aos EUA e precaver-se com a Rússia [75]. Ao mesmo
tempo, Li Hongzhang persuadiu os representantes dos
governos ocidentais a iniciar relações diplomáticas com a
Coreia. Apesar disso, a maioria dos ocidentais não
mostraram interesses e alguns passaram a questionar o
status tributário coreano, pois almejaram constituir relações
em termos de igualdade.

Li, realista por natureza, entendeu esses


questionamentos e passou a aceitar a independência
soberana da Coreia. Todavia, ele antes de tudo queria que o
Ocidente reconhecesse a primazia da China sobre a
península coreana e afastar a preponderância japonesa. Em
momento derradeiro, os EUA foi o primeiro governo
ocidental a estabelecer relações com a Coreia. Depois de
dois anos de negociações, o Comodoro Robert Wilson
Shufeldt, mediado por Li Hongzhang, assinou em 22 de
maior de 1882 com representantes coreanos o Tratado de
Paz, Amizade e Comércio [76]. Esse tratado, conhecido como
a Convenção Shufeldt, era muito mais igualitário e justo do
que o Tratado de Kanghwa e os outros impostos pelos
ocidentais com a China, Japão e outros reinos asiáticos
feitos à época. Estipulava o tratado que a Coreia poderia
impor tarifas comerciais sobre produtos americanos. Nos
anos seguintes, os outros governos ocidentais presentes na
China passaram a celebrar tratados em termos similares
com o reino coreano: Grã-Bretanha e Alemanha (1883),
Rússia e Itália (1884) e França (1886) [77]. Este último,
curiosamente, definia a entrada de missionários católicos. E
em todos esses tratados, para certo alívio de Li Hongzhan, o
soberano coreano afirmava alimentar laços tributários
nominais com a China, a respeitar a tradição, mas
plenamente independente em termos práticos.

A abertura dos portos e relações do reino coreano foi um


ponto de ruptura histórico, e foi o momento de partida de
uma série de desafios a serem enfrentados nas décadas
seguintes. A modernização industrial e tecnológica adotada
no Japão Meiji e promovida na China pelo príncipe Gong
(1833 – 1898). O rei Gojong adotou atitude similar, mas
houve vivos protestos de conservadores neoconfucianos,
principalmente após a humilhante imposição dos japoneses.
Um desses líderes de resistência ao rei, Choe Ik-hyeon,
organizou um vasto número de seguidores e combatentes
(“O Exército Justo”, Uibyeong, ) que denunciaram a
presença japonesa e de qualquer influência ocidental como
o catolicismo. E, após uma série de ações combatentes pelo
interior, voltaram-se para o antigo regente, o Daewongun,
Heungseon, que se encontrava aposentado. Isso evidenciou
uma profunda divisão que consolidou no reino coreano em
fins do século 19, entre aqueles anti-japoneses,
antiocidentais e conservadores contra aqueles que
enxergaram as relações estrangeiras como essenciais para
as reformas necessárias à Coreia de então, inspirados no
movimento chinês de “auto-fortalecimento” (ziqiang
yundong, ).

A primeira tentativa sistematizada de modernização


coreana foi iniciada pelo rei Gojong e seus partidários. Em
janeiro de 1881, criou-se uma nova divisão burocrática do
governo que lidaria com assuntos externos, o Escritório para
os Assuntos Extraordinários de Estado (Tongnigimu amun,
), inspirado na contraparte do governo chinês. Essa
nova repartição estava fora da estrutura burocrática
tradicional dos outros ministérios e foi criada
especificamente para lidar com assuntos diplomáticas e
comerciais. Ademais, foi criado uma unidade militar,
Pyolgigun (“Forças Especiais”) que foi treinada por oficiais
japoneses [78]. Essas criações, evidentemente, foram
motivadas pelo exemplo da política japonesa de “nação rica
e nação forte” (fukoku kyohei).

Não obstante, a criação de uma nova divisão militar


provocou reação considerável de antigos membros da
classe bélica. Em julho de 1882, soldados descontentes com
os pagamentos atrasados e cientes das condições especiais
do Pyolgigun, revoltaram-se, mataram o conselheiro militar
japonês e atacaram a delegação japonesa na capital. O
movimento ampliou-se com a entrada de funcionários e
yangbans conservadores que nomearam Heungseon como
líder e reivindicaram a sua restauração ao poder.

Essa situação delicada e frágil da Coreia certamente


facilitou a crescente atuação de nações vizinhas sobre a
península. A conter os tumultos e rebeliões, o governo
chinês enviou um contingente de três mil homens, e os
japoneses mobilizou um batalhão na capital coreana.
Eventualmente, com o correr dos fatos, o Daewongun foi
sequestrado pelos chineses e levado para Tianjin, na China.
A rainha Min, que tinha se refugiado no interior, retornou ao
palácio real e o rei Gojong renovou suas tentativas de
reforma, adotando o slogan “moralidade oriental, tecnologia
ocidental” ou “maneiras orientais, máquinas ocidentais”
(tongdo sogi) [79]. A dupla intervenção sobre a Coreia em
1882 inicialmente pendeu, portanto, para os chineses a
garantir o soberano no trono. Li Hongzhan, visando
fortalecer a posição de Gojong, mandou um conselheiro
alemão, o eminente linguista e sinólogo Paul Georg von
Möllendroff (1848 - 1901). Gojong, desconfiado das
intenções chinesas, rejeitou o alemão e preferiu escolher
um ministro americano, Lucius Foote (1826 - 1913), para
aconselhamentos na diplomacia, defesa, educação e
agricultura.

Os ânimos, contudo, ainda não foram acalmados. Muitos da


sociedade coreana se dividiram sobre os rumos
modernizadores. A classe média, chungin, tenderam a ser a
favor dos japoneses que favoreceriam seus negócios e
atividades mercantis. Os yangbans, em sua maioria,
consideraram uma ofensa às tradições as reformas e novos
acordos com o estrangeiro. Nesse cenário, alguns
funcionários radicais da corte, liderados por Kim Ok-gyun
(1851 – 1894) e Bak Yung-hio (1861 – 1939), lideraram um
golpe de Estado em dezembro de 1884, conhecido como
Golpe Gapsin [80]. Eles tinham aproveitado a ocasião em que
os chineses, defrontados com os franceses na Indochina,
retiraram do reino coreano metade de seus três mil homens.
Essa tentativa de tomada de poder, inspirados nas ideias
reformistas de Bak Kyusu que considerava a experiência
japonesa como exemplar, foi fruto de um plano amplo de
mudar e modernizar todo o sistema coreano, instituições
políticas, estrutura social e econômica. Mas esse sonho
durou apenas três dias, pois esses golpistas foram
reprimidos por novos reforços militares chineses, e muitos
buscaram a proteção da legação japonesa e foram eLivross
para o Japão.

Após o golpe de 1884, a China e o Japão decidiram dar


uma trégua sobre a península coreana e concordaram em
retirar suas forças do reino. Li Hongzhan e Ito Hirobumi
(1841 – 1909), principal elaborador da política externa
japonesa à época, decidiram assinar a Convenção de Tianjin
em 18 de abril de 1885. Contudo, apesar das iniciativas, a
paz coreana ainda era precária no jogo de equilíbrio de
poder entre a China, Japão e a Rússia.

Desde a abertura dos portos, as novas ideias, gostos,


hábitos, produtos e instituições como hospitais e escolas
começaram a atrair cada vez mais a classe urbana e elite
coreana. Missões religiosas de protestantes cristãos de
americanos e canadenses começaram a ter popularidade
nos serviços médicos prestados. Um jovem missionário
presbiteriano americano, doutor Horace Newton Allen (1858
– 1932) abriu um hospital na capital coreana em 20 de
setembro de 1884. Outros, como o metodista Reverendo
Henry Gerhart Appenzeller e o Reverendo William B.
Scranton e Horace G. Underwood atuaram energicamente
em instituições educacionais particulares. Este último
fundou a Escola de Meninos Baejae (Baejae Hakdang),
enquanto a mão de Scranton, Mary, abriu e foi a primeira
diretora da Escola de Meninas Ehwa (Ehwa Hakdang) em 31
de maior de 1886 [81]. Essas instituições foram grandes
propagadoras da educação e ideias não-confucianas para
gerações de coreanos.
Produtos importados como algodão, fósforos, querosene,
corantes e louças começaram a cair no gosto do
consumidor, solapando as tradições. Novas demandas,
novos produtos a serem fabricados e comerciados. A classe
mercantil rapidamente adaptou-se às mudanças,
aprimorando a feitura dessas mercadorias. A classe
camponesa, contudo, ainda permaneceu estagnada e presa
às propriedades rurais, alheios às mudanças e
conservadores nos valores. Embora a demanda pelo arroz
tivesse incrementado com os japoneses, a condição do
campesinato pouco foi alterada ao longo do século 19.

Foi no meio rural e camponês que emergiu um poderoso


e popular movimento de cunho religioso, criado por um
yangban, Choe Je-u (1824 – 1864), chamado de Donghak
(“Aprendizado Oriental”) em 1860. Essa nova corrente
social, na verdade, foi reflexo de oprimidos e ressentidos
com as assombrosas mudanças na sociedade coreana.
Donghak buscou revitalizar o confucionismo clássico,
rejeitando as tradições do neoconfucionismo, e a valorizar o
auto-aprimoramento de acordo com a vontade e ordem do
Céu (Tian, ), presente nos escritos atribuídos ao Confúcio
[82]. Choe Je-u teve assim grande apelo popular xenofóbico,

em oposição ao que muitos consideraram como decadência


e degeneração das influências estrangeiras, incluindo o
cristianismo.

As ideias propostas do Donghak eram de fato inovadoras


em certo sentido. A defesa do pleno igualitarismo social e
de gênero que aboliria o status de privilegiados como os
yangbans, conforme defendido na obra de Choe Je-u em
“Livro Abrangente de Aprendizagem Oriental” (Dongkyeong
Daejon, ), enfrentou os membros dos altos cargos no
poder coreano. Com as promessas de criar uma nova
sociedade mais justa, o Donghak ofereceu uma redenção às
pessoas que sofriam com a discriminação social das
tradições. Pelo seu radicalismo e impacto, Choe Je-u foi
julgado por um tribunal composto por magistrados yangban
e executado como herege em 1864 [83].

Algumas décadas depois, o movimento Donghak


fortaleceu-se novamente em 1892 e 1893, com a liderança
passando para o sobrinho de Choe Je-u, Choe Si-yeong
(1827 - 1898). Enquanto os seguidores anteriormente
tinham sido essencialmente rurais, agora houve gradual e
crescente presença no meio urbano. No início de 1893,
representantes desse movimento chegaram à capital,
Hanyang, para terem audiência com o rei Gojong. Os pleitos
foram ouvidos e o corpo de Choe Je-u foi devidamente
honrado. No entanto, as outras demandas por amplas
reformas políticas e sociais não foram atendidas. Assim,
alguns líderes do movimento mais combativos passaram a
organizar revoltas contra os magistrados e funcionários do
governo, como a que foi liderada no campo por Jeon
Bongjun (1853 – 1895) em janeiro de 1894. Em abril de
1894, o Donghak ampliou-se para outras cidades e
províncias coreanas, e derrotaram as forças
governamentais, principalmente na região sudoeste
coreana.

Desesperado, o governo coreano apelou para as


tropas chinesas a dominar a rebelião. No entanto, de acordo
com a Convenção de Tianjin, nem o Japão nem a China
poderiam enviar tropas para a Coreia sem o outro. Quando
um contingente militar de três mil militares chineses
chegaram ao solo coreano em junho de 1894, o Japão
imediatamente reagiu e mandou uma força de sete mil
homens. A frágil paz coreana, mais uma vez, foi ameaçada.
Os rebeldes de Donghak foram prontamente reprimidas e
Jeon Bongjun preso, apesar da força dos apelos do
movimento ainda a ecoar por anos nas províncias
interioranas.

Em julho de 1894, as forças japonesas na capital


coreana provocaram um golpe de Estado que derrubou os
seguidores na corte da rainha Min, que defendia uma
posição mais nacionalista, e instalou um governo pró-
japonês. Heungseon, o antigo Daewongun, foi colocado de
novo no trono da dinastia Joseon, e passou a defender os
interesses anti-chineses e a favor de Tóquio. A Coreia
gradativamente passou a se tornar, de fato, um protetorado
japonês. Ao agir dessa maneira decisiva, o governo japonês
provocou a ira dos chineses, e assim foi declarada guerra
entre os dois países em 1º de agosto. Os enfrentamentos
logo tomaram conta nos mares e em terra, com a
prevalência japonesa. Ao final, Li Hongzhan, como
representante do governo imperial chinês, foi em abril de
1895 para a cidade de Shimonoseki, um porto na costa
ocidental do Japão, para assinar outro tratado no qual foi
reconhecido o fim do status tributário da Coreia e sua plena
independência [84].

Após esses eventos fatídicos, um novo grupo de


funcionários, inclusive com alguns membros do Golpe
Gapsin, assumiram o poder coreano com o apoio japonês.
Esse grupo começou a implementar um programa de
modernização que havia sido adiado por anos no reino
Joseon. Essa série de medidas foram conhecidas como as
Reformas Gabo, que se estenderam de 1894 a 1896. Seus
principais proponentes foram Kim Hong-jip e Yu Kil-chun
(1856 – 1914) que atuaram para aprovação de leis no
recém-criado Conselho Deliberativo (Gunguk gimucheo,
), este liderado por Heungseon.
O primeiro objetivo das reformas foi estabelecer de fato
a independência coreana como nação, a romper todas as
ligações tributárias e nominais com a China Qing, e revogar
todos os acordos assinados com o Império do Meio entre
1882 e 1894. Foi proibido o uso do calendário chinês que foi
substituído por documentos oficiais baseados na fundação
da dinastia Joseon. O rei Gojong, embora ainda no trono,
mas cada vez mais como um mero símbolo de Estado,
recebeu o título de “Sua Majestade, o Grande Rei” (Taegunju
peha), conferindo-lhe status de imperador. O alfabeto
hangul passou a ser usado nas publicações oficiais do
governo e a história coreana começou a ser lecionada em
todos os níveis de ensino. A partir de 1895, o governo
inaugurou a impressão de jornais com uso extenso da
escrita coreana.

O próximo passo das reformas foi ainda mais


substancial, pois almejou-se reorganizar a estrutura do
governo tradicionalmente assentados na classe yangban.
Foi criado uma estrutura moderna inspirado no governo
japonês do imperador Meiji. Foi abolido o antigo Conselho
de Estado e seus seis ministérios, e surgiu um novo
gabinete executivo com oito ministérios. Um Departamento
de Assuntos Reais foi concebido para separar os assuntos
monárquicos dos de Estado. Sem dúvida, isso visou
restringir o poder do rei, transferindo as prerrogativas fiscais
do palácio para o Ministério das Finanças. Ademais, foi
fundado um novo sistema monetário lastreado na prata, e
um banco nacional foi estabelecido a padronizar pesos e
medidas do reino.

O sistema educacional não ficou de fora. Foram


estabelecidas inúmeras escolas de ensino primário,
secundário e faculdades nos moldes ocidentais. Por
consequência, o tradicional exame do serviço público foi
abolido. O novo governo, visando a ampla reforma,
encorajou e financiou o estudo no exterior, enviando cerca
de 200 estudantes para o Japão, ao mesmo tempo em que
custeava por bolsa alunos a serem educados na escola
americana de Bahae. O currículo das escolas foi expandido
para incluir a plena alfabetização no hangul, além do ensino
da matemática, aritmética, e nos níveis mais avançados,
ciências ocidentais e línguas estrangeiras.

O mais impactante das Reformas Gabo foi a


modernização da vida social. Com o estabelecimento de um
sistema judiciário moderno, a tortura e punição coletiva a
um crime individual foram abolidas. Os yangbans, passaram
a poder investir e atuar nas atividades comerciais. As
nomeações para os cargos públicos foram abertas a todos
os estratos sociais. O casamento prematuro foi proibido, e
as viúvas poderiam se casar novamente. Esposas
secundárias e seus filhos não eram mais discriminadas.

O novo gabinete foi dominado por um enviado japonês,


Inoue Kaoru (1835 – 1915) que energicamente buscou
implementar essas avassaladoras reformas num curto
período de tempo. Esse grandioso projeto foi feito com a
ajuda e supervisão de mais de 40 conselheiros japoneses
que tiveram experiência nas reformas da Restauração Meiji.
Ao contrário do entusiasmo febril dos reformistas no
governo, a sociedade coreana precisou de certo tempo para
assimilar as mudanças sociais e econômicas. Heungseon,
como presidente do Conselho Deliberativo, passou a
questionar as reformas e tentou manter algumas tradições e
relações especiais com o governo chinês, o que provocou
sua destituição do cargo. Membros do movimento popular
Donghak passaram a atuar de forma mais difusa pelo
interior e províncias do país, a denunciar as mudanças.

O ministro Inoue convenceu o rei Gojong a perdoar os


delitos dos líderes do golpe de 1884, Pak Yung-hio e Seo
Gwangbom, e esses se juntaram ao gabinete de Kim Hong-
jip. Além disso, Inoue mobilizou tropas japonesas para
esmagar de vez os rebeldes Donghak e pelo seu
envolvimento na fracassada tentativa de alcançar o poder
com Heungseon. E visando maior controle da Coreia, os
japoneses nomearam um membro substituto do ministro
residente Inoue Kaoru, um militar de formação, Miura Goro
(1847 - 1926), em 1895.

A resistência anti-japonesa também vinha de outros


setores da sociedade. Vários membros yangban
neoconfucionistas rejeitaram prontamente as Reformas
Gabo, assim como os rebeldes inspirados pelo movimento
Donghak, classes populares e membros da família real,
entre esses os membros do clã Min, ligados por sangue à
rainha Min. Esses últimos, vendo-se afastados do poder
efetivo, foram procurar a ajuda dos russos. Assim, Miura
Goro começou a organizar uma conspiração para se livrar
dos membros Min dos círculos monárquicos. À meia-noite de
7 de outubro de 1895, um grupo de japoneses armados
junto com alguns coreanos aliados invadiram o palácio real
e assassinaram a rainha Min por esfaqueamento e depois
seu corpo foi incinerado por querosene [85].

Apesar da turbulência dos eventos nos dias seguintes ao


regicídio, as Reformas Gabo continuaram sendo
implementadas. Em 30 de dezembro de 1895, o ministro
Kim Hong-jip aprovou o uso do calendário ocidental a
começar no ano de 1896. No mesmo dia, o rei Gojong, que
vivia virtualmente como um prisioneiro real, decretou que
todos deveriam cortar seus tradicionais topetes, costume
que vinha de séculos que se fundamentava nos
ensinamentos confucianos. Nesse sentido, os ânimos foram
ainda mais inflamados, e as lutas e confrontos de
conservadores ortodoxos e elementos anti-japoneses e
antiocidentais se alastraram pela península. Esse conjunto
de rebeldes se juntaram e organizaram-se em grupos
armados e revigorando o “Exército Justo”, Uibyeong, do
movimento Donghak. Apesar disso, pouco puderam fazer
frente à superioridade bélica das tropas do governo e dos
japoneses. Ademais, muitos camponeses que participaram
nas lutas, não conseguiram entrar em consenso com
rebeldes yangbans mais conservadores e críticas do
igualitarismo defendido pelo Donghak.

Em fevereiro de 1896, o rei Gojong, buscou refúgio na


legação russa da capital coreana com a ajuda de dois
funcionários seus. Sob a proteção russa, Gojong escapou do
controle dos japoneses e passou a abolir as medidas feitas
pelas Reformas Gabo. O ministro Kim Hong-jip e membros
de seu gabinete chegaram a ser presos, e pior, foram
mortos pela fúria popular. A Rússia czarista começou a atuar
como protetora da monarquia coreana, mas suas ambições
entraram em conflito com os japoneses. Essa mudança
política por parte dos russos, mais agressiva e ativa na
península coreana, tinha se revelado clara desde a coroação
do Czar Nicolau II em 26 de maio de 1896. Diante disso,
pelo maior envolvimento no leste asiático, vários emissários
japoneses, chineses e coreanos se fizeram presentes na
corte russa em São Petersburgo. A servir aos interesses da
família real coreana, foi enviado um membro da família Min,
Min Yonghwan (1861 – 1905), e pelos chineses, Li Hongzhan
a negociar a construção da linha ferroviária russa que
passaria pela Manchúria. O Japão também se fez presente,
com Yamagata Aritomo (1838 – 1922) para discutir e
negociar a questão coreana. Para receber a todos, o
anfitrião russo foi o ministro das Relações Exteriores, o
príncipe Aleksey Lobanov-Rostovsky (1824 – 1896) que teve
a delicada tarefa de agradar a tantos interesses e pleitos.
Visando antes de tudo a defender os interesses nacionais, o
chanceler russo passou a negociar com os chineses a
passagem pela Manchúria e isso demandou reforçar o
controle sobre a península coreana, indo de encontro aos
interesses japoneses. Apesar disso, foi assinado um
entendimento de termos com o governo de Tóquio, no
acordo chamado de Yamagata-Lobanov assinado em 9 de
junho de 1896 [86]. Nesse, foi proposto uma divisão das
esferas de influência na península coreana, a ser demarcado
pelo paralelo 38 norte, algo que foi rejeitado pelos russos.
Essa linha de latitude iria depois ser evocado por Stálin em
1945.

Muitos outros coreanos estavam ansiosos em manter a


plena independência de sua nação. Membros da corte e
reformistas radicais anti-japoneses buscaram o possível
para se articularem com novas forças no plano
internacional, além dos russos e chineses. Um dos mais
ardorosos defensores da independência foi Soh Jaipil (1864 –
1951) que buscou exílio nos EUA desde o Golpe Gapsin de
1884 e retornou à Coreia como Philip Jaisohn. Ele foi um dos
primeiros coreanos a conseguir cidadania americana. Este
tornou-se num dos mentores do Clube Chongdong, grupo de
líderes anti-japoneses, pró-americanos, localizados na rua
Chongdong da capital, nas proximidades das escolas e
legações americanas. Após a fuga do rei para as
autoridades russas, Soh Jaipil se juntou ao novo governo
estabelecido pelo monarca e aliados e atuou como
conselheiro. Com o apoio financeiro angariado, inaugurou
em 7 de abril de 1896, um dos primeiros jornais modernos,
o Tongnip Sinmun ( , “Notícias Independentes”),
publicado com o alfabeto coreano de um lado e inglês no
outro. Sua circulação diária inicial foi estimada em torno de
duas a três mil cópias [87].

Em 2 de julho, foi fundado sob a iniciativa de Soh o


Clube da Independência (Tongnip Hyophoe, ). E um dos
primeiros atos dessa organização foi a construção de um
portão, uma espécie de Arco do Triunfo na capital coreana, a
simbolizar a aspiração aos ideais democráticos e iluministas
da nova Coreia: o Portão da Independência (Dongnimmun,
). Esse ato foi significativo pois fora erguido no local onde
antes, pela tradição, recebia-se os enviados chineses a
respeitar os princípios do protocolo sadae, irmandade. O
Clube da Independência aproveitou o período de relativo
equilíbrio dos poderes entre a Rússia, China e Japão para
construir as bases de uma nação independente, forte e
próspera. Em 1897, o rei Gojong deixou a legação russa, e
mudou-se para o Palácio Gyeongun (atual Deoksugung) e
passou a nomear funcionários pró-russos a instituir
programas de modernização que, a despeito das Reformas
Gabo pró-japonesas, buscou também fortalecer a posição
monárquica. Em agosto de 1897, Gojong mudou seu título
para Gwangmu (“Guerreiro da Luz”, ) e em outubro
nomeou-se imperador, e proclamou seu reino como Império
da Grande Coreia. Uma nova constituição foi aprovada em
17 de agosto de 1899 centralizando o poder legislativo,
executivo e judiciário em torno da figura do imperador, tal
como no sistema czarista russo. Essas reformas, referidas
como Reforma Gwangmu, almejou equilibrar as tendências
modernizantes mas a manter a autonomia e tradição
coreana.

Apesar disso, os rebeldes conservadores, muitos da


antiga classe dos literatos e do movimento Donghak se
opuseram a esse conceito que entrava em conflito com a
tradição oriental. O Clube da Independência, que era local e
foco do apoio ao novo governo, era passivo e elitizado
demais para ecoar na sociedade coreana. Ainda assim, o
governo de Gwangmu passou a concentrar as reformas
agora no campo econômico, a garantir a sua capacidade
financeira. Através de um amplo levantamento das
propriedades fundiárias e recenseamento populacional
entre 1898 e 1901, o governo criou um novo departamento,
o Escritório de Contrato de Terras. Assim, poderia ter dados
para novas políticas fiscais e populacionais. E todo o
sistema rodoviário, minerador, comunicações, sistema
postal e indústria manufatureira passou a estar sob a égide
do governo.

No entanto, apesar das reformas apontarem para um


maior controle planejado centralizado, a base financeiro do
governo de Gwangmu era frágil demais para todos os
programas ambiciosos. A fim de arrecadar fundos para a
modernização industrial, o governo passou a conceder
direitos especiais e isenções fiscais para a entrada do
capital estrangeiro, isso nos setores da mineração,
ferroviário, eletricidade e saneamento. Isso provocou
críticas de nacionalistas, como no Clube da Independência e
de seu jornal, que enxergaram nessas concessões uma
afronta da soberania nacional a favor dos interesses
estrangeiros. Entre abril e julho de 1898, o clube começou a
discutir como implementar um sistema democrático
parlamentar e monarquia constitucional, visando assim ter
algum limite aos poderes do rei. Isso foi exposto e
argumentado a partir de uma série de editoriais de Soh
Jaipil no jornal “Notícias Independentes”, ganhando
visibilidade no meio urbano e letrado. A reação do governo
foi uma crescente perseguição ao líder que, depois de anos
de militância e vendo-se ameaçado, fugiu para os EUA em
maio de 1898.

Mas em fins do século 19, havia surgido uma nova


geração de líderes críticos do regime coreano e que lutaram
pelos ideais democráticos e constitucionais. Assim como
Soh Jaipil, jovens olharam o sistema político americanos
com admiração, e esses passaram a atuar no Clube da
Independência. Entre esses, Yun Chi-ho (1864 – 1946) e Yi
Sang-jae (1850 – 1929) que tinham formado seus ideais
através de sua educação na Escola Baejae e suas vivências
no exterior. Chiho depois virou editor do primeiro jornal
comercial da Coreia, o Gyeongseong Sinmun (“Notícias da
Capital”) fundado em 1898 [88]. Isso se inseriu na tendência
de incentivos das escolas missionários ocidentais
protestantes no país de publicações de periódicos
vernaculares em hangul, como o Joseon Kurisudoin Hoebo
(“Boletim Coreano Cristão”), o Kurisudo Sinmun (“Jornal
Cristão”) e o Hyopsong Hoebo (“Boletim da Sociedade da
Amizade Mútua”) [89]. Este último boletim foi fruto de um
clube estudantil da Escola Baejae, que tinha sido iniciado
sob a liderança de Yi Sungman (ou Syngman Rhee) (1875 –
1965) que depois se juntou ao Clube da Independência.

Em outubro de 1898, membros do Clube da


Independência se congregaram na Praça Chongno, no
centro da capital, Hanyang (atual Seul), reunindo cerca de 4
mil pessoas. Nessa ocasião, vários membros oficiais e do
governo estavam presentes assim como membros notáveis
da sociedade, desde da classe dos letrados, religiosos,
comerciantes e estudantes. O evento foi uma primeira
grande manifestação democrática, um ensaio para as
mudanças exigidas no reino em tempos de transformação.
Representantes do governo saíram do evento com
propostas que depois foram levados ao monarca. Entre as
propostas, uma recomendava a criação com efeitos efetivos
de um alto órgão legislativo, Conselho Privado. Com
relutância, o imperador Gwangmu (antes, o rei Gojong)
acatou as propostas e prometeu implementá-las. Mês
seguinte, em novembro de 1898, foi promulgada um novo
conjunto de regulamentos, pelos quais estabeleceu-se que
metades dos 50 membros do Conselho Privado seriam
escolhidos do Clube da Independência. Isso provocou a
indignação dos membros conservadores e monarquistas que
persuadiram o imperador que o clube planejava no futuro
estabelecer uma república no país. Convencido, o imperador
coreano mandou então a detenção dos líderes do clube. Yi
Soang-jae e outros 16 membros foram imediatamente
encarcerados para interrogações.

Essas detenções, e a aparente indecisão e debilidade do


imperador, gerou ondas de protestos pelo país. Em 29 de
novembro, Gwangmun compôs o Conselho Privado, mas
com apenas 17 membros do Clube da Independência. Um
deles era o jovem Syngman Rhee. Apesar da maioria dentro
desse conselho legislativo serem compostos de membros
monarquistas, membros da chamada Associação Imperial,
os da Clube da Independência conseguiram aprovar
resolução para repatriar Pak Yung-hio e Soh Jaipil do exílio.
Enquanto as tensões fermentavam, houve rumores de que
certos grupos estavam tramando um golpe para instalar
uma monarquia constitucional, e a colocar no trono o
Príncipe Imperial Uihwa (Yi Kang) (1877 - 1955) e a convidar
Pak Yung-hio para ser primeiro-ministro. O resultado foi a
prisão de vários líderes considerados suspeitos de sedição e
desordem à ordem imperial. Em 21 de dezembro de 1898,
tropas reais do governo reprimiam as demonstrações da
sociedade que lutaram por democratização e a soltura dos
membros do Clube de Independência. O flerte com a
democracia coreana teve uma vida tênue e breve nesse
momento, e perspectivas sombrias pareciam vir do norte e
do outro lado do mar ao leste.
7 A TEMPESTADE
A Coreia na virada do século 19 para o seguinte encontrava-
se numa situação delicada. Nuvens de tempestade
pareciam confluir para a península. Durante o período, o
governo coreano buscou investimentos externos para
dinamizar sua modernização, no setor industrial, pesqueiro,
minerador, transporte e infraestrutura urbana. No âmbito
externo, a Rússia e o Japão começaram a tomar rumos mais
agressivos com base nos seus interesses asiáticos. Em
janeiro de 1902, o governo japonês obteve um trunfo
diplomático ao assinar um acordo com os britânicos sobre
questões navais. Além disso, Londres reconheceu os
interesses nipônicos sobre a península coreana. Em agosto
de 1903, animados com tal êxito, os japoneses passaram a
exigir que os russos reconhecessem igualmente a sua
proeminência sobre o território coreano, propondo em
contrapartida a Manchúria ao regime czarista.

