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Conceitualização Cognitiva

Profa. Dra. Angela Donato Oliva


Aula 11
Conceitualização Explicativa
– Caso de Depressão
TÓPICOS

01. Avançando na compreensão do caso


02. Nível explicativo de conceitualização longitudinal
01. Avançando na
compreensão do caso.
Marco apresenta quadro de humor deprimido em diferentes esferas de sua vida.

Ele se preocupa com a própria saúde, com o trabalho, tem medo de desapontar a
família, apresenta comportamento de verificação (se deixou o gás aberto quando
sai de casa, se deixou luzes ligadas), se sente sem ânimo, cansado e incapaz de
lidar com as situações em geral.

Com base na conceitualização (explicativa e transversal) de Marco dos fatores


desencadeantes e de manutenção, ele e a sua terapeuta escolheram, inicialmente,
intervenções comportamentais para interromper a ruminação relacionadas aos
erros no trabalho – meta: aumentar as atividades positivas e interromper a
evitação.

Os experimentos (comportamentais e observacionais) testaram seus pressupostos


subjacentes referentes ao significado e às consequências dos erros.

Conforme esperado, o humor de Marco melhorou nas primeiras semanas em que


tais intervenções foram implementadas.

Kuyken et al., (2010)


Os pensamentos autocríticos de Marco são compatíveis com a teoria de Beck; a
pesquisa mostra que uma visão negativa de si mesmo é uma característica principal do
pensamento depressivo (Clark et al., 1999).

Se a conceitualização estiver correta, um pensamento mais equilibrado conseguido por


meio dos Registros de Pensamentos e experimentos comportamentais levará Marco a
vivenciar um humor melhorado e respostas mais funcionais para lidar com os erros e as
imperfeições.

Quando Marco testou os pensamentos negativos, seu humor melhorou sensivelmente.


Os resultados dessas intervenções ajudaram Marco e a terapeuta a avaliarem a
“adequação” da conceitualização.

Kuyken et al., (2010)


Limitação identificada na conceitualização transversal, focada no presente:

MARCO: Pensar no trabalho é um desencadeante do meu humor deprimido, mas observei


que, quando fico perturbado, nem sempre é a respeito de coisas no trabalho. Não é apenas
isso que me faz ficar triste.
TERAPEUTA: O que mais você acha que faz você se sentir triste?
MARCO: Eu estava na fila, pensando no trabalho, na reunião, em não estar preparado, em ser
um inútil novamente, e essas coisas fizeram eu me sentir ansioso e deprimido. E o pior foi
que eu estava segurando a mão da minha filha e vi que estava distante em pensamento.
Pensei no fracasso que eu sou como pai.
TERAPEUTA: Como esse pensamento fez você se sentir?
MARCO: Completamente arrasado. (olhar triste, abatido, ombros caídos). Meu pai não era muito
presente para mim e para meu irmão quando estávamos crescendo. Ele ficava deprimido por
longos períodos, e às vezes nós nem o víamos. Eu realmente queria que os meus filhos não
tivessem que lidar com esse tipo de coisa.
TERAPEUTA: Parece que é importante para você que o seu humor deprimido não interfira no
tempo que você tem com a sua família.
MARCO: É assim, realmente.
TERAPEUTA: Então, além de pensar nos erros no trabalho, pensar em si mesmo com um
fracasso como pai faz com que você se sinta mal. Você sente isso agora? (Marco concorda
com a cabeça.). Você acha que este é um tipo separado de pensamento, ou acha que os
pensamentos sobre erros e fracassos, seja no trabalho ou em casa, é um tema que o deixa
deprimido?
MARCO: Eu acho que fracasso poderia ser a minha música tema.
TERAPEUTA: Então vamos passar mais tempo hoje examinando esse tema com mais detalhes.

