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SISTEMATIZAÇÃO DAS

TÉCNICAS E ESTRATÉGIAS
DE INTERVENÇÃO EM TCC

Relembrando conceitos e características


Na TCC, o foco principal é o que está acontecendo no presente e as principais pre-
ocupações são os processos que atualmente mantêm o problema que levou o pa-
ciente a buscar por terapia, ao invés dos processos que podem ter levado ao pro-
blema, há anos de desenvolvimento. A TCC acredita que o tratamento baseado
em teorias a partir de evidências científicas é muito importante por várias razões:
cientificamente, para que os tratamentos possam ser fundamentados em teorias
consistentes e bem estabelecidas; economicamente, para que a relação custo-be-
nefício do tratamento seja benéfica para o cliente; e, eticamente, para que os clien-
tes recebam tratamento adequado.
A forma moderna de TCC inclui uma variedade de técnicas e abordagens, como
terapia de exposição, treinamento de inoculação de estresse, terapia de processa-
mento cognitivo, terapia cognitiva, treinamento de relaxamento, terapia compor-
tamental dialética e terapia de aceitação e compromisso. As técnicas terapêuticas
variam de acordo com questões específicas que devem ser tratadas. A forma atual
de TCC tem como alvo os principais componentes de determinado transtorno. A
TCC é normalmente fornecida ao longo de 12 a 20 sessões; cada sessão normalmen-
te dura de 45 minutos a 1 hora de duração.
Uma característica fundamental da TCC é o estabelecimento de uma relação de
trabalho forte e colaborativa com o paciente. Isso será facilitado se houver uma
atmosfera calorosa e de confiança. Empatia e consideração positiva incondicional
para com o paciente são de extrema importância. O papel do terapeuta na TCC deve

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ser o de guia, catalisador e professor. O início dessa relação de trabalho é feito com a
psicoeducação do paciente sobre a natureza do transtorno, explicando o modelo de
TCC da etiologia e manutenção do transtorno e a intervenção derivada do modelo.
Nas poucas sessões iniciais, uma avaliação completa do problema apresentado por
um paciente é feita e a hipótese inicial e o plano de tratamento são formulados.
Esta fase do tratamento é chamada de “Avaliação Cognitiva Comportamental”. O
problema atual do paciente é avaliado por meio de automonitoramento dos sin-
tomas dele, entrevista comportamental e observação direta do comportamento
ou avaliação objetiva dos sintomas do paciente por meio de um questionário de
autorrelato. O terapeuta ajuda a identificar e diferenciar os problemas para que os
desafios sejam reduzidos a objetivos gerenciáveis.
No início de cada sessão, informações de revisão são coletadas do paciente sobre
eventos que ocorreram desde a sessão anterior que são relevantes para os objetivos
dele para o tratamento. Com isso, alguma parte da sessão de tratamento também
é dedicada às dificuldades que podem ocorrer antes da próxima sessão. Essas di-
ficuldades são então discutidas no contexto da resolução de problemas e da im-
plementação das habilidades cognitivas e comportamentais necessárias. Embora a
intervenção específica usada durante a TCC possa variar, as intervenções são base-
adas em teorias cognitivas e de aprendizagem. Por meio dessas técnicas cognitivas
e comportamentais, geralmente os pensamentos automáticos negativos e as cren-
ças disfuncionais do primeiro paciente são identificados e testados na realidade.
A tarefa de casa é uma parte essencial do tratamento de TCC, já que o paciente não
é apenas transformado durante as sessões, mas muitas mudanças na estrutura
cognitiva e no comportamento dele ocorrem entre as sessões. Isso é catalisado por
uma tarefa de casa que geralmente segue o processo de resolução de problemas
na sessão de tratamento. A conclusão bem-sucedida da tarefa de casa é um bom
indicador do sucesso da terapia. Essa prática entre as sessões também incentiva o
paciente a generalizar as habilidades aprendidas para lidar com os problemas en-
contrados em seu cotidiano.
Existem várias técnicas cognitivas e comportamentais específicas utilizadas no
procedimento da TCC, é importante que o terapeuta tenha bem claro o objetivo do
uso da técnica, bem como as devidas adaptações dela ao paciente, pois elas têm o
objetivo de influenciar o pensamento, o comportamento e o humor do paciente,

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mas não se deve compreender técnica como “receita de bolo”, pois as técnicas de-
vem ser implementadas de acordo com os fatores individuais e contextuais do pa-
ciente. Algumas delas são enumeradas a seguir, embora não sejam exclusivas.