A chancelaria russa então fez outra proposta, a de criar


uma zona neutra entre as partes na Coreia ao norte do
paralelo 39. Mas como a Rússia tinha desconsiderado a
oferta japonesa de dividir a Coreia em 1896, Tóquio resolveu
por bem agir por igual e rejeitou a ideia [90]. Era então
inevitável que os dois governos iriam colidir em algum
momento. Em fevereiro de 1904, forças japonesas
desembarcaram no solo coreano e entraram na capital,
Hanyang. Feito isso, intimidaram o governo coreano a
renunciar à sua condição independente e neutralidade e a
aceitar o controle japonês. Nesse contexto, o movimento do
Clube da Independência e outros setores encontravam-se
bastante ativos no cenário político coreano. E isso fez com
que os dirigentes japoneses buscassem colaboradores
coreanos na sua empreitada. Foi assim que foi formado um
grupo de coreanos pró-japoneses, chamado de Iljinhoe
(“Sociedade Unida para o Progresso”, ) em agosto de
1904. O grupo era liderado por Song Byung Joon (1858 –
1925) e Yi Yonggu (1868 – 1912), sendo que o primeiro
havia vivido no exílio no Japão e tinha trabalhado como
intérprete do exército japonês. Yi, por sua vez, curiosamente
tinha ascendido como líder de uma seita que antes
pertencia ao movimento Donghak. Além dessas duas
figuras, outros da sociedade coreana de várias origens,
desde ex-funcionários reformistas, comerciantes e rebeldes
antiocidentais, juntaram-se à organização. Para demonstrar
sua lealdade, todos os membros cortaram seus topetes e
colaboraram ativamente na construção de linhas de trem e
esforço de guerra contra os russos. Apesar desse
entusiasmo, o governo japonês ordenou aos seus
diplomatas e militares a não assumirem publicamente
nenhuma conexão com o grupo, a fim de conferir maior
legitimidade nacional.

Em momento derradeiro, as forças japonesas cruzaram o


rio Yalu em maio de 1904 e atacaram os russos na península
de Liaodong. Embora os japoneses superassem em número
os russos na Manchúria e região, sofreram amargamente
inúmeras baixas para capturar a cidade de Port Arthur (hoje,
Luyshun). Mas, felizmente para o lado japonês, a vitória
adveio do mar. Graças à sua aliança com os britânicos
desde 1902, a passagem da frota naval russa do Mar Báltico
foi impedida de passar pelo Canal de Suez, forçando-a a
circunavegar longamente o continente africano a fim de se
juntar à batalha no leste asiático. Tendo tempo para
planejar sua estratégia naval, o almirante japonês, Togo
Heihachiro (1847 - 1934) e admirador do herói coreano do
século 16, o almirante Yi Sun-sin, esmagou
espetacularmente a frota russa quando essa tentava
atravessar o Estreito de Tsushima para chegar à cidade de
Vladivostok após viagem de dois meses [91].
A vitória conferiu ao Japão grande visibilidade militar e
política no meio internacional. Nos EUA, o presidente
Theodore Roosevelt (1858 – 1919), mais impressionado com
as reformas da monarquia constitucional japonesa do que o
regime czarista, ofereceu-se como mediador da paz para os
conflitos no leste asiático. Assim, Washington enviou então
o secretário William Taft (1848 – 1930) a Tóquio para assinar
um acordo secreto com o chanceler Katsura Taro (1848 –
1913). O Acordo Taft-Katsura reconheceu mutuamente o
domínio japonês na Coreia assim como a presença dos EUA
nas Filipinas. Visando à paz, Roosevelt apresentou-se como
voluntário para negociar os termos entre russos e japoneses
em Portsmouth, New Hampshire. Assim, em setembro de
1905, as duas partes assinaram o Tratado de Portsmouth.
No acordo, a Rússia foi obrigada a entregar a parte
meridional das Ilhas Sacalina e Curilas, juntamente com as
ferrovias na Manchúria para o controle japonês, assim como
a admissão dos interesses nipônicos sobre a Coreia.

Enquanto isso, o imperador coreano, Gwangmu, buscou


infrutiferamente o apoio americano pelo reconhecimento da
independência coreana, conforme assinado no Tratado de
Paz, Amizade e Comércio de 1882. No entanto, Roosevelt
desconsiderou qualquer mudança de postura, mesmo após
insistentes pedidos do representante coreano, o reverendo
Homer Hulbert (1863 – 1949) e Syngman Rhee. Assim
sendo, o campo estava aberto para a dominação japonesa
na Coreia. Em novembro de 1905, o ex-ministro, Ito
Hirobumi, chegou à capital coreana, onde as tropas
japonesas já tinham ocupado as dependências do palácio
real. Ito Hirobumi passou então a exigir um novo tratado de
protetorado pelo qual o governo japonês assumiria controle
do reino coreano. Embora veementemente rejeitado por
Gwangmu, o acordo foi assinado por membros de seu
gabinete intimidados em 17 de novembro. Os acordos
assinados foram reunidos no Tratado de Protetorado de
1905. Assim, o império coreano, com mais de quatro mil
anos de tradição, e quinhentos anos de dinastia, teve seu
termo efetivo nas mãos japonesas. Vários membros do
governo apresentaram vivo protesto. Alguns cometeram
suicídio. Outros, na capital, juntaram-se aos rebeldes e
inconformados e novas insurreições começaram a se
avolumar no interior pelo lado do Uibyeong, “O Exército
Justo”.

O modelo governamental adotado pelos japoneses se


inspirou no dos britânicos sobre o Egito, a manter todas as
instituições e cargos diretores nas mãos coreanas, apesar
de manter os assuntos cruciais em assuntos políticos
internos de segurança, finanças e política externa através
de conselheiros japoneses. O mandato japonês iniciou-se
nesse molde com Ito Hirobumi, nomeado como residente-
geral em dezembro de 1905. E sua primeira política,
visando angariar popularidade e apoio coreano, foi pegar
emprestado 10 milhões de ienes de Tóquio a fim de
promover um amplo projeto de infraestrutura moderna.
Inspirado em Lord Evelyn Baring Cromer (1841 – 1917), o
cônsul-geral britânico no Egito, Ito tentou convencer
membros da sociedade coreana aos benefícios das reformas
e construção de estradas, hospitais, escolas e aumento da
produção agrícola. Ademais, Ito mandou construir sua
residência oficial na encosta da montanha Namsan, com
plena vista geral da capital coreana. A construção era
reflexo dos novos tempos, com traços marcantes ocidentais
misturados com orientais, uma síntese do que havia
ocorrido depois da Reforma Meiji no Japão.

O desafio maior de Ito Hirobumi foi encontrar


colaboradores coreanos para corroborar e legitimar seu
regime. Nisso, muitos da antiga elite coreana, como Pak
Cheesoon (1858 – 1916) entre outros permaneceram nos
seus postos dentro do gabinete pelo apoio pró-japonês.
Novos colaboradores se juntaram em maior de 1907 com o
endosso de Ito Hirobumi: Song Pyong-jun, Cho Chunggun e
Ko Yonghui, dentre os mais destacados. Com as novas
oportunidades abertas com o novo regime, membros que
antes eram marginalizados na sociedade coreana passaram
a ascender no poder e status. Entre esses, Song Pyong-jun
tomou para si um sobrenome yangban apesar de sua
origem familiar humilde. Ko Yonghui era um chungin (classe
média) que tinha vivido no Japão desde a Abertura dos
Portos em 1876.

O “Exército Justo”, Uibyeong, começou a tornar-se no


principal foco de resistência armada aos japoneses.
Membros dessa organização começaram a aumentar suas
campanhas no interior, atacando representantes e
magistrados coreanos, mercadores e militares japoneses.
Ex-membros yangbans, como Choe Ikhyon estavam
dispostos a lutar contra os nipônicos, mas recusaram-se a
combater militares coreanos que ainda eram considerados a
serviço do imperador Gwanmu. Nesse sentido, houve uma
divisão nos rebeldes do Uibyeong, com parte a manter sua
tradicional lealdade à dinastia Joseon, enquanto outros
postaram-se mais radicais a lutar pela plena igualdade e
nacionalismo coreano, muitos desses, camponeses das
províncias meridionais da península. No meio urbano,
alguns intelectuais lançaram um movimento patriótico
desvinculado do Uibyeong, acreditando que apenas um
auto-fortalecimento nacional iria garantir a soberania
coreana. Conservadores confucionistas, que haviam
criticado as reformas modernizadoras, passaram a aderir à
essa ala, e passaram a enviar seus filhos para escolas com
currículo de ensino técnico ocidental, a organizar
associações como a Changanhoe (“Sociedade de
Fortalecimento Pessoal”) e a publicar jornais e periódicos.
Um de seus projetos resultou na ampla campanha em 1907
de angariar doações para pagamento da dívida nacional a
credores estrangeiros, “Movimento de Pagamento do Débito
Nacional”, Gukchae Bosang Undong( ).

Enquanto isso, o imperador Gwanmu passou a ampliar


sua rede de contatos no exterior em busca de ajuda. Por
sugestão do Reverendo Homer Hubert, o monarca enviou
representantes para a Segunda Conferência Internacional
da Paz realizada em Haia, Holanda, em junho de 1907 [92].
Entretanto, a Coreia havia perdido sua soberania como
Estado para o Japão, impedindo seus representantes a não
participar oficialmente da conferência. Apesar do
comovente discurso de um dos representantes coreanos, Yi
Wijong, o governo japonês usou isso como pretexto para
remover de vez o imperador coreano do trono. De fato, Ito
Hirobumi e seus colaboradores no governo coreano
passaram a pressionar e ameaçar o imperador coreano, a
ponto de ele passar seu trono para o seu filho, o príncipe
herdeiro Sunjong (1874 – 1926), o último rei da dinastia
Joseon.

Como primeiro ato, o novo soberano monárquico assinou


um tratado revisado com os japoneses, permitindo a
nomeação de ministros japoneses para todos os ministérios.
A abdicação forçada de Gwanmu (ou Gojong) e o novo
tratado de protetorado ampliou ainda mais os sentimentos
anti-japoneses na sociedade coreana. Muitos do exército
coreano foram aposentados e passaram a engrossar as
fileiras das guerrilhas do “Exército Justo” em 1908. Ito
Hirobumi tinha subestimado a antipatia popular e agora
passou a enfrentar resistência armada cada vez maior no
campo. Assim, Ito ampliou as campanhas militares em toda
a península. Em 1908, o exército japonês matou cerca de 11
mil e 500 membros do Uibyeong, gerando visibilidade na
imprensa internacional. Nessa onda repressora, um
nacionalista coreano que vivia nos EUA, An Chang-ho (1878
– 1938), organizou um movimento clandestino em 1909,
chamado de Shinminhoe (“Sociedade das Novas Pessoas”,
), cujo objetivo era organizar e financiar a resistência
armada a partir do exterior. Outros membros da sociedade,
intelectuais e nacionalistas, passaram a se engajar na
publicação de jornais e panfletos na capital. Um dos mais
ativos jornalistas desse veio foi Shin Chae-ho (1880 – 1936),
que criticou o imperialismo japonês. Seus escritos
influenciaram muitos, como o poeta e historiador coreano,
Choe Nam-seon (1890 – 1957).

Isolada internacionalmente e sem apoio sustentado no


meio interno, a resistência coreana anti-japonesa passou a
adotar medidas extremas. Como último recurso, em maio de
1908, um americano que serviu como conselheiro aos
japoneses sobre a Reforma Gabo, Durham White Stevens,
foi baleado por dois nacionalistas coreanos em Oakland,
Califórnia. Diante da crise internacional e dos protestos do
governo dos EUA, o residente-geral na Coreia, Ito Hirobumi
renunciou ao seu cargo, dando vez aos japoneses que
defenderam uma política mais repressora e direta para a
Coreia. Em julho de 1909, o gabinete japonês passou a
adotar uma política de anexação. Em seu último ato
diplomático, Ito Hirobumi visitou a cidade de Harbin, na
Manchúria, em outubro, para se encontrar com o ministro
russo, Vladimir Kokovsoff, a negociar a aprovação russa da
anexação da Coreia. Na estação de trem, um nacionalista
coreano, An Jung-geun (1879 – 1910), apontou sua arma de
fogo e matou Ito Hirobumi [93]. O jovem An tinha planejado o
ato para chamar a atenção mundial para a situação
coreana. Mas provocou o contrário, com muitos passando a
ter simpatias pelo Japão.
Na capital coreana, petições de pró-japoneses passaram
a chegar às mãos do imperador Sunjong para uma união
voluntária com o Japão. Em 1910, visando maior segurança
e controle, duas divisões do exército japonês chegaram ao
solo coreano. E depois de anos de campanha contra a
guerrilha do Uibyeong no interior, foi nomeado como
residente-geral, General Terauchi Masatake (1852 – 1919)
que fortaleceu a repressão e investigação com o uso da
infame polícia secreta japonesa, o Kenpeitai. A fim de
intimidar os rebeldes e oposicionistas, Terauchi ordenei que
todas as organizações políticas e movimento sociais fossem
dissolvidas, incluindo o Ilchinhoe, a partir de 1907. Em
momento derradeiro, o primeiro-ministro coreano, Yi
Wanyong e Terauchi assinaram o Tratado de Anexação em
22 de agosto de 1910 [94], terminando de vez a dinastia
Joseon.

A anexação de fato reformulou a presença japonesa na


Coreia. Invés do residente-geral, agora havia um
governador-geral, com poderes coloniais a dirigir e
administrar. No entanto, algumas áreas coreanas foram
preservadas. Poderes legislativos restritos e alguma força
militar coreana foi resguardada, apesar dos postos do
oficialato serem reservados apenas aos japoneses. O
General Terauchi Masatake, primeiro governador-geral da
Coreia passou a comandar a nova colônia com mão de ferro.
Essa dura medida revela mais das características e limites
do imperialismo japonês. Primeiramente, os japoneses não
foram capazes de convencer a população coreana do seu
projeto modernizador, resultando em anos de conflitos
contra resistentes. Mesmo após várias derrotas contra o
Uibyeong, a antipatia e resistência coreana persistiu por
décadas. Acrescente-se a isso a tradicional postura
conservadora da elite coreana, que acreditava de que eles
eram, pela tradição confuciana, superiores aos japoneses
que tinham se “degenerado” nos modos ocidentais desde a
Reforma Meiji.

Sendo assim, a imposição japonesa se deu nas mãos


militares, com pouco efeito de convencimento dos coreanos
a se submeterem. E foram pelos militares japoneses que se
concretizou a dominação, pela via dura, animados depois da
vitória sobre os russos em 1905. Em outro aspecto, a
economia japonesa não era tão sólida a ponto de não
depender da coreana. Os japoneses, antes de tudo,
enxergaram a Coreia como fornecedor essencial de matéria-
prima para a economia, como o arroz e minerais, e como
mercado consumidor dos produtos industriais japoneses e
capital de investimento. Depois de feito um amplo
levantamento das terras coreanas, o Governo Geral
nacionalizou vastas extensões de arrozais cujo produto era
vendido abaixo do preço de mercado visando favorecer os
investidores japoneses, principalmente da companhia
“Oriental Development Company”( ), fundada em
1908 [95]. Além disso, os empresários coreanos precisaram
de autorização do governo para fundar novas empresas,
consideradas sempre a favor dos japoneses. As tarifas de
importação dos produtos japoneses eram baixas,
justamente para não permitir concorrência com o mercado
coreano.

As atividades políticas foram proibidas e foi impedido o


exercício livre de expressão, imprensa e reunião. Em agosto
de 1911, o governo aprovou leis que desencorajava os
coreanos a receber educação superior e ter acesso ao
estudo da área das humanidades e ciências sociais,
incluindo sua própria história e geografia. Foram, contudo,
incentivados a aprender a língua japonesa, e promovia-se
como heróis os coreanos que tinham colaborado com a
administração japonesa. Em 1912, ano da morte do
imperador Meiji, todos os eventos coreanos de celebração e
festa foram terminantemente proibidos [96]. O número de
escolas públicas na Coreia aumentou na medida em que
obedeciam ao novo sistema, e as particulares, com maior
autonomia, diminuíram. Em março de 1912, as autoridades
japonesas começaram a ter poder livre de investigação,
interrogatório e tortura contra suspeitos.

Sob esse duro regime, o pouco espaço de resistência se


dava por organizações com apoio estrangeiro, como as
escolas missionárias e particulares. Apesar de serem vistos
como suspeitos, as autoridades japonesas queriam
preservar a imagem internacional da administração
japonesa na Coreia. Esses missionários, por sua vez, em boa
parte advindos da América do Norte de igrejas protestantes,
começaram a denunciar cada vez mais a opressão e os
abusos dos direitos humanos, angariando suporte e apoio
de nacionalistas coreanos e de outros missionários e
cristãos convertidos coreanos. Em outras palavras, o
cristianismo na Coreia passou a ser visto como meio de
escapar da opressão japonesa. Em 1911, citando alegações
de conspirações a assassinar o governador-geral, o General
Terauchi, foi expedido mandato de prisão a vários líderes
cristãos coreanos, incluindo Yun Chi-ho. Apesar disso, o
cristianismo coreano continuou a crescer com relativo
entusiasmo, principalmente nas províncias onde o
neoconfucianismo não havia feito raízes históricas como no
noroeste da península. Visando contrapor a popularidade
cristão, as autoridades coloniais passaram a promover o
budismo, crença historicamente compartilhada com os
japoneses.

Enquanto isso, o mundo estava mudando radicalmente. A


Rússia czarista desabou diante da Revolução Bolchevique
em novembro de 1917, e Lênin havia proferido o princípio
internacionalista do comunismo, a de que todos os povos
oprimidos deveriam ser apoiados. A mensagem foi poderosa
e chegou aos ouvidos coreanos que inspirou o movimento
comunista local. Em novembro de 1918, representantes de
um partido nacionalista coreano – Partido da Juventude da
Nova Coreia – sediado em Xangai e liderado por Yo Um-
hyung (ou Lyuh Woon-hyung) (1886 - 1947), foram para a
Conferência de Paz em Paris para peticionar pela
independência da Coreia. Ao mesmo tempo, a comunidade
coreana nos EUA tentou mandar representantes, chefiado
por Syngman Rhee, que tinha se convertido ao cristianismo.
Apesar dos esforços, pouco efeito prático foi alcançado.

A Conferência de Paz que transcorreu até 1919, serviu ao


menos de inspiração e esperança para os coreanos que
persistiram na luta contra a dominação colonial. Pois o
presidente dos EUA no evento, Woodrow Wilson (1856 –
1924) chegou a defender a autodeterminação dos povos.
Em Tóquio, alguns coreanos em 8 de fevereiro de 1919,
fundaram o Partido da Independência da Coreia, em
resposta ao que viram como promessa dos tempos em
mudança. Outros coreanos, retornados dos seus estudos da
Universidade de Waseda, em Tóquio, passaram a ensinar
para as novas gerações os direitos e princípios libertadores
do nacionalismo e autodeterminação. Igualmente também
foi organizado uma ampla campanha internacional pela
independência coreana, e promoveram figuras que lutaram
por isso como Yi Sang-jae. Alguns outros nacionalistas
coreanos passaram a apoiar lideranças religiosas, enquanto
outro basearam-se nas décadas de lutas dos rebeldes do
movimento Donghak, agora reencarnado como uma seita
religiosa, o Cheondogyo (“Religião dos Meios Celestes”,
), ou Cheondoísmo. O secretário-geral desse novo
movimento religioso e milenarista, Choe Rin (1878 - ?),
conseguiu convencer a liderança de se envolver na política
anticolonial. Outros líderes religiosos, cristãos, também
reagiram à mensagem de Woodrow Wilson e passaram a
lutar por novos ideais.

Todo esse turbilhão de inspirações e ideais convergiu no


dia 1º de março de 1919, quando houve uma grande
concentração de manifestantes na Praça Pagoda na capital
coreana. Na ocasião, houve a presença de 33 líderes
religiosos, 16 dos quais cristãos, 15 do Cheondoísmo e dois
budistas [97]. E assim foi lida a Declaração de Independência
por Son Byong-hi (1861 – 1922), escrita pelo poeta Choe
Nam-seon, ainda hoje é referência para as causas
nacionalista e de libertação coreana. A mensagem gritada
pela “Longa Vida (Man-se) À Independência Coreana!”
ecoou pelo movimento e pelo país, ao ponto em que foi
mobilizado estimados dois milhões de coreanos. Dias
depois, as manifestações pelo país ganharam ares
violentos, e as autoridades japonesas resolveram agir de
maneira brutal. Mobilizando a polícia, o kenpeitai e o
exército, foram usados rifles e espadas durante semanas
contra os considerados subversivos. Ao todo, cerca de 7500
pessoas morreram, 15 mil feridos e mais de 46 mil presas e
torturadas [98]. Centenas de casas, igrejas e escolas foram
incendiadas. Em 15 de abril, a população de uma aldeia
perto de Suwon foi massacrada dentro de uma igreja local
pelas autoridades japonesas. As notícias aterradoras, no
entanto, não chegaram a impactar na imprensa
internacional, pois muitos países ocidentais não assumiram
posição crítica diante de um aliado nos esforços da Primeira
Guerra Mundial, o Japão.

Esse movimento de 1º de março de 1919, conhecido


como Movimento Sam-il ( ), foi a maior demonstração
do povo coreano contra o colonialismo japonês. Em termos
de escala, nenhuma outra resistência coreana durante o
período da dominação japonesa foi igual. Surpreendidos, as
autoridades japonesas passaram a reformular sua política
colonial de uma postura impositiva para maior
reconciliação. Em 1920, um novo governador-geral foi
apontado, o almirante Saito Makoto (1858 – 1936), e foi
anunciado um conjunto de medidas que, supostamente,
seria em benefício dos coreanos. O kenpeitai foi substituído
por forças regulares, e oficiais japoneses não mais poderiam
ostentar suas espadas consideradas como símbolo da
opressão colonial. Novas medidas permitiram publicações
coreanas e direito de expressão e reunião. O número de
escolas foi aumentado, assim como os anos de estudo aos
coreanos. Foi prometido o respeito às tradições e cultos
coreanos. Dos novos jornais coreanos fundados em 1920,
dois foram pertenciam e foram dirigidos por coreanos, o
Dong-A Ilbo( ) e o Chosun Ilbo( ) [99]. O primeiro
jornal, em determinado momento durante as Olimpíadas de
Berlim de 1936, publicou uma foto do maratonista coreano
e medalhista de ouro, Son Kijong (1912 – 2002), com a
bandeira japonesa apagada de seu peito. Por esse incidente,
o jornal foi suspenso por um tempo. Na década de 1930, o
governo japonês tentou desencorajar o uso do idioma
coreano e do hangul, mas o Chosun Ilbo passou a publicar
histórias do romance sobre o líder rebelde coreano do
século 16, Im Kkeokjeong, visando preservar a memória e
cultura coreana.

Essa nova política colonial, focada nos aspectos culturais,


esperava apaziguar os ânimos e contestações coreanas.
Visando coibir os mais rebeldes, o governo de Saito revogou
as escolas particulares de missionários cristãos, sob o
pretexto de propagar crenças subversivas à ordem coreana.
Nas escolas públicas, as autoridades japonesas passaram a
ensinar história a defender a integração e assimilação aos
japoneses, distorcendo o passado coreano [100]. A primeira
universidade coreana foi fundada na capital em 1924, e
voltou-se principalmente para a comunidade japonesa,
apesar de terem sido reservadas um terço de suas vagas
para os coreanos.

O movimento nacionalista coreano depois dos eventos de


1º de março de 1919 pareceram promissores. Uma nova
geração de líderes começou a surgir das instituições
coreanas de ensino, como foi Yi Kwang-su (1892 - 1950),
que tinha se formado com os ideais do Iluminismo europeu
e articulou um governo nacionalista no exílio, junto com seu
mentor protestante, Ahn Changho, em Xangai. Voltando
para sua terra natal em 1922, Yi compôs um ensaio, “Sobre
a Reconstrução da Nação” (Minjok Kaejoron), argumentando
que a reconstrução moral das elites é essencial para uma
futura nação soberana e independente. O talento literário
de Yi Kwang-su foi além, e ganhou notoriedade com a
publicação de sua obra de ficção de 1917, “O Sem-Coração”
(Mujong), em que os personagens principais (o professor Yi
Hyong-sik, a sua amada e filha de seu mestre, a tradicional
Pak Yong-chae, e as tentações da moderna e próspera Kim
Son-hyong) passam por tentações, pressões e cobranças
diante das tradições que clamam por lealdade, honra num
cenário devastador de mudanças da modernidade [101].

O 1º de março inspirou outros combatentes da liberdade


para uma Coreia independente. Ao longo da década de
1920, muitos entraram em consenso de que deveriam se
unir numa frente ampla a defender um novo regime político,
republicano e não mais monárquico. Ainda em 1919, havia
cinco governos provisórios coreanos a estruturar um futuro
comando político com a saída dos japoneses, sediados na
capital (clandestinamente), em Vladivostok na Rússia
Bolchevique e em Xangai. Várias figuras e líderes coreanos
de resistência se congregaram na resistência organizada
representando os diferentes espectros políticos que
abundava no meio oposicionista coreano e centraram-se no
Governo Provisório da República da Coreia (Daehanminguk
Imsijeongbu, ), sediada em Xangai,. Syngman
Rhee, um democrata cristão que viveu e se inspirou no
governo dos EUA; Yi Dong-nyong (1869 – 1940), antigo
membro do “Exército Justo” (Uibyeong) eLivros na
Manchúria; Yi Dong-hwi (1873 – 1935), ex-soldado que se
tornou líder comunista na Sibéria; Ahn Changho, um
influente pensador das reformas morais e filosóficas
advindo da comunidade protestante cristã coreana; Shin
Chaeho, historiador, jornalista, nacionalista e anarquista e;
Yi Kwangsu, um dos mais talentosos escritores da sua
geração e autor da Declaração de Independência lida nos
protestos de 1º março de 1919. Essa gama de lideranças
compunha um governo em forma apenas, pois havia as
distâncias geográficas a ser superada numa unidade
organizacional. E havia as discordâncias entre eles.
Syngman Rhee entrava em desacordo com as ideias
comunistas de Yi Dong-hwi. Em 1925, Rhee havia sido
retirado do posto de presidência do governo provisório em
Xangai. Nacionalistas mais radicais criticaram Rhee por sua
moderação e proposta de submeter a Coreia a um mandato
sob a Sociedade das Nações, conforme defendeu em
Genebra em 1933. Cansado das provocações e acusações,
Rhee então decidiu ir para os EUA onde atuou
diplomaticamente até 1945.

Após outros desentendimentos, o governo provisório de


Xangai passou para a presidência de Kim Gu (1875 – 1949)
que assumiu o controle em 1940 até depois da Segunda
Guerra Mundial em 1947. A atual constituição da Coreia do
Sul, reconhece essa organização como antecessora de seu
governo legitimado. Syngman Rhee, apesar de sua ativa
campanha nos EUA e Europa, não conseguiu atrair muita
atenção das autoridades, pois ainda havia muitas colônias
europeias na África, Ásia e América Latina antes da Segunda
Guerra Mundial. Apenas o governo soviético ofereceu de
imediato ajuda, pois por ideologia defendia a libertação dos
povos oprimidos pelo mundo. A ajuda era dada através da
Internacional Comunista (Comintern), estabelecida em
1919, ao fornecer fundos, armas e conselheiros para os
combatentes da independência. Assim, o movimento
comunista coreano foi o primeiro beneficiado desse apoio
soviético. Mas seus membros em boa parte viviam e
atuavam no território russo. Em 26 de junho de 1918, Yi
Dong-hwi tinha fundado o Partido Socialista Coreano, em
Khabarovsk, no leste da Rússia. Isso concorreu com os
imigrantes coreanos que tinham formado em janeiro de
1918 uma seção do Partido Comunista em Irkutsk, enquanto
lutaram contra o exército czarista na Revolução
Bolchevique. As duas facções lutaram entre si pelo
favorecimento da Comintern. Enquanto os últimos
enfatizaram a revolução proletária internacional, os
primeiros, sob Yi Dong-hwi, queriam a independência
nacional da Coreia. Depois de algum tempo, Yi renomeou
seu partido para o Partido Comunista Koryo, em janeiro de
1921, sediado em Xangai e se congregou em torno dos
outros líderes do Governo Provisório da República da Coreia.

Nesse meio tempo, os ensinamentos de Marx e Lênin


espalhou-se com furor entre o meio intelectual e rebelde
coreano, entre estudantes, ativistas, políticos e eLivross na
China, Manchúria, Sibéria e Japão, resultando em vários
grupos comunistas. Todos esses tentaram se infiltrar na
Coreia e lutar pela emancipação do povo coreano do
domínio opressor japonês. Contudo, a polícia japonesa agiu
com eficiência impiedosa contra qualquer tipo de subversão
à ordem colonial. Eventualmente, vários agentes
comunistas coreanos resolveram cooperar entre si e
fundaram secretamente na capital o Partido Comunista da
Coreia (Choson Kongsandang, ) em abril de 1925,
que passou a ganhar o apoio substancial da Comintern. Boa
parte de seus ativistas foram presos e reprimidos pela
polícia japonesa, mas, num segundo momento em junho de
1926, conseguiram instigar uma manifestação em massa
que teve impacto na resistência nacionalista anti-japonesa.
Em setembro de 1926, esses comunistas resolveram mudar
sua estratégia e se juntar a uma frente unificada com os
nacionalistas, estabelecendo assim em fevereiro de 1927 a
“Sociedade Nova Coreia” (Singanhoe, ). Mesmo assim,
unificados e ampliados na sua luta pela independência, os
comunistas e nacionalistas sofreram seguidas perseguições
e repressões do governo japonês colonial. Em outubro de
1928, quase já não havia nenhuma organização comunista
atuante na Coreia e isso se estenderá até 1945.

