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Conceitualização Cognitiva

Elementos da Conceitualização

Profa. Dra. Angela Donato Oliva


Aula 03
Elementos da
Conceitualização - Parte 1
TÓPICOS

01. A metáfora do cadinho


02. Três pilares da conceitualização.
03. Pilar do empirismo colaborativo
01. Metáfora do cadinho para
entender a Conceitualização
A conceitualização é um processo relacional, mas depende em grande parte das habilidades do
terapeuta (J. Beck, 2007).

Empirismo colaborativo* é central para a relação terapêutica, juntamente com a descoberta


guiada, o questionamento socrático e a curiosidade investigativa.

*processo em que terapeuta e cliente trabalham (com metas) para integrar informações a
um modelo compreensão e mudança.

A metáfora do "cadinho (crucible) de conceituação" (Kuyken et al., 2010) integra a teoria da


TCC, a pesquisa e os dados da experiência do cliente para promover a mudança.

Pensamentos, emoção e comportamento, fornecem a base material para as primeiras


hipóteses que vão sendo avaliadas constantemente.

(Easden & Kazantzis, 2017)


Novo enfoque de conceitualização.

“Mistura” a teoria e pesquisa (aspectos


relevantes da TCC) com a história e a
experiência da pessoa para produzir uma
descrição e uma explicação dos problemas do
cliente de maneira específica ao caso.

O processo desafiador de combinar aspectos


nomotéticos (teoria e pesquisa sobre a
população) e idiográficos (a experiência
particular de uma pessoa).

Fonte: Pixabay, 2021.


O “cadinho” é onde a teoria, a pesquisa e as experiências
do cliente são integradas para formar um entendimento
específico das dificuldades do cliente.
É o ajuste do modelo teórico ao problema do cliente.

Envolve identificar uma estrutura teórica capaz de


refletir a lógica do funcionamento psicológico do
cliente que apresenta o problema/dificuldade.

A meta da conceitualização é indicar caminhos


duradouros de mudança.

Fonte: Pixabay, 2021.


2. Três pilares que
estruturam a conceitualização
Os terapeutas de TCC precisam balancear os elementos
da conceptualização de caso:

A conceituação é uma ferramenta que


possivelmente melhora a atuação prática de
TCC. e
m f
n
Ajuda a descrever e a explicar (aquilo que os p o
í
i r
clientes apresentam) em um formato teórico v
r ç
conceitual que faça sentido e seja coerente, e
i a
de modo a levar a intervenções eficazes. i
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s
m
É o que leva da avaliação à intervenção o
terapêutica.

É a construção de uma teoria idiográfica a


partir de uma teoria nomotética (geral).
Fonte: iStock, 2021
03. Pilar do Empirismo Colaborativo
01. Empirismo Colaborativo (terapeuta “traz” o cliente para o processo)

Colocar os ingredientes no cadinho é fundamental, mas a química só acontece se o


cadinho for aquecido com o calor do “empirismo colaborativo”. O empirismo
colaborativo é o catalisador que vai integrar/acoplar/amalgamar/ajustar a teoria da
TCC e a experiência narrada pelo cliente.

A conceitualização é efetiva se for elaborada pelo terapeuta e pelo cliente


colaborativamente.

Erro: O cliente pode se encantar com o personagem visto pelos óculos e


enquadramentos do terapeuta quando este faz sozinho o processo.

Terapeutas conhecem a teoria e as pesquisas mais relevantes e que servem para


explicar os problemas dos clientes.
Clientes fornecem informação essencial para que um panorama claro seja elaborado e
um caminho/alvo seja alcançado.
O empirismo serve para que as melhores evidências disponíveis sejam utilizadas.
02. Empirismo Colaborativo (processo de co-construção)

A conceitualização é construída progressivamente, vai sendo revista. Informações são


acrescentadas, eventos são enfatizados, relatos vão ficando mais precisos ou alguns
eliminados, novas conexões são descobertas a partir dos relatos da experiência do
cliente.

A conceitualização começa com descrições iniciais (das dificuldades atuais) até


identificar os fatores desencadeantes e os fatores que mantêm essas dificuldades,
incluindo fatores da história que poderiam ajudar a explicar os problemas atuais.