Kuyken et al., (2010)


Situação Humor Pensamentos automáticos Ações
Avaliação 0 – 100% (imagens) O que fez para administrar
os sentimentos?
Na fila da loja, pensando no Triste 90% Penso em outras coisas, não Chorei, fui para casa e fiquei
trabalho. presto atenção na minha na cama.
filha. Sou um fracasso
como pai.
Em casa pensando no Deprimido 75 % Sempre cometo erros, não Tentei ver TV e fiquei
trabalho. posso mais fazer esse pensando no trabalho, fiquei
trabalho. acordado até tarde.
No trabalho e fui chamado Ansioso 80% Sou um inútil, não fiz nada Fui para a reunião e fiquei
para a reunião de Deprimido 90% semana passada. É uma quieto sobre o que eu tinha
atualização. questão de tempo até eu ser feito.
demitido.
Em casa me arrumando para Ansioso 90% Posso ter deixado o fogão Voltei 4 vezes para verificar.
visitar minha mãe. Preocupado 90% aceso.
Em casa e vi o vizinho saindo Triste 90% Sou um inútil como pai Fui trabalhar no jardim para
com o filho para jogar Meu vizinho faz muito mais me distrair.
futebol. do que eu – nunca faço
nada.
A dimensão cognitiva da conceitualização: uma compreensão mais abrangente do humor deprimido.
“Se eu quiser ser visto como competente, eu preciso fazer tudo bem” ou “Se eu
Pressuposto não fizer tudo bem, serei visto como incompetente”. Estes pressupostos podem
subjacente: explicar a verificação dos eventos do dia em sua mente buscando os erros que
poderiam passar despercebidos.
“Se eu cometer erro,
isso significa que eu O humor deprimido é desencadeado pela percepção de erros cometidos. Ser
sou um inútil”. cuidadoso é ponto forte, mas se for superdesenvolvido pode se tornar uma
vulnerabilidade para a pessoa se sentir deprimida ao cometer erros.
Evito o trabalho;
Penso em: “erros no trabalho”; rumino.
“não presto atenção na minha Triste Choro, fico na cama.
filha”. Sou um fracasso em tudo e
P. mantém
como pai também.
A.

Trabalho acumula.
Não faço nada.
Avalia que os outros pais
Eu sempre cometo erros.
são melhores.
Eu sou um inútil
Eu sou uma perda de TERAPEUTA: “Se eu cometer um erro, então isto significa que eu sou um inútil, uma perda de tempo”, e isto está
conectado sentir-se deprimido. Eu entendi corretamente?
tempo. MARCO: É isso mesmo.
Os pressupostos subjacentes estão ligados ao humor deprimido de Marco. Crenças centrais negativas: “eu sou um inútil” ou “eu sou uma
perda de tempo”. Os erros acionam o humor deprimido de MARCO. A descoberta guiada fará o aprendizado de MARCO ser mais significativo
e duradouro. Ele precisa identificar o desencadeante por si mesmo, ao invés de a terapeuta lhe apontar o padrão (Kuyken et al. 2010).
02. Nível explicativo de
conceitualização longitudinal.
Conceitualizações longitudinais respondem às seguintes perguntas

• Por que os ganhos da terapia não estão se mantendo?


• Por que está havendo um progresso limitado ou de curta duração (volta para
antigos padrões)?
• Por que os problemas persistem?
• Quais experiências principais do desenvolvimento moldaram as crenças centrais
do paciente, os pressupostos subjacentes e as estratégias para lidar com as
dificuldades?
• Que fatores contribuíram para os padrões de manutenção?
• Como os pontos fortes da pessoa impedem que as dificuldades atuais piorem?”
• É possível predizer reações futuras similares do cliente?
Quando Marco identifica que cometer erros desencadeia nele o humor deprimido a terapeuta
apresenta o modelo de conceitualização da depressão.

Falhas no trabalho são desencadeantes comuns do humor deprimido para muitas pessoas
(Bieling, Beck e Brown, 2000). Saber que outras pessoas reagem dessa forma ajuda a
normalizar suas reações ao erro.