As atividades comunistas permaneceram no exterior,


pois o pensamento marxista e o exemplo bolchevique
alimentou a esperança de muitos que sonharam com a
independência coreana. No meio artístico e literário, isso
também se fez presente. Em julho de 1925, foi fundado a
Federação do Artista Proletariado Coreano (ou conhecido
pela sigla, KAPF) que passaram a defender uma arte e
literatura voltado para a realidade da classe oprimida da
Coreia colonial. Esse movimento foi bem sucedido desde o
início pois conseguiu congregar uma frente unida que
considerava imperativo, antes de tudo, denunciar a
exploração colonial do povo coreano, despertando na classe
artística a sensibilidade para o realismo e questões sociais.
Pelo cinema e rádio, o povo coreano conseguiu ter acesso
às obras dessa escola. Um dos mais notáveis adveio do
cinema, de Na Woon-gyu (1904 – 1937), diretor e escritor do
filme de 1926, Arirang( ). O filme virou sensação
nacional na Coreia [102]. A história apresentava a vida dura
de um humilde estudante coreano que veio do interior para
a capital coreana. No movimento de 1º de março de 1919, o
estudante é preso e sofre brutais torturas, e depois volta
para sua aldeia natal com problemas mentais. Certo dia,
com a turbulência de seu estado mental, ele testemunha
sua irmã sendo agredida por um filho de autoridade
japonesa, ao que ele reage e mata o agressor com uma
foice. Preso novamente pela polícia japonesa, ele
repentinamente cura-se da sua doença mental.

A Crise da Bolsa de Nova York em 1929 agravou


consideravelmente a economia japonesa que passou a
defender o fascismo militar e a expansão sobre a China. Em
junho de 1928, militares japoneses eliminaram o senhor de
guerra na Manchúria, Zhang Zuolin, e estabeleceram ali um
Estado-fantoche (Manchukuo) sob o nominal trono imperial
do último descendente da dinastia Qing chinesa em
fevereiro de 1932. Posteriormente, as forças japonesas
passaram a expandir sua presença sobre toda a região
norte e costa chinesa. Parecia que o sonho de Toyotomi
Hideyoshi de conquistar a Coreia e China no século 16 era
agora realidade.

Pelo lado dos nacionalistas coreanos, a década de 1920 e


1930 trouxe perspectivas limitadas, apesar do entusiasmo
bolchevique. Em Xangai, havia o maior grupo de resistência
organizada pela independência coreana, no Governo
Provisório da República da Coreia, além de alguns grupos
comunistas. Mas todos tinham sérias limitações nas suas
atuações de guerrilha contra o exército japonês. Na
Manchúria, a maioria das guerrilhas coreanas entrou em
colapso na década de 1930. Visando fundear de vez sua
presença na região e na Coreia, os japoneses passaram a
construir infraestrutura e indústrias metalúrgica, química e
têxtil, além de promover mudanças para aumento da
produção agrícola. E sob o incentivo do governo-geral na
Coreia, conglomerados de empresas japonesas, conhecidas
como zaibatsu, como a Mitsui, Mitsubishi e Noguchi, foram
convidados a se instalar no território coreano e
manchuriano, a explorar a mão-de-obra barata coreana e
chinesa. Em termos estatísticos, a produção industrial
dessas regiões cresceu exponencialmente, mas isso sempre
se dirigiu à política colonial japonesa e com pouco
participação do empresariado coreano.

Em julho de 1937, militares japoneses entraram em


confronto com chineses num subúrbio de Pequim. Levando
isso como pretexto, o governo japonês iniciou uma nova
guerra contra os chineses e assim passou a controlar boa
parte do norte e da costa chinesa. O governo nacionalista
chinês, sob o comando de Chiang Kai-Shek, em Nanquim,
pouco pode fazer a deter esses avanços, e a capital do sul
foi tomada após cinco meses de batalhas, após o massacre
de milhares de cidadãos. No vasto interior chinês, no
entanto, o domínio nipônico foi mais limitado, e foi dessa
região que guerrilhas organizadas pelo Partido Comunista
Chinês começou a se organizar e ganhar força.

Na Manchúria, um exército de rebeldes anti-japoneses


manchurianos e coreanos foi organizado pelo Partido
Comunista Chinês em 28 de janeiro de 1936. Até 1940, essa
unidade tornou-se um fardo para a presença japonesa na
região, e isso atraiu a atenção de líderes que desejaram a
expulsão dos japoneses na Coreia. Um desses foi um
membro do exército, chamado de Kim Songju (1912 – 1994)
que depois mudou seu nome para Kim Il Sung (ou Kim
Kyung-cheon), em homenagem a um lendário combatente
coreano na Manchúria. Com este nome, Kim Il-Sung tornou-
se no maior líder de resistência aos japoneses no norte
coreano e Manchúria, e depois irá ser o primeiro líder da
Coreia do Norte em 1948. Em 4 de junho de 1937, Kim Il
Sung, então com apenas 24 anos de idade, com crescente
apoio de comissários comunistas chineses, passou a invadir
o território coreano ao sul do rio Yalu. Comandando uma
companhia de cerca de 150 homens, atacou com sucesso a
base japonesa em Pochonbo, na fronteira com a China,
matando vários militares japoneses [103]. Após o feito, as
forças de Kim Il Sung recuaram para o território
manchuriano novamente e depois para Khabarovsk, na
Rússia, na chamada “Marcha Árdua” (gonanui haenggun,
), mas seu feito inspirou as lutas anti-japonesas nos
próximos anos. No território russo, Kim Il Sung passou a ser
protegido e treinado pelo Comando Oriental do Exército
Vermelho Soviético.

Com a expansão das ofensivas japonesas sobre a China,


o governo-geral intensificou a exploração dos recursos
humanos e minerais da Coreia, a apoiar os esforços de
guerra. Para tal, foram determinadas políticas draconianas
sem precedentes. O novo governador-geral, Minami Jiro
(1874 – 1955), nomeado em agosto de 1936, começou a
implementar a política de plena assimilação, a juntar os dois
países como se fosse “num só corpo” (naisen ittai, )
[104]. Minami assim acreditava que poderia abolir a

identidade coreana a mobilizar seus esforços militares para


o império japonês. Em 1937, foi estabelecido um órgão de
vigilância e inteligência para policiar os coreanos, o Comitê
Central de Informação. Houve aumento notável de agentes
da polícia secrete japonesa, além do incremento no número
de militares no território coreano. A Coreia vivia sob um
Estado colonial e cada vez mais policial. A fim de intimidar
os dissidentes e intelectuais coreanos, as autoridades
coloniais prenderam vários de seus líderes, como o influente
escritor, Yi Kwang-su, e cristãos como Yun Chi-ho.

Em agosto de 1938, o governador-geral lançou uma


política de mobilização da sociedade coreana visando sua
total dedicação e lealdade à guerra, fundando a Federação
Coreana de Mobilização Total do Espírito Nacional (Kokumin
Seishin Sodoin Chosen Renmei). Suas ramificações
envolveram todos os escalões administrativos, desde a
capital às províncias, cuja base era em torno de grupos de
dez famílias cada. Cada uma dessa unidades deveriam
contribuir em serviços, trabalhos, racionamento e vigilância
[105]. Diante disso, as condições de vida tornaram-se cada

vez mais opressivas e miseráveis. Boa parte da sociedade


coreana foi forçada a usar uniformes de guerra. A moda
masculina deveria seguir à moda militar japonesa, enquanto
as mulheres coreanas foram proibidas de usar saias
ocidentais ou o vestido tradicional coreano, o chima( ), e
forçadas a usar calças marrons (mompei). Os uniformes
escolares foram concebidos a refletir o sistema japonês
(seifuku, ), com o uniforme preto de cadete para os
meninos, e o uniforme marinheiro para as meninas.

Minami Jiro dirigiu ainda sua política para a plena


assimilação da cultura, religião e tradição coreana. Um dos
seus principais alvos foi a língua coreana. Em março de
1938, foi decretado pelo governador-geral que todas as
escolas deveriam usar apenas a língua japonesa, e que
todos os estudantes deveriam falar essa língua, mesmo em
casa. Todas as manhãs, os estudantes tinham que se curvar
em direção ao leste, ao palácio do imperador japonês
(Tennô, ) e recitar um juramento de lealdade ao império.
Jornais de língua coreana, como o Dong-A Ilbo e o Chosun
Ilbo, foram fechados. E todo mês, os coreanos foram
forçados a visitar um templo xintoísta e fazer adorações aos
deuses japoneses [106]. Isso causou grandes problemas
entre a população cristã coreana, ao desrespeitar um dos
Dez Mandamentos. Diante disso, a repressão contra a
população cristão foi impetuosa. Em 1938, 18 escolas
cristãs foram fechadas. Dois anos depois, mais de dois mil
cristãos coreanos foram presos por desobediência e mais de
duzentas igrejas foram fechadas. Cerca de 50 líderes
cristãos, incluindo o presbiteriano Reverendo Chu Ki-Chol
(1897 – 1944), foram martirizados na prisão.

Em 1939, foi decretado que todos os coreanos deveriam


adotar sobrenomes japoneses [107]. Uma grande ofensa às
tradições confucionistas de cultuar os ancestrais familiares.
Diante da relutância e resistência de muitos coreanos, o
governo colonial buscou recompensar aqueles que tinham
mudado com benefícios com racionamentos mais generosos
e acesso a cargos mais altos no governo. Apesar disso,
cerca de 20% da população coreana ainda assim desafiou a
nova política e manteve seus nomes originais.

A intensificação da Segunda Guerra Mundial pelo lado


japonês se deu após o ataque surpresa a Pearl Harbor em 7
de dezembro de 1941. A política colonial na Coreia levou o
povo coreano a uma mobilização ainda maior no esforço de
guerra. O exército japonês passou a incorporar membros
coreanos voluntários. Um desses foi Park Chung-hee (1917 –
1979), que depois seria um dos líderes da Coreia do Sul
entre 1961 e 1978, e tinha entrado na Academia Militar em
Tóquio, alcançando o posto de tenente do Exército Imperial
Japonês em 1944 [108]. Com a falta de mão-de-obra diante
da Guerra do Pacífico contra os EUA, o Japão passou a
recrutar militarmente na Coreia a partir de 1943. Cerca de
187 mil foram recrutados para o exército japonês e outros
20 mil para a marinha. Além disso, os militares japoneses
mobilizaram cerca de 200 mil jovens coreanos para a
Brigada do Corpo Dedicado (Teishintai), cujas meninas
depois seriam referidas como “mulheres de conforto” [109].
Essas foram enviadas para as linhas de combate e forçadas
à servidão sexual das tropas japonesas. Desde 1939, as
autoridades japonesas na Coreia tinham recrutado
trabalhadores coreanos para trabalhos compulsórios, mas
em 1944, isso se expandiu grandemente e começou a
envolver quase um milhão de coreanos até o fim da guerra
[110]. Esses trabalhadores forçados atuaram nas minas,

fábricas e também no campo de batalha.

Até a rendição japonesa em 15 de agosto de 1945, o


governo-geral na Coreia tinha empregado todos os seus
meios e recursos para perseguir e reprimir qualquer
oposição e dissidência. O Partido Comunista da Coreia foi
dissolvido e pulverizou-se em pequenas células clandestinas
nas zonas industriais. A maioria dos líderes nacionalistas
coreanos, como Yi Kwang-sun, Choe Nam-seon, Kim Seong-
su e Yun Chi-ho foram subjugados e presos. Outras
lideranças sobreviveram, mas a partir do exterior. Na China,
o Governo Provisório da República da Coreia, sob Kim Gu,
fugiu para a cidade interiorana de Chongqing que tinha se
tornado na capital temporária do governo nacionalista
chinês. No norte da China, o Partido Comunista Chinês
treinou e protegeu líderes coreanos comunistas, como Kim
Tu-bong (1889 – 1958) e Kim Mu-chong (1904 - 1952), que
lutaram contra os japoneses. Na Rússia, na província de
Khabarovsk, Kim Il Sung e seus seguidores continuaram
sendo preparados e instruídos pelo Exército Soviético. E nos
EUA, Syngman Rhee continuava seus esforços diplomáticos
pela causa da independência coreana.
8 A FRATURA

Após agosto de 1945, os dias da Segunda Guerra Mundial


estavam contados. A Alemanha nazista havia se rendido em
8 de maio, mas ainda persistia a frente japonesa contra os
americanos. O imperador Hirohito (1901 – 1989) finalmente
decidiu se render após dois bombardeios atômicos nas
cidades de Hiroshima e Nagasaki em 6 e 9 de agosto,
respectivamente. Como a União Soviética havia declarado
guerra contra o Japão em 8 de agosto, o Exército Vermelho
avançou para as províncias ocupadas no norte e nordeste
da Coreia. Os EUA, no momento, estavam distantes da
região, localizados nas ilhas Ryukyu a cerca de 600 km de
distância da península coreana. Em 15 de agosto, Hirohito
anuncia, por meio do rádio e para uma população atônita
que jamais tinha ouvido a voz do imperador, a rendição
incondicional às Forças Aliadas.

Na Coreia, o evento teve promissoras repercussões. O


governador-geral tinha passado para as mãos de Endo
Ryusaku (1886 - 1963) e este, ciente da rendição,
secretamente sondou lideranças coreanas para transferir o
poder administrativo. Um dos primeiros considerados foi o
partido nacionalista de Kim Seong-su, um líder experiente e
bem articulado entre os nacionalistas mais moderados que
tinha apresentado relativa cooperação com os japoneses. As
autoridades japonesas acreditaram que o grupo dele teria
mais condições de controlar e apaziguar os ânimos após o
período colonial e a guerra. Apesar da oferta feita, Kim a
rejeitou, insistindo que o Governo Provisório da República da
Coreia, eLivros em Chongqing na China, era a única com
legitimidade a representar o povo coreano. Sendo assim,
Endo voltou-se para Yo Unhyong (ou Lyuh Woon-hyung), que
esteve desde agosto de 1944 formando secretamente um
partido político com esquerdistas moderados, a Liga da
Construção da Coreia (Konguk Tongmaeng) [111]. Este
colocou como condição a plena independência coreana,
com a liberdade de imprensa, não-interferência nas
atividades políticas coreanas, movimentos trabalhistas e
estudantis [112]. Em troca, Lyuh prometeu não dissolver a
estrutura da administração vigente do Governo Geral e
controlar o impulso retaliatório contra os japoneses na
península. Sendo assim, Lyuh, junto com An Chaehong
(1892 – 1965) organizaram o Comitê para a Preparação da
Independência Coreana (Konguk Chunbiwiwonhoe),
convidando todo o espectro das lideranças nacionalistas,
independentemente das diferenças ideológicas.

Em Pyongyang, no norte coreano, o governador japonês


abordou um nacionalista cristão, Cho Man-sik (1882 – 1950),
a fim de organizar outro comitê para buscar a conciliação e
ordem na região. Cho concordou em cooperar, unindo-se
depois ao Konguk Chunbiwiwonhoe em 17 de agosto.
Contudo, o grupo de Cho era composto por apenas dois
comunistas entre os 20 membros de orientação mais
conservadora e direitista. Ao se juntaram ao grupo na
capital coreana, agora renomeada como Seul, os direitistas
de Cho se viram em minoria contra a maioria esquerdista no
Konguk Chunbiwiwonhoe [113]. Os comunistas coreanos
tinham se reagrupado em fins de agosto sob a liderança de
Bak Honyong (1900 – 1955), que tinha retornado de Seul.
Com a presença massiva das tropas soviéticas ao norte da
Coreia, os esquerdistas começaram a ganhar ânimo e
esperança de um futuro promissor. Ademais, representantes
diplomáticos de Moscou permaneceram em Seul durante a
guerra, com a concordância das autoridades japonesas após
terem assinado um Pacto de Neutralidade (Nisso Churitsu
Joyaku, ) entre os dois países desde abril de 1941.
Portanto, a União Soviética era a única potência vencedora
da guerra que manteve sua presença continuada na
península coreana.

Aproveitando-se das mudanças políticas e vácuo de


poder, o Konguk Chunbiwiwonhoe, vendo-se em sua maioria
dominada por esquerdistas e com a proximidade soviética,
declararam a República Popular da Coreia (Choson Inmin
Konghwakuk, ). E logo estabeleceram dezenas de
comitês populares locais (Inmin Wiwonnhoe) nas províncias
lideradas por membros comunistas [114]. E disso,
organizaram um corpo armado, chamado de Preservação da
Paz, composto por membros jovens, a assumir o papel de
preservar a ordem pública. Em 6 de setembro de 1945, Lyuh
Woon-Hyung e Bak Honyong presidiram um plenário
congressional, no Congresso dos Representantes do Povo.
Mais de mil delegados de todo o país compareceram e
elegeram 55 representantes para um corpo legislativo da
nova Coreia, o Comitê Legislativo do Povo, a ser presidido
por Lyuh. Assim nasceu as estruturas iniciais da República
Popular da Coreia. O Comitê Legislativo nomeou um
presidente e seus membros de gabinete. Syngman Rhee
tornou-se presidente e Kim Gu, ministro do interior. Mas
naquele momento, na composição política coreana,
representantes além da esquerda estavam em
desvantagem. Em outras palavras, a Coreia nasceu em
setembro de 1945 sob os moldes da República Popular que
visou um governo de coalizão e incorporar todo a gama de
líderes nacionalistas, mas com um coeso núcleo comunista
predominante.

Os países aliados vitoriosos da Segunda Guerra Mundial


não tinham consenso sobre o futuro da península coreana.
Quando se reuniram no Cairo em 1º de dezembro de 1943,
Roosevelt, Churchill e Chiang Kai-shek pensaram em termos
vagos e imprecisos sobre uma forma de tutela das
potências aliadas, declarando que a Coreia seria, no devido
tempo, livre e independente. Os aliados reunidos
entenderam que a península não tinha um governo
soberano desde o início do século 20. Apesar disso, os
coreanos desejaram ardentemente por um autogoverno, e
entenderam que teriam uma independência iminente após a
guerra. Cópias da Declaração do Cairo foram distribuídas
pela Coreia, gerando grandes expectativas e efervescências
entre as lideranças nacionalistas. Mais tarde, em Ialta, em
fevereiro de 1945, Stalin, Roosevelt e Churchill foram mais
cautelosos e não apresentaram nenhuma conclusão sobre a
Coreia. E em julho, em Potsdam, os EUA demonstraram
visível desinteresse, enquanto a União Soviética manteve-se
ambígua a respeito. E, notavelmente, nenhum
representante coreano havia sido convidado pelos governos
aliados para discutir a situação coreano do pós-guerra.

A indiferença dos EUA, em particular, levou à uma


decisão do Pentágono no dia 10 de agosto de 1945 em
propor uma linha ao longo do paralelo 38 como fronteira de
ocupação futura entre americanos e soviéticos. Como o
Japão tinha se rendido antes do esperado, a Rússia, não
mais tinha motivos para não avançar da Manchúria para a
península. Stalin, almejando os portos do nordeste da Coreia
como parte de sua campanha de total controle
manchuriano, aceitou a linha demarcada do governo de
Truman. Assim, o 25º Exército Soviético começou a ocupar o
norte da península coreana em 9 de agosto, um dia depois
de ter rompido o Pacto de Neutralidade com o governo
japonês.

Em 15 de agosto, o general Ivan Mikhailovich Christiakov,


comandante do 25º Exército, fez um apelo ao povo coreano
de sua base na Manchúria. Ele anunciou o estabelecimento
de um comando militar soviético na Coreia e declarou a
Rússia como libertador do país que tinha sido oprimido
pelos japoneses. O povo coreano não recebeu a mensagem
de bom grado, pois foram frequentes os saques de vilas e
cidades por tropas soviéticas e oportunistas coreanos.
Mesmo assim, os soviéticos começaram cedo a estruturar o
poder em nível local por onde tinham presença, com base
nos comitês populares locais (Inmin Wiwonnhoe) e forças
policiais a controlar a ordem pública. Quando chegaram a
Pyongyang em 28 de agosto, o general Christiakov junto
com seu comissário político, general Nikolai Georgievich
Lebedev, reorganizaram o comitê nacionalista,
principalmente através de Cho Man-sik, no recém-criado
Comitê Político do Povo, que tinha nacionalistas e
comunistas em igual número.

Pelo lado americano, houve considerável hesitação e


postura impositiva. Os decisores políticos nos EUA, em
Washington e Tóquio, nomearam o general John R. Hodge
(1893 - 1963) como comandante das Forças Armadas dos
EUA na Coreia. Seu apontamento se deu unicamente pelo
fato de seu exército estar mais próximo da península, em
Okinawa, no sul do arquipélago japonês. Quando Hodge
desembarcou com sua força em Inchon em 8 de setembro,
uma comitiva do Governo Provisório da República da Coreia
foi recebê-lo. Ao se deparar com um suposto “governo
coreano”, o general recusou a encontra-los, pois Hodge
permaneceu fiel ao que foi anunciado na Ordem Geral de 7
de setembro de 1945 pelo seu superior em Tóquio, general
Douglas MacArthur (1880 - 1964):

Em virtude da autoridade investida em mim como Comandante em Chefe


das Forças do Exército dos EUA e do Pacífico, venho por meio deste
estabelecer o controle militar na Coreia ao sul da latitude 38 Norte, e
anuncio aos habitantes de lá as seguintes condições de ocupação: todos os
poderes de governo sobre o território citado está sob a minha autoridade.
As pessoas obedecerão às minhas ordens e se submeterão à minha
autoridade. Atos de resistência às forças de ocupação ou quaisquer atos
que possam perturbar a paz e segurança serão punidos severamente. Para
todos os efeitos, o inglês será a língua oficial do controle militar [115].

(tradução nossa)

As palavras de MacArthur soaram desalentadoras para


os coreanos que sonharam com a plena independência
depois da guerra e de décadas de governo colonial japonês.
A mensagem contrastava com a mensagem soviético
tornada pública em 8 de agosto, em que ao menos foi
entendido que os coreanos sofreram nas mãos dos
japoneses e que foi enfatizada a liberdade: “A noite escura
da escravidão sobre a Coreia durou por longas décadas, e,
chegou enfim a hora da libertação!” (tradução nossa) [116].
Aparentemente, as autoridades militares dos EUA
consideraram o país como hostil aos seus interesses que,
por terem colaborado com o regime japonês, deveriam
cumprir os termos da capitulação que tinham estendido ao
Japão. Portanto, os EUA continuaram a manter a estrutura
colonial japonesa do governo geral assim como suas duras
leis sobre os coreanos. A Ordem Geral de MacArthur
considerava o povo coreano como algo a ser protegido, mas
guiados em termos políticos a seguir os caminhos
democráticos e pacíficos. O general Hodge, por sua vez,
recusando receber os coreanos em Inchon, manifestou
claramente sua não reconhecimento oficial do Governo
Provisório da República da Coreia sediado em Chongqing,
apesar de ter permitido a volta de seus líderes.

Assim, Kim Gu, presidente do Governo Provisório,


retornou à Coreia em 23 de novembro. O mesmo se deu
com Syngman Rhee em 16 de outubro, que tinha por tantos
anos atuado junto ao Departamento de Estados dos EUA,
em Washington. Rhee, que tinha se tornado no líder de
independência mais popular na década de 1940, não teve
uma recepção triunfante para sua terra natal, entretanto.
Apenas os membros mais da direita nacionalista do espectro
político coreano em Seul, do Partido Democrático Coreano,
liderado por Song Jin-woo (1889 - 1945) e Kim Seong-su
(1891 – 1955) estavam entusiasmados.

Pelo lado soviético, a fanfarra foi maior. Foi organizado


uma ampla cerimônia de recepção de herói para Kim Il
Sung. Impressionando os presentes e o povo, que ficaram
surpreendidos com a pouca idade do militar coreano, com
apenas 33 anos de idade. Enquanto os antigos líderes
comunistas coreanos, como Pak Hon-yong, lutavam pela
hegemonia em Seul, os russos em Pyongyang
concentraram-se em apoiar e fortalecer Kim Il Sung. Kim
tinha servido por anos sob o comando do general Terentii
Shtykov (1907 - 1964) que tinha sido promovido a
comandante da Primeira Força do Extremo Oriente do
Exército Vermelho, algo superior em comando do que o 25º
Exército, portanto influente na política soviética na Coreia. E
para limpar o acesso de Kim ao poder, foi encontrado
misteriosamente morto seu rival comunista na região norte
coreana, Hyon Chun-hyok em 28 de setembro de 1945 [117].
Para estruturar o poder soviético sob Kim, a administração
civil dos russos estabeleceu em novembro vários cargos
administrativos e reorganizou o órgão executivo, Comitê
Popular, a refletir o modelo na União Soviética. E fez com
que o Comitê ficasse sempre sob controle do Partido
Comunista aliado a Moscou. Assim foi feita a ascensão de
Kim como líder inconteste da Coreia ao norte do paralelo 38.
Em dezembro, Kim Il Sung foi nomeado como chefe do
Partido Comunista Coreano, acima de todas as antigas
lideranças. A ascensão de Kim Il Sung foi feita de maneira
independente e sem consultas com os comunistas coreanos
em Seul. Os soviéticos, cientes disso, queriam promover
seus aliados mais confiáveis e a manter a península
dividida.

A primeira importante cúpula dos aliados sobre a Coreia


iniciou-se em 16 de dezembro de 1945 em Moscou, com a
presença de ministros de Relações Exteriores dos EUA,
URSS, Reino Unido e, em momento posterior, da China. O
acordo alcançado foi anunciado em 28 de dezembro que
propôs uma Comissão Conjunta estadunidense-soviética
para auxiliar a formação de um futuro governo coreano. Foi
também concluído de que seria necessário um período de
até cinco anos de tutelagem desses países da cúpula a
atuar sobre a Coreia, materializando o vago projeto
proposta em Cairo em fevereiro de 1943 e em Ialta dois
anos depois [118].

O acordo feito em Moscou, desencorajou os coreanos


que almejaram a independência imediata. A frustração
explodiu em manifestações pelo país, a incluir todos os
coreanos, dos esquerdistas aos mais conservadores. Em
poucos dias, porém, a descontentamento da esquerda
começou a se organizar e seguir as diretrizes dos soviéticos
que endossaram o Acordo de Moscou. À direita,
diferentemente, o movimento anti-tutelagem prosseguiu,
sob a liderança de Syngman Rhee e Kim Gu mobilizando
seus partidários e apoiadores principalmente no sul do
paralelo 38 e em Seul. Em suma, com a continuada
presença de comunistas coreanos independentes e de
direitistas na região meridional coreana, o cenário apontava
para um maior agravamento dos conflitos.

Em 11 de fevereiro de 1946, seguindo uma diretiva do


Departamento de Estado dos EUA para o comando militar
americano na Coreia, foi organizado uma coalizão política
entre os coreanos ao sul do paralelo 38 visando organizar
representantes em consenso a terem voz com a Comissão
Conjunta EUA-URSS, conforme acordado em Moscou. Todos
se reuniram no Conselho Democrático Representativo da
Coreia do Sul, organizado pelos EUA e Syngman Rhee foi
eleito como presidente do Conselho, embora com ressalvas
do general Hodge e sua equipe que desejaram ter uma
liderança mais moderada como Kim Kyu-sik (1881 - 1950),
que pudesse melhor dialogar com direitistas e esquerdistas.
Mas o clima político na Coreia do Sul parecia não favorecer
a moderação, com a esquerda e oposicionistas sul-coreanos
prontamente rejeitando o Conselho que, em vez disso,
formaram a Frente Nacional Democrática [119]. A Comissão
EUA-URSS realizou sua primeira reunião em Seul em 20 de
março de 1946, e não conseguiu chegar a entendimentos
mínimos mútuos sobre quais partidos políticos coreanos
teriam participação no governo provisório. Os delegados
soviéticos tinham insistido em excluir a maioria dos
membros da direita coreana, alegando que esses se
opunham aos acordos feitos em Moscou. Os EUA, em
contraparte, defenderam a livre expressão política,
incluindo aqueles que tinham rejeitado a tutelagem. Depois
de dois meses de impasses, a Comissão Conjunta foi
finalmente adiada indefinidamente. Foi o início da quebra de
diálogo entre as partes coreanas na Coreia do Sul.

Os direitistas começaram a organizar um movimento


essencialmente antissoviético e anticomunista, exigindo a
independência imediata e sem tutelagem. Syngman Rhee
exigiu em 3 de junho de 1946 o estabelecimento de um
governo independente no sul, se a URSS não cooperasse
com os EUA com relação a um governo coreano unificado na
península. Kim Kyu-sik, fortemente apoiado por militares e
governo dos EUA, promoveu um movimento de coalizão
entre os partidos da esquerda e direita na Coreia do Sul. Em
julho, o Departamento de Estado dos EUA ordenou que Seul
respeitasse a diretiva de encorajar uma ampla coalizão de
moderados como primeiro passo para um governo interino
coreano. Esquerdistas moderados sul-coreanos, como Lyuh
Woon-hyung, se juntaram nessa coalizão, mas o Partido
Comunista Coreano, sob Pak Hon-yong se opôs a qualquer
fratura da península coreana.

Ao norte do paralelo 38, os soviéticos, sob a


Administração Civil Soviética, entregaram sua autoridade a
uma administração centrada em Pyongyang e passaram a
atuar como conselheiros ao governo de Kim Il Sung. Vendo-
se empoderados pela presença do Exército Vermelho no
norte da península, os comunistas coreanos passaram a
perseguir oposicionistas ao seu projeto de poder, incluindo a
prisão do líder nacionalista, Cho Man-sik em janeiro de 1946
no Hotel Koryo em Pyongyang [120]. Assim tinha sido
demonstrada a falta de vontade dos russos e comunistas no
norte coreano em cooperar com outras lideranças
nacionalistas. Assim, a política norte-coreana começou a ser
consolidar em torno de duas facções comunistas, uma
composta por guerrilheiros manchurianos e chineses que
tinham lutado com Kim Il Sung, e coreanos que tinham
vivido em território russo que vieram com o Exército
Vermelho. Kim, que tinha o apoio do governo soviético,
pedia a instalação de um governo efetivo e democrático na
Coreia do Norte, a seguir a política de Stalin de “socialismo
em um único país” [121], que significou a estabilização
política do domínio soviético onde tinham controle, ou seja,
no norte da península coreana. Essa ideia foi implementada
pelo grupo de comissários do Exército Vermelho na Coreia
do Norte, particularmente sob o general Shtykov.