Quando a conceitualização alcança patamares mais inferenciais podem ser feitas


conjecturas sobre fatores predisponentes (aspectos genéticos) ou fatores protetores
(familiares que dão apoio).
03. Empirismo Colaborativo (diagrama de conceitualização)

➢ Ação clínica: construir um diagrama de conceitualização


em colaboração com o cliente.

❖ Características do diagrama:

✓ Seja fácil de ser visualizado;


✓ Contemple os princípios (teóricos) considerados mais Fonte: iStock, 2021

importantes;
✓ Ajude a “retratar” as características gerais ou específicas das
dificuldades e particularidades do cliente.
✓ Seja revisto, modificado ou alterado sempre que necessário
04. Empirismo Colaborativo (papel e algumas falas do terapeuta)

➢Como o terapeuta demonstra o “calor” que permite o processo funcionar:


O que fala, como fala, a entonação, o olhar, prestar atenção plena ao cliente, ter bons
insights. São sinais que indicam suporte emocional, empatia, sintonia, envolvimento,
interesse, denotam atenção (presença), inspiram confiança.
➢Terapeuta estabelece posição mais horizontal e menos hierárquica.
Exemplos de fala:

“Eu sou especialista em TCC, mas você é um especialista da sua história”.


O psicólogo não sabe tudo, nem apresenta o cliente para o próprio cliente.

“Queria saber algumas coisas, mas você precisa me dar um feedback se o que eu peço é
útil. Isso está bom para você? ”.
“O que você tem feito para (ou o que ajuda você a) lidar com momentos difíceis?”.
“Se pensar em algo importante que eu não tenha perguntado, por favor, traga para
sessão”.

➢Sobre a agenda:

“O que você gostaria de trazer hoje para a sessão?


Vamos fazer uma lista para aproveitar o tempo”.
05. Empirismo Colaborativo (papel e algumas falas do terapeuta)

Checando a compreensão do cliente:


“Isso está fazendo sentido? Você consegue me dar um exemplo de sua vida sobre isso?”.

Dando o dever de casa - O terapeuta precisa convencer o cliente da utilidade de fazer um dever
de casa, e não usar argumento de autoridade ou pedido para sensibilizar o cliente:

“Hoje você percebeu aqui na sessão a ligação entre pensamento e humor e essa aprendizagem será útil para
ajudar você. Será importante exercitar isso ao longo da semana, pois você vai ficar mais consciente dos seus
pensamentos e poderá testar suas crenças. Em geral eu peço para os clientes anotarem os pensamentos e
emoções em uma folha de papel como essa (apresenta folha de registro).
Você aceitaria fazer assim ou tem outra sugestão?”

O empirismo colaborativo se apoia fortemente na aliança terapêutica* que está sendo


construída desde o início.

*Aspectos do terapeuta e do cliente (são comuns a todas as abordagens).


06. Empirismo Colaborativo (papel do terapeuta)

O empirismo colaborativo se apoia fortemente na relação terapêutica.

O terapeuta atento consegue “ler” sinais nas expressões faciais do cliente; um terapeuta atento formula
questões e dirige melhor a sessão para as metas acordadas.

A relação do terapeuta e do cliente é um pouco assimétrica. Por mais que a TCC seja uma empreitada
colaborativa, o terapeuta tem a função de ajudar o cliente a diminuir seu sofrimento e aumentar sua
resiliência. Um ingrediente fundamental na relação terapêutica é a habilidade comunicativa do terapeuta
de envolver o cliente em novas formas de significar e interpretar o mundo e a si próprio.

Detalhe dos dedos de Adão e do Criador se tocando, do quadro


renascentista de Michelangelo intitulado “A criação de Adão”.

Fonte: Pixabay, 2021


A relação terapêutica inclui fenômenos de transferência, contratransferência e resistência.
Um terapeuta, com excelente domínio das técnicas, já se deparou com um “caso difícil”, em
que a terapia “não avança”, mesmo se esmerando na conceitualização.

O cliente difícil - “resistente” ou “não colaborativo” - acaba sendo considerado o responsável


pelo insucesso da terapia (Newman, 2007).