A terapeuta precisa destacar que os erros têm para Marco um significado pessoal muito
grande (devido à sua experiência). Cometer erros desencadeia seu humor deprimido porque
está associado a um pressuposto subjacente negativo: “Se eu cometer um erro, isso
significa que sou um inútil, uma perda de tempo ”. Essa é uma síntese da conceitualização
explicativa transversal de Marco.
Há momentos em que Marco comete erros e não se sente deprimido com
isso. A terapeuta precisa descobrir essas experiências positivas, pois elas
revelam outros significados dos fatores desencadeantes. Exemplo: Marco
pode cometer erros em tarefas em que todos os colegas cometem erros.

A experiência positiva ajuda a conceitualizar a resiliência de Marco.


Maior resiliência menor ruminação.
Antecedentes Comportamentos Consequências
(A) (B) (C)

Pensamentos Lidar com tarefas como acho que Me sinto no controle


sobre trabalho os colegas fazem: admitir os da situação e bem.
erros sem ficar diminuído por (Resiliência)
eles, aceitando isso como normal,
sem tentar adiar o trabalho

Kuyken et al., (2010)


A terapeuta precisa investigar a imagem que Marco tem de seu pai, pois ela pode ser relevante
para compreender a preocupação de “Marco ser um bom pai”.

O quanto Marco é realista nas suas interpretações sobre si e sobre o mundo?

1) Se ficar evidente que ele não é um pai e marido “bom”, então o foco da terapia pode ser
desenvolver habilidades para melhorar esse papel;

2) Se os pensamentos de Marco forem interpretações errôneas, o trabalho será para


desenvolver autoavaliações mais equilibradas.

Em ambos os casos , Marco e a terapeuta poderão examinar as ligações entre os


pensamentos e os padrões de comportamento que aprisionam Marco dentro de um ciclo inútil
de autocrítica e esquiva.

Kuyken et al., (2010)


A terapeuta considerou a hipótese de que o pressuposto de “Se eu cometer erro, eu sou um inútil”
parecia ter origem na infância, nas críticas que a mãe fazia.

A morte do pai o aproximou da mãe (muito crítica) e o nascimento do filho também (mãe eventualmente
ia para a casa dele).

O nascimento do filho aumentou o trabalho em casa, diminuiu as horas de sono e acentuou a


preocupação com o sustento da família.

Junto com isso, ele foi promovido no trabalho, recebeu mais pressão, responsabilidades e tarefas.

Alguns desses aspectos apoiam a conceitualização de Marco sobre seu humor deprimido no presente e
outros sugerem que há coisas que precisam ser investigadas, uma vez que a melhora de Marco
enfrentava oscilações.

Assim, ele e a sua terapeuta continuaram a examinar os eventos no contexto da conceitualização.

Kuyken et al., (2010)


Marco descreveu um período por volta dos seus 17 anos, em que se preparava para os
exames escolares. Sua mãe estava preocupada com os problemas de saúde do seu pai e
Marco passou a ter mais responsabilidades com seu irmão para ajudar a mãe a cuidar do seu
pai. Marco organizou seu cronograma de estudos, mas foi mal em diversas provas. Ficou
desapontado e isso piorou com a crítica da sua mãe, que contribuiu para aumentar o
sentimento de desesperança. O tema da responsabilidade está presente desde cedo e
também está muito evidente no presente.

Marco começou a olhar para si como uma pessoa inútil e impotente. Essas crenças se
fortaleceram à medida que seu desânimo foi crescendo. Foi difícil para ele recuperar-se ou até
mesmo realizar as tarefas de casa e as atividades diárias. Demorou vários meses para que ele
voltasse a se envolver acadêmica e socialmente.

Kuyken et al., (2010)


Essas experiências de Marco indicam fatores desencadeantes e de manutenção que parecem
estar contempladas na conceitualização explicativa de sua depressão atual.

Experimento observacional: Marco observou os erros cometidos pelos outros no trabalho e


reconheceu que não julgava os outros como inúteis quando eles cometiam erros e viu que as
pessoas não davam aos erros a mesma importância que ele.

Sobre o pressuposto subjacente “Se eu cometer um erro, os outros vão me achar inferior”
(fortalecido pelos comentários da mãe sobre os erros dele) – quando cometia um erro, Marco
não recebia por parte da esposa e dos colegas maiores críticas.