A partir de março de 1946, a administração de Kim Il


Sung passou a ampliar sua política, visando reformar a
estrutura fundiária. O Estado passou então a confiscar as
grandes propriedades sem compensações e as redistribuiu
para fins de lavoura sem exigência de pagamentos. Ao
mesmo tempo, a administração norte-coreana passou a
nacionalizar as principais indústrias e estabelecimentos
financeiros. De fato, essa revolução havia sido um alívio
para aqueles que tinham sido explorado e destituídos
durante o governo japonês. Foi relativamente fácil, pois,
expropriar daqueles poucos que tinham se aliado aos
japoneses, além da pouca quantidade de terra arável estar
disponível no norte coreano em comparação com o sul. O
resultado foi a redistribuição de terras para inúmeras
famílias, mas de pequenas dimensões aráveis. E apesar da
ampla satisfação, houve resistência daqueles destituídos ou
injustiçados que passaram a alimentar sentimentos
anticomunistas. Em centros urbanos norte coreanos isso foi
mais evidente. Em Pyongyang, houve tentativas individuais
de atentado contra a vida do comandante Christiakov e de
um tio maternal de Kim Il Sung, o presbiteriano Kang Ryang-
uk (1904 - 1983) [122]. A resistência no norte também
envolveu proprietários de terra, pequenos burgueses e
comerciantes, intelectuais e estudantes que discordaram do
regime nascente. Assim, esses foram os primeiros que
deixaram o norte coreano. Essa corrente depois irá
incrementar para entre 1,5 a dois milhões de pessoas de
1945 a 1949 [123], que a partir de então passou a ser
regulamentado o tráfego pelo paralelo 38.
Kim Il Sung viu-se, portanto, acompanhado de
comunistas fiéis aos soviéticos e chineses comunistas via os
manchurianos. No entanto, Kim conseguiu angariar lealdade
para compor o grupo dominante nos órgãos executivos
cruciais como a Secretaria do Partido e na área de
segurança. Pouco a pouco, delineava-se uma estrutura
unipartidária e dominante na Coreia do Norte, sem espaço
para dissidências, mesmo entre os comunistas. A fim de
isolar ainda mais possíveis questionamentos de comunistas
mais leais aos chineses e membros do Comintern dos
soviéticos, Kim criou em agosto de 1946, o Partidos dos
Trabalhadores da Coreia do Norte (Pukchoson Rodongdang,
), tornando-a uma esfera política totalmente
independente dos comunistas estrangeiros e dos sul-
coreanos organizados em torno de Pak Hon-yong. Em
comparação com os países do Leste Europeu, a Coreia do
Norte se consolidou rapidamente em torno do seu partido
comunista próprio.

Em Seul, o Partido dos Trabalhadores Sul-Coreanos


(Namchoson Rodongdang, ), liderados por Pak Ho-
nyong, assumiu uma postura dura a passou a lutar na
clandestinidade em maio de 1946, quando suas atividades
foram tornadas ilegais [124]. Pak tinha se posicionado contra
as orientações de Moscou e Pyongyang de respeitar a busca
por coalizões e negociar com a Comissão Conjunta, e estava
determinado a lutar contra o governo militar dos EUA na
Coreia do Sul. Nesse sentido, Pak exigiu reformas agrárias
radicais, como feito no norte, e a pronta transferência do
poder para um comitê de coreanos no sul. Os comunistas
sul-coreanos começaram a organizar uma séria de
sabotagens a partir de 1º de outubro em Daegu, no sudeste
da península. Essa postura de Pak, no entanto, não
impressionou Stalin que já tinha consolidado seu aliado e
poder no norte coreano. Diante disso, vendo-se
abandonados, Pak e seus seguidores passaram a buscar um
governo independente e unificado em Seul, sob diretrizes
comunistas próprias. Isso começou a irritar Moscou, pois
viam como inaceitável um poderio fora de seu controle na
Coreia. Nesse sentido, Stalin, sob recomendação de
Shtykov, passou a tratar exclusivamente com Kim Il Sung, e
Pak Hon-yong buscou desesperadamente alguns contatos
diplomáticos russos em Seul.

Em 7 de outubro de 1946, houve relativo consenso entre


os membros de esquerda e direita da coalizão em Seul. Os
moderados que foram predominantes nesse corpo político
consideraram a importância de redistribuição de terras
depois da guerra e do domínio japonês, mas com uma
política de compensações a serem respeitadas. Sob
sugestão dos EUA, 45 membros desse corpo foram eleitos
publicamente e nomeados, visando assim garantir alguma
legitimidade. Em 12 de dezembro, Kim Kyu-sik foi escolhido
como presidente da Assembleia Legislativa Interina
Coreana, a maioria dos seus membros advindo dos
direitistas do Partido Democrático da Coreia (Han-guk
Minjudang, ) e apoiadores de Syngman Rhee e Kim
Seong-su. Impulsionadas com a Assembleia Interna, os
militares americanos passaram então a apoiar uma
transferência de administração para um governo interino
sul-coreano, conforme previsto no Acordo de Moscou. Em
fevereiro de 1947, um moderado coreano, An Jae-hong,
tomou posse como administrador civil interino. O sucesso
da atuação da coalizão sul-coreana, reforçou a ideia de
Washington de que somente por meio desse processo
poderia ser solidificado um governo representativo de toda
a península.

Contudo, a reação de algumas lideranças sul-coreanas


foi de que a Comissão Conjunta EUA-URSS iria
eventualmente estender aos soviéticos e comunistas do
norte a oportunidade de ganhar presença ao sul do paralelo
38, e passaram a retomar as atitudes contra o período de
tutelagem estrangeira. Isso se deu com o incentivo de
Syngman Rhee e Kim Seon-su. Mas essas duas figuras
alimentavam sonhos diferentes para a Coreia independente.
Kim pensava que o ex-governo provisório sediado em
Chongqing deveria ser o único legitimado para a Coreia.
Rhee, diferentemente, começou a considerar que os
americanos e soviéticos não resolveriam suas questões
sobre a península, enxergando a parte sul coreana como a
que deveria ficar sob controle dos americanos e aliados. Os
dois líderes tinham recebido bem a Doutrina Truman,
declarada em março de 1947, que postulou a contenção a
vigilância ativa dos comunistas a começar pela Grécia e
Turquia.

O fato é que as duas superpotências tinham já se


posicionado ao longo do paralelo 38, e nenhum parecia dar
sinais de conciliação rumo a uma unidade coreana. Assim, a
Comissão Conjunta EUA-URSS, idealizada no Acordo de
Moscou, não conseguiram chegar mais a nenhum acordo
em julho de 1947. O governo soviético se opunha a
qualquer inclusão de políticos de direita sob o argumento de
que foram esses que rejeitaram o período proposto de
tutelagem negociado em Moscou. Ficou claro que isso foi
uma estratégia do governo soviético de excluir qualquer
oposição ao projeto de poder de Stalin a consolidar o
“socialismo em um país” na Coreia do Norte. Em
contrapartida, Washington, depois de constatar que a
Polônia, Romênia e Bulgária tinham se tornado em satélites
da URSS no outono de 1947, abandonaram qualquer ilusão
de que poderiam agir em conjunto com os soviéticos a
definir o futuro unitário da Coreia. Ou seja, os americanos
tinham noção de que ao norte do paralelo 38, era território
sob controle da área soviética.
À medida que os anos da Guerra Fria passaram, o
governo militar dos EUA começou a cooperar, embora com
relutância, do que considerava como líder de uma Coreia do
Sul longe dos soviéticos, dos nacionalistas e comunistas
locais: Syngman Rhee. Portanto, a coalizão política, de
esquerdistas e direitistas coreanos, endossada pelos
americanos na Coreia do Sul começou a entrar em colapso.

No meio social, a Coreia após a saída dos japoneses se


encontrava num turbilhão. De 1945 a 1950, a população
coreana cresceu de cerca de 16 milhões para 20 milhões.
Enquanto 630 mil japoneses haviam sido repatriados da
península, mais de um milhão de coreanos voltaram do
arquipélago coreano. No meio interno, cerca de 1 milhão de
800 mil coreanos, desde proprietários de terras,
empresários e anticomunistas atravessaram o paralelo 38
para o sul coreano, além de cerca de 12 mil imigrantes
coreanos que chegaram da China e Manchúria [125].

A economia coreana que tinha se baseado inteiramente


no iene japonês até o fim da guerra em 1945, agora entrou
numa crise súbita diante da brutal retirada de capital e
gestão nipônica. A maioria das instalações industriais
controladas por japoneses foi abandonada ou destruída,
minas e ferrovias foram largadas sem qualquer manutenção
e capacidade operativa. O desemprego, em comparação
com 1944, subiu para cerca de 60% no setor industrial em
1947. As colheitas de arroz diminuíram com a redistribuição
de terras, apesar da tentativa do governo dos EUA em
fornecer farinha, elemento não habitual na dieta dos
coreanos. A inflação veio com o caos. De agosto de 1945 a
dezembro de 1946, os preços no varejo dispararam quase
dez vezes o valor nominal, no atacado, 28 vezes. O custo
médio mensal de alimentos por pessoa aumentou de oito
ienes para 800 ienes [126].
Essa crise avolumou-se com a chegada de refugiados e
repatriados coreanos. Embora na maioria jovens, a maioria
não encontrou emprego e ocupação, e migraram para os
centros urbanos coreanos. Alguns desses, ociosos e
desocupados, começaram a formar gangues no mercado
negro e ilícito, outros foram empregados na força policial.
Associações políticas jovens começaram a crescer nesse
cenário, como a União da Juventude Democrática e
Patriótica Coreana (comunista), a Associação da Juventude
Democrática da Grande Coreia (direitista), Associação de
Jovens do Noroeste (anticomunista), Associação Juvenil da
Independência Coreana (pró-Syngman Rhee), Corpo Juvenil
Taedong (nacionalista) e Corpo Nacional Juvenil
(ultradireitista) [127]. Essas associações e grupos políticos
dependeram de fundos estrangeiros e de atividades ilegais,
e tornaram-se foco de violência e desordem a combater
pelas suas ideologias. Assim, lideranças políticas coreanas
passaram a ser alvo da intolerância. O jornalista e ativista
social Song Jin-woo, líder do Partido Democrático da Coreia,
foi assassinado pela organização terrorista, Baikuisa, em 30
de dezembro de 1945. Lyuh Woon-hyung foi morto por um
jovem direitista de 19 anos de idade, Han Chigeun, em 19
de julho de 1947. Sua morte ganhou amplas repercussões.
Logo em seguida, Chang Toksu (1895 – 1947), um dos
fundadores do partido de Song Jin-woo, veio a falecer por
um radical de esquerda [128]. E finalmente, Kim Gu,
presidente do Governo Provisório da República da Coreia,
tornou-se vítima fatal em 26 de junho de 1949 pelas mãos
de um tenente militar coreano, Ahn Doo-hee, enquanto
estava em casa lendo poesia. O clima político e social foi
ainda mais agravado com as constantes mobilizações e
sabotagens de membros do Partido Comunista de Pak Hon-
yong, incluindo a greve dos ferroviários em 24 de setembro
de 1946 e a rebelião na Estação de Daegu em 1º de
outubro, sob os gritos “matem os policiais!” [129]. Para
combatê-los, as autoridades sul-coreanos e militares
americanas não pouparam esforços e empregar jovens
direitistas e anticomunistas nas forças policiais.

No meio internacional, o caso coreano foi levado para as


Nações Unidas, onde a influência dos EUA era dominante.
Os direitistas em Seul rapidamente acolheram essa
iniciativa americana. No entanto, alguns membros mais
moderados da Coreia do Sul, prevendo que o norte não
cooperaria com a ONU e tornaria a unificação impraticável,
convocaram uma reunião de vários líderes coreanos do
norte e do sul para discutir o futuro integrado da nação. Em
14 de novembro de 1947, a Assembleia Geral da ONU
adotou a Resolução 112, visando a realização de eleições
gerais para uma Assembleia Nacional até 31 de março de
1948. As eleições deveriam ser basear no sufrágio adulto e
no voto individual e secreto. Uma Comissão Temporária das
Nações Unidas foi estabelecida para a Coreia (United
Nations Temporary Commission on Korea, UNTCOK), a
supervisionar a resolução que passou a ser concretizada na
Coreia do Sul [130].

No norte coreano, as autoridades se recusaram a adotar


a resolução da ONU, e criaram em fevereiro de 1948 um
exército próprio, o EPC (Exército Popular Coreano, Choson
inmingun, ) e anunciaram a elaboração de uma nova
constituição para a futura república popular. Eventualmente,
em 26 de fevereiro, a comissão da ONU começou a
organizar as urnas eleitorais com o apoio dos militares
americanos. As eleições na Coreia do Sul foram marcadas
para o dia 10 de maio. Nesse meio tempo, algumas
lideranças sul-coreanas moderadas passaram a boicotar as
eleições, pois não aceitavam a divisão da península,
manifestada implicitamente no processo eleitoral separado
no sul. Os comunistas na Coreia do Sul, sob Pak Ho-nyong
do Partido dos Trabalhadores da Coreia do Sul, tentaram
impedir a realização eleitoral por meio de ações
guerrilheiras baseadas na ilha de Jeju. Apesar disso, as
eleições foram um sucesso, com a votação de cerca de 75%
da população de eleitores. As eleições sul-coreanas, ao final,
foram consideradas válidas e justas pela UNTCOK.

A Assembleia Nacional na Coreia do Sul adotou um


sistema presidencialista em 17 de julho. Dos 198
representantes na Assembleia, 83 deles, a maioria, eram de
partidos independentes, 56 deles, pró-Rhee e 29 do Partido
Democrático da Coreia. Syngman Rhee, que tinha entrado
em coligação com os democráticos, foi eleito como
presidente do novo governo sul-coreano. Em 15 de agosto,
a República da Coreia foi proclamada como único governo
legítimo da península fundamentado nas eleições
supervisionadas pela ONU. Em 12 de dezembro, o novo
governo sul-coreano foi confirmado pela Assembleia Geral
das Nações Unidas. O governo dos EUA e de países aliados
reconheceram o novo governo coreano, e logo
estabeleceram relações diplomáticas.

No verão de 1948, eleições foram organizadas no norte


coreano, no qual os eleitores não tiveram outra escolha
senão os candidatos recomendados do partido comunista
local, da Frente Democrática da Coreia do Norte para a
Unificação ( ). Em agosto, os representantes eleitos
se reuniram no Conselho Supremo do Povo e proclamaram a
República Popular Democrática da Coreia (RPDC) em 9 de
setembro, liderada por Kim Il Sung e Pak Ho-nyong como
vice-premiê e ministro das Relações Exteriores. A URSS e
seus aliados rapidamente reconheceram o novo governo.
Assim, oficialmente, a Coreia foi fraturada em dois. Em fins
de 1948, forças soviéticas se retiraram do norte. Os
americanos fizeram o mesmo em junho de 1949, após
prolongados debates em Washington sobre o prazo e
maneira de retirada dos militares americanos na península.

A nova república sul-coreana foi contestada pelo Partido


dos Trabalhadores da Coreia do Sul. A resistência foi
organizada principalmente por comunistas de Jeju em 3 de
abril de 1948 que depois se estendeu pela península ao
longo do ano em combates entre as forças governamentais
e comunistas. Em outubro de 1948, houve motins e
rebeliões dentro do exército sul-coreano, instigado por
membros comunistas que passaram a ter como base a
Montanha Jirisan nas províncias meridionais. No verão de
1949, o Partido dos Trabalhadores da Coreia do Sul juntou-
se ao Partido dos Trabalhadores Coreanos, do norte da
península, e fundou-se a Frente Democrática Sul-Coreana
Para a Unificação Nacional, que resultou em atividades de
guerrilha e sabotagens mais organizadas no sul do paralelo
38.

Nesse clima de confrontos e rebeliões na Coreia do Sul,


o presidente, Syngman Rhee se viu num dilema. Ou
concentrava-se para julgar e expelir os japoneses e sua
estrutura deixada na península, ou enfrentava o premente
problema das insurreições organizadas pelos comunistas.
Rhee optou pela segunda opção, visto que era a questão
mais iminente e que poderia causar maior consequência
para seu governo. Apesar de ter sido sempre um voraz
crítico da dominação japonesa, o presidente passou a
empregar algum de seus colaboradores da política colonial
para identificar e reprimir as atividades clandestinas dos
comunistas no sul-coreano. Sua postura rendeu-lhe amplas
críticas, pois assim evitou buscar julgar e condenar os
japoneses e seus aliados que haviam oprimido os coreanos
durante décadas. Embora tenha sido aprovada uma lei
especial para o efeito de investigar e punir os colaboradores
da administração japonesa, esses não somente deixaram de
ser devidamente sentenciados pela justiça coreana como
foram usados como conselheiros e agentes da polícia a
reprimir as células subterrâneas comunistas. Diante disso, a
partir da primavera de 1950, o núcleo do Partido dos
Trabalhadores da Coreia do Sul entrou em colapso diante da
ampla ofensiva policial de investigação e repressão às
atividades de guerrilha.

Na China, o cenário político mudou radicalmente com a


ascensão dos comunistas sob Mao Zedong ao poder em
outubro de 1949. Voluntários coreanos que lutaram com os
comunistas chineses na Manchúria contra os japoneses e
nacionalistas do Kuomitang, tornaram-se uma força militar a
ser usado na península coreana. Foi notável a ausência de
ajuda significativa dos EUA na guerra civil chinesa, e isso foi
anotado por Stalin e Kim Il Sung. Após o gradativo fracasso
e desarticulação comunista na Coreia do Sul, Kim Il Sung e
Pak Ho-nyong passaram a planejar uma ampla ofensiva a
subjugar a Coreia ao sul do paralelo 38, a usar a lealdade do
recém-criado EPC e das tropas coreanas veteranas na
Manchúria. Para ter respaldo internacional, Kim e Pak
solicitaram ajuda militar de Moscou e Pequim para que fosse
fornecido homens, equipamentos e mantimentos para a
empreitada bélica. E acreditaram as autoridades norte-
coreanas de que os EUA não teriam interesse imediato na
península, assim como foi demonstrado na China. Isso foi
ainda mais confirmado quando, em 12 de janeiro de 1950, o
Secretário de Estado dos EUA, Dean Acheson (1893 - 1971),
num discurso na National Press Club em Washington
afirmou que a política de contenção anticomunista
americana não incluía a Coreia, mas a concentrar-se num
perímetro de defesa na região do Pacífico [131].

Kim Il Sung, sentindo-se encorajado diante da ocasião


histórica, foi para Moscou e pediu a Stalin o endosso de seu
plano de unificação. Stalin, que não desejava uma guerra
aberta contra os EUA, decidiu apoiá-lo sob a condições de
que a URSS permanecesse oficialmente não envolvido na
guerra entre as duas partes coreanas. Por sua vez, Mao
Zedong prontamente disponibilizou 41 mil tropas do
Exército Voluntário Coreana que lutaram por anos no solo
chinês a ajudar o esforço norte-coreano. Conselheiros
militares soviéticos logo chegaram com armas e
equipamentos, o que fez com que as forças norte-coreanas
inchassem para dez divisões de combate, uma brigada de
tanques e um regimento de motociclistas. Essas foram
equipados com 1600 artilharias, 258 tanques soviéticos T-34
e 172 aviões [132]. Pelo lado sul-coreano, os números eram
desoladores. Aproximadamente 100 mil homens poderiam
ser mobilizados, mas apresentavam pouca disciplina e
experiência de combate. Desse total, cerca de 65 mil
homens estavam armados com morteiros e metralhadoras
com defeitos. Além disso havia apenas quatro mil homens
da Guarda Costeira e força policial de 45 mil homens [133].
Ademais, não havia nenhum apoio aéreo, de tanques e
artilharia para a força de infantaria. Mesmo assim, Syngman
Rhee manteve-se compromissado a enfrentar as forças
norte-coreanas, esperando um eventual apoio dos EUA a
conter o avança comunista.

Do dia 10 ao 19 de junho de 1950, sete divisões do EPC


foram mobilizadas para o paralelo 38 a pretexto de realizar
manobras de exercício militar. No dia 23, seus comandantes
receberam ordens de começar a guerra de libertação do sul.
Isso se desdobrou rapidamente em marchas ofensivas a
partir do dia 25. Como meio de justificar a invasão sobre a
linha divisória, a Coreia de Kim argumentou estar retaliando
contra um suposto ataque sul-coreano. Esse motivo pode
ter se originado das frequentes provocações e ameaças na
fronteira entre os dois exércitos beligerantes ao longo do
paralelo. A tensão tinha escalado ainda mais depois de
sustentadas declarações do presidente sul-coreano,
Syngman Rhee, que afirmava de que o norte deveria ser
enfrentado eventualmente.

Os eventos da guerra foram a favor dos norte-coreanos,


inicialmente. Fortalecidos e mais bem equipados e ajudados
pelos soviéticos, tomaram rapidamente Seul no dia 28 de
junho de 1950, apenas três dias do início das ofensivas [134].
Os norte-coreanos, entretanto, não esperavam uma rápida
resposta dos EUA que reagiram no Conselho de Segurança
da ONU logo no dia seguinte a condenar as agressões do
regime de Kim Il Sung. Assim, com o boicote e ausência da
delegação soviética que sistematicamente denunciava o
organismo internacional como instrumento do imperialismo
capitalista, foi aprovada a Resolução 82 para combater as
tropas norte-coreanas. Em seguida, o presidente dos EUA,
Harry Truman (1884 - 1972), despachou forças aéreas norte-
americanas no dia 27 e forças terrestres no dia 30 para a
península. Dezesseis países membros da ONU (Austrália,
Bélgica, Canadá, Colômbia, Etiópia, França, Grécia,
Luxemburgo, Holanda, Nova Zelândia, Filipinas, República
da África do Sul, Tailândia, Turquia, Reino Unido, além dos
Estados Unidos da América) enviaram forças para a Coreia
que ficou sob o comando do General Douglas MacArthur em
Tóquio.

Os americanos, aliados e o exército sul-coreano


passaram a se concentrar num perímetro de defesa no Rio
Nakdong perto da cidade de Pusan, no sudoeste da
península coreana. Depois de seis semanas de impasse,
MacArthur lançou sua famosa operação desembarcando em
Inchon em 15 de setembro [135] sob comando do General
Hobart R. Gay da 1ª Divisão de Cavalaria vindo de
Yokohama. Dez dias depois, Seul foi recapturado, cortando
efetivamente as linhas de frente norte-coreanos no sul, que
as obrigaram a recuar em retirada. Em 27 de setembro foi
aprovada a diretriz do Estado-Maior das Forças Armadas dos
EUA de 27 de setembro que permitiu uma operação militar
ao norte do paralelo 38 para perseguir e demolir as forças
norte-coreanas. No dia 2 de outubro, MacArthur ordenou
que suas tropas cruzassem a fronteira, e 18 dias depois já
se encontravam no controle de Pyongyang e a avançar em
direção ao norte, ao Rio Yalu. O general estadunidense não
tinha a percepção de que Mao Zedong, enquanto isso, tinha
já mobilizado 18 divisões de combate de seu exército
contando com coreanos voluntários na China. Mao tinha
enfrentado a reticência de seu chanceler, Zhou Enlai (1898 -
1976), e assim nomeou Peng Dehuai (1898 - 1974) como
comandante das tropas chinesas que entrariam no solo
norte-coreano [136]. As batalhas se intensificaram ao longo
da fronteira norte-coreana e, vendo-se fortalecidos com o
apoio dos chineses, os comunistas conseguiram vencer as
forças da ONU no Reservatório de Chosin, na região
nordeste da Coreia do Norte, depois de dezessete dias de
batalhas entre 27 de novembro e 13 de dezembro de 1950.
As forças sob o comando do Major-General Edward Almond
conseguiram fugir do cerco e foram para o porto de
Hungnam [137]. O evento foi amplamente celebrado pelos
norte-coreanos e chineses, e marcou uma virada decisiva de
retirada das tropas das Nações Unidas para o sul.

O avanço dos chineses e norte-coreanos foi notável para


o sul em novembro de 1950. No dia 2 de dezembro, após
árduas batalhas no vale do rio Chongchon, as tropas
chinesas e coreanas continuaram em direção ao paralelo
38. No dia 31 de dezembro, os chineses do 13º Exército
forçaram o recuo dos americanos sob o comando do
Tenente-General Matthew B. Ridgway que evacuou para
Seul no dia 3 de janeiro de 1951. Depois de alguns dias, a
capital sul-coreana foi evacuada pelas tropas onusianas
[138]. Nos meses seguintes, as forças beligerantes
começaram a enfrentar diversos impasses e batalhas
inconclusivas ao longo do paralelo 38. Em 23 de março, o
presidente Truman declarou em um comunicado que as
forças da ONU haviam evitado a invasão comunista na
Coreia e que, portanto, o Comando das Forças das Nações
Unidas estava pronto para negociar um cessar-fogo. Dia
seguinte, o General MacArthur, desconsiderou a posição do
presidente dos EUA e solicitou o bombardeio da região da
Manchúria, na China, para retaliar contra os comunistas
chineses. Truman, como havia feito Stalin, sabia que isso
escalaria ainda mais os conflitos para uma guerra
generalizada, e assim destituiu MacArthur do comando das
Forças da ONU em 11 de abril de 1951 [139].

Mapa: As fases da Guerra da Coreia (1950 – 1953).

Ainda decorreram dois anos até os dois lados rivais na


Guerra da Coreia a assinarem um armistício em 27 de julho
de 1953. A guerra causou danos consideráveis e
traumáticos para toda a península. O acordo definitivo foi
assinado pelo General Clark, Kim Il Sung e Peng Dehuai. O
presidente Syngman Rhee se recusou a assiná-lo, mas deu
sua aprovação tácita para a trégua depois dos EUA terem
assegurado seu compromisso de segurança na Coreia do
Sul. A fronteira da trégua ficou novamente estabelecida
marginalmente ao longo do paralelo 38, e essa área ficou
depois conhecida como Zona Desmilitarizada (DMZ). A
guerra custou um imenso número de vidas humanas,
afetando ao todo a vida de 30 milhões de coreanos de toda
a península, assim como 700 mil coreanos advindos da
Manchúria. As estatísticas dos números são ainda
controversas, mas estima-se que 2 720 000 pessoas foram
mortas ou desapareceram. Desse número estonteante, mais
de um milhão são de norte-coreanos que possivelmente
migraram ou fugiram para o sul. Estima-se que cerca de
meio milhão de soldados norte-coreanos tenham morrido
em batalha, e mais de um milhão, vítimas civis. No sul, as
baixas militares foram de 237 686 pessoas, e cerca de meio
milhão de civis sul-coreanos foram sequestrados, e outros
600 mil civis mortos ou desaparecidos, totalizando a perda
sul-coreana em torno de 1 330 000. De acordo com
registros oficiais, as baixas dos EUA foram de 33 629 mortos
e 103 284 feridos [140]. As outras forças da ONU, excluindo
os sul-coreanos perderam 3 143 vidas, 11 532 feridos e 525
desaparecidos. Por último, os registros chineses afirmam
que tiveram 116 mil mortos de suas forças, 220 mil feridos
e 29 mil desaparecidos, somando 336 mil chineses, mas
estima-se realisticamente que o total tenha chegado para
mais de 900 mil chineses [141].
9 A RECONSTRUÇÃO

A Coreia do Sul teve sua vida independente após a Guerra


da Coreia (1950 – 1953) sob a liderança de Syngman Rhee.
Sua liderança advinha de seus anos de luta pela
independência coreana contra a dominação japonese e
comunista. Rhee vinha de uma família de valores cristãos
coreanos, e tinha se casado com uma austríaca. Sem ter
filhos, Rhee era enxergado como um líder sem ligações
familiares e tendências ao nepotismo na sociedade coreana,
o que lhe rendeu valor pelo seu compromisso às causas
nacionais. Seu longo exílio no exterior conferiu-lhe novas
perspectivas e ideais para o futuro coreano, tendo obtido
seu doutorado na Universidade de Princeton, em Nova
Jersey, EUA. Era o vivo admirador do sistema americano, e
queria isso a ser implementado na Coreia do Sul nascente.
Seu ensino quando jovem foi feita por missionários
americanos que lhe deu valores éticos baseados no
cristianismo protestante.

Apesar de seu fervor político, Rhee teve que lidar com a


condição social e histórica da Coreia após a traumática
guerra que terminou em 1953. Desde o início do século 20,
os coreanos foram destituídos de qualquer liberdade de
pensamento e participação política, a não ser na
clandestinidade. A maioria coreana, portanto, resumia sua
vida política a obediências de um poder opressivo e brutal.
A economia coreana também teve reflexos históricos. Por
décadas, os principais setores econômicos foram geridos a
apoiar políticas estratégicas dos japoneses e, depois da
Segunda Guerra Mundial, aos preceitos do comando militar
americano visando conter o comunismo. A economia sul-
coreana, em específico, dependeu em grande parte da
agricultura e mineração, com as principais indústrias
japonesas se instalando no norte do paralelo 38 e na
Manchúria. Com a crise da Guerra Mundial e da Guerra da
Coreia, a elite sul-coreana também se viu destituída de
qualquer perspectiva de emprego e ocupação numa
economia em ruínas, mesmo aqueles egressos das
universidades e faculdades. O governo militar americano,
após 1945, tentou fornecer ajuda para a reconstrução da
economia sul-coreana, mas boa parte dos investimentos
foram para as áreas militares e Forças Armadas. Isso tudo
resultou numa sociedade de crise, desempregada,
politicamente volúvel, sem tradição democrática, e com
proeminência dos setores militares.

Foi nesse contexto que a Coreia do Sul, em 1953, que o


presidente Syngman Rhee iniciou seu mandato, com
inúmeros desafios a serem enfrentados e por amplas
críticas da oposição. Apesar de sua idade avançada já à
época, Rhee demonstrou uma determinação férrea de se
manter no poder e assim se deu por uma década. Isso, no
entanto, começou a demonstrar sua tendência autoritária.
Rhee foi criticado principalmente por oprimir a oposição
com o uso da Lei de Segurança Nacional aprovada em 1948.
Mas a Coreia do Sul na década de 1950 era bem diferente
de antes da guerra. O crescimento populacional sul-coreano
era palpável, com sustentada alta taxa de natalidade, isso
num cenário de rápida urbanização e ampla escolaridade da
população que não estavam mais dispostos a tolerar
tendências autoritárias.

