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Conceitualização Cognitiva

Elementos da Conceitualização

Profa. Dra. Angela Donato Oliva


Aula 05
Aspectos da
Conceitualização
TÓPICOS

01. Funções da conceitualização


02. Informações para a conceitualização
01. Funções da conceitualização
Conceitualização

1) Sintetiza
integra, organiza, de maneira a dar sentido, o que é relevante da história de
vida/experiência e dificuldades atuais do cliente, com o modelo teórico da TCC
e a pesquisa.

“Estou , considerando essa hipótese alternativa de entender. Pensar que minha


mãe não se sente segura ou em condições de lidar com meus problemas por
gostar muito de mim faz muito sentido e muda o sentimento de mágoa que
sinto por pensar que ela não quer me ouvir porque me coloca em segundo plano
em sua vida.”

Kuyken et al., 2010


Conceitualização

2) Normaliza

Problemas apresentados, é validante. Pacientes consideram seus problemas


estigmatizantes, se afastam dos outros, se sentem “anormais”, “malucos”,
“esquisitos” ou “envergonhados”.

Sentem alívio quando compreendem que há pessoas como eles.

A conceitualização descreve o problema com uma linguagem construtiva e os


clientes entendem porque os problemas são mantidos.

Ela dá esperança, ajuda o cliente a ver sentido no modelo cognitivo e esse é um


primeiro passo para mudança.

Kuyken et al., 2010


Conceitualização

3) Envolvimento e engajamento do cliente com a TCC, um pré-


requisito para a mudança.

Gera curiosidade e interesse.

Oferece forma de lidar com as dificuldades e caminhos para clientes alcançarem


suas metas.

Aumenta autoeficácia:

“Quando minha filha começou a choramingar, senti meu peito apertar. Mesmo
que eu não pudesse evitar essa reação, fez sentido para mim, entendi que mais
uma vez estava vendo as coisas de maneira negativa, que eu não era louca, que
ao pegá-la no colo eu iria acalmá-la, que isso era uma etapa do desenvolvimento
dela e não duraria para sempre.”

Kuyken et al., 2010


Crenças negativas sobre a terapia atrapalham o processo e informações relevantes não são
reveladas, porque clientes têm medo de serem repreendidos. Se algo importante for revelado,
o terapeuta deve usar:

TERAPEUTA: Obrigado, por ter confiado em mim/ por ser honesto comigo - isso nos ajudará a trabalhar
melhor juntos. (cliente desconfortável, olhando para baixo, se encolhendo. O terapeuta usa essa
informação não verbal e pergunta): O que você acha que vai acontecer agora que me contou que foi
abusada na infância?
CLIENTE: (evitando contato visual) Você vai me desprezar e não vai querer mais trabalhar comigo, vai
achar que eu fui culpada. Eu me sinto envergonhada. (começa a chorar.)

Quando bem administrados, momentos como esse podem ser um avanço. As crenças, emoções e
comportamentos importantes do cliente quando são descobertos e integrados em uma conceitualização,
fazem a conceitualização caminhar em direção a um maior progresso.

O terapeuta ajuda a cliente a entender os sentimentos de vergonha e medo por ter sido abusada; busca
compreender o contexto, as experiências anteriores e as crenças associadas. No relato da história da
cliente, a mãe se preocupava em fazer reuniões sociais/trabalho, negligenciando os cuidados com a filha
e sendo dura quando esta fazia algo que desagradasse a mãe. O pai era ausente exigente e severo. Por
medo, a cliente escondia tudo para não ser castigada. Essas experiências criaram um padrão de
funcionamento de não revelar certas coisa por medo de o terapeuta vir a desprezá-la e a culpá-la pelo
abuso sofrido. A construção colaborativa da conceitualização pode diminuir alguns desses medos.

Kuyken et al., 2010


Conceitualização

4) Organiza e faz com que problemas complexos e


numerosos pareçam mais gerenciáveis.

Os clientes podem se sentir sobrecarregados pelo grande número de dificuldades que


enfrentam. Feita com habilidade, a conceitualização de caso ajuda a gerenciar os
problemas. É o processo de "transformar a confusão/bagunça em algo organizado".
É quando as peças do quebra-cabeça estão montadas.

Kuyken et al., 2010


Conceitualização

5) Orienta a seleção, o foco e a sequência das intervenções.