Kuyken et al., (2010)


Ele testou o pressuposto alternativo de que as pessoas não notam ou não se importam muito
com os erros dos outros, cometendo erros menores deliberadamente em apresentações e
reuniões. Ele aprendeu a aceitar que os erros são parte natural da vida, não significam que a
pessoa seja inútil e que eles não levam necessariamente a resultados ruins.

Terapeuta pode inserir no modelo a Resiliência e os Pontos Fortes.

Kuyken et al., (2010)


Os terapeutas podem fazer as seguintes perguntas para ajudar os clientes a
conceitualizarem a resiliência:

• “Como você lidou com situações desafiadoras no passado?”


• “Que pontos positivos, crenças ou estratégias o ajudaram?”
• “Como essas experiências poderiam ajudá-lo a lidar com esta situação?”
• “Que pontos positivos, crenças ou estratégias podem ajudá-lo a lidar com isso?”
• “Que habilidades você precisa desenvolver para lidar com esta situação?”
• “Alguém pode ajudá-lo a lidar com a situação?”
• “Que oportunidades existem nesta situação?”
• “Que lições você pode aprender?”
• “Quem você conhece que lida bem com situações como esta? Como ele lidaria com
esta situação?”
– “Que estratégias ele usaria?”
– “Que crenças guiariam suas ações?”

Beck, J., (2022); Kuyken et al., (2010)


MARCO: Eu ficava feliz quando tocava. Os meus filhos às vezes sentam
comigo. E quando consigo tocar bem uma peça, realmente sou transportado
pela música.

Marco agendou uma aula de piano para ter um apoio estruturado na retomada dessas
habilidades. Ele reservou um tempo para tocar piano, fez contato com um amigo para se
encontrarem, ajudou a filha a lidar com o medo de cães. A ideia é de que essas atividades
impulsionariam o humor de Marco, reduzindo o tempo de ruminações sobre o trabalho e
dificultando o desencadeante de “pensar nos seus erros”.

Beck, J., (2022); Kuyken et al., (2010)


Para inserir no modelo de conceitualização as preocupações relacionadas: a) com a
saúde (medo de contrair HIV) e; b) com o comportamento de verificação
(preocupações por não trancar as portas ou por deixar o fogão ou as luzes acesas ao
sair de casa), devem ser seguidos 4 passos:

1º) Reunir exemplos de preocupações obsessivas - pensamentos intrusivos


característicos do TOC estão ligados à responsabilidade e à necessidade de estar no
controle (Frost et al., 1997). “Cada vez que eu saía de casa eu tinha o mesmo
sentimento de que o gás poderia estar ligado, apesar de ter verificado. É como se,
mesmo depois de eu ter revisto, se a casa viesse a pegar fogo, seria minha culpa,
porque eu havia verificado e ainda assim aconteceu. Então isso piorava as coisas.
Cada vez que eu queria ir embora, tinha que voltar e verificar o fogão. Eu estava
agindo como um louco.”

Kuyken et al., (2010)


Os pensamentos de Marco parecem típicos do TOC. A terapeuta também observa a visão
que Marco tem de si mesmo como “louco” e aproveita a oportunidade para introduzir
informações sobre o TOC para ajudar a normalizar as experiências dele.

TERAPEUTA: Eu entendo por que parece loucura para você. Mas todos temos às vezes
pensamentos que não fazem sentido e não conseguimos afastá-los. São chamados de
“pensamentos intrusivos”. As pesquisas mostram que todos têm pensamentos intrusivos.
MARCO: Eu nunca soube que minha esposa tivesse pensamentos assim.
TERAPEUTA: Os pensamentos intrusivos dela podem ser diferentes dos seus. Na maior parte
das vezes, para a maioria das pessoas, eles não são um problema.

TERAPEUTA: No TOC um pensamento aparece de repente na nossa cabeça e desencadeia


angústia. São pensamentos indesejáveis e desagradáveis que chamamos de pensamentos
intrusivos. O seu geralmente parece ser a respeito do fogão estar ligado. Correto?