Nas eleições presidenciais de 15 de março de 1960, o


rival de Rhee para a presidência tinha sofrido uma morte
prematura, e Rhee foi reeleito pela quarta vez. Contudo,
dessa vez, a oposição passou a manifestar seu
descontentamento com amplas acusações de intimidação
eleitoral em algumas circunscrições eleitorais no interior
coreano. E foram das províncias que surgiram as primeiras
manifestações massivas contra o processo eleitoral de
1960. Em Masan, no sul da península, um estudante de
Ensino Médio havia sido morto no dia das eleições por
forças policiais, instigando uma manifestação estudantil em
Seul que se deu no dia 19 de abril de 1960. No evento, foi
estimado em cerca de 20 mil estudantes participantes,
principalmente de universitários e secundaristas que foram
às ruas gritando “Abaixo a ditadura!”. A repressão policial
foi aumentada depois que alguns foram em direção ao
palácio presidencial, com a morte de 100 pessoas [142].
Diante da comoção dos eventos, em 26 de abril, o
presidente Rhee submeteu-se às pressões e declarou sua
renúncia, indo viver no Havaí.

O poder político na Coreia do Norte, depois de 1953,


começou a gravitar cada vez mais em torno da figura de
Kim Il Sung, e isso se deu através de uma série de
perseguições a oposicionistas. O quadro das lideranças do
Partido dos Trabalhadores da Coreia do Norte foi alterado
quando, em outubro de 1950, Ho Ka-i (ou Alexei Ivanovich
Hegai) (1904 – 1953), um proeminente coreano com
ligações soviéticas e segundo no comando partidário, foi
reprimido por ter cometido erros na reconstrução partidária
durante os eventos da Guerra da Coreia. Mais tarde, foi
relatado que ele alegadamente cometeu suicídio em
Pyongyang em 1953 [143] e foi substituído como vice-
secretário geral do Comitê Central do Partido dos
Trabalhadores por Pak Chang-ok (? – 1960). No mesmo ano,
Kim Mujong, um dos principais generais do Partido, da
facção chamada de Yanan ( ) – de coreanos comunistas
com ligações chinesas – foi expulso do país por conduta
imprópria. Mas o maior objetivo político de Kim Il Sung foi
Pak Hon-yong, maior líder comunista sul-coreano do Partido
dos Trabalhadores da Coreia do Sul. No início de 1953, um
dos partidários de Pak havia sido preso no norte e
confessou, possivelmente sob torturas, que havia um
complô em andamento. Desde então, Pak nunca mais foi
visto em ocasiões oficiais e em agosto de 1953 foi
definitivamente preso. Dois anos depois, foi condenado à
morte por espionagem [144]. Pak e seus seguidores foram
todos responsabilizados e acusados pelos fracassos da
“guerra de unificação”.

Quando houve as famosas acusações contra Stalin por


Nikita Khrushchov (1894 - 1971) na URSS no 20º Congresso
do Partido Comunista Soviético em fevereiro de 1956, isso
repercutiu amplamente no sistema norte-coreano. Os
membros da facção de Yanan, passaram a planejar uma
mudança na estrutura político do país, a mudar a liderança
centralizada numa pessoa por uma liderança coletiva. Isso
se deu enquanto Kim Il Sung estava em visita de Estado em
Moscou no verão de 1956. Assim que Kim retornou, os
membros de Yanan foram imediatamente condenados por
acusações de antirrevolucionários. Moscou e Pequim
tentaram veementemente intervir no evento, mas Kim
declarou em março de 1958 que havia definitivamente
liquidado todos os dissidentes na Coreia do Norte. Nos anos
posteriores, a Coreia do Norte passou a se fechar cada vez
mais, e passou a assentar o seu sistema político numa
ideologia própria, a não depender do estrangeiro, pela
política do juche (“autoconfiança”, ). No setor econômico
após a guerra, Kim planejou a restauração das atividades
através de Planos Trienais, claramente inspirados nos planos
quinquenais dos soviéticos. Na mesma época, em 1956, Kim
lançou um amplo programa de reforma e revitalização
chamado de Chollima (“Cavalo Alado”, ), uma versão
coreana do Grande Salto Adiante de Mao Zedong. Esses
programas tiveram resultados notáveis, a considerar o
estado da economia norte-coreana depois de 1953, mas o
excessivo esforço resultou em crônica falta de matéria-
prima e da estrutura produtiva. Embora o setor industrial
tenha crescido, isso se deu às custas da agricultura que
passou por crises de colheitas de grãos. A mão-de-obra foi
exaurida no trabalho, provocando efeitos nefastos na
sociedade. A coletivização agrícola acarretou em fome e
miséria no campo. Apesar de seus defeitos e número
desconhecido de mortes, Kim Il Sung – e seu filho e
sucessor, Kim Jong-Il - sempre declarou a glória do Programa
Chollima e dos planos de desenvolvimento, como feito no 6º
Plenário do Partido em outubro de 1980 [145].

Depois da renúncia de Syngman Rhee, em junho de


1960, a Assembleia Nacional da Coreia do Sul adotou uma
nova constituição que estipulava um sistema parlamentar
bicameral, anunciando o que seria a Segunda República.
Nas eleições gerais, realizadas em 19 de julho, o Partido
Democrata originado do antigo Partido Democrático
Coreano dominou as duas câmaras do Parlamento, com 175
dos 233 assentos entre os deputados, e 31 dos 58
senadores. O parlamento então escolheu o católico Chang
Myon (1899 – 1966), ex-vice-presidente e ex-embaixador
em Washington, como primeiro-ministro e Yun Posun (1897 –
1990) como presidente. O cargo de primeiro-ministro
acabou sendo o chefe de governo, com seu próprio
gabinete, enquanto a presidência se tornou mais uma figura
de Estado, apenas. Chang Myon era um fervoroso
democrata e acredito que poderia continuar o que Rhee não
tinha conseguido. E suas crenças políticas, fortemente
ancoradas no sistema dos EUA, apontavam para uma
imprensa livre, sem censuras. No entanto, o Partido
Democrata de Chang, atormentado por rivalidades
faccionais, foi incapaz de resolver o grave desemprego nas
cidades e escassez de mantimentos no campo. Ademais, a
nascente administração de Chang passou a enfrentar
crescentes manifestações e descontentamentos de jovens,
estudantes, professores, sindicatos e outros grupos sociais
organizados. Entre os estudantes e professores, foram
vários os clamores por partidos de esquerda e unificação
com o norte agitou a cena política sul-coreana. Isso,
juntamente com o desemprego e precariedade social de
vários setores da sociedade foi visto como pretexto para
que certos militares, receosos do comunismo, se
projetassem para o cenário político.

Apesar dos programas de modernização de Chang para


superar as dificuldades econômicas na Coreia do Sul, um
grupo de jovens oficiais militares, liderados pelo Major-
General Park Chung-Hee (1917 -1979), realizaram um golpe
de Estado em 16 de maio de 1961. O corpo do exército sul-
coreano tinha crescido consideravelmente para mais de 600
mil homens após a Guerra da Coreia, equipados e treinados
por oficiais americanos. Modelado na administração militar
dos EUA, o Exército Nacional tornou-se eficiente e
disciplinado diante das incertezas da sociedade coreana na
década de 1950 e 1960. Park Chung Hee era produto dessa
transformação militar. Formou-se em Tóquio e também na
Manchúria, como cadete do exército. Outros apoiadores
seus, como Kim Jong-pil (1926 - ), formaram-se depois da
ocupação japonesa, em academias coreanas depois da
Segunda Guerra Mundial. A maioria dos oficiais à época do
golpe de 1961, portanto, eram jovens, ambiciosos e
inquietos diante das mudanças políticas.

Na madrugada de 16 de maio de 1961, com o golpe de


Estado, os militares transmitiram por rádio para toda a
Coreia do Sul mensagem contendo os objetivos para o
futuro da nação: anticomunismo, estreitar e manter laços
com os EUA, combater a corrupção, reconstrução da
economia, contenção do regime norte-coreano e promessa
de retorno ao governo civil em momento posterior. Com
isso, a junta militar no poder declarou lei marcial e dissolveu
a Assemblei Nacional. A constituição foi suspensa e todas as
atividades políticas foram proibidas. Ademais, a liberdade
de imprensa foi limitada pela censura. Em seguida, a junta
nomeou-se como Conselho Supremo da Reconstrução
Nacional, presidido por Park Chung Hee. Foi criado em 13 de
junho de 1961 o Serviço Nacional de Inteligência (Gukga
Jeongbowon , ), a ser chefiada por Kim Jong-pil, para
que pudesse controlar e investigar as informações no meio
nacional e exterior. Os ministérios do novo governo foram
quase todos ocupados por militares.

O regime militar sul-coreano passou a promulgar leis de


cunho anticomunista com base na Lei de Segurança
Nacional. Isso permitiu a detenção e prisão de políticos e
intelectuais de tendência esquerdista. Com relação a outros
da sociedade, os militares buscaram eliminar os privilégios
e práticas de corrupção como entre o empresariado. Para
recuperar a economia, os militares lançaram um ambicioso
programa, Plano Quinquenal de Desenvolvimento
Econômico ( 5 ) em 1962. Este seria o primeiro de
muitos outros posteriores. O governo americano,
considerando o regime como um baluarte contra o
comunismo norte-coreano e chinês, aceitou o novo regime,
mas com a promessa de que haveria retorno ao comando
civil no futuro. Era evidente, no entanto, que os militares
desejaram manter o poder, mesmo que sob forma civil no
futuro.

Em dezembro de 1962, o Conselho Supremo da Coreia


do Sul adotou uma nova constituição sob sistema
presidencial e unicameral. Ou seja, centralizou-se o poder.
Logo, em janeiro de 1963, certas atividades políticas foram
retomadas, mas sempre a manter o comunismo afastado.
Kim Jong-pil havia organizado o Partido Republicano
Democrático, mas mesmo assim as eleições presidenciais e
legislativa em nível nacional no final do ano deu vitória
apertada para Park Chung Hee, com pequena margem de
liderança sobre o ex-presidente Yun Posun. Ao se legitimar
no cargo presidencial, Park inaugurou a chamada Terceira
República em 16 de dezembro de 1963 [146].

As perspectivas no norte-coreano eram ainda mais


sombrias. No início de 1957, Kim Il Sung quase eliminou
todos os seus oponentes do Partido dos Trabalhadores. No
meio internacional, a refletir seu crescente isolacionismo,
Kim manteve-se neutro nas crescentes tensões entre
Pequim e Moscou. Ao se posicionar assim, Kim buscou
barganhar com os dois centros de poder, visando angariar
maior apoio e ajuda ao seu regime. Em termos políticos
internos, o partido de Kim era o Estado. Em fevereiro de
1960, Kim, acompanhado de outros membros do partido, foi
visitar uma vila agrícola coletivizada perto de Pyongyang,
em Chongsan. Ao se deparar com problemas, passou a
acusar alguns membros do partido pelos erros. Em cima
disso, elaborou uma política renovada para as vilas e
comunidades interioranas, “Orientação Locais” do Grande
Líder (Suryong) e isso foi aplicado para todo o país. O
método visava melhorar a produtividade econômica e
agrícola através de maior compromisso e fidelidade às
orientações do líder norte-coreano.

Em outubro de 1960, na comemoração dos 15 anos do


Partido dos Trabalhadores, foi iniciada uma nova fase
histórica do comunismo norte-coreano. Dali em diante, Kim
Il Sung passou a ser a fonte de toda a sabedoria e verdade
em relação ao passado, presente e futuro da nação. Assim
passou-se a formular uma interpretação dos eventos
históricos como repleto de inimigos da nação, de burgueses
e capitalistas, imperialistas desde os japoneses aos
estadunidenses, dos lacaios sul-coreanos, e a ascensão
libertadora do comunismo sob a liderança de Kim Il Sung.
Esse tipo de discurso passou a legitimar o regime norte-
coreano, a pautar-se nas agressões e ameaças do exterior,
e a enfatizar o heroísmo do povo e dos líderes comunistas.

Na economia, a Coreia do Norte apresentou índices de


crescimento ao final dos anos de 1950, o que reforçou ainda
mais autoconfiança do regime unitário. Os planos de
desenvolvimento, quinquenais, contudo, sempre passaram
a relatar a superação dos objetivos esperados. Em 1962, um
novo plano de sete anos foi elaborado. A prioridade passou
a ser a indústria leve e agricultura, com o continuado
destaque à indústria pesada [147]. No 4º Congresso do
Partido dos Trabalhadores, referido como “Congresso dos
Vitoriosos”, realizado em 11 de setembro de 1961, foi
entusiasticamente confirmado como ideologia do Estado o
patriotismo socialista irrestrito a ser esperado por todos os
norte-coreanos, ao que resultaria no nascimento de um
novo homem socialista para o mundo.

A Terceira República da Coreia do Sul teve início com os


programas de desenvolvimento de Park Chung Hee. Militar
de formação, Park testemunhou como os japoneses
administraram com eficiência a Manchúria com a ajuda de
tecnocratas advindos de instituições do Japão. Inspirado por
isso, Park passou a orientar seu governo para a mesma
eficiência, e assim implementou uma série de planos
econômicos de cinco anos, e criou o Conselho de
Planejamento Econômico, chefiado por aliados e
submetendo todos os ministérios a esse conselho. A maioria
dos militares no governo gradualmente passaram os seus
cargos para tecnocratas mais eficientes recrutado no país e
no exterior, entre os quais muitos economistas e
administradores formados nos EUA. A ênfase econômica
era, antes de tudo, buscar montar uma base industrial forte
a garantir uma sustentada pauta exportadora superavitária,
principalmente de produtos industriais leves como têxteis,
sapatos e acessórios, e conter os gastos de importações
[148]. Os militares, contudo, permaneceram nos setores

estratégicos de segurança nacional e do Serviço Nacional de


Inteligência.

Como outros países subdesenvolvidos, a Coreia do Sul


precisou de capital estrangeiro para impulsionar sua
modernização econômica. O presidente Park tinha
constatado que o Japão havia alcançado uma rápida
recuperação econômica e crescimento depois da Segunda
Guerra Mundial graças à demanda da Guerra da Coreia,
evento em que os EUA usaram o arquipélago como base de
suprimentos. Assim, apoiado pelos EUA que desejava uma
reaproximação entre coreanos e japoneses, foi normalizada
a relação entre Seul e Tóquio, depois de negociações sobre
compensações pelo domínio colonial japonês. Houve
consideráveis manifestações estudantis contra o acordo que
foi considerado como precipitado e injusto, mas Park chegou
a estabelecer de vez as relações diplomáticas com o Japão
em junho de 1965, recebendo apenas 300 milhões de
dólares como compensação histórica, e outros 500 milhões
em empréstimos financeiros públicos e privados [149].

Em agosto de 1965, o governo sul-coreano ratificou pela


Assembleia Nacional o envio de forças militares ao Vietnã,
acatando o pedido do governo dos EUA, baseado nas
promessas contidas no Memorando Brown. Nesse
documento, Washington se comprometeu a modernizar e
ampliar o meio industrial e militar sul-coreano, assim como
empréstimos regulares. Assim, um total de mais de 300 mil
soldados sul-coreanos foram lutar com os americanos no
Vietnã entre 1965 e 1973, um dos maiores contingentes dos
aliados ao EUA [150].

Durante o Primeiro Plano de Desenvolvimento


Econômico Quinquenal (1962 – 1966), a economia sul-
coreana teve desempenho de crescimento anual médio de
7,8%, alcançando um expressivo aumento de exportações
do setor têxtil com intensivo uso de mão-de-obra. A Guerra
do Vietnã, os empréstimos japoneses e americanos
asseguraram os investimentos industriais para o Segundo
Plano Quinquenal (1967 – 1971), juntamente com a
poupança nacional. Graças ao crescimento econômico, Park
venceu novamente as eleições presidenciais em maio de
1967 sobre seu rival, Yun Posun. Sob sua liderança
autoritária e desenvolvimentista, a Coreia do Sul passou a
se transformara numa economia moderna, com intenso uso
de mão-de-obra que reduziu o desemprego e com o uso
gerencial de burocratas conjugado com a classe empresarial
industrial. Esse conluio gerencial com o governo passou a se
consolidar como uma classe dirigista que se aglomerou em
torno de chaebol, conglomerado de empresas controladas
por famílias e associados.

Em abril de 1971, Park Chung Hee concorreu de novo


para presidência, removendo o impedimento constitucional
que impedia três mandatos consecutivos na Coreia do Sul.
O candidato da oposição, Kim Dae-Jung (1925 - 2009), um
político defensor da democracia que por anos se opusera ao
autoritarismo de Park, foi derrotado nas urnas. Chaebols
tinham contribuído consideravelmente para a campanha
eleitoral para a campanha de Park, e o Serviço Nacional de
Inteligência manteve-se vigilante para investigar e intimidar
qualquer industrial que apoiasse Kim Dae-Jung. Ademais, a
promessa de unificação com o norte coreano de Kim Dae-
Jung pareceu soar comunista ou esquerdista demais para os
elementos anticomunistas e conservadores da Coreia do
Sul. O eleitorado sul-coreano, nas eleições, tinha mostrado
certa divisão geográfica, com as províncias no sudoeste a
apoiaram mais o candidato da oposição, enquanto os mais
sulistas, ao presidente Park. Apesar de sua vitória, Park
Chung Hee teve que lidar com uma crescente inquietação
social diante de seu regime autoritário. Diante disso, Park
passou em 1972 a concentrar ainda mais o poder
presidencial, a garantir a ordem pública, e não permitir
dissidências e críticas ao seu regime [151].

Com a mudança de poder soviético, nas mãos do Nikita


Khrushchov e de sua atitude irresoluta na crise cubana em
1962, a liderança norte-coreana passou a considerar
Moscou como fraco e inábil diante do imperialismo norte-
americano. Ademais, a Coreia do Norte tinha piorado em
seu relacionamento com a China após membros da Guarda
Vermelha chinesa terem criticado abertamente o regime de
Kim Il Sung em 1967 durante a Revolução Cultural. Assim, o
norte coreano passou a sentir-se ameaçado, ainda mais
quando a Coreia do Sul de Park Chung Hee firmou tratados
com o Japão e EUA. Para piorar ainda mais, o exército sul-
coreano fortaleceu-se consideravelmente com a ajuda dos
EUA depois da participação na Guerra do Vietnã.

Desde 1962, a Coreia do Norte tinha enfatizado uma


política de defesa a ser implementado junto com o
desenvolvimento econômico, como declarado no slogan da
época: todas as pessoas armadas, todo território fortificado,
todas as forças autorizadas e modernizadas. O orçamento
de defesa tinha aumentado abruptamente para cerca de
30% do orçamento nacional entre 1967 a 1971. No entanto,
isso começou a afetar o crescimento econômico da nação,
gerando críticas e descontentamentos mesmo no opressivo
ambiente do Partido dos Trabalhadores da Coreia do Norte.
As perseguições seguiram-se a isso, com membros de um
subgrupo de membros comunistas guerrilheiros de lutaram
contra os japoneses, da facção Gapsan, foram expurgados
em 1967 [152].

Na sua visita presidencial em 1965, Kim Il Sung declarou


que o Partido dos Trabalhadores manteria consistentemente
sua filosofia única, juche, autossuficiência política e
econômica e autodefesa militar. O Juche permitiu a Kim
solidificar de vez o culto à sua figura no regime norte-
coreano, a não depender de outros regimes, nem a tolerar
dissidências. Seu local de nascimento, em Mangyongdae, foi
declarado como santuário sagrado nacional e seus
ancestrais foram sepultados e cultuados como heróis
combatentes. Supostamente, seu avô foi considerado como
um dos envolvidos no incêndio do navio americano, General
Sherman, em 1866. O senso de isolamento norte-coreano
aumentou ainda mais em janeiro de 1968, quando um
grupo se infiltrou na Zona Desmilitarizada na fronteira ao
longo do paralelo 38 e foi para o sul e tentou atacar o
presidente Park Chung Hee. Outro grupo norte-coreano
planejou um ato na costa oriental da Coreia do Sul.
Ademais, foi nessa época que um navio dos EUA, o USS
Pueblo, foi capturado no Mar do Leste, perto da Coreia do
Norte, enquanto estava em operação.

Essas provocações, no entanto, pouco efeito surtiu e fez


com que Park Chung Hee fortalecesse sua autoridade sobre
qualquer movimento dissidente e democrático de
estudantes e oposicionistas na Coreia do Sul. Em meados de
1970, Kim Il Sung, instigou outra onda de expurgos de
líderes dentre do seu partido, substituindo-os por uma nova
geração de revolucionários, a incluir seu filho mais velho,
Kim Jong Il (1942 – 2011) que passou a ser chamado de
“Querido Líder” [153]. O núcleo do poder político norte-
coreano começou a ser ocupado pela família Kim e seus
familiares.

O início da década de 1970 pareceu ser promissor para


uma maior unificação da península coreana. Em abril de
1971, o premiê norte-coreano, Kim Il Sung, anunciou uma
série de propostas para uma Coreia unida em forma
confederada. Em agosto, o presidente Park Chung Hee
também se expressou visando uma maior integração com o
norte. Eventualmente, a Cruz Vermelha da Coreia do Sul
passou a se envolver nos esforços humanitários de famílias
separadas pela divisão da península. Para isso,
representantes de ambos os lados do paralelo 38 trocaram
publicamente declarações de unidade e foram realizadas
reuniões preparatórias em contatos secretos entre Seul e
Pyongyang. Finalmente, em 4 de julho de 1972, um acordo
foi tornado público entre Kim Yong-ju (1920 - ), diretor do
Partido dos Trabalhadores da Coreia do Norte e irmão de
Kim Il Sung, e Lee Hu-rak (1924 - 2009), diretor do Serviço
Nacional de Inteligência da Coreia do Sul que visitou a
capital norte-coreana em segredo. O encontro entre os dois
representantes coreanos resultou numa declaração de três
princípios de reunificação: autoconfiança, paz e
solidariedade nacional. Os dois lados concordaram em
estabelecer uma Comissão Coordenada Norte-Sul, e a ligar
os dois gabinetes de governo diretamente por uma linha
telefônica. E assumiram o compromisso de diminuir as
acusações um contra o outro nas declarações públicas.

Apesar das boas intenções, o comunicado de 4 de julho


de 1972 não levou as duas Coreias para uma reunificação.
Na verdade, acabou exacerbando ainda mais o controle
político de ambas as partes. A fim de criar um sistema
político mais eficiente para promover a solidariedade
nacional contra os comunistas, Park Chung Hee suspendeu
a constituição sul-coreana em 17 de outubro, declarou lei
marcial e dispersou a Assembleia Nacional. Foi esboçada
uma nova constituição, a de Yusin (“restauração”, também
referido como Outubro Yusin, ) que maximizou ainda
mais o poder presidencial, com autoridade para emitir
decretos de emergência, dissolver o parlamento e nomear
um terço dos legisladores, isso num mandato de seis anos
sem limites de mandatos. O presidente sul-coreano seria a
partir da nova constituição eleito indiretamente por
delegados distritais pelo país, que poderiam ser facilmente
influenciados pelo poder executivo nacional. Já em
dezembro de 1970, Park Chung Hee foi reeleito como
presidente praticamente onipotente na Coreia do Sul.

Enquanto isso, em Pyongyang, o Conselho Supremo


convocou uma sessão para adotar uma nova constituição
norte-coreana que passou a concentrar ainda mais o poder
de Kim Il Sung, que a partir de então seria presidente do
país. O presidente, no comando do Comitê Central do Povo,
órgão executivo máximo recém-criado, foi adotado
constitucionalmente com todos os poderes sem precedentes
no mundo. Enquanto essas duas tendências das duas Coreia
tiveram curso, em 30 de agosto de 1972, houve
negociações entre representantes de ambos os lados pela
Cruz Vermelha em Pyongyang. Delegações sul-coreanas
oficialmente atravessaram a fronteira pela primeira vez
desde a divisão da península. Mês seguinte, norte-coreanos
foram a Seul. No entanto, o diálogo entre as partes nunca
chegou a uma conclusão substancial, já que os sul-coreanos
desejaram resolver antes as questões familiares e
humanitárias da separação, enquanto os norte-coreanos
queriam resolver primeiramente questões políticas como a
abolição das leis anticomunistas no sul. As visitas, nesse
sentido, começaram a ser mais apresentações cerimoniais
para a mídia, não tendo mais resultados concretos
produzidos. Apesar disso, as trocas familiares ainda
continuaram até agosto de 1973, quando Kim Yong-ju,
presidente da Comissão Coordenada Norte-Sul, resolveu
suspender os diálogos como protesto contra o sequestro de
Kim Dae-Jung pelo serviço secreto sul-coreano quando
estava em exílio em Tóquio em 8 de agosto [154].

Park Chung Hee e seus seguidores acreditaram que a


democracia sul-coreano poderia esperar até que a economia
estivesse desenvolvida o suficiente para lidar com a
pobreza generalizada do país. De fato, o lema de seu
governo foi “economia agora, democracia depois” [155].
Como resposta à crescente desigualdade social devido aos
anos de industrialização urbana, a partir de abril de 1970 o
presidente Park passou a implementar o programa de
desenvolvimento e modernização agrário, no Movimento
Saemaul (“Nova Comunidade”, ), especialmente nas
regiões e províncias mais precárias. O programa rural foi
inspirado nas tradições comunitários coreanas, de
solidariedade, cooperação laboral (dure, ) e autogoverno
(hyangyak, ). Park estendeu esses conceitos para toda a
nação em uma política nacional aplicando-o para as
empresas, escolas e organizações sociais.

Apesar disso, a sociedade sul-coreana tinha mudado e


passou a ser cada vez mais crítica com seu regime
antidemocrático. Em 1973, intelectuais, líderes religiosos,
políticos de oposição e líderes estudantis iniciaram uma
ampla campanha contra a constituição Yusin. Isso foi
amplificado depois do sequestro de Kim Dae-jung no Japão
em agosto. Uma campanha de petição para novas emendas
constitucionais surgiu. Park, reagiu duramente a isso, e
suprimiu o direito de manifestação conforme o Decreto de
Emergência no. 1, segundo o qual a lei marcial poderia
condenar infratores com até 15 anos de prisão. Mesmo
assim, as manifestações se intensificaram e se espalharam
pela Coreia do Sul. Após outro decreto emergencial, o de no.
4, entrar em vigor, oito estudantes foram presos e
executados e 14 sentenciados à pena de morte. Um deles
foi um poeta e escritor ativista, Kim Chi-ha (1941- ), que se
tornou célebre pelo seu poema “Cinco Bandidos” (Ojok) e
por seu tempo de prisão, e pelo seu pseudônimo, Jiha
(“subterrâneo”) [156].

O clima ficou ainda mais tenso no regime sul-coreano


quando um agente norte-coreano tentou assassinar o
presidente Park no Dia da Independência em 15 de agosto
de 1974. O agente falhou em seu alvo, mas atingiu a
primeira-dama que estava junto com o presidente na
cerimônia de comemoração do dia. O regime Yusin de Park
perdurou com vigor, e passou a reprimir e censurar
qualquer manifestação de oposição e suspeita. Com a
vitória dos comunistas no Vietnã em 1975, o regime de Park
passou a temer ainda mais a ameaça esquerdista,
fortalecendo ainda mais os decretos de emergência. Essas
medidas draconianas de supressão dos direitos humanos
provocaram reações internacionais. Isso se tornou um
escândalo quando foi revelada a ação de um lobista sul-
coreano, Tongsun Park, a subornar legisladores dos EUA em
Washington visando impedir o governo de pressionar a
Coreia do Sul, no que depois ficou conhecido como o caso
Koreagate, revelado na imprensa americana em 1976. Essa
questão diplomática delicada foi combatida pelo presidente
Jimmy Carter (1924 - ), que passou a pressionar pela
retirada das tropas americanas na Coreia do Sul pelas
violações dos direitos humanos do regime de Park,
conforme declarou em sua visita a Seul em 1978 [157].

Apesar das pressões, Park Chung Hee não buscou


reformar seu regime para maior democratização,
enfatizando em primeiro plano o desenvolvimento
econômico da Coreia do Sul. Isso começou a gerar desgaste
no meio político sul-coreano. Em maio de 1979, Kim Young-
sam (1927 - 2015), um ativista social contra o regime Yusin,
foi eleito líder da oposição. Por manobras deliberadas do
governo, Kim foi retirado de sua posição por agentes do
Serviço Nacional de Inteligência. Kim tinha por anos
defendido maior pressão do governo de Carter para
pressionar o presidente Park pelos abusos dos direitos
políticos e humanos. Em outubro, uma grande manifestação
estudantil tomou as ruas de Pusan, cidade portuária no sul
da península e terra natal de Park Chung Hee. Quando os
protestos começaram a ganhar a mídia e se espalhou para a
cidade próxima de Masan, o governo declarou nova lei
marcial e Forças Especiais foram mobilizadas. No mesmo
mês, como protesto, os americanos decidiram retirar seu
embaixador de Seul, e Kim Young-sam e seus partidários do
Novo Partido Democrático da Assembleia Nacional [158].
A rivalidade política começou a se avizinhar do círculo
mais próximo do presidente Park. Em 26 de outubro, Kim
Jae-gyu (1926 – 1980), diretor do Serviço Nacional de
Inteligência, foi discutir sobre os protestos com o
presidente. No evento, Kim atirou e matou Park Chung Hee.
Isso demonstrou o desgaste e impopularidade crescente do
regime Yusin, que passou a ser criticado inclusive por
agentes de segurança e inteligência, além de militares sul-
coreanos apoiados por americanos e sob comando nominal
das Nações Unidas desde a invasão norte-coreana em 1950.
Park, diante disso, tinha criado um corpo de segurança sob
comando presidencial para suprimir rebeliões e insurreições.
O chefe dessa guarda de segurança era o paraquedista Cha
Chichol (1934 – 1979) que tinha se desentendido ao longo
do tempo com o diretor do Serviço Nacional de Inteligência,
Kim Jae-gyu. As duas organizações, portanto, começaram a
rivalizar pelas questões cruciais de segurança da Coreia do
Sul. No dia do assassinato do presidente, Park tinha
favorecido a posição de Cha em detrimento dos pedidos de
Kim. Sendo assim, Kim, vendo-se afastado dos favores do
presidente sobre como lidar com os protestos e
manifestações, decidiu por bem atirar contra Park Chung
Hee e também matando Cha. Kim Jae-gyu, depois foi
condenado à pena de morte por enforcamento em 24 de
maio de 1980.