Estratégias de intervenção – técnicas cognitivas


1. Identificar e monitorar 7. Listar as evidências que apoiam e refutam seus
pensamentos distorcidos. pensamentos.
2. Avaliar o grau de crença em 8. Colocar o evento em perspectiva, examinando
tais pensamentos negativos e suas consequências na visão do paciente.
grau de emoção associado aos 9. Padrão duplo (Perguntando ao paciente se ele
pensamentos. aplicaria os mesmos padrões se o evento ocorrer
3. Categorizar os pensamentos com outros).
negativos em distorções 10. Troca de papéis e contestação de pensamentos
cognitivas específicas. negativos do paciente.
4. Descida vertical (O que 11. O paciente é solicitado a examinar muitas causas
significaria se o pensamento e consequências alternativas do pensamento,
fosse verdadeiro?). especialmente alternativas menos negativas.
5. Qual é a suposição subjacente? 12. Aceitação (Existe uma realidade que o paciente
6. Quais são os custos e benefícios pode aprender a aceitar, ao invés de tentar
do pensamento? consertar ou lutar com ela?).

Estratégias de intervenção – técnicas comportamentais


6. Técnicas de relaxamento.
1. Exposição ou enfrentamento dos 7. P r o g r a m a ç ã o d e a t i v i d a d e s
estímulos temidos. (listar atividades ao longo do dia,
2. Dessensibilização sistemática. classificando-as de acordo com as
3. Modelagem. emoções associadas a eles).
4. Observação dos outros (o paciente 8. Atribuições de tarefas graduadas
“copia” e representa o comportamento (planejamento e execução de
que ele observa em outra pessoa – comportamentos que se esperam e
“Como os outros lidaram com isso? ”). que produzam recompensa).
5. Ensaio comportamental (o paciente 9. Treinamento de assertividade.
representa o comportamento que 10. Treinamento de comunicação.
planeja realizar fora da sessão). 11. Autorrecompensa para aumentar
comportamentos desejáveis.

A terapia cognitiva foi proposta pela primeira vez por Beck no início dos anos 1960
para a depressão, evoluiu rapidamente para um dos principais métodos psicote-
rapêuticos no tratamento psiquiátrico moderno. Sua eficácia no tratamento da

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depressão, transtorno de ansiedade generalizada, transtorno do pânico, transtor-
nos alimentares e outras condições psiquiátricas foi bem estabelecida por inúme-
ras pesquisas. A maioria das doenças psiquiátricas agora tem diretrizes de trata-
mento bem organizadas com base na TCC. Os objetivos da TCC incluem o alívio
imediato dos sintomas e a aquisição de habilidades cognitivas e comportamentais
que reduzem o risco de recaídas.

Exemplo prático: Caso clínico1

Conceitualização de caso
Paciente, 22 anos, muçulmana, solteira, foi encaminhada com queixa de humor deprimido,
falta de concentração, falta de autoconfiança, indecisão, sentimento de culpa, raiva,
irritabilidade, dor de cabeça, palpitações e comportamento de evitação. Foi encaminhada
para intervenção psicológica pelo psiquiatra que a diagnosticou com depressão. Seu traje,
aparência e comportamento pareciam ser culturalmente apropriados. Na entrevista inicial,
ela falou de boa vontade sobre seus problemas. Ela estava bem motivada e interessada
em trabalhar em colaboração com o terapeuta. A paciente vem de uma família restrita, o
relacionamento entre os pais era conflituoso, o que mantinha seu problema. A dominação
do irmão mais velho e a falta de apoio da família também mantinham seu problema. Ela
foi retirada das atividades diárias e encontros sociais. Passou a desenvolver evitação, um
dos fatores de manutenção do seu transtorno atual.
Avaliação
Nas sessões de avaliação, a paciente relatou que acreditava estar sofrendo de uma doença
psicológica, queixou-se de falta de concentração, falta de autoconfiança e indecisão. Também
se queixou de humor deprimido, sentimento de culpa, falta de prazer, raiva e desesperança.
Afirma que sentia irritabilidade e medo. A paciente foi avaliada quanto à elegibilidade para
o tratamento a partir da entrevista em profundidade. Os resultados indicaram que ela estava
sofrendo de depressão. Com base nas informações coletadas da paciente, sua formulação
foi feita na predisposição, precipitação e manutenção de fatores, foi aplicado o inventário
de depressão e de ansiedade. Verificou-se que ela era passiva e raivosa e não conseguia
expressar suas emoções de forma adequada. Mas depois disso, quando percebeu o erro,
ela estava sofrendo de graves sentimento de culpa. Após a avaliação inicial, a paciente foi
designada para tratamento e avaliada regularmente.