Kuyken et al., (2010)


2º) Identificar fatores desencadeantes e mantenedores das preocupações obsessivas.

TERAPEUTA: Você diz que verificar o fogão ajuda, mas que também piora, porque, se alguma
coisa acontecer depois de você ter verificado isso torna a sua falha ainda maior.
MARCO: Bem, quanto mais eu verifico, pior me sinto, mas sinto que tenho que revisar.
TERAPEUTA: Quanto mais você verifica, mais você sente como sua culpa. Está correto?
MARCO: Sim, se eu verificar e depois acontecer algo ruim, isso me deixará ainda pior.
TERAPEUTA: Você disse que no final pediu a sua esposa para verificar. Como isso ajuda?
MARCO: Bem, eu não tenho certeza de que ela realmente verificou. Ela é meio despreocupada
com as coisas. Mas isso me ajuda porque, se algo acontecesse, não seria por minha culpa.

Ø Quem é o culpado é que é o importante nessa situação

Kuyken et al., (2010)


Para tratar o TOC, é vital trazer à tona todos os comportamentos usados para
neutralizar a ansiedade.

v podem ser comportamentos compulsivos evidentes e também


comportamentos que não são aparentes, como os rituais mentais. O
tratamento em geral só é efetivo quando interrompe todos os
comportamentos de manutenção (Salkovskis, 1999).

Modelos da TCC para o TOC - a pessoa vivencia um pensamento intrusivo com


uma ressonância pessoal que causa altos níveis de sofrimento (Frost et al.,
1997) e conduz à ansiedade. A pessoa tenta reduzir (neutralizar) a angústia por
meio de uma ação (van Oppen e Arntz, 1994). Esse processo de neutralização
da ansiedade, se repetido, é expresso em forma de compulsões.
Marco fala sobre ser sua a responsabilidade, o que é um tema identificado como central no TOC.

Modelo de preocupação no TOC Pensamento intrusivo:


“O fogão pode estar
ligado”.

Imagem: Explosão e casa


Verificação: Volto e incendeia
verifico o fogão Pensamento: “Foi minha
culpa”.

Ansioso

Pensamento: “Se a casa


Esquiva: Peço para minha explodir e incendiar a
mulher verificar. Evito ser o culpa não vai ser minha”.
último a sair de casa.
3º) Escolher as intervenções com base na conceitualização explicativa das preocupações
obsessivas

Com base na conceitualização do TOC, que integra as experiências de Marco com a teoria e a
pesquisa em TCC, a terapeuta orienta o trabalho.

O objetivo do tratamento do TOC não é parar com os pensamentos instrusivos, mas reconhecer
esses pensamentos como fenômenos normais que são piorados quando se tenta controlá-los

Kuyken et al., (2010)


Importa:

a) Interromper os comportamentos de manutenção para aprender que o resultado temido


não irá acontecer na ausência desses comportamentos de segurança;

b) Saber que os comportamentos variam de bem evidentes, como compulsões de verificar


ou limpar, a comportamentos muito discretos, quase imperceptíveis, como não tocar na
maçaneta da porta do terapeuta quando entra no consultório - para evitar
contaminação - ou então neutralizações encobertas ou mentais como contar ou ter
pensamentos positivos.

c) As pessoas com TOC acreditam que essas respostas podem ajudar a prevenir a
catástrofe temida. Cada uma delas deve ser identificada e acrescentada à
conceitualização.

Kuyken et al., (2010)


Tratamento:

O primeiro estágio da terapia foi normalizar a ocorrência dos pensamentos intrusivos de


Marco.

Marco e a terapeuta planejaram uma “pesquisa” em que ele perguntaria às pessoas em


quem confiava se elas alguma vez haviam experienciado pensamentos intrusivos.
(pensamentos estranhos ou incomuns) Essa tarefa, para ser feita em casa, lançou mão do
ponto forte já identificado por Marco de ter uma família e amigos muito próximos e
apoiadores.