Depois de 18 anos de governo autoritário, Park Chung


Hee construiu uma nação sul-coreana moderna, próspera e
industrializada. Frequentemente é alegado que a Coreia sob
Park foi mais uma empresa, onde 51% das ações dos
grandes conglomerados nacionais, chaebols, pertenciam ao
próprio presidente. De fato, o PIB da Coreia do Sul subiu de
US$ 2,3 bilhões em 1962 para US$ 61,4 bilhões em 1979. A
renda per capita aumentou de US$ 87 para US$ 1,597 no
mesmo período [159]. Mas esse desenvolvimento veio às
custas da supressão de qualquer tendência democrática e
livre expressão social e política.

A questão sucessória de Kim Il Sung apareceu em


setembro de 1973, em Pyongyang, dando destaque ao seu
filho mais velho, Kim Jong Il (1942 - 2011) que tinha sido
nomeado como o segundo posto mais poderoso do regime
norte-coreano do Partido dos Trabalhadores, a ser
responsável pela parte da propaganda, organização e
orientação. Depois que se tornou membro pleno do Comitê
do Partido em fevereiro de 1974, Kim Jong Il tornou-se o
herdeiro oficial do “Grande Líder”, seu pai. Nos anos
seguintes, Kim filho passou a empreender uma ampla
campanha conhecida como Movimento Revolucionário, em
que foi promovida a ideologia juche, em três dimensões:
filosofia, tecnologia e cultura. Com isso, o sucessor norte-
coreano passou a liderar uma nova geração de elites da
Coreia do Norte, a consolidar seu papel de dirigente
nacional.

A sucessão foi oficialmente confirmada no 6º Congresso


do Partido dos Trabalhadores em outubro de 1980, quando
Kim Jong Il foi nomeado como membro de duas
organizações importantes da Coreia do Norte: do Comitê
Executivo Político do Partido (ou Politburo) e do Comitê
Militar do Secretariado do Partido [160].

A política pautada no juche da Coreia do Norte passou a


exigir o total compromisso e lealdade de cada cidadão
coreano, numa estrutura econômica isolada que se
estagnou durante a década de 1970. As dificuldades
econômicas para o desenvolvimento não foram superadas
apesar do Plano de Seis Anos (1971 – 1977) e o
subsequente Plano de Sete Anos (1978 -1984). Ademais, a
taxa de crescimento foi inferior a 2%, enquanto o vizinho ao
sul tinha alcançado taxa de cerca de 10%. Em 1980, o PIB
da Coreia do Sul, quase US$ 65 bilhões, era mais de seis
vezes maior que o do norte, que ficou em torno de um total
de quase US$ 10 bilhões. O desempenho de crescimento do
PIB norte-coreano será sofrido entre os anos de 1980 a
1985, estimado em torno de 3,6% anual, e ainda mais
sofrido entre os anos de 1985 a 1990, em torno de 1,4%
[161]. Devido em grande parte à orientação autossuficiente,

a economia norte-coreana sofreu com a falta de inovação


tecnológica com o tímido contato com o exterior, a baixa
atividade da atividade comercial que era quase toda
controlada pelo Estado, e as deficiências do setor
energético. Mesmo assim, a liderança norte-coreana e sua
estrutura partidária manteve-se no poder.

O assassinato de Park Chung Hee passou a ser


investigado pelo Major General Chun Doo-Hwan (1931 - ) no
comando da área de segurança do governo sul-coreano. No
processo judicial, Chun começou a crescer no cenário
político e militar entre a geração mais nova depois da morte
de Park e de seu chefe de segurança pessoal, Cha Chichol.
Segundo a Constituição Yusin em vigor na época no artigo
48, o presidente assume as funções do chefe de governo
nessas ocasiões, e assim Choi Kyu-hah (1919 – 2006)
chegou ao posto máximo da Coreia do Sul em 1979. No
entanto, nos círculos militares houve grande inquietação
sobre o futuro político da nação. Oficiais da área de
segurança e defesa leais a Chun, como o Major General Roh
Tae-woo (1932 - ), organizaram um golpe de Estado em que
o Chefe do Estado-Maior do Exército da Coreia do Sul foi
detido e preso em 12 de dezembro de 1979. Como em
1961, os EUA pouco fizeram a respeito para impedir o golpe.
Assim, Chun e Roh deram o primeiro passo em direção à
hegemonia política.
Depois de 18 anos do governo autoritário de Park Chung
Hee, o povo sul-coreano passou a exigir reformas
democráticas e maior liberdade política, depois de décadas
de crescimento econômico. Líderes políticos da oposição,
como Kim Dae-jung, Kim Jong-pil e Kim Young-sam
prepararam-se para concorrer às novas eleições
presidenciais. Os militares, no entanto, não pretendiam abrir
mão do governo, e pouco fizeram para implementar o
processo de normalização política. Em 14 de maio de 1980,
houve grande manifestação estudantil pela democratização
em Seul. No próximo dia, dezenas de milhares encheram o
centro de Seul e protestaram contra a tentativa dos
militares de obstruir a democracia sul-coreana. Esse
“Primavera de Seul”, contudo, teve vida curta, pois em 17
de maio, uma lei marcial foi decretada e todas as atividades
políticas foram proibidas. Os militares passaram a reprimir
as manifestações nas ruas e campi universitários. Kim Dae-
jung e Kim Jong-pil foram presos acusados de insurreição e
desordem. Kim Young-sam foi colocado em prisão domiciliar.

Chun Doo-Hwan formou uma junta militar a ser presidida


por ele mesmo nas instâncias máximas do poder. E no dia
18 de maio de 1980, novas manifestações de larga escala
foram reprimidas, dessa vez em Gwangju, a sudoeste do
país e região natal de Kim Dae-jung. A cidade de Gwangju,
capital da província, chegou a ser controlada pelos rebeldes
e mantiveram assim por mais de uma semana, até 27 de
maio, e o caso passou a inspirar outros movimentos pela
Coreia do Sul. Mas no dia 27, logo as Forças Especiais
entraram na cidade e mataram centenas de manifestantes
e estudantes. Há estimativas de que foram mortas 606
pessoas [162]. Essa breve chama pela democratização foi
apagada pelo regime militar. Os EUA, em maio de 1980,
tinha cerca de 37 mil tropas estacionadas na Coreia do Sul,
mas preferiu seguir uma política de não-interferência, que
os tornaram figura criticada pelos democratas e opositores
ao regime sul-coreano.

Em setembro de 1980, Chun Doo-Hwan foi eleito


presidente indiretamente pelos delegados da Assembleia
Nacional, órgão criado por Park Chung Hee na Constituição
Yusin. Logo antes de sua eleição, Chun havia ampliado o
mandato presidencial para o limite de sete anos.
Pressionado pelo golpe de Estado no ano anterior e pela
repressão em Gwangju, o presidente Chun passou a
promover políticas de apaziguamento e visibilidade, como a
abolição do toque de recolher, abrandamento das leis de
segurança e permitir viagens ao exterior. Para impulsionar a
imagem da Coreia do Sul no meio internacional, o governo
juntamente com o apoio de chaebols, defenderam em 1981
a hospedagem em Seul dos Jogos Olímpicos a ser realizado
em 1988.

No plano econômico, o governo de Chun passou a colher


os frutos de anos de investimento na indústria leve,
química, metalúrgica e naval durante a década de 70 sob o
presidente Park, e começou a traçar novas metas na década
de 80 para bens de consumo. Devido ao baixo preço do
barril de petróleo, dos dólares americanos e dos juros, a
indústria sul-coreana tinha se consolidado expressivamente
no setor automobilístico, naval e eletrônicos que passaram
a ser a sua principal pauta exportadora. Em 1986, surgiu o
primeiro carro sul-coreano produzido em massa, o Hyundai
Excel, que entrou com sucesso no mercado dos EUA. Em
1987, o PIB da Coreia do Sul atingiu a marca de US$ 1, 284
trilhões, com renda per capita de US$ 3,098 [163]. Apesar
disso, ainda havia considerável desigualdade econômica na
sociedade, entre o meio urbano e rural, e isso iria resvalar
para movimentos de protestos e sindicatos.
No 6º Congresso do Partido dos Trabalhadores da Coreia
em 10 de outubro de 1980, o presidente norte-coreano, Kim
Il Sung propôs uma fórmula de reunificação das duas
Coreias, a serem estabelecidas numa forma confederativa, a
República Democrática Confederada de Koryo [164]. O
governo proposto seria um Estado com dois sistemas, com o
governo central a ser responsável pelas questões de
assuntos internacionais e militares, enquanto cada um dos
dois teria governos com total autonomia interna. Embora a
ideia de Kim Il Sung tenha parecido plausível, a questão de
quem iria controlar o governo central permaneceu
disputado e incerto se a forma confederada fosse
implementada. Em 1982, o presidente Chun Doo-Hwan
propôs uma contrapartida, sua própria fórmula de
reunificação coreana, em que seria adotada uma
constituição democrática unida. Tendo em vista as
dificuldades das negociações entre o norte e o sul, essa
ideia também pareceu irreal. Em outubro de 1983, a
perspectiva de união tornou-se impraticável, quando um
terrorista norte-coreano colocou uma bomba na tentativa de
assassinar o presidente Chun em visita diplomática à
Birmânia (Mianmar). Apesar do presidente ter conseguido
sair com vida, 17 membros de sua delegação foram mortos.

As conversas unitárias se resumiram apenas às questões


humanitárias diante de famílias separadas desde a Guerra
da Coreia. Nesse sentido, em setembro de 1985, pela
primeira vez desde 1953, membros de famílias do sul e do
norte atravessaram Panmunjom, na Área de Segurança
Conjunta da ONU da Zona Desmilitarizada. Um grupo de
norte-coreanos veio depois visitar familiares em Seul,
enquanto sul-coreanos selecionados foram para Pyongyang.

O sistema norte-coreano começou a ser solidificar num


monólito de culto aos Kims ao longo da década de 1980. As
publicações e a campanha ideológica e propagandística
começaram a construir o mito da vida de Kim Jong Il.
Supostamente Kim Jong Il teria nascido em um
acampamento secreto da montanha sagrada de Baekdu,
onde teria originado Dangun, a figura fundadora da nação
coreana. Kim Júnior teria sido um aluno brilhante e teria
formulado planos de Estado, incluindo atentados contra a
Coreia do Sul como a que aconteceu na Birmânia (Mianmar)
em 1983, assim como ocorrido contra o voo 858 da Korean
Air em pleno ar sobre o Mar de Andamão em 29 de
novembro de 1987 [165]. A filosofia juche foi reforçada na
Coreia do Norte, a fundamentar a continuidade do regime
de Kim Il Sung para o esforço de construção da nação para
o futuro. No início da década de 1990, Kim Jong Il já tinha se
tornado no comandante supremo do Exército do Povo
Coreano e a presidente do setor de defesa do país.

A partir de meados da década de 1980, a sociedade sul-


coreana começou a se mobilizar mais uma vez pedindo a
revisão da Constituição Yusin para instituir a votação
popular para presidência. No entanto, o presidente Chun
Doo-Hwan manteve-se persistente em manter a
constituição no qual seu sucessor no poder seria escolhido
indiretamente por delegados. Em 10 de junho de 1987,
houve a morte de um estudante por tortura policial que
desencadeou outra grande manifestação no centro de Seul.
No evento, ficou claro que as contestações tinham crescido
para além dos oposicionistas e esquerdistas sul-coreano.

Relutantemente, o presidente Chun e seu candidato


sucessor, Roh Tae-woo, cederam às demandas populares e
anunciaram em 29 de junho a aceitação de eleições
presidenciais diretas. Essa eleição ocorreu finalmente em
dezembro de 1987, para um mandato presidencial para
cinco anos, modificando a constituição. Foi o primeiro voto
universal direto para presidente em 16 anos. Roh Tae-woo
acabou vencendo com 36% dos votos, acima dos
opositores, Kim Young-sam e Kim Dae-jung, que não
conseguiram se unir na oposição democrática. No entanto,
nas eleições legislativas posteriores, realizada em abril de
1988, o partido de Roh não conseguiu maioria parlamentar
e assim teve que formar coalizão com Kim Young-sam e Kim
Jong-pil, alienando de vez Kim Dae-jung na política sul-
coreana.

O verão de 1988 marcou o momento de maior


visibilidade de Seul e da Coreia do Sul em décadas. Foi
quando foram realizadas em setembro na capital os 24º
Jogos Olímpicos, com a ampla participação dos países
comunistas depois do boicote aos jogos anteriores em 1984
em Los Angeles. A Coreia do Norte foi a única que não
mandou representantes e atletas. As Olimpíadas de Seul
refletiram os novos tempos e esperanças de uma península
unificada e paz mundial nos anos finais da Guerra Fria. Ao
mesmo tempo, deu oportunidade à Coreia do Sul a
demonstrar seu desenvolvimento econômico e
comprometimento democrático recente. Aproveitando a
ampla visibilidade, o governo de Roh Tae-woo buscou
melhorar a imagem da Coreia do Sul depois de anos de
repressão antidemocrática e abusos de direitos humanos. A
partir de fevereiro de 1989, no contexto das mudanças na
Europa, a Coreia do Sul estabeleceu relações diplomáticas
com a Hungria e depois com a União Soviético em setembro
de 1990 e com a China comunista em agosto de 1992.
Buscando o diálogo com o vizinho ao norte, o presidente
Roh propôs uma série de visitas em sua declaração feita em
7 de julho de 1988. Prometeu que o sul-coreano iria apoiar o
estabelecimento dos contatos de Pyongyang com o Japão e
EUA. Para fins de unificação da península, Roh apresentou
um programa em 1989, para uma Comunidade Nacional
Unificada [166], e as duas Coreias entraram com
representações próprias na ONU em 17 de setembro de
1991, depois de meses de intercâmbios esportivos e
culturais acordados entre Seul e Pyongyang. Em 13 de
dezembro, foram assinados acordos de alto nível sobre
reconciliação entre as partes, e foi almejado cooperação,
trocas e não-agressão. Os dois lados coreanos concordaram
em reconhecer a existência de cada governo, a respeitar
suas diferenças e autonomias.

Embora tenha sido um grande gesto diplomático, ainda


não foi reconhecido acordos sobre a liberdade de imprensa
e indústria, que resultou em crescente movimentos de
protesto de sindicatos e de trabalhadores de colarinho
branco como professores e jornalistas na Coreia do Sul. Isso
ganhou força depois do número de sindicatos e associações
trabalhistas ter aumentado consideravelmente depois de
1987. Greves e paralisações tornaram-se cada vez mais
frequentes na Coreia do Sul no fim da década, que passou a
afetar o desempenho econômico da nação.

Para as eleições presidenciais de dezembro de 1992 na


Coreia do Sul, os dois candidatos democráticos, Kim Young-
sam e Kim Dae-jung saíram à frente nas pesquisas. O
presidente do grupo Hyundai, o maior chaebol da Coreia do
Sul, Chung Ju-yung (1915 – 2001), também fez sua
candidatura como dissidente do regime anterior. Young-sam,
que havia feito coalizão com o partido governista de Roh,
venceu as eleições.

Como primeiro presidente civil sul-coreano em 32 anos,


Kim Young-sam passou a investir no processo de
democratização da Coreia do Sul. Para tanto, seu governo
foi marcado por denunciar os abusos do regime militar do
passado e a legitimar a república com base na Segunda
República (1960 – 1961) de Chang Myon e da Primeira
(1948 – 1960) de Syngman Rhee, indo até mesmo ao
Governo Provisório da República da Coreia sediada em
Xangai durante a ocupação japonesa. Para destruir o
passado de opressão, Young-sam mandou demolir o antigo
prédio do governador-geral japonês em Seul (Joseon-
chongdokbu Cheongsa, ), o “Capitólio de Seul”, em
novembro de 1996. No campo político, o novo presidente
passou a perseguir e condenar membros corruptos e
militares do regime autoritário anterior. E passou a defender
eleições provinciais ausentes no país desde o golpe do
General Park Chung Hee em 1961. Kim Young-sam, por fim,
conseguiu levar a julgamento os dois presidentes
anteriores, Roh Tae-woo e Chun Doo-Hwan. Apesar de terem
sido condenados pelo envolvimento no golpe de dezembro
de 1979, e pelas repressões em Gwangju em maio de 1980,
foram depois anistiados em momento posterior. Juntamente
com várias lideranças políticas, militares e empresariais.

No início dos anos 90, a Coreia do Sul de Kim Young-sam


passou a sofrer pressões globais para liberalizar seu
mercado. Em agosto de 1993, o presidente Kim reformou,
para tal fim, as práticas bancárias ao adotar um sistema de
transações em tempo real para dar maior transparência
financeira. Em dezembro, o governo sul-coreano assinou o
Acordo da Rodada Uruguai, abrindo de vez a maioria do seu
mercado interno, incluindo para commodities, finanças,
construção, distribuição e serviços. Em setembro de 1996, a
Coreia do Sul foi admitida para o seleto grupo de países
desenvolvidos membros da Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico (OCDE), criada para
cooperação e desenvolvimento conjunto internacional. De
fato, em números, a Coreia do Sul apresentava-se com altos
índices de desenvolvimento, chegando sua renda per capita
a US$ 10,000 em 1996, tendo crescido a renda
consistentemente na década em média 5% por ano [167].

O crescente isolamento do regime da Coreia do Norte


complicou a sobrevivência econômica do país na década de
1980, e isso foi ainda mais dificultado depois da queda dos
regimes comunistas em 1989. A economia norte-coreana,
até então, tinha persistido no seu esforço de
autossuficiência (juche) com ajuda de envio de alimentos e
petróleo da China e União Soviética. Mas com pouca terra
arável, e com escassos recursos energéticos, a Coreia do
Norte teve que negociar e barganhar como pôde sob o
comando de Kim Jong Il. Após o colapso do Muro de Berlim,
a URSS cortou seu fornecimento de petróleo, pois passaram
dali a exigir pagamento devido em divisas internacionais.
Da China, igualmente, foi exigido que Kim Jong Il passasse a
reformar sua economia de mercado aberto.

O governante norte-coreano, então, teve que optar por


uma estratégia crucial para a sobrevivência de seu regime.
Desde 1980, na pequena cidade de Yongbyon, a cerca de
100 km de Pyongyang, esteve em desenvolvimento um
centro de pesquisas e usina nuclear experimental em
andamento. Em 1986, foram obtidos os primeiros resultados
positivos do material radiativo. A usina e o centro de
pesquisa nuclear de Yongbyon (Nyeongbyeon haeksiseol.
), começou a chamar a atenção mundial quando imagens
de satélite revelaram sua existência. As imagens foram
publicadas no New York Times em 1989. O material
acumulado de plutônio do uso de urânio da usina poderia
ser usado para posterior fabricação de armamento nuclear,
algo que os EUA começaram a monitorar de perto.

Apesar de ter ratificado o acordo do Tratado de Não-


Proliferação Nuclear (TNP) em 1985, a Coreia do Norte
recusou receber uma equipe de investigação da Agência
Internacional de Energia Atômica (AIEA), organização que
fiscaliza a proliferação de armas nucleares no mundo. Assim
sendo, Kim Jong Il passou a barganhar com sua posição
nuclear, a fim de obter ajuda econômica internacional,
chegando mesmo a anunciar a sua retirada do TNP em
1993. Mas isso não chegou a se concretizar, pois em julho
de 1994 Kim, após uma série de negociações com os EUA
com os bons ofícios do ex-presidente americano, Jimmy
Carter que visitou Pyongyang em missão não-oficial,
concordou em abolir o desenvolvimento do programa de
Yongbyon na condição de que os americanos e seus aliados
providenciassem ajuda nuclear para a construção de
reatores de água leve para atender as demandas
energéticas. Essas estações, evidentemente, não
produziriam combustível que pudesse ser usado em armas
nucleares.

Ademais, Jimmy Carter havia solicitado como condição


em Pyongyang o prosseguimento das negociações com o
regime sul-coreano, e para isso tinha antes recebido o
compromisso do presidente sul-coreano, Kim Young-sam
para tal.

Alguns meses antes da visita de Carter, o Kim Young-


sam tinha realizado reuniões com norte-coreanos a fim de
negociar a soltura de presos comunistas na Coreia do Sul.
Ao ser informado da missão de Carter ao norte, Young-sam
então propôs uma reunião de cúpula Norte-Sul. Em 28 de
junho de 1994, foi realizado os primeiros contatos
preliminares entre delegados dos dois países asiáticos.
Entretanto, Kim Il Sung, que tinha negociado para a parte
norte-coreana, chegou a falecer de infarto do miocárdio em
8 de julho, e as negociações foram interrompidas.
Kim Jong Il havia ascendido ao cargo de governante de
fato há anos na Coreia do Norte, muito antes da morte de
seu pai, o “Grande Líder” da nação norte-coreana. Visando
respeitar a posição única de Kim Il Sung, foi preservado seu
cargo de presidente, e Kim Filho assumiu apenas a função
de presidente da Comissão Nacional de Defesa.
Efetivamente era o líder inconteste, ainda mais reforçado
com o laço sanguíneo de seu genitor. Uma vez no poder,
sem qualquer obstrução, Kim Jong Il passou a adotar uma
posição mais assertiva sobre a questão nuclear com os EUA.
Em outubro de 1994, o governo norte-coreano e os EUA
assinaram novo acordo, em que foi prometida a interrupção
da estação de Yongbyon, em troca do fornecimento pelos
EUA e aliados de 5 mil toneladas de petróleo anualmente
até que fossem concluídas a construção de duas instalações
nucleares de água leve na Coreia do Norte. Para tanto, foi
estabelecida em 15 de março de 1995 a Organização de
Desenvolvimento de Energia da Península Coreana (Korean
Peninsula Energy Development Organization, KEDO), no
qual a Coreia do Sul, Japão, União Europeia e outros,
participariam financeiramente com a construção das
estações de água leve [168].

Assim, Kim Jong Il conseguiu assegurar o fornecimento


energético de petróleo desesperadamente necessário para
a economia norte-coreana. Mas ainda havia a questão da
carência alimentar. Em 1995, a China passou a exigir o
pagamento por divisas internacionais de seu suprimento de
alimentos para a Coreia do Norte. No referido ano, Kim Jong
Il passou a pleitear ajuda alimentar para as Nações Unidas,
pelo Programa Alimentar Mundial (PMA), a atender áreas
emergenciais atingidas pela fome. Para justificar seu pedido
à agência internacional, Kim Jong Il tinha apresentado como
causa da fome e morte de cerca de 5 milhões de norte-
coreanos, inundações sem precedentes. Foi nesse veio que
a mídia norte-coreana passou a divulgar imagens de
milhões de coreanos em situação famélica que chocou a
opinião internacional. Apesar disso, os inspetores do PMA
somente puderam visitar uma área limitada do país, e não
puderam confirmar o fato de crise generalizada, nem as
causas destrutivas das supostas inundações em 1995.
Mesmo assim, o governo norte-coreano continuou a insistir
na crise humanitária até 1997, quando o PMA resolveu
atender os pedidos humanitários [169].

O presidente sul-coreano, Kim Young-sam em 1997


enfrentou uma grave crise financeira. Isso decorreu depois
de anos de investimentos e empréstimos de bancos
coreanos com juros baixos em mercados de alto risco no
Sudeste Asiático e na Rússia. Quando os investidores
internacionais se retiraram dos mercados de risco da
Indonésia e Tailândia, a crise se alastrou pelos mercados
asiáticos no verão de 1997. A Coreia do Sul não ficou imune
a isso. O governo de Kim teve, portanto, via o Ministro das
Finanças, Lim Chang-yuel, de pedir ao Fundo Monetário
Internacional (FMI) para resgatar os bancos sul-coreanos de
declarar moratória.

As eleições presidenciais sul-coreanas ocorreram, como


esperado, em 18 de dezembro de 1997. Desta vez, Kim
Dae-jung se colocou como opositor e concorreu contra o
candidato da situação, o ex-primeiro ministro de Kim Young-
sam, Lee Hoi-chang (1934 - ). Em 3 de dezembro, alguns
dias antes das eleições, o governo sul-coreano havia
sancionado o primeiro pacote de resgate financeiro do FMI,
no valor histórico de US$ 57 bilhões, sob duras condições
[170]. A sociedade sul-coreana, que havia desfrutado de

décadas de prosperidade, sofreu com as amargas


demissões exigidas pelo plano de reestruturação do FMI e
da alta das taxas de juros. Insatisfeitos, a maioria do
eleitorado nas urnas escolheu o oposicionista, Kim Dae-jung
para presidente. Uma vez no cargo presidencial, Kim Dae-
jung agiu rapidamente para resolver o problema da crise
financeira da Coreia do Sul. Usando seu capital histórico e
pessoal, Dae-jung conseguiu convencer a maioria dos sul-
coreanos a enfrentar a crise social nos dois anos seguintes.
Em 2000, a Coreia do Sul já tinha pagado parte substancial
de seu empréstimo do FMI.

Com a estabilidade econômica e financeira recuperada, o


presidente Kim Dae-jung passou a formular uma nova
política de unificação da península coreana. Como líder da
oposição liberal que havia por anos clamado por uma
postura mais negociadora com a Coreia do Norte, o
presidente Kim Dae-jung tinha sido no passado rotulado
pelos militares e conservadores como liberal e
marginalizado demais no sistema político autoritário sul-
coreano. Agora, como presidente, Dae-jung elaborou uma
nova postura com a “Política da Luz do Sol” (Haetbyeot
jeongchaek, ), termo inspirado numa das fábulas de
Esopo, “O Vento do Norte e o Sol”, que enfatiza a
superioridade do poder da persuasão sobre o uso da força.
Sob essa nova política, o governo sul-coreano iria prestar
assistência econômica ao norte, em vez de buscar
estrangulá-la por pressões e bloqueios, visando assim
persuadir Pyongyang das vantagens de uma maior
integração.

No veio dessa nova política, o presidente sul-coreano


tinha convencido a participação de um dos maiores
empresários da Coreia do Sul, dono do maior chaebol, o
Grupo Hyundai, a contribuir para uma política de
investimentos e empréstimos para o regime do norte. Foi
assim que, em junho de 1990, o empresário Chung Ju-yung
(1915 - 2001), atravessou a fronteira militarizada para o
norte juntamente com milhares de cabeças de gado a
fornecer alimentos e aliviar a pressão da fome. O ato,
apesar de comovente, surtiu pouco efeito integrativo no
norte-coreano. Isso se aliou ao ceticismo de muitos sul-
coreanos em relação à pouca inclinação de Kim Jong Il
buscar reformar a estrutura do poder e liberalizar a
economia da Coreia do Norte. No entanto, as novas atitudes
de conciliação com o norte surtiu mais efeito entre a
geração mais nova dos sul-coreanos, que nunca haviam
experimentado as consequências da fratura da península e
do regime autoritário do General Park Chung Hee. Foi nesse
contexto que começou a haver uma divisão ideológica na
Coreia do Sul na virada do século, entre aqueles idealistas e
jovens contra o ceticismo conservador dos mais velhos.

A “Política da Luz do Sol” de Kim Dae-jung continuou


como meta de seu governo, e buscou -se incentivar
investimentos ao norte do paralelo 38, visando angariar
apoio internacional e convencer pela mudança o regime de
Kim Jong Il. O Grupo Hyundai, como exemplo, chegou a
investir na região das Montanhas Kumkang (Kumkangsan),
um grandioso projeto turístico na Coreia do Norte. Em
momento culminante, o próprio presidente Kim Dae-jung foi
visitar oficialmente Kim Jong Il em Pyongyang em 13 de
junho de 2000. No evento, os dois líderes concordaram com
uma nova cooperação entre as duas nações irmãs. Disso
resultou a Declaração Conjunta Norte-Sul de 15 de junho,
que incluiu o enfatizou a importância na busca de
conciliação das diferenças e do projeto de unificação da
península, além de questões humanitárias, cooperação
econômica e intercâmbios. Ademais, houve a promessa de
Kim Jong Il de retribuir a visita no futuro.

O idealismo do encontro resultou em desconfianças dos


setores mais conservadores da Coreia do Sul, que
enxergava que uma forma confederativa da península
apenas manteria o regime comunista norte-coreano que,
eventualmente, poderia se alastrar para o sul. Não
obstante, apesar das críticas manifestadas, a Declaração
Conjunta foi o único consenso conseguido entre o norte e
sul coreano em décadas. Como reconhecimento de seus
esforços diplomáticos intercoreanos, Kim Dae-jung foi
agraciado com o Prêmio Nobel da Paz de 2000.

EPÍLOGO

A virada para o século 21 trouxe novas perspectivas para a


península coreana. O governo de Kim Dae-jung, na Coreia
do Sul, conseguiu angariar forte apoio popular e
internacional. A indústria sul-coreana começou a crescer
para outros setores investidos, especialmente na área de
Tecnologia da Informação. A realização da Copa do Mundo
em 2002, juntamente com o Japão, mais uma vez chamou a
atenção para a região leste asiática. No campo diplomático,
Kim Dae-jung, obteve poucos resultados com o regime
norte-coreano, com sua “Política da Luz do Sol”. Isso foi
obstruído com os eventos de 11 de setembro de 2001,
quando o presidente dos EUA, George W. Bush, passou a
pressionar ainda mais a Coreia do Norte para mudanças e
abertura.

Em 2003, Roh Moo-hyun (1946 - 2006), foi eleito


presidente da Coreia do Sul em dezembro. Sua vitória teve
forte apoio entre os mais jovens que tinham esperanças de
um regime democrático mais participativo, especialmente
entre ativistas jovens que tinham crescido protestando
contra os regimes autoritários do passado, chamados de
“Geração 386” (sampallyuk sedae, ). O novo governo
empreendeu reformas econômicas liberalizantes que
acarretou em consequências sociais impopulares. Foi
durante seu governo que a Coreia do Sul passou a ser a 10ª
maior economia do mundo [171].

Presidente Roh almejou ir além de regionalismo e


privilégios entre o governo e o setor empresarial, buscando
combater práticas abusivas e corruptas na Coreia do Sul.
Apesar de seus esforços, Roh passou a enfrentar crescente
descontentamento entre os mais jovens e desempregados a
partir de 2003. Ano seguinte, Roh sofreu impedimento
(impeachment) pela Assembleia Nacional, sob alegações de
corrupção e violação das leis eleitorais. Apesar disso, seu
partido manteve-se como maioria no parlamento nas
eleições realizadas em abril de 2004, e Roh foi reempossado
pela Suprema Corte. As discussões da sociedade civil e
imprensa ainda persistiram nos anos seguintes. Em 2009,
Roh e seus familiares passaram a ser investigados por
práticas de suborno e corrupção. Em 23 de maio de 2009,
não suportando mais as pressões, Roh cometeu suicídio
[172].