Algo envolvendo a interação entre cliente, técnica e terapeuta (relação terapêutica) pode
contribuir para o processo não evoluir da maneira esperada.

Adotar uma postura empática e trabalhar as dificuldades ajuda a diminuir a resistência e a


fortalecer o vínculo. Com isso, aumentam as chances de mudança do cliente.

(Newman, 2007)
O paciente desencadeia reações no terapeuta que podem ser positivas ou negativas.
As negativas podem desencadear evitação, distorção, irritação e ansiedade no terapeuta.
As positivas (de moderada intensidade) podem ser manejadas para aumentar a empatia
produtiva, aquela em que se tem como resultado uma ajuda adequada às necessidades
do cliente.

Ao ter uma reação positiva exagerada, o terapeuta se identifica e concorda inteiramente


com o ponto de vista do cliente, não consegue “enxergar” alternativas produtivas aos
problemas e situações narradas. Esse “emparelhamento afetivo” com o cliente faz a
terapia “emperrar” e faz o terapeuta se sentir inseguro em relação à sua competência
profissional.

Clientes de terapeutas mais empáticos e calorosos melhoram mais do que os clientes de


terapeutas que apresentam escores baixos de empatia.

O comportamento empático do terapeuta proporciona o fortalecimento do vínculo


terapêutico e maior adesão ao tratamento.

(Elliott et al., 2011)


As habilidades pessoais do terapeuta vão propiciar:

a) colaboração (empirismo colaborativo);


b) facilitação da descoberta guiada;
c) conceitualização cognitiva;
d) convite à exploração de pensamentos alternativos;
e) capacidade de comunicação que permite dar feedback positivo ou negativo ao
cliente, de forma construtiva;
f) manter a calma, ter postura calorosa, expressar cuidado e consideração quando o
cliente manifesta emoções fortes (raiva, ameaça de suicídio, etc.);
g) Usar os conflitos do cliente para beneficiar a relação terapêutica, dizendo para o
cliente que as reações que surgem no terapeuta podem estar refletindo o que o
cliente vivencia em outras relações interpessoais, gerando respostas focadas em
sentimentos positivos e soluções construtivas.

(Newman, 2007)
Em Síntese...
Em síntese,

a conceitualização forma a base do empirismo colaborativo na qual o cliente se torna um


coinvestigador, um autodetetive e um pesquisador.

O cliente vai testar, refinar comportamentos adaptativos e habilidades cognitivas em


colaboração com o terapeuta, durante a sessão e/ou com as tarefas de casa; vai realizar
experimentos comportamentais e serão feitas contínuas avaliações da conceitualização em
relação ao quanto ela se ajusta à experiência do cliente e à teoria.

O empirismo colaborativo foca não apenas no transtorno e na conceitualização dos


problemas, mas inclui habilidades, pontos fortes e resiliência, essenciais para
conceitualização abrangente.

(Newman, 2007)
Referências bibliográficas

BECK, J. S. (2007). Terapia cognitiva para desafios clínicos: O que fazer quando o básico não funciona (S. M. de
Carvalho, Trad.). Porto Alegre: Artmed (Obra original publicada em 2005).

EASDEN, M. & KAZANTZIS, N. (2017). Case conceptualization research in cogntive behavior therapy: A state of the
science review. J. Clin. Psychol. (1-29) https://doi.org/10.1002/jclp.22516

ELLIOTT, R., BOHART, A. C., WATSON, J. C., & GREENBERG, L. S. (2011). Empathy. In J. C. Norcross (Ed.),
Psychotherapy relationships that work (2ª ed., pp. 132-152). New York: Oxford University Press.

KUYKEN, W., PADESKY, C. A., & DUDLEY, R. (2010). Conceitualização de Casos Colaborativa: o trabalho em
equipe com pacientes em terapia cognitivo-comportamental. Porto Alegre: Artmed.

NEWMAN, C. F. (2007). The therapeutic relationship in cognitive therapy with difficult-to-engage clients. In P. Gilbert,
R. L. Leahy The Therapeutic Relationship in the Cognitive Behavioral Psychotherapies (pp. 181-200). London:
Routledge.

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