Marco descobre que a mulher e o vizinho têm pensamentos estranhos e tentam de


alguma forma não dar crédito para eles. Ele percebeu que os pensamentos intrusivos dos
outros para ele não geravam desconforto. Marco também conseguiu concluir que não é o
pensamento em si, mas a reação dele ao pensamento é o que realmente importa.

Kuyken et al., (2010)


4º) Examinar e revisar a conceitualização das preocupações obsessivas.

Quando Marco perguntou para as pessoas se elas tinhas pensamentos intrusivos, a


resposta delas normalizou essa ocorrência para ele. A esposa disse que se sentia
responsável* pelo bebê no carrinho (carrinho rolar na ladeira) e o amigo se sentia
responsável* por não desrespeitar o templo religioso (falar palavras obscenas).

• Isso ajuda no aspecto da responsabilidade que é um fator que predispõe ao problema


de Marco – ele tem pressupostos de responsabilidade).

O terceiro elemento-chave na conceitualização das preocupações obsessivas de Marco


era o comportamento de esquiva e de verificação. Isso foi enfrentado com sucesso pelo
uso de exposição e de prevenção de resposta em todo o leque de comportamentos
identificados.

Kuyken et al., (2010)


As preocupações de Marco com HIV: TOC ou ansiedade em relação à saúde?

A ansiedade com a saúde e o TOC têm semelhanças, como o comportamento frequente de


verificação, vigilância e interpretação errônea de fenômenos que ocorrem normalmente, como os
pensamentos intrusivos e as sensações corporais.

Eles diferem no aspecto em que as pessoas com TOC focam na responsabilidade pelos
acontecimentos negativos, enquanto que as que têm ansiedade com a saúde temem ter uma
doença que seja ameaçadora à sua vida a curto ou médio prazo. Pessoas com ansiedade pela
saúde buscam a tranquilização de que estão saudáveis e solicitam exames médicos e
intervenções para buscar evidências de doença.

As preocupações de Marco com o HIV aumentavam a vigilância e a superestimação dos riscos;


incorporavam também a busca de tranquilização que é comum na ansiedade pela saúde e nos
processos de neutralização comuns no TOC.

Marco observou com a conceitualização sobre o TOC que os seus pensamentos e os seus
comportamentos desempenhavam algum papel no grau de ansiedade que sentia em relação a
contrair HIV.

Kuyken et al., (2010)


O medo de Marco não era medo de contrair HIV, era o medo do julgamento que fariam dele.

Marco sabia que mesmo que desenvolvesse HIV teria acesso a medicações para lidar com a
doença. Temia que as pessoas pensassem que ele havia sido infiel à esposa e pensassem mal
dele. A ameaça era contra os valores morais e sua posição social.

Marco lembrava que o pai (bipolar) tinha sido infiel quando estava em períodos de mania
(Marco não é bipolar) e isso fazia sua mãe sofrer. Marco aprendeu com essa experiência que
nunca agiria irresponsavelmente em termos sexuais. Marco não tem medo de contrair
hepatite C, pois essa doença não tem esse estigma de “ser sexualmente irresponsável”.

Ansiedade causada pelo medo de adquirir HIV se apoia no pressuposto subjacente:


“Se eu tiver HIV as pessoas vão achar que fui infiel a minha esposa e vão pensar mal de mim.”

Kuyken et al., (2010)


Conceitualização das preocupações de Marco com o medo
de contrair HIV (medo do julgamento )
Mancha vermelha na xícara
Desencadeantes Piscina pública
Possível sangue ou fluido

Pensamento intrusivo:
“Pode haver sangue ou fluidos e
eu vou pegar HIV

“Se eu tiver HIV, os outros vão


Pressuposto subjacente achar que eu fui infiel e vão
pensar mal de mim

Ciclos de manutenção Ansiedade Ciclos de manutenção

Verificação:
Examino o corpo buscando sinais de que meu sistema Esquiva:
imune está mal; faço testes clínico de HIV, tranquilizo Evito beber em xícaras
minha esposa que não tenho HIV Evito nadar em piscinas
Em Síntese...
O propósito da conceitualização não é para promover o insight por parte do cliente tipo:
“eu me entendo mais, mas não me sinto melhor”

O propósito da conceitualização é criar uma compreensão precisa das dificuldades de


modo a facilitar a escolha das intervenções apropriadas em TCC. A não compreensão do
caso, ou melhor, uma compreensão distorcida, parcial, fará o terapeuta escolher
intervenções não apropriadas para o caso.

