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Náná

O barro da vida e da morte


2º EDIÇÃO

Por Dani Isoàlà


NÁNÁ

Nàná (nãnã) é uma das primeiras òrìsàs femininas ligadas ao momento da criação da
terra. Senhora que faz parte da família fúnfún (òrìsàs que vestem branco), tem nos detalhes
em lilás os seus sinais de ligação com o mundo dos mortos. Sua origem remete a formação do
mundo e dos primeiros seres humanos através do barro dominado por ela.
Quando Orúnmilà resolveu criar o mundo, deu a cada divindade o seu elemento da
natureza para cuidar na terra. A esta sábia senhora, Nàná, lhe foi concedido o domínio sobre o
barro, o terreno massapê próprio para o plantio, onde tudo dá e prospera. Assim como
Yemanjá, Náná é uma Iyaba antiga, que teve um papel muito importante da formação dos
seres humanos na terra.
Existe um itan que conta esta passagem. Òbátàlá e Àjálà receberam de Orúnmilà a
tarefa de fazer cabeças que se tornariam seres humanos e o corpo seria esculpido com o barro
dominado por Náná. Ao chegar na Terra com as cabeças, Òbátàlà passou a retirar vastas
porções de barro sem ao menos pedir licença, mas o choro da velha senhora era grande.
Àjálà pediu licença, conversou com a nobre senhora e recebeu dela a permissão para a
retirada do barro. No entanto, ela impôs uma condição: Do barro os seres serão formados, mas
para o barro devem voltar quando forem chamados por Ikú para que eu receba de volta aquilo
que está sendo dado. Assim foi combinado e os corpos humanos pôde ser formado.
Existe uma outra lenda que se conta sobre Náná, que é o fato dela não ter conseguido
criar os seus filhos. No entanto, quando se busca informações africanas sobre as suas
possíveis crias, conta-se que em tempos antigos nos territórios africanos, crianças que
nascessem com alguma deficiência ou doença era um sinal de mal presságio e traria má sorte
para a comunidade.
Antigamente, muitas dessas crianças eram sacrificadas nos rios devido o mito do mal
presságio, sendo modificado depois com o passar dos anos. Nos candomblés do Brasil, conta-
se que Náná gerou dois filhos que foram Obalúwàiyé e Osúmarè. O primeiro nasceu com o
corpo coberto de chagas e o segundo nasceu com o corpo e rosto de uma serpente. Ambos
foram colocados ao rio, como contam as fontes orais, para muita tristeza de Náná. Assim
Yemanjá acabou sendo a mãe criadeira de ambos.
Na região de Osogbo, no Benin, Náná é reconhecida por todos como a semente da
vida. Para o povo de culto dos voduns, ela é uma senhora que permitiu a formação dos seres e
de toda uma cidade. Independente de sua relação com os outros òrìsàs e sua dificuldade em
ser mãe, ela é a fonte da vida e permitiu de nascimento de todos aqueles que se encontram na
terra.
Seus instrumentos não são de metal como os outros òrìsàs. Sua ferramenta é a base de
palha da costa e sisal. Ela usa em sua mão um Ibiri, instrumento a base de palha da costa, sisal
e búzio que funciona para controlar os eguns que ela entrega para Oya. O fato dela não usar
ferramenta de metal traz para os terreiros de candomblé um itan que mostra o motivo dela não
usar o metal oferecido por Ogún.
Diz os contos que Ogun sempre foi o homem responsável por produzir as armas de
todas as divindades, assim como todos os obes responsáveis pelos sacrifícios de animais. Mas
Náná disse a Ogun que não usaria seus instrumentos de metais e sim de madeira. Ogun a
desafiou e perguntou como ela iria cortar os animais sem o metal. Náná aceitou o desafio.
Ogún disse que tomaria o seu reino em uma batalha, Náná não se sentiu ameaçada e
disse a Ogún que ele não conseguiria passar pelo seu terreno. Ogún tentou por três dias e três
noites, mas sempre que ele pisava no solo de Náná ele começava a afundar e a ficar preso no
seu barro. Apesar de toda a teimosia de Ogún ele percebeu que não conseguiria caminhar pelo
solo massapê e decidiu desistir de sua empreitada. Satisfeita com a desistência de Ogún, ela se
viu vitoriosa e disse a todos que nunca utilizaria metais como instrumentos de corte, mas sim
o poder do seu barro para copar animais através da cerâmica.
Ogun, acostumado a ser sempre solicitado, sentiu-se incomodado com a falta de
atenção de Náná para com seus serviços e torcia para que ela sentisse dificuldade em cortar
seus bichos, mas assim seguiu ela sem os metais até o fim. Sendo assim, nenhum instrumento
de Náná é de metal, sendo apenas de madeira ou cerâmica.
Apesar de Ogún sentir-se incomodado, ele reconhece a importância de Náná para os
seres humanos e para a terra. A sua antiguidade é sinônimo de sabedoria e por isso,
dificilmente costuma ser contestada. Ela é uma ancestral. Náná é uma ancestral que está
ligada ao culto das Iyamis, as senhoras da jaqueira.
Há um outro itan que mostra a ligação de Náná com Òsáàlà. Náná era temida pelos
homens, pois diziam que ela usava os eguns para punir os homens quando as mulheres
reclamavam. Um dia, Ogún procurou por Ifá para falar da perseguição de Náná aos homens
através dos eguns e pediu ajuda para acabar com esta situação. Os òrìsàs pediram ajuda
também a Osalufan.
Osalufan foi até Náná, este foi bem servido por ela, mas, em sua sabedoria e buscando
acalmar o instinto de Náná contra os homens, pediu a ela que fizesse um suco de igbins e
tomasse com ele em homenagem a sua visita. O suco deixou Náná calma, mais tranquila e
aplacou a sua ira.
Desse dia em diante, Náná passou a ouvir sempre os dois lados, a esposa e o marido,
passando a ter calma nas suas decisões ao solicitar a ação dos eguns. Um dia, Náná saiu de
casa para uma diligência e Osalufan se vestiu de mulher. Imitando a voz mansa de Náná, ele
chamou os eguns e exigiu que Osalufan também fosse obedecido pelos eguns. Desta forma,
ele também passou a controlar os eguns junto com Náná.