1 Para acessar o caso completo: Ara, J. Cognitive Behavior Therapy for Depression: A Case Report. J Clin Case
Rep 2018, 8:7December 2017. DOI: 10.4172/2165-7920.10001151. Disponível: file:///C:/Users/Dell/Desktop/
Cognitive_Behavior_Therapy_for_Depression_A_Case_R.pdf

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Técnicas
z A formulação do problema da cliente foi desenhada com base no modelo cognitivo.
A formulação foi compartilhada com a paciente para prepará-la para o tratamento
psicológico.
z Os objetivos do tratamento foram estabelecidos e definidos em colaboração com a
paciente: 1) reduzir os sintomas depressivos; 2) extinguir a evitação; e 3ª) reduzir os
sentimentos de culpa. As prioridades foram então definidas através da negociação de
quais problemas deveriam ser tratados primeiro.
z A primeira sessão de tratamento teve como objetivo estabelecer a aliança terapêutica com
a paciente; educá-la sobre a depressão e o processo terapêutico; enfatizar a importância
da tarefa de casa; apropriar-se da responsabilidade pelas mudanças. A empatia foi
estabelecida para levar a paciente a expressar seus sentimentos, pensamentos e ajustar
suas expectativas sobre os ganhos com a terapia.
z A técnica de “desafio de pensamento” foi usada para modificar os pensamentos
automáticos distorcidos da paciente, examinando as evidências a favor destes
pensamentos.
z Tomada de decisão: o problema de tomada de decisão é um problema comum em
paciente com depressão. Se a tomada de decisão não for apropriada nesse momento,
a pessoa não sentirá conforto e se culpará. Existem algumas etapas de tomada de
decisão. São eles isolar o problema, decidir agir, reunir recursos, planejar, visualizar
seu plano de ação e agir.
z Treinamento assertivo: para tornar a paciente mais assertiva utilizou-se esta técnica. Esse
treinamento a ajudou a se comunicar com seus familiares. O treinamento assertivo ajuda
a pessoa a expressar como se sente, sem ser agressivo ou não respeitar os sentimentos
dos outros no processo.
z Técnicas de relaxamento: estas técnicas ensinaram a paciente a reduzir a dor de cabeça
e a tensão. As evidências sugerem que os procedimentos de relaxamento têm sido
eficazes para uma vasta gama de problemas, incluindo cefaleia, insônia, ansiedade,
explosões de raiva, entre outros.
z A paciente foi ensinada a expressar a raiva de maneira construtiva. Isso inclui definir a
raiva, ser assertivo e encontrar uma maneira mútua de resolver o problema.
z Qualidades positivas: a paciente frequentemente subestimava suas qualidades positivas,
o que mantinha seus problemas. Assim, foi solicitado a ela que escrevesse pelo menos
duas boas qualidades todos os dias, para que ela pudesse ter consciência de suas
qualidades positivas, isso a ajudaria a se perceber sob outra perspectiva.
z Automonitoramento: as sessões 8-13 focaram nas atividades de automonitoramento. A
paciente reclamou de falta de prazer, então uma folha de registro foi dada para registrar
o que ela fazia em sua rotina e classificar cada atividade de 0-10 para prazer (P). Foi usado
para melhorar o humor e aumentar o nível de atividades prazerosas.
z A avaliação subjetiva do problema da cliente foi feita de forma intermitente nas sessões
de avaliação e tratamento.

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Conclusão
A cliente foi muito sensível a respeito de seu problema. Quando percebeu que a terapeuta
entendia seus problemas, ela ficou muito motivada e mostrou alto nível de adesão ao
tratamento. Ela aceitou a formulação de seus problemas e pôde internalizar as técnicas.
Os pensamentos automáticos distorcidos foram reduzidos e ela começou a pensar
positivamente e de modo adaptativo.

SISTEMATIZANDO: CATEGORIZAÇÃO DE TÉCNICAS E


ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO EM TCC

Técnicas cognitivas Automonitoramento Grau de crenças

Pensamentos
automáticos Evidências Evento em perspectiva
distorcidos

Causas e
Troca de papéis Aceitação
consequências

Técnicas Ensaio
Atribuições de tarefas
comportamentais comportamental

Treinamento da
Modelagem Dessensibilização
assertividade

Técnicas de Treinamento de
Exposição
relaxamento comunicação

Programação Observações
Autorrecompensa
de atividades dos outros

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REFERÊNCIAS

1. Leahy RL. Introduction: Fundamentals of Cognitive Therapy. In: Leahy, R. L,


editor. Practicing Cognitive Therapy: a Guide to Interventions. Northvale, NJ:
Jason Aronson; 1997.

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