Dá forma à terapia. Há muitas intervenções em TCC (sempre em expansão) e o protocolo selecionado


deve ser o que melhor se aplica ao caso. Comorbidades e especificidades precisam ser levadas em conta.

A conceitualização ajuda os clientes a entender por que estão fazendo algo, enfatiza a necessidade de
mudança e fornece um enfoque terapêutico claro. Com a compreensão das questões terapeuta e o
cliente podem decidir qual dificuldade abordar primeiro, justificando a escolha. Os clientes participam na
tomada de decisões sobre o que será priorizado.

A conceitualização fornece o mapa para ajudar o terapeuta e o cliente a decidirem juntos sobre os
melhores caminhos em direção aos objetivos da terapia.

Kuyken et al., 2010


Conceitualização

6) Identifica os pontos fortes do cliente e sugere maneiras de ajudar a


aumentar a resiliência. Fornece uma descrição e compreensão da
pessoa como um todo, não apenas questões problemáticas.

O foco nos pontos fortes amplia os resultados da terapia, alivia o sofrimento, traz
melhoria da qualidade de vida e fortalece a aliança terapêutica.

Kuyken et al., 2010


Conceitualização

7) Seleciona intervenções de melhor custo-benefício para alcançar os


objetivos da terapia.

Por exemplo, alguém por ter parado de trabalhar pode ir deixando, aos poucos, de
realizar tarefas que poderiam dar prazer. Com isso, passa a não atender telefonemas,
não abrir porta, etc. o que deprime o humor. Para essa pessoa, a ativação
comportamental de fazer atividades físicas novas, voltar a praticar um esporte, pode
levar a mudanças positivas e reforçadoras.

Vale lembrar que um mesmo mecanismo (cognitivo ou comportamental) pode estar


conectando alguns problemas. Sendo assim, mudar esse mecanismo pode beneficiar
outras esferas da vida do cliente.

Kuyken et al., 2010


Conceitualização

8) Antecipa e aborda problemas na terapia.

Impasses e dificuldades terapêuticas são oportunidades para testar ou desenvolver a


conceitualização, pois permite compreender dificuldades terapêuticas sugerindo maneiras
de enfrentá-las/abordá-las. Por exemplo, o terapeuta pode levantar a hipótese de um
cliente com esquema de desconfiança falte a terapia por começar a suspeitar que a
mesma não estará sendo boa para ela. O terapeuta pode explicar sobre essas possíveis
crenças que podem ser ativadas e afastar o cliente da terapia: "A terapia não vai me
ajudar ", "As pessoas não querem de fato me ajudar" ou “Não vou passar por isso, não vou
mais." Avaliar essas crenças na conceitualização permite que as preocupações do cliente
sejam abordadas, buscando evitar a desistência após poucas sessões.

Kuyken et al., 2010


Conceitualização

9) Ajuda a entender a não resposta à terapia e sugere caminhos


alternativos para a mudança.

Os resultados de pesquisa da TCC relatam que parte das pessoas responde


parcialmente ou não responde (Butler, Chapman, Forman, & Beck, 2006). A falta de
resposta pode, por exemplo, ser resultado de desesperança ou evitação persistente.
Terapeutas e clientes devem explorar os fatores que podem explicar a não resposta
voltando à história do cliente e revendo aspectos da teoria.

Kuyken et al., 2010


Conceitualização
10) Permite supervisão e consultoria de alta qualidade.
Durante a conceitualização de caso, começamos a entender o que desencadeia, o que mantém e o
que predispõe o problema apresentado pelo cliente. Começamos a entender também os fatores
que protegem os clientes e promovem a resiliência. O mesmo processo acontece na supervisão. A
conceitualização de casos estrutura o pensamento do supervisor e do supervisionado.
Ao mesmo tempo, na supervisão o supervisionado tem uma experiência de aprendizado com o
supervisor (que oferece um modelo que instiga curiosidade e a descoberta guiada no
supervisionado). O supervisionado, por sua vez, replica esse processo na terapia com o cliente.

Na supervisão são discutidos planos de tratamento, progresso da terapia, resultados de


intervenções específicas, impasses terapêuticos e reações do terapeuta. Na conceitualização se
busca “ajustar”, entender melhor a dificuldade para depois planejar um caminho a seguir.