Lee Myeong-bak (1941 - ) sucedeu Roh em fevereiro de


2008. Visando revitalizar a democracia e economia sul-
coreana, Lee planejou medidas para inserir
competitivamente a nação no mundo globalizado, a
conciliar com a Coreia do Norte e trazer benefícios e bem-
estar à sociedade. Em abril, o partido de Lee conseguiu
maioria parlamentar, que garantiu ao presidente aprovação
aos seus projetos nacionais. Em negociações com os EUA,
Lee e Bush abordaram as questões de construir uma área
de livre comércio, ajudando a aliviar as tensões entre os
dois países. Lee concordou em suspender a importação de
carne bovina dos EUA, que causou protesto entre os
pecuaristas e industrialistas sul-coreanos.

A postura de Lee Myeong-bak com o norte-coreano foi


mais incisiva e dura. O presidente apostou em pressões
conjuntas com a Rússia, China, Japão e EUA. Nesse sentido,
as relações diplomáticas globais da Coreia do Sul
melhoraram, cujo êxito veio quando hospedou a Cúpula dos
Países do G20 em novembro de 2010 em Seul.

Em fevereiro de 2013, Lee foi sucedido pela Park Geun-


hye (1952 - ), primeira mulher presidente da Coreia do Sul,
e filha mais velha do General Park Chung-hee. Park não
concluiu seu mandato presidencial por um escândalo que
levou ao seu impeachment em dezembro de 2016. A causa
foi devido a corrupção envolvendo relatos de várias
organizações de notícias reportarem abusos cometidos pela
sua assessora Choi Soon-sil (1956 - ) em 2016, sob
acusações de tráfico de influência. Isso causou as maiores
ondas de protesto da história da Coreia do Sul, mesmo com
a aprovação no parlamento de impedimento da presidente.
Uma vez retirada do cargo presidencial, as investigações
foram julgadas e condenadas na Suprema Corte. Assim, o
impeachment de Park Geun-hye foi confirmado em 10 de
março de 2017. Após alguns meses, com novas eleições
presidenciais, Moon Jae-in (1953 - ) foi eleito em 10 de maio.
Em suma, o regime sul-coreano parece ter se consolidado
em bases democráticas, com uma sociedade civil
independente e crítica, assentada numa economia
desenvolvida e próspera.

O contraste com o norte-coreano é revelador quando se


observa fotos de satélite em órbita terrestre no período
noturno. Ao norte do paralelo 38, quando não há focos de
luz e eletricidade, um notável contraste com a concentração
ao sul (imagem). O regime de Kim Jong Il teve que se
adequar às demandas mais duras do presidente dos EUA,
George W. Bush, que passou a concentrar seus esforços de
luta e combate ao terrorismo sobre regimes considerados
pertencentes ao “Eixo do Mal”, que incluiu a Coreia do
Norte, a partir de fins de 2001. Nesse sentido, a política
conciliadora da “Luz do Sol” de Kim Dae-jung foi
desconsiderada, provocando uma reação de rearmamento
convencional e nuclear de Pyongyang. Kim Jong Il tinha
considerado com atenção o que os EUA fizeram com o
regime de Saddam Hussein ao derrubá-lo em 2003. Três
anos depois, o programa nuclear norte-coreano começou a
retomar seu programa de desenvolvimento de ogivas e
capacidade balística. Em 9 de outubro, foram realizadas
detonações nucleares na base subterrânea de Punggye-ri
[173].

Kim Jong Il parece ter compreendido a importância de


revitalizar a economia norte-coreana. Isso foi expressado
depois de sua visita à China em janeiro de 2006, quando
depois declarou ter ficado impressionado com as reformas
de mercado feito desde fins da década de 1970 [174]. Apesar
das expectativas de reformas econômicas, o governo não
abriu mão do controle das atividades do país.

As tensões com os EUA e a Coreia do Sul parecem ter


aumentado depois que um navio de guerra sul-coreano,
Cheonan, ter naufragado em 26 de março de 2010 na costa
ocidental da península perto da fronteira dos países
coreanos. O clima se agravou ainda mais depois de
exercícios militares realizados pelas forças sul-coreanas na
ilha de Yeonpyeong em 23 de novembro terem sofrido
ataques de artilharia norte-coreana. O incidente foi
amplamente condenado nos organismos internacionais.

Em 17 de dezembro de 2011, Kim Jong Il morreu de


ataque cardíaco. Após meses de especulações e incertezas
no meio internacional, finalmente foi revelado de que seu
filho mais novo, Kim Jong-un (1983 - ), seria seu sucessor.
Este continuou com a política de seu pai, diante das
pressões e condenações internacionais ao programa nuclear
da Coreia do Norte que tinha demonstrado desenvolver e
testar mísseis de longo alcance e bombas de hidrogênio,
capazes, teoricamente de ir além do arquipélago japonês e
atingir partes da costa do Pacífico dos EUA.

As perspectivas pareciam sombrias até fins de 2017. No


entanto, no ano seguinte, a Coreia do Norte anunciou que
iria participar das Olímpiadas de Inverno de Pyeongchang
na Coreia do Sul realizadas em fevereiro. Em março, o
presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou que iria se
encontrar num encontro de cúpula com Kim Jong-un,
previsto para ser realizado em 12 de junho, em Cingapura, a
tratar da desnuclearização norte-coreana. Ao que tudo
indica, há vontade de Pyongyang e Kim Jong-un de negociar
e dialogar com a Coreia do Sul e EUA, mas na espera de
contrapartida a preservar a soberania de seu regime. Resta
saber se isso terá consequências duradouras para a paz e
prosperidade da sofrida sociedade norte-coreana.

***
A Coreia, no conjunto de sua história, foi palco de
intensos combates, migrações, embates e contestações.
Disso moldou-se a nação coreana, de sua criatividade e
energia, de suas adaptações e inventividades. Nas últimas
décadas, a península foi fraturada em duas partes, no que
convencionamos chamar de Coreia do Norte e Coreia do Sul.
Os desentendimentos ainda afloram na região, amplificados
pelos interesses internacionais em não perder um
posicionamento no leste asiático. Mas caberá ao tempo nos
revelar se a unidade coreana será restabelecida,
reassumindo a unidade histórica da nação coreana.
REFERÊNCIAS

ADRIAN, Buzo. The Guerilla Dynasty: Politics and


Leadership in North Korea. Londres & Nova York: I.B. Tauris,
1999.

AMES, Roger T. & ROSEMONT JR., Henry. The Analects of


Confucius: A Philosophical Translation. Nova York: Random
House, 1999.

BEISNER, Robert L. Dean Acheson: A Life in the Cold War.


Oxford & Nova York: Oxford University Press, 2006.

BOOSE, Donald W. Over the Beach: US Army Amphibious


Operations in the Korean War. Fort Leavenworth, Kansas,
EUA: Combat Studies Institute Press, 2008.
BREUKER, R. Establishing a Pluralist Society in Medieval
Korea, 918–1170: History, Ideology and Identity in the Koryŏ
Dynasty. Leiden: Brill, 2010.

BUCKELY, Patricia & WALTHALL, Anne. East Asia: A


Cultural, Social, and Political History. Boston: Wadsworth,
2013.

CAPRIO, Mark E. Japanese Assimilation Policies in


Colonial Korea, 1910-1945. Seattle: University of
Washington Press, 2011.

CHAN, Robert Kong. Korea-China Relations in History and


Contemporary Implications. Hong Kong: Palgrave Macmillan,
2018.

CHOI, Jai-Keun. The Origin of the Roman Catholic Church


in Korea: An Examination of Popular and Governmental
Responses to Catholic Missions in the Late Chosôn Dynasty.
Seul: The Hermit Kingdom Press, 2006.

CHOI, Jai-Keun. The Origin of the Roman Catholic Church


in Korea: An Examination of Popular and Governmental
Responses to Catholic Missions in the Late Chosôn Dynasty.
Seul: The Hermit Kingdom Press, 2006.

CHOI, Jongtaik. “The Development of the Pottery


Technologies of the Korean Peninsula and their Relationship
to Neighboring Regions” In: BYINGTON, M. E. (Org.). Early
Korea 1: Reconsidering Early Korean History through
Archaeology. Seul: Korea Institute, Harvard University Press,
2008.

CHOY, Bong-youn. Korea: a history. Rutland, Vermont,


EUA & Tóquio: Charles E. Tuttle, 1971.
CHUNG, Young-Iob. Korea Under Siege, 1876-1945:
Capital Formation and Economic Transformation. Oxford &
Nova York: Oxford University Press, 2006.

DEAL, William E. Handbook to Life in Medieval and Early


Modern Japan. Nova York: Infobase, 2006.

DEANE, Hugh. The Korean War 1945-1953. San


Francisco, EUA: China Books, 1999.

DUK-KYU, Jin. Historical Origins of Korean Politics. Seul:


Jisik Sanup Publications, 2005.

ECKERT, Carter J.; LEE, Ki-baik; LEW, Young Ick;


ROBINSON, Michael & WAGNER, Edward W. Korea Old and
New: A History. Seul: Ilchokak, 1990.

FARRIS, William Wayne. Sacred Texts and Buried


Treasures: Issues in the Historical Archaeology of Ancient
Japan. Honolulu: University of Hawaii Press, 1998, pp. 67,
109; KIM, Jinwung, A History of Korea: From 'Land of the
Morning Calm' to States in Conflict. Bloomington: Indiana
University Press, 2012.

FLAHERTY, Robert Pearson. “Korean Millenial


Movements” In: WESSINGER, Catherine (Org.). The Oxford
Handbook of Millennialism. Oxford & Nova York: Oxford
University Press, 2011.

FORCZYK, Robert. Russian Battleship vs Japanese


Battleship: Yellow Sea 1904–05. Londres: Bloomsbury
Publishing, 2013.

FUCHS, Eckhardt; KASAHARA, Tokushi & SAALER, Sven


(Orgs.). A New Modern History of East Asia, vol. 1.
Göttingen, Alemanha: V & R Academic, 2018.
GORDENKER, Leon Gordenker. The United Nations and
the Peaceful Unification of Korea: The Politics of Field
Operations, 1947–1950. Haia: Martinus Nijhoff, 1959.

GRAYSON, James Huntley. Korea: a Religious History.


Londres: Routledge Curzon, 2002.

HABOUSH, JaHyun Kim & DEUCHLE, Martina (Orgs.)


Culture and the State in Late Choson Korea. Cambridge,
Massachusetts, EUA & Londres: Harvard University Press,
1999.

HAGGARD, Stephan & NOLAND, Marcus. Famine in North


Korea: Markets, Aid, and Reform. Nova York: Columbia
University Press, 2009.

HALBERSTAM, David. The Coldest Winter: America and


the Korean War. Nova York: Hyperion, 2007.

HAN, Jongwoo. Power, Place, and State-Society Relations


in Korea: Neo-Confucian and Geomantic Reconstruction of
Developmental State and Democratization. Plymouth, Reino
Unido: Lexington, 2013.

HAN, Yong-sup. “The May Sixteenth Military Coup” In: KIM,


Byong-Kook & VOGEL, Ezra F (Orgs.). The Park Chung Hee
Era. Cambridge, Massachussets & Londres: Harvard
University Press, 2011.

HENDERSON, Gregory; LEBOW, Richard Ned &


STOESSINGER, John George. Divided Nations in a Divided
World. Filadélfia, Pensilvânia, EUA: David McKay Co., 1974.

HEO, Uk & ROEHRIG, Terence. South Korea Since 1980.


Nova York: Cambridge University Press, 2010.
HOARE, James & PARES, Susan. Korea: an introduction.
Londres & Nova York: Routledge, 1988.

HOARE, James E. Historical Dictionary of Democratic


People's Republic of Korea. Plymouth, Reino Unido:
Scarecrow, 2012.

HOLCOMBE, Charles. A History of East Asia: From the


Origins of Civilization to the Twenty-First Century.
Cambridge: Cambridge University Press, 2017.

HWAK, Tae-Hwan. U.S.-Korean relations, 1882-1982.


Seul: Kyungnam University Press, 1982.

HWANG, Kyung Moon. A History of Korea. Nova York:


Palgrave, 2017.

HWANG, Kyung Moon. A History of Korea: An Episodic


Narrative. Basingstoke, Reino Unido: Palgrave Macmillan,
2010.

HYEGYONG. The Memoirs of Lady Hyegyong: The


Autobiographical Writings of a Crown Princess of Eighteenth-
Century Korea. Organizado e traduzido por JaHyun Kim
Haboush. Berkeley, Los Angeles & Londres: University of
California Press, 2013.

JEON, Ho-tae. Koguryo, the Origin of Korean Power and


Pride. Seoul: Northeast History Foundation, 2007.

KANG, Etsuko Hae-Jin. Diplomacy and Ideology in


Japanese-Korean Relations: From the Fifteenth to the
Eighteenth Century. Nova York & Londres: Macmillan Press,
1997.
KANG, Jae-eun. The Land of Scholars: Two Thousand Years
of Korean Confucianism. Traduzido por Suzanne Lee.
Paramus, Nova Jersey: Homa & Sekey Books, 2003.

KATSIAFICAS, George. Asia's Unknown Uprisings: South


Korean Social Movements in the 20th Century. Oakland,
California, EUA: PM Press, 2012.

KIHL, Young Whan. Transforming Korean Politics:


Democracy, Reform, and Culture: Democracy, Reform, and
Culture. Londres & Nova York: Routledge, 2015.

KIM, Choong Soon & KIM, Song-su. A Korean Nationalist


Entrepreneur: A Life History of Kim Songsu, 1891–1955.
Nova York: State University of New York Press, 1998.

KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport,


Connecticut, EUA & Londres: Greenwood Press, 2005.

KIM, Dong Hoon. Eclipsed Cinema: The Film Culture of


Colonial Korea. Edimburgo: Edinburgh University Press,
2017.

KIM, Duk-Whang. A History of Religions in Korea. Seul:


Daeji Moonwha-sa, 1988.

KIM, Hunggyu. Understanding Korean


Literature.Traduzido por Robert J. Fraser. Londres & Armonk,
Nova York: M. E. Sharpe, 1997.

KIM, Hyung-A & SORENSEN, Clark W. (Orgs.).


Reassessing the Park Chung Hee Era, 1961-1979:
Development, Political Thought, Democracy, and Cultural
Influence. Seattle: University of Washington Press, 2011.
KIM, Jinwung. A History of Korea: From "Land of the
Morning Calm" to States in Conflict. Bloomington, Indiana:
Indiana University Press, 2012.

KIM, Kwang-Ok. “Colonial Body and Indigenous Soul:


Religion as a Contested Terrain of Culture” In: LEE, Hong
Yung; HA, Yong-Chool & SORENSEN, Clark W. (Orgs.).
Colonial Rule and Social Change in Korea, 1910-1945.
Seattle: University of Washington Press, 2013.

KIM, Sebastian C. H. Pyongin pakhae and Western


Imperial Aggression in Korea. In: BECKER, Judith & STANLEY,
Brian (Orgs.). Europe as the Other: External Perspectives on
European Christianity. Göttingen, Alemanha: Vandenhoeck &
Ruprecht Press, 2014.

KIRK, Donald & KIM, Kisam. Kim Dae-jung and the Quest
for the Nobel: How the President of South Korea Bought the
Peace Prize and Financed Kim Jong-il's Nuclear Program.
Nova York: Palgrave Macmillan, 2013.

KLEINER, Juergen. Korea: a Century of Change. Nova


Jersey, Londres, Cingapura & Hong Kong: World Scientific,
2001.

KOWNER, Rotem. Historical Dictionary of the Russo-


Japanese War. Lanham, Boulder, Londres & Nova York:
Rowman & Littlefield, 2017.

KWAK, Tae-Hwan Kwak & JOO, Seung-Ho. North Korea and


Security Cooperation in Northeast Asia. Londres & Nova
York: Routledge, 2016.

KWANG, Cho. The Choson Government´s Measures


Against Catholicism. In: YU, Chai-Shin (Org.). The Founding
of Catholic Tradition in Korea. Fremont, California: Asia
Humanities Press, 2004.

KWON, O-Jung. "The History of Lelang Commandery" In:


BYINGTON, Mark E. (Org.). The Han Commanderies in Early
Korean History. Cambridge: Harvard University Press, 2014.

LANKOV, Andrei Nikolaevich. From Stalin to Kim Il Song:


The Formation of North Korea, 1945-1960. Londres: Hurst &
Company, 2002.
LANKOV, Andrei. The Real North Korea: Life and Politics
in the Failed Stalinist Utopia. Oxford & Nova York: Oxford
University Press, 2013.

LEE, Ann Sung-Hi. Yi Kwang-su and Modern Literature:


Mujong (edição bilíngue). Ithaca, Nova York: Cornell
University, 2011.

LEE, Bong. The Unfinished War: Korea. Nova York: Algora


Publishing, 2003.

LEE, Chae-Jin. A Troubled Peace: U.S. Policy and the Two


Koreas. Baltimore, EUA: Johns Hopkins University Press,
2006.

LEE, Chong-Sik. “Historical Setting” In: SAVADA, Andrea


Matles & SHAW, William (Orgs.). South Korea: A Country
Study. Washington, D. C., EUA: DIANE Publishing, 1997.

LEE, Chong-Sik. “Historical Setting” In: SAVADA, Andrea


Matles & SHAW, William (Orgs.). South Korea: A Country
Study. Washington, D. C., EUA: DIANE Publishing, 1997.

LEE, E-Wha. Korea's Pastimes and Customs: A Social


History. Traduzido por Ju-Hee Park. Paramus, Nova Jersey:
Homa & Sekey Books, 2006.
LEE, Jongsoo James. The Partition of Korea After World
War II: A Global History. Nova York: Palgrave Macmilan,
2006.

LEE, Kenneth B. Korea and East Asia: The Story of a


Phoenix. Londres & Westport, Connecticut, EUA: Praeger,
1997.

LEE, Ki-baik. A New History of Korea. Cambridge,


Massachusetts, EUA: Harvard University Press, 1984.

LEE, Peter H. (Org.). Sourcebook of Korean Civilization:


Volume Two: From the Seventeenth Century to the Modern
Period. Nova York: Columbia University Press, 1996.

LEE, Peter H. “Hyangga” In: LEE, Peter H. (Org.). A


History of Korean Literature. Cambridge: Cambridge
University Press, 2009.

LEE, Peter H. Sourcebook of Korean Civilization: Volume


Two: From the Seventeenth Century to the Modern Period.
Nova York: Columbia University Press; Paris: Unesco, 2010.

LEE, Sang Taek. Religion and Social Formation in Korea:


Minjung and Millenarianism. Nova York & Berlim: Mouton de
Gruyter, 1996.

LEE, Soyoung; DAEHOE, Ahn; CHANG, Chin-Sung &


SOOMI, Lee. Diamond Mountains: Travel and Nostalgia in
Korean Art. New Haven & Londres: Yale University Press;
Nova York: The Metropolitan Museum of Art, 2018.

LEE, Young Jo. “Economy and Society: The Countryside”


In: KIM, Byong-Kook & VOGEL, Ezra F (Orgs.). The Park
Chung Hee Era. Cambridge, Massachussets & Londres:
Harvard University Press, 2011.

LEVINE, Amy. South Korean civil movement


organisations: Hope, crisis and pragmatism in democratic
transition. Oxford & Nova York: Oxford UNiversity Press,
2016.

LIM, Jae-Cheon. Kim Jong-il's Leadership of North Korea.


Londres & Nova York: Routledge, 2009.

LOPEZ JR., Donald S. et al. Hyecho's Journey: The World


of Buddhism. Londres & Chicago: University of Chicago
Press, 2017.

MACEDO, Emiliano Unzer. História do Japão: uma


introdução. San Bernadino, California: Amazon, 2017.

MATRAY, James I. Crisis in a Divided Korea: A Chronology


and Reference Guide: A Chronology and Reference Guide.
Santa Barbara, California: ABC-Clio, 2016.

MILLETT, Allan R. The Korean War: The Essential


Bibliography. Dulles, Virginia, EUA: Potomac Books, 2007.

MIN, Anselm K. (Org.). Korean Religions in Relation:


Buddhism, Confucianism, Christianity. Nova York: State
University of New York Press, 2016.

MOHAN, Pankaj. "The Controversy over the Ancient


Korean State of Gaya: A Fresh Look at the Korea–Japan
History War" In: LEWIS, Michael (Org.). ‘History Wars' and
Reconciliation in Japan and Korea: The Roles of Historians,
Artists and Activists. Nova York & Londres: Palgrave
Macmillan, 2016.
MOON, Chung-In. “The Sunshine Policy and the Korean
Summit: assessments and prospects“ In: AKAHA, Tsuneo
(Org.). The Future of North Korea. Nova York & Londres:
Routledge, 2002.

MOSSMAN, Billy C. Ebb and Flow: November 1950 – July


1951, United States Army in the Korean War. Washington, D.
C., EUA: Center of Military History, 1990.

NAHM, Andrew C. Korea: Tradition & Transformation: a


History of the Korean People. Seul: Hollym International,
1996.

ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND


DEVELOPMENT. Health at a Glance: OECD Indicators 2003.
Paris: OECD Publishing, 2003.

PALAIS, James B. Confucian Statecraft and Korean


Institutions: Yu Hyongwon and the Late Choson Dynasty.
Seattle & Londres: University of Washington Press, 2002.

PALAIS, James B. Politics and Policy in Traditional Korea.


Cambridge, Massachusetts, EUA & Londres: Harvard
University Press, 1991.

PARK, Seong-Rae. Science and Technology in Korean


History: Excursions, Innovations, and Issues. Fremont,
California, EUA: Jain Publishng, 2005.

PEARLMAN, Michael D. Truman and MacArthur: Policy,


Politics, and the Hunger for Honor and Renown. Bloomington
& Indianapolis, EUA: Indiana University Press, 2008, p. 203.

PETERSON, Mark. A Brief History of Korea. Nova York:


Infobase, 2010.
PINKSTON, Daniel A. “DPRK WMD Programs” In: KWAK,
Tae-Hwan & JOO, Seung-Ho (Orgs.). North Korea's Foreign
Policy Under Kim Jong Il: New Perspectives. Farnham, Reino
Unido: Ashgate Publishing., 2009.

PRATT, Keith & RUTT, Richard. Korea: a Historical and


Cultural Dictionary. Londres: Routledge, 1999.

REES, David. Korea: An Illustrated History - From Ancient


Times to 1945. Nova York: Hippocrene Books, 2001.

ROSSABI, Morris. "Muslim and Central Asian Revolts" In:


SPENCE, Jonathan D. & WILLS, John E. Jr. From Ming to
Ch'ing: Conquest, Region, and Continuity in Seventeenth-
Century China. New Haven & Londres: Yale University Press,
1979.

SANDLER, Stanley. The Korean War: An Encyclopedia.


Londres & Nova York: Routledge, 2013.

SCALAPINO, Robert A. & LEE, Chong-Sik. Communism in


Korea: The Society. Berkeley, Los Angeles & Lodres:
University of California Press, 1972.

SCHMID, Andre. Korea Between Empires, 1895-1919.


Nova York: Columbia University Press, 2002.

SEEKINS, Donald M. “The Society and Its Environment”.


In: SAVADA, Andrea Matles & SHAW, William (Orgs.). South
Korea: A Country Study. Washington, D. C., EUA: DIANE
Publishing, 1997.

SETH, Michael J. A Concise History of Modern Korea:


From the Late Nineteenth Century to the Present. Vol. 2.
Lanham, Maryland, EUA: Rowman & Littlefield, 2016.
SETH, Michael J. A Concise History of Modern Korea:
From the Late Nineteenth Century to the Present. Lanham,
EUA: Rowman & Littlefield, 2010.

SETH, Michael J. A History of Korea: From Antiquity to the


Present. Plymouth, Reino Unido: Rowman & Littlefield, 2010.

SETH, Michael J. North Korea. Londres: Palgrave, 2018.

SETH, Rasmussen. Igniting The Chemical Ring Of Fire:


Historical Evolution Of The Chemical Communities Of The
Pacific Rim. Nova Jersey & Londres: World Scientific, 2018.

SETTON, Mark. Chŏng Yagyong: Korea's Challenge to


Orthodox Neo-Confucianism. Nova York: State University of
New York Press, 1997.

SHARMA, Shalendra.The Asian Financial Crisis: Crisis,


Reform and Recovery. Manchester & Nova York: Manchester
University Press, 2003.

SHORT, John Rennie. Korea: A Cartographic History.


Chicago: University of Chicago Press, 2012.

SHULTZ, Edward J. Generals and Scholars: Military Rule


in Medieval Korea. Honolulu: University of Hawaii Press,
2000.

SIMONS, Geoff. Korea: The Search for Sovereignty. Nova


York: Palgrave Macmillan, 1995.

SOH, C. Sarah. The Comfort Women: Sexual Violence


and Postcolonial Memory in Korea and Japan. Chicago:
University of Chicago Press, 2008.
SUH, Dae-sook. Kim Il Sung: The North Korean Leader.
Nova York: Columbia University Press, 1995.

SUH, Jae-Jung. Truth and Reconciliation in South Korea:


Between the Present and Future of the Korean Wars. Londres
& Nova York: Routledge, 2013.

TUCKER, Spencer C. The Encyclopedia of the Vietnam


War: A Political, Social, and Military History: A Political,
Social, and Military History. Santa Barbara, California: ABC-
Clio, 2011.

TUDOR, Daniel. Korea: The Impossible Country: South


Korea's Amazing Rise from the Ashes - The Inside Story of
an Economic, Political and Cultural Phenomenon. Clarendon,
Vermont, EUA: Tuttle, 2012.

TURNBULL, Stephen. Samurai Invasion: Japan's Korean


War 1592–98. Londres: Cassell & Co, 2002.

TWINING, Daniel. “Strengthening the U.S.-Korea Alliance


for the 21st Century” In: BAE, Jung-Ho & DENMARK,
Abraham (Orgs.). The U.S.-ROK Alliance in the 21st Century.
Seul: Korea Institute for National Unification, 2009.

TZOU, Byron N. China and International Law: the


boundary disputes. Nova York: Praeger, 1990.

UCHIDA, Jun. “Between Collaboration and Conflict: State


and Society in Wartime Korea” In: KIMURA, Masato &
MINOHARA, Toshihiro. Tumultuous Decade: Empire, Society,
and Diplomacy in 1930s Japan. Toronto, Buffalo & Londres:
University of Toronto Press, 2013.

WARNER, Denis & WARNER, Peggy. The Tide at Sunrise:


A History of the Russo-Japanese War, 1904-1905. Londres &
Portland, Oregon, EUA: Frank Cass, 2002.
.
YAKYING, Jeong. The Analects of Dasan, Volume I: A
Korean Syncretic Reading, Traduzido e comentado por
Hongkyung Kim. Oxford: Oxford University Press, 2016.

YI, Pae-yong. Women in Korean History. Seul: Ewha


Womans University Press, 2008.

YI, T ʻ ae-jin. The Dynamics of Confucianism and


Modernization in Korean History. Ithaca, Nova York: Cornell
University Press, 2007.

YOON, Tae-Ryong. “Historical Overhang or Legacy is


What States Make of It: The Role of Realism and Morality in
Korea-Japan Relations” In: GANESAN, N. (Org.). Bilateral
Legacies in East and Southeast Asia. Cingapura: Institute of
Southeast Asian Studies, 2015.

YU, Chai-Shin. The New History of Korean Civilization.


Bloomington, Indiana, EUA: iUniverse, 2012.

ZACHMANN, Urs Matthias. China and Japan in the Late


Meiji Period: China Policy and the Japanese Discourse on
National Identity, 1895-1904. Londres & Nova York:
Routledge, 2010.

ZUNXIAN, Huang. Chaoxian celue: The Strategy for


Chosun. Seul: Kunkuk University Press, 1977.
SOBRE O AUTOR

Doutor em História Social pela FFLCH/ USP (2007), Mestre


em Postcolonial Politics pela University of Wales,
Aberystwyth, País de Gales, Reino Unido (2002) e graduado
em Relações Internacionais pela UnB (2000). É professor do
departamento de História da Universidade Federal do
Espírito Santo (Ufes) e tem vários artigos e publicações na
área de Ásia e África contemporânea.

[1] TUDOR, Daniel. Korea: The Impossible Country: South Korea's Amazing Rise
from the Ashes - The Inside Story of an Economic, Political and Cultural
Phenomenon. Clarendon, Vermont, EUA: Tuttle, 2012, p. 4; KIM, Chun-Kil. The
History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres: Greenwood Press, 2005,
p. 20; SETH, Rasmussen. Igniting The Chemical Ring Of Fire: Historical Evolution
Of The Chemical Communities Of The Pacific Rim. Nova Jersey & Londres: World
Scientific, 2018, p. 173.
[2] KWON, O-Jung. "The History of Lelang Commandery" In: BYINGTON, Mark E.
(Org.). The Han Commanderies in Early Korean History. Cambridge: Harvard
University Press, 2014, pp.96-98.
[3] JEON, Ho-tae. Koguryo, the Origin of Korean Power and Pride. Seoul:
Northeast History Foundation, 2007, pp. 25–27.
[4] KIM, Jinwung. A History of Korea: From "Land of the Morning Calm" to States
in Conflict. Bloomington, Indiana: Indiana University Press, 2012, pp. 35–36.
[5] CHOI, Jongtaik. “The Development of the Pottery Technologies of the Korean
Peninsula and their Relationship to Neighboring Regions” In: BYINGTON, M. E.
(Org.). Early Korea 1: Reconsidering Early Korean History through Archaeology.
Seul: Korea Institute, Harvard University Press, 2008, pp. 157, 176-187.
[6] FARRIS, William Wayne. Sacred Texts and Buried Treasures: Issues in the
Historical Archaeology of Ancient Japan. Honolulu: University of Hawaii Press,
1998, pp. 67, 109; KIM, Jinwung, A History of Korea: From 'Land of the Morning
Calm' to States in Conflict. Bloomington: Indiana University Press, 2012, p. 74.

[7] LEE, Peter H. “Hyangga” In: LEE, Peter H. (Org.). A History of Korean
Literature. Cambridge: Cambridge University Press, 2009, p. 73.
[8] Escola budista que tem como seus princípios básicos a superação das
insatisfações mundanas (dukkha) e o transcendimento do círculo vicioso do
sofrimento e renascimentos (samsara), objetivando a todos a alcançar o estado
da iluminação (nirvana).
[9] LOPEZ JR., Donald S. et al. Hyecho's Journey: The World of Buddhism. Londres
& Chicago: University of Chicago Press, 2017, p. 62.