Quando a terapia atinge os objetivos do cliente em um nível transversal, não é


necessário ir para o nível longitudinal. O nível longitudinal é usado quando há problemas
impregnados e resistentes, pessoas com transtornos de personalidade.
Conceitualizar bem e precisamente permite a escolha da técnica adequada para o caso.

Por exemplo, a ativação comportamental melhora o humor de pessoas deprimidas,


epecificamente para os casos de esquiva (Marco evita tarefas no trabalho e atividades
gratificantes em sua vida pessoal). Essa foi a intervenção escolhida pela terapeuta para
iniciar o trabalho.

O registro de pensamentos mostrou que Marco gasta uma grande quantidade de tempo
em casa ruminando os erros relacionados com o trabalho. A consequência desse foco
ruminativo foi que Marco não se envolveu em outras atividades mais gratificantes. A
terapeuta procurou pontos fortes e interesses de Marco para encontrar atividade que ele
pudesse achar prazerosas.
O terapeuta experiente pode visualizar um modelo explicativo elaborado desde o início
da terapia. Mas se ele fizer a conceitualização sozinho, ele irá deixar de lado a
colaboração na qual o cliente participa do processo.

A terapeuta também ajudou Marco, durante a ruminação, a mudar o foco da autocrítica


(“Por que eu sou assim?”) para uma ênfase na solução do problema (“O que eu posso
fazer quanto a isso amanhã?”).

Esta sugestão foi derivada das pesquisas que demonstram que esse tipo de alteração
no foco ruminativo produz efeitos benéficos no humor favorece a solução do problema
(Watkins et al., 2007).
Marco lembrou que ajudou sua mãe a resolver muitos assuntos financeiros e legais
depois que seu pai faleceu. Lembrou-se de que havia dado conta dessas tarefas
complexas separando os problemas em partes pequenas.

Marco empregou esse princípio na sua vida atual para reduzir a sua tendência a
procrastinar em grandes tarefas.

Marco ajudou sua filha a superar o medo de cães. Ele descreveu como a encorajou a
não correr quando visse um cão que a amedrontasse. Essa lembrança o inspirou a se
decidir por ficar no trabalho e terminar as suas tarefas, mesmo quando se sentisse
triste ou ansioso, exatamente como ele havia incentivado a filha a encarar seu medo.
Ele usou estratégias para enfrentar e não evitar as dificuldades (dividir em partes
menores e não fugir quando algo o amedrontasse).
Referências bibliográficas

BECK, J. S. (2022). Terapia Cognitivo-comportamental: Teoria e prática (3ª edição). Porto Alegre: Artmed.

BECK, J. S. (2007). Terapia cognitiva para desafios clínicos: O que fazer quando o básico não funciona (S. M.
de Carvalho, Trad.). Porto Alegre: Artmed (Obra original publicada em 2005).

BIELING, P. J., BECK, A. T, & BROWN, G. KL. (2000). The sociotropy-autonomy scale: Structure and implications.
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CLARK, D. A., BECK, A. T, & ALFORD, B. A. (1999). Scientific foundations of cognitive theory and
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FROST, R., STEKETEE, G., AMIR, N., BOUVARD, M., CARMIN, C., CLARK, D. A., et al. (1997). Cognitive assessment of obsessive-
compulsive disorder. Behaviour Research and Therapy, 35, 667-681.

KUYKEN, W., PADESKY, C. A., & DUDLEY, R. (2010). Conceitualização de Casos Colaborativa: o trabalho em
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SALKOVSKIS, P. M. (1999). Understanding and treating obsessive-compulsive disorder. Behaviour Research and Therapy, 37,
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van OPPEN, P., & ARNTZ, A. (1994). Cognitive therapy for obsessive-compulsive disorder. Behaviour Research and Therapy, 32,
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