Kuyken et al., 2010


02. Informações para
a conceitualização
Quais informações precisam ser coletadas pelo terapeuta
para a construção da conceitualização:

1. Diagnóstico/sintomas ou dificuldades atuais;


2. Contribuições das experiências da infância e outras influências do desenvolvimento;
3. Questões situacionais e interpessoais;
4. Fatores biológicos, genéticos e médicos;
5. Pontos fortes e qualidades;
6. Padrões típicos de pensamentos automáticos, emoções e comportamentos;
7. Esquemas subjacentes (significado dos pensamentos automáticos).

J. Beck (2022)
Quais informações precisam ser coletadas pelo terapeuta
para a construção da conceitualização:

1. Distinguir o que é uma situação, um pensamento automático (P.A.), um


comportamento, uma emoção ou sentimento e uma reação fisiológica.

2. Identificar P.A.s que surgem nas situações (característica do funcionamento


mental) e que estão impregnados de valores culturais e das histórias individuais.

3. Que há consequências dos P.A.s (imagens, lembranças) nas emoções, reações


fisiológicas e comportamentos. Entender essa ligação (em via de mão dupla).

4. Que um P.A. revela algo que ele acredita sobre si/outros/mundo. Que
interpretamos o mundo, e construímos crenças com as quais interagimos nos
contextos.

5. E que ele deve indagar “o que isso (P.A.) significa sobre mim?” E terá que
identificar as próprias crenças, regras e suposições.
J. Beck (2022); Knapp, 2004
A conceitualização precisa atender aos seguintes critérios:

Ter utilidade,
Ser simples,
Teoricamente coerente,
Oferecer explicações sobre comportamentos passados,
Encontrar sentido nos comportamentos presentes,
Ter capacidade para predizer comportamentos futuros.

Rangé (2004)
Em Síntese...
Funções da Conceitualização
1) Sintetiza.
2) Normaliza, é validante.
3) Envolve e engaja o cliente.
4) Organiza/arruma problemas.
5) Seleciona e organiza a sequência das intervenções.
6) Pontos fortes.
7) Intervenção de melhor custo-benefício para alcançar as metas da terapia.
8) Problemas da terapia são oportunidades para conceitualizar.
9) Ajuda a entender a não resposta e permite mudanças de rumo.
10) Facilita a supervisão.

Kuyken et al., 2010


Algumas considerações sobre a conceitualização:

É a alma do tratamento.
Fazer a conceitualização evita problemas na terapia (J. Beck, 2022).
É a base a partir da qual o terapeuta fundamenta suas primeiras hipóteses a
partir dos dados coletados.
Precisa ser verificada constantemente com o paciente em certos pontos.
Embora haja uma intervenção-padrão e um norte na sequência das sessões,
por intermédio da conceitualização o conteúdo da TCC é construído
individualmente.
Integra os componentes cognitivos, comportamentais e emocionais que
emergem nas sessões.
A conceitualização permite/ajuda:

Entender as reações do paciente;


Identificar crenças centrais;
Identificar cognições e comportamentos com maior necessidade (e possibilidade)
– para mudar;
Focar os problemas centrais do paciente na sessão.
Escolher uma intervenção eficaz para a clínica.
Referências bibliográficas

BECK, J. (2022). Terapia Cognitivo-comportamental: Teoria e prática (3ª edição). Porto Alegre: Artmed.

BUTLER, A. C., CHAPMAN, J. E., FORMAN, E. M., & BECK, A. T. (2006). The empirical status of cognitive-behavioral therapy: A
review of meta-analyses. Clinical Psychology Review, 26, 17-31.

KNAPP, P. (2004). Terapia Cognitivo-Comportamental na Prática Psiquiátrica. Porto Alegre: Artmed.

KUYKEN, W., PADESKY, C. A., & DUDLEY, R. (2010). Conceitualização de Casos Colaborativa: o trabalho em equipe com pacientes em
terapia cognitivo-comportamental. Porto Alegre: Artmed.

RANGÉ, B. (2004). Conceituação cognitiva. In C. N. de Abreu & H. J. Guilhardi (Orgs.), Terapia comportamental e
cognitivo-comportamental: Práticas clínicas (pp. 286-299). São Paulo: Roca.

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