[10] KIM, Duk-Whang. A History of Religions in Korea. Seul: Daeji Moonwha-sa,


1988, p. 118.
[11] YU, Chai-Shin. The New History of Korean Civilization. Bloomington, Indiana,
EUA: iUniverse, 2012, p. 40.
[12] Influente monge budista à época que defendia a localização auspiciosas
das cidades, casas, templos e cemitérios, conforme a geomancia budista, ou
pungsu.
[13] PRATT, Keith & RUTT, Richard. Korea: a Historical and Cultural Dictionary.
Londres: Routledge, 1999, p. 466.

[14] DUK-KYU, Jin. Historical Origins of Korean Politics. Seul: Jisik Sanup
Publications, 2005, p. 261.
[15] SHULTZ, Edward J. Generals and Scholars: Military Rule in Medieval Korea.
Honolulu: University of Hawaii Press, 2000, p. 4.
[16] BREUKER, R. Establishing a Pluralist Society in Medieval Korea, 918–1170:
History, Ideology and Identity in the Koryŏ Dynasty. Leiden: Brill, 2010, pp. 407 –
447.
[17] SHULTZ, Edward J. Generals and Scholars: Military Rule in Medieval Korea.
Honolulu: University of Hawaii Press, 2000, pp. 121-123.
[18] KIM, Hunggyu. Understanding Korean Literature.Traduzido por Robert J.
Fraser. Londres & Armonk, Nova York: M. E. Sharpe, 1997, p. 89.
[19] MACEDO, Emiliano Unzer. História do Japão: uma introdução. San
Bernadino, California: Amazon, 2017, pp. 68 – 70.

[20] A primeira expedição dirigiu-se principalmente à ilha meridional japonesa


de Kyushu em novembro de 1274. A segunda expedição foi planejada em várias
frentes a serem desdobradas em momento posterior, mas foram obstruídas por
surtos de doenças e fortes ventos nos mares no mês de agosto. Acredita-se que
na primeira expedição foram mobilizados em torno de 15 mil homens mongóis e
chineses e 8 mil coreanos, além de 300 navios de grande porte e mais de 500
menores. YOON, Tae-Ryong. “Historical Overhang or Legacy is What States Make
of It: The Role of Realism and Morality in Korea-Japan Relations” In: GANESAN, N.
(Org.). Bilateral Legacies in East and Southeast Asia. Cingapura: Institute of
Southeast Asian Studies, 2015, pp. 25 – 26.
[21] PARK, Seong-Rae. Science and Technology in Korean History: Excursions,
Innovations, and Issues. Fremont, California, EUA: Jain Publishng, 2005 , p. 82-
85.
[22] YU, Chai-Shin. The New History of Korean Civilization. Bloomington, Indiana,
EUA: iUniverse, 2012, p. 102.
[23] LEE, Peter H. (Org.). Sourcebook of Korean Civilization: Volume Two: From
the Seventeenth Century to the Modern Period. Nova York: Columbia University
Press, 1996, p. 326.
[24] CHOY, Bong-youn. Korea: a history. Rutland, Vermont, EUA & Tóquio: Charles
E. Tuttle, 1971, p. 71.
[25] GRAYSON, James Huntley. Korea: a Religious History. Londres: Routledge
Curzon, 2002, p. 107.
[26] PETERSON, Mark. A Brief History of Korea. Nova York: Infobase, 2010, p. 79.

[27] HAN, Jongwoo. Power, Place, and State-Society Relations in Korea: Neo-
Confucian and Geomantic Reconstruction of Developmental State and
Democratization. Plymouth, Reino Unido: Lexington, 2013, p. 139.
[28] Conjunto de ideias a ser materializado no espaço que busca o equilíbrio (tal
como o yin-yang) e influências positivas da ordem da natureza e do cosmos.

[29] PRATT, Keith & RUTT, Richard. Korea: a historical and cultural dictionary.
Londres & Nova York: Routledge, 1999, p. 255.
[30] HWANG, Kyung Moon. A History of Korea. Nova York: Palgrave, 2017, p. 65.

[31] TURNBULL, Stephen. Samurai Invasion: Japan's Korean War 1592–98.


Londres: Cassell & Co, 2002, p. 48.

[32] MACEDO, Emiliano Unzer. História do Japão: uma introdução. San


Bernadino, California: Amazon, 2017, p. 83.
[33] TURNBULL, Stephen. Samurai Invasion: Japan's Korean War 1592–98.
Londres: Cassell & Co, 2002, pp. 72- 73.
[34] HWANG, Kyung Moon. A History of Korea. Nova York: Palgrave, 2017, pp. 68
– 71.
[35] PRATT, Keith & RUTT, Richard. Korea: a historical and cultural dictionary.
Londres & Nova York: Routledge, 1999, pp. 350 – 351.
[36] DEAL, William E. Handbook to Life in Medieval and Early Modern Japan.
Nova York: Infobase, 2006, p. 299.
[37] HOARE, James & PARES, Susan. Korea: an introduction. Londres & Nova
York: Routledge, 1988, p. 143.

[38] ROSSABI, Morris. "Muslim and Central Asian Revolts" In: SPENCE, Jonathan
D. & WILLS, John E. Jr. From Ming to Ch'ing: Conquest, Region, and Continuity in
Seventeenth-Century China. New Haven & Londres: Yale University Press, 1979,
pp. 191 - 192.
[39] CHAN, Robert Kong. Korea-China Relations in History and Contemporary
Implications. Hong Kong: Palgrave Macmillan, 2018, pp. 105 – 106.
[40] MACEDO, Emiliano Unzer. História do Japão: uma introdução. San
Bernadino, California: Amazon, 2017, pp. 100 – 101.
[41] KANG, Etsuko Hae-Jin. Diplomacy and Ideology in Japanese-Korean
Relations: From the Fifteenth to the Eighteenth Century. Nova York & Londres:
Macmillan Press, 1997, pp. 138-145.

[42] SHORT, John Rennie. Korea: A Cartographic History. Chicago: University of


Chicago Press, 2012, p. 58.
[43] YI, Pae-yong. Women in Korean History. Seul: Ewha Womans University
Press, 2008, pp. 25 -28.
[44] KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres:
Greenwood Press, 2005, pp. 87 - 89.
[45] SETH, Michael J. A History of Korea: From Antiquity to the Present. Plymouth,
Reino Unido: Rowman & Littlefield, 2010, p. 162.
[46] KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres:
Greenwood Press, 2005, pp. 89-90.
[47] LEE, Ki-baik. A New History of Korea. Cambridge, Massachusetts, EUA:
Harvard University Press, 1984, pp. 217 – 218.
[48] HYEGYONG. The Memoirs of Lady Hyegyong: The Autobiographical Writings
of a Crown Princess of Eighteenth-Century Korea. Organizado e traduzido por
JaHyun Kim Haboush. Berkeley, Los Angeles & Londres: University of California
Press, 2013, p. 220.
[49] Ibidem, pp. 335-337.

[50] KANG, Jae-eun. The Land of Scholars: Two Thousand Years of Korean
Confucianism. Traduzido por Suzanne Lee. Paramus, Nova Jersey: Homa & Sekey
Books, 2003, pp. 378 – 380.
[51] YAKYING, Jeong. The Analects of Dasan, Volume I: A Korean Syncretic
Reading, Traduzido e comentado por Hongkyung Kim. Oxford: Oxford University
Press, 2016, pp. 9 -10.

[52] SETTON, Mark. Chŏng Yagyong: Korea's Challenge to Orthodox Neo-


Confucianism. Nova York: State University of New York Press, 1997, pp. 60-61.
[53] PALAIS, James B. Confucian Statecraft and Korean Institutions: Yu Hyongwon
and the Late Choson Dynasty. Seattle & Londres: University of Washington Press,
2002, pp. 809 – 811.
[54] KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres:
Greenwood Press, 2005, p. 95.

[55] MIN, Anselm K. (Org.). Korean Religions in Relation: Buddhism,


Confucianism, Christianity. Nova York: State University of New York Press, 2016,
pp. 96 – 97.
[56] SETH, Michael J. A History of Korea: From Antiquity to the Present. Plymouth,
Reino Unido: Rowman & Littlefield, 2010, pp. 157 – 158.
[57] PALAIS, James B. Politics and Policy in Traditional Korea. Cambridge,
Massachusetts, EUA & Londres: Harvard University Press, 1991, p. 307.
[58] HABOUSH, JaHyun Kim & DEUCHLE, Martina (Orgs.) Culture and the State in
Late Choson Korea. Cambridge, Massachusetts, EUA & Londres: Harvard
University Press, 1999, p. 54.

[59] HWANG, Kyung Moon. A History of Korea. Nova York: Palgrave, 2017, p. 95.

[60] Ibidem, pp. 95 – 96.

[61] LEE, Soyoung; DAEHOE, Ahn; CHANG, Chin-Sung & SOOMI, Lee. Diamond
Mountains: Travel and Nostalgia in Korean Art. New Haven & Londres: Yale
University Press; Nova York: The Metropolitan Museum of Art, 2018, pp. 13 - 42.
[62] LEE, E-Wha. Korea's Pastimes and Customs: A Social History. Traduzido por
Ju-Hee Park. Paramus, Nova Jersey: Homa & Sekey Books, 2006, pp. 197, 246.
[63] TZOU, Byron N. China and International Law: the boundary disputes. Nova
York: Praeger, 1990, p. 47.
[64] CHOI, Jai-Keun. The Origin of the Roman Catholic Church in Korea: An
Examination of Popular and Governmental Responses to Catholic Missions in the
Late Chosôn Dynasty. Seul: The Hermit Kingdom Press, 2006, pp. 9 – 14.
[65] Muito dessa curiosidade inicial coreana adveio das obras traduzidas do
jesuíta atuante e influente na corte chinesa, Matteo Ricci (1552 – 1610), na sua
obra “A Verdadeira Noção de Deus” ( ), publicado em Pequim em 1603 e
traduzido à época para várias línguas asiáticas.

[66] KWANG, Cho. The Choson Government´s Measures Against Catholicism. In:
YU, Chai-Shin (Org.). The Founding of Catholic Tradition in Korea. Fremont,
California: Asia Humanities Press, 2004, p. 105
[67] GRAYSON, James Huntley. Korea: a Religious History. Londres: Routledge
Curzon, 2002, p. 143.
[68] LEE, Sang Taek. Religion and Social Formation in Korea: Minjung and
Millenarianism. Nova York & Berlim: Mouton de Gruyter, 1996, pp. 80 – 81.
[69] SETH, Michael J. A History of Korea: From Antiquity to the Present. Plymouth,
Reino Unido: Rowman & Littlefield, 2010, p. 20.
[70] MATRAY, James I. Crisis in a Divided Korea: A Chronology and Reference
Guide. Santa Barbara, California: ABC Clio, 2016, p. 26.
[71] Essas estelas são conhecidas como “Estelas de Rejeição à Reconciliação”
(chokhwapi) e foram depois retiradas em 1882 após os acordos assianados com
governos ocidentais.
KIM, Sebastian C. H. Pyongin pakhae and Western Imperial Aggression in Korea.
In: BECKER, Judith & STANLEY, Brian (Orgs.). Europe as the Other: External
Perspectives on European Christianity. Göttingen, Alemanha: Vandenhoeck &
Ruprecht Press, 2014, p. 73.

[72] CHOI, Jai-Keun. The Origin of the Roman Catholic Church in Korea: An
Examination of Popular and Governmental Responses to Catholic Missions in the
Late Chosôn Dynasty. Seul: The Hermit Kingdom Press, 2006, p. 218.
[73] KANG, Jae-eun. The Land of Scholars: Two Thousand Years of Korean
Confucianism. Traduzido por Suzanne Lee. Paramus, Nova Jersey: Homa & Sekey
Books, 2003, p. 432.
[74] YI, Pae-yong. Women in Korean History. Seul: Ewha Womans University
Press, 2008, p. 189.
[75] Para acesso à versão original em chinês, ver: ZUNXIAN, Huang. Chaoxian
celue: The Strategy for Chosun. Seul: Kunkuk University Press, 1977, p. 47.

[76] HWAK, Tae-Hwan. U.S.-Korean relations, 1882-1982. Seul: Kyungnam


University Press, 1982, pp. 19-20.
[77] LEE, Kenneth B. Korea and East Asia: The Story of a Phoenix. Londres &
Westport, Connecticut, EUA: Praeger, 1997, p. 127.
[78] LEE, Peter H. Sourcebook of Korean Civilization: Volume Two: From the
Seventeenth Century to the Modern Period. Nova York: Columbia University
Press; Paris: Unesco, 2010, p. 347.
[79] YI, Tʻae-jin. The Dynamics of Confucianism and Modernization in Korean
History. Ithaca, Nova York: Cornell University Press, 2007, pp. 358-359
[80] LEE, Peter H. Sourcebook of Korean Civilization: Volume Two: From the
Seventeenth Century to the Modern Period. Nova York: Columbia University
Press; Paris: Unesco, 2010, p. 348.
[81] BUCKELY, Patricia & WALTHALL, Anne. East Asia: A Cultural, Social, and
Political History. Boston: Wadsworth, 2013, p. 376.

[82] AMES, Roger T. & ROSEMONT JR., Henry. The Analects of Confucius: A
Philosophical Translation. Nova York: Random House, 1999, pp. 46 – 48.
[83] FLAHERTY, Robert Pearson. “Korean Millenial Movements” In: WESSINGER,
Catherine (Org.). The Oxford Handbook of Millennialism. Oxford & Nova York:
Oxford University Press, 2011, p. 332.
[84] ZACHMANN, Urs Matthias. China and Japan in the Late Meiji Period: China
Policy and the Japanese Discourse on National Identity, 1895-1904. Londres &
Nova York: Routledge, 2010, pp. 31 – 32.
[85] LEE, Kenneth B. Korea and East Asia: The Story of a Phoenix. Londres &
Westport, Connecticut, EUA: Praeger, 1997, p. 133.
[86] KOWNER, Rotem. Historical Dictionary of the Russo-Japanese War. Lanham,
Boulder, Londres & Nova York: Rowman & Littlefield, 2017, p. 614.
[87] SCHMID, Andre. Korea Between Empires, 1895-1919. Nova York: Columbia
University Press, 2002, p. 51.
[88] PRATT, Keith & RUTT, Richard. Korea: a Historical and Cultural Dictionary.
Londres: Routledge, 1999, p. 178.
[89] NAHM, Andrew C. Korea: Tradition & Transformation: a History of the Korean
People. Seul: Hollym International, 1996, p. 195.
[90] WARNER, Denis & WARNER, Peggy. The Tide at Sunrise: A History of the
Russo-Japanese War, 1904-1905. Londres & Portland, Oregon, EUA: Frank Cass,
2002, p. 152.
[91] FORCZYK, Robert. Russian Battleship vs Japanese Battleship: Yellow Sea
1904–05. Londres: Bloomsbury Publishing, 2013, pp. 57-71.
[92] ECKERT, Carter J.; LEE, Ki-baik; LEW, Young Ick; ROBINSON, Michael &
WAGNER, Edward W. Korea Old and New: A History. Seul: Ilchokak, 1990, p. 245.

[93] FUCHS, Eckhardt; KASAHARA, Tokushi & SAALER, Sven (Orgs.). A New
Modern History of East Asia, vol. 1. Göttingen, Alemanha: V & R Academic, 2018,
p. 341.
[94] Considerando a união dos dois países nos termos de serem uma única
família (ilhan ilga), conforme postula a tradição confucionista. CAPRIO, Mark E.
Japanese Assimilation Policies in Colonial Korea, 1910-1945. Seattle: University
of Washington Press, 2011, p. 185.
[95] CHUNG, Young-Iob. Korea Under Siege, 1876-1945: Capital Formation and
Economic Transformation. Oxford & Nova York: Oxford University Press, 2006,
pp. 162 – 163.

[96] CAPRIO, Mark E. Japanese Assimilation Policies in Colonial Korea, 1910-


1945. Seattle: University of Washington Press, 2011, pp. 105 – 106.
[97] REES, David. Korea: An Illustrated History - From Ancient Times to 1945.
Nova York: Hippocrene Books, 2001, p. 121.
[98] KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres:
Greenwood Press, 2005, p. 130.
[99] FUCHS, Eckhardt; KASAHARA, Tokushi & SAALER, Sven (Orgs.). A New
Modern History of East Asia, vol. 1. Göttingen, Alemanha: V & R Academic, 2018,
p. 288.
[100] Como no caso de uma suposta aliança entre o reino coreano de Minama
(Imna em coreano), que as crônicas japonesas como o Nihongi atestam terem
concordado em ser submeter aos japoneses entre os séculos 3 e 6. O argumento
foi depois usado como justificativa histórica para a intervenção nipônica sobre a
península. Estudos arqueológicos coreanos em tempos recetes não encontram
respaldo desse acordo feito, remetendo o suposto fato para colonos coreanos de
Minama que se estabeleceram no arquipélago japonês na região de Oita, em
Kyushu.
MOHAN, Pankaj. "The Controversy over the Ancient Korean State of Gaya: A
Fresh Look at the Korea–Japan History War" In: LEWIS, Michael (Org.). ‘History
Wars' and Reconciliation in Japan and Korea: The Roles of Historians, Artists and
Activists. Nova York & Londres: Palgrave Macmillan, 2016, pp. 108 – 109.

[101] LEE, Ann Sung-Hi. Yi Kwang-su and Modern Literature: Mujong (edição
bilíngue). Ithaca, Nova York: Cornell University, 2011.
[102] KIM, Dong Hoon. Eclipsed Cinema: The Film Culture of Colonial Korea.
Edimburgo: Edinburgh University Press, 2017, p. 71.
[103] HOARE, James E. Historical Dictionary of Democratic People's Republic of
Korea. Plymouth, Reino Unido: Scarecrow, 2012, p. 307.
[104] UCHIDA, Jun. “Between Collaboration and Conflict: State and Society in
Wartime Korea” In: KIMURA, Masato & MINOHARA, Toshihiro. Tumultuous Decade:
Empire, Society, and Diplomacy in 1930s Japan. Toronto, Buffalo & Londres:
University of Toronto Press, 2013, p. 147.

[105] SETH, Michael J. A Concise History of Modern Korea: From the Late
Nineteenth Century to the Present. Vol. 2. Lanham, Maryland, EUA: Rowman &
Littlefield, 2016, pp. 80 - 81.
[106] KIM, Kwang-Ok. “Colonial Body and Indigenous Soul: Religion as a
Contested Terrain of Culture” In: LEE, Hong Yung; HA, Yong-Chool & SORENSEN,
Clark W. (Orgs.). Colonial Rule and Social Change in Korea, 1910-1945. Seattle:
University of Washington Press, 2013, p. 288.
[107] HOLCOMBE, Charles. A History of East Asia: From the Origins of Civilization
to the Twenty-First Century. Cambridge: Cambridge University Press, 2017, p.
277.
[108] HAN, Yong-sup. “The May Sixteenth Military Coup” In: KIM, Byong-Kook &
VOGEL, Ezra F (Orgs.). The Park Chung Hee Era. Cambridge, Massachussets &
Londres: Harvard University Press, 2011, p. 44.
[109] SOH, C. Sarah. The Comfort Women: Sexual Violence and Postcolonial
Memory in Korea and Japan. Chicago: University of Chicago Press, 2008, pp. 18 –
19.
[110] FUCHS, Eckhardt; KASAHARA, Tokushi & SAALER, Sven (Orgs.). A New
Modern History of East Asia, vol. 1. Göttingen, Alemanha: V & R Academic, 2018,
p. 330.
[111] SCALAPINO, Robert A. & LEE, Chong-Sik. Communism in Korea: The
Society. Londres & Berkeley, California: University of California Press, 1972, p.
921.
[112] KIM, Choong Soon & KIM, Song-su. A Korean Nationalist Entrepreneur: A
Life History of Kim Songsu, 1891–1955. Nova York: State University of New York
Press, 1998, p. 129.
[113] LANKOV, Andrei Nikolaevich. From Stalin to Kim Il Song: The Formation of
North Korea, 1945-1960. Londres: Hurst & Company, 2002, pp. 10 – 12.
[114] HWANG, Kyung Moon. A History of Korea: An Episodic Narrative.
Basingstoke, Reino Unido: Palgrave Macmillan, 2010, p. 197.
[115] KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres:
Greenwood Press, 2005, pp. 167 – 168.
[116] Ibidem, p. 168.

[117] KLEINER, Juergen. Korea: a Century of Change. Nova Jersey, Londres,


Cingapura & Hong Kong: World Scientific, 2001, p. 275.
[118] LEE, Jongsoo James. The Partition of Korea After World War II: A Global
History. Nova York: Palgrave Macmilan, 2006, pp. 160 – 161.
[119] SCALAPINO, Robert A. & LEE, Chong-Sik. Communism in Korea: The
Society. Berkeley, Los Angeles & Lodres: University of California Press, 1972, pp.
281-282, 287 – 291.
[120] LANKOV, Andrei. From Stalin to Kim Il Song. Londres: Hurst & Co., 2002, p.
23.
[121] Tese desenvolvida por Nikolai Bukahrin em 1925 que depois foi adotada
como política de Estado por Josef Stalin.
[122] Apesar deste último ter perdido no ataque a vida de seus filhos e um
sacerdote visitante na sua residência. SIMONS, Geoff. Korea: The Search for
Sovereignty. Nova York: Palgrave Macmillan, 1995, p. 178.
[123] SEEKINS, Donald M. “The Society and Its Environment”. In: SAVADA,
Andrea Matles & SHAW, William (Orgs.). South Korea: A Country Study.
Washington, D. C., EUA: DIANE Publishing, 1997, p. 95.
[124] MATRAY, James I. Crisis in a Divided Korea: A Chronology and Reference
Guide: A Chronology and Reference Guide. Santa Barbara, California: ABC-Clio,
2016, p. 286.
[125] KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres:
Greenwood Press, 2005, p. 151.
[126] HENDERSON, Gregory; LEBOW, Richard Ned & STOESSINGER, John George.
Divided Nations in a Divided World. Filadélfia, Pensilvânia, EUA: David McKay
Co., 1974, p. 55.
[127] KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres:
Greenwood Press, 2005, p. 151.
[128] PRATT, Keith & RUTT, Richard. Korea: a Historical and Cultural Dictionary.
Londres: Routledge, 1999, pp. 234 – 235.
[129] BUCKELY, Patricia & WALTHALL, Anne. East Asia: A Cultural, Social, and
Political History. Boston: Wadsworth, 2013, p. 491.
[130] GORDENKER, Leon Gordenker. The United Nations and the Peaceful
Unification of Korea: The Politics of Field Operations, 1947–1950. Haia: Martinus
Nijhoff, 1959, pp. 49, 112.

[131] BEISNER, Robert L. Dean Acheson: A Life in the Cold War. Oxford & Nova
York: Oxford University Press, 2006, p. 326.
[132] KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres:
Greenwood Press, 2005, p. 155.
[133] LEE, Chong-Sik. “Historical Setting” In: SAVADA, Andrea Matles & SHAW,
William (Orgs.). South Korea: A Country Study. Washington, D. C., EUA: DIANE
Publishing, 1997, p. 32.
[134] MILLETT, Allan R. The Korean War: The Essential Bibliography. Dulles,
Virginia, EUA: Potomac Books, 2007, pp. 17-20.
[135] BOOSE, Donald W. Over the Beach: US Army Amphibious Operations in the
Korean War. Fort Leavenworth, Kansas, EUA: Combat Studies Institute Press,
2008, pp. 176 – 178.
[136] HALBERSTAM, David. The Coldest Winter: America and the Korean War.
Nova York: Hyperion, 2007, pp. 354-356.

[137] SANDLER, Stanley. The Korean War: An Encyclopedia. Londres & Nova
York: Routledge, 2013, p. 212.
[138] MOSSMAN, Billy C. Ebb and Flow: November 1950 – July 1951, United
States Army in the Korean War. Washington, D. C., EUA: Center of Military
History, 1990, p. 192.
[139] PEARLMAN, Michael D. Truman and MacArthur: Policy, Politics, and the
Hunger for Honor and Renown. Bloomington & Indianapolis, EUA: Indiana
University Press, 2008, p. 203.
[140] DEANE, Hugh. The Korean War 1945-1953. San Francisco, EUA: China
Books, 1999, p. 190.

[141] KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres:
Greenwood Press, 2005, p. 157.
[142] KATSIAFICAS, George. Asia's Unknown Uprisings: South Korean Social
Movements in the 20th Century. Oakland, California, EUA: PM Press, 2012, pp.
131 – 133.
[143] LANKOV, Andrei. The Real North Korea. Oxford & Nova York: Oxford
University Press, 2013, pp. 13 -14.
[144] SUH, Dae-Sook. Kim Il Sung: The North Korean Leader. Nova York:
Columbia University Press, 1988, p. 136.

[145] ADRIAN, Buzo. The Guerilla Dynasty: Politics and Leadership in North
Korea. Londres & Nova York: I.B. Tauris, 1999, p. 138.
[146] LEE, Young Jo. “Economy and Society: The Countryside” In: KIM, Byong-
Kook & VOGEL, Ezra F (Orgs.). The Park Chung Hee Era. Cambridge,
Massachussets & Londres: Harvard University Press, 2011, pp. 353 – 360.
[147] SUH, Dae-sook. Kim Il Sung: The North Korean Leader. Nova York:
Columbia University Press, 1995, p. 169.

[148] KIM, Hyung-A & SORENSEN, Clark W. (Orgs.). Reassessing the Park Chung
Hee Era, 1961-1979: Development, Political Thought, Democracy, and Cultural
Influence. Seattle: University of Washington Press, 2011, pp. 5 – 6.
[149] Ibidem, p. 48.

[150] TUCKER, Spencer C. The Encyclopedia of the Vietnam War: A Political,


Social, and Military History: A Political, Social, and Military History. Santa
Barbara, California: ABC-Clio, 2011, pp. 1703 – 1704.

[151] LEE, Chong-Sik. “Historical Setting” In: SAVADA, Andrea Matles & SHAW,
William (Orgs.). South Korea: A Country Study. Washington, D. C., EUA: DIANE
Publishing, 1997, pp. 39 – 40.
[152] LIM, Jae-Cheon. Kim Jong-il's Leadership of North Korea. Londres & Nova
York: Routledge, 2009, p. 37.
[153] Ibidem, p. 46.
[154] KIRK, Donald & KIM, Kisam. Kim Dae-jung and the Quest for the Nobel:
How the President of South Korea Bought the Peace Prize and Financed Kim
Jong-il's Nuclear Program. Nova York: Palgrave Macmillan, 2013, p. 143.
[155] KIM, Hyung-A & SORENSEN, Clark W. (Orgs.). Reassessing the Park Chung
Hee Era, 1961-1979: Development, Political Thought, Democracy, and Cultural
Influence. Seattle: University of Washington Press, 2011, p. 5.

[156] HWANG, Kyung Moon. A History of Korea. Londres: Macmillan, 2010, pp.
236-237.
[157] LEE, Chae-Jin. A Troubled Peace: U.S. Policy and the Two Koreas. Baltimore,
EUA: Johns Hopkins University Press, 2006, p. 95.
[158] SETH, Michael J. A Concise History of Modern Korea: From the Late
Nineteenth Century to the Present. Lanham, EUA: Rowman & Littlefield, 2010, p.
187.
[159] KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres:
Greenwood Press, 2005, p. 169.
[160] LANKOV, Andrei. The Real North Korea: Life and Politics in the Failed
Stalinist Utopia. Oxford & Nova York: Oxford University Press, 2013, pp. 77 - 80.
[161] SETH, Michael J. North Korea. Londres: Palgrave, 2018, p. 156.

[162] SUH, Jae-Jung. Truth and Reconciliation in South Korea: Between the
Present and Future of the Korean Wars. Londres & Nova York: Routledge, 2013,
p. 136.
[163] KIM, Chun-Kil. The History of Korea. Westport, Connecticut, EUA & Londres:
Greenwood Press, 2005, p. 172.
[164] MOON, Chung-In. “The Sunshine Policy and the Korean Summit:
assessments and prospects“ In: AKAHA, Tsuneo (Org.). The Future of North
Korea. Nova York & Londres: Routledge, 2002, p. 37.
[165] HEO, Uk & ROEHRIG, Terence. South Korea Since 1980. Nova York:
Cambridge University Press, 2010, pp. 131 – 132.
[166] KIHL, Young Whan. Transforming Korean Politics: Democracy, Reform, and
Culture: Democracy, Reform, and Culture. Londres & Nova York: Routledge,
2015, p. 360.
[167] ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT.
Health at a Glance: OECD Indicators 2003. Paris: OECD Publishing, 2003, p. 84.
[168] LEE, Bong. The Unfinished War: Korea. Nova York: Algora Publishing, 2003,
p. 263.
[169] HAGGARD, Stephan & NOLAND, Marcus. Famine in North Korea: Markets,
Aid, and Reform. Nova York: Columbia University Press, 2009, pp. 130 – 133.

[170] SHARMA, Shalendra.The Asian Financial Crisis: Crisis, Reform and


Recovery. Manchester & Nova York: Manchester University Press, 2003, p. 219.
[171] TWINING, Daniel. “Strengthening the U.S.-Korea Alliance for the 21st
Century” In: BAE, Jung-Ho & DENMARK, Abraham (Orgs.). The U.S.-ROK Alliance
in the 21st Century. Seul: Korea Institute for National Unification, 2009, p. 319.
[172] LEVINE, Amy. South Korean civil movement organisations: Hope, crisis and
pragmatism in democratic transition. Oxford & Nova York: Oxford UNiversity
Press, 2016, p. 34.
[173] PINKSTON, Daniel A. “DPRK WMD Programs” In: KWAK, Tae-Hwan & JOO,
Seung-Ho (Orgs.). North Korea's Foreign Policy Under Kim Jong Il: New
Perspectives. Farnham, Reino Unido: Ashgate Publishing., 2009, p. 105.

[174] KWAK, Tae-Hwan Kwak & JOO, Seung-Ho. North Korea and Security
Cooperation in Northeast Asia. Londres & Nova York: Routledge, 2016, pp. 159 –
160.

Você também pode gostar