Nàná Bùkúù

Assim ela é chamada na cidade de Isara-Remo, no Estado de Ògún, na Nigéria. Lá


encontra-se o seu Templo, onde o culto é organizado e mantido vivo pelas mulheres. Apenas
as mulheres são iniciadas para esta divindade e tem o domínio do seu culto em territórios
africanos.
Somente as mulheres, também, realizam sacrifícios de animais dentro do templo,
puxam cantigas para homenagear a divindades e tocam seus instrumentos. Os homens não
tem acesso ao culto no interior do templo. Para uma mulher torna-se uma sacerdotisa de Náná,
ela precisa ter entrado no processo de menopausa como sinal de sua entrada no mundo como
anciã.
Esta exigência ocorre porque Nàná Bùkúù é considerada uma mulher madura e sábia,
onde a sua idade está diretamente ligada ao seu início de vida na terceira fase da vida, para
tanto, suas sacerdotisas precisam ter a mesma característica para poder ministrar os cultos
dedicados a ela. Isso não significa que a pessoa só poderá ser iniciada na idade avançada, pelo
contrário.
No entanto, o controle da organização dos templos e seus festivais ficam a cargo das
mais velhas, daquelas que já se encontram sem a menstruação.

Qualidades de Nàná

Nanã Abenegi: Nasceu o Ibá Odu, cabaça que traz Oxumarê, Oxossi Olodé, Oya e
Yemanjá.
Nanã Adjaoci ou Ajàosi: É a guerreira e agressiva que veio de Ifé, às vezes
confundida com Obá. Mora nas águas doces e veste-se de azul.
Nanã Ajapá ou Dejapá: Vive no fundo dos pântanos, é um Orixá bastante temido,
ligado a lama, a morte, e a terra. Veio de Ajapá. Cuida dos velhos e dos doentes, toma conta
dos moribundos. Nela predomina a razão.
Nanã Buruku ou Búkùú: Também é chamada Olú aiye (senhora da terra), ou Olówo
(senhora do dinheiro) ou ainda Olusegbe. Este Orixá veio de Abomey; ligado à água doce dos
pântanos, usa um ibiri azul.
Nanã Obaia ou Obáíyá: É ligada a água e a lama. Mora nos pântanos; usa contas
cristal vestes lilás e veio do país Baribae.
Nanã Omilaré: É a mais velha. Associada aos pântanos profundos e ao fogo. É a dona
do universo, a verdadeira mãe de Omolu Intoto. Veste musgo e cristal.
Nanã Savè: Veste-se de azul e branco, e usa uma coroa de búzios.
Nanã Ybain: É a mais temida. Orixá da varíola. Usa cor vermelha, é a principal, come
direto na lagoa, dando origem a outros caminhos. Para chamá-la, a ekedi tem que ir batendo
com seus otás para fazê-la pegar suas filhas.
Nanã Oporá: Veio de Ketu, coberta de òsun vermelho. É a mãe de Obaluaiyê, ligada
a terra, temida, agressiva e irascível.
Nanã Xalá: Muito ligada ao Branco e a Oxalá.

Comida de Náná

A comida mais comum dedicada a Náná é o vatapá de pão na tigela de barro. Isso não
significa que ela não possa comer outros elementos ligado aos seus enredos com os outros
òrìsàs, no entanto, esse é o alimento mais comum.

Traduções

1 Eni koríko odò ki wàlè, omon nílè kò ràjò,


Nàná ikú rè omon nílè kò ràjò, kò ràjò,
Kò ràjò, ó félé, kò ràjò, kò ràjò,
Nàná ikú rè omon nílè, kò ràjò, kò ràjò

Esteira de capim que cobre o rio e está rente ao chão,


Por onde os filhos da terra não viajam (transitam)
Nãnã é sua more (ikú), os filhos da terra não viajam,
Não transitam, não viajam, a terra é fina e frágil.
Nãnã é sua morte, filhos da terra não viajem.

2 Òdí Nàná ní ewá, léwà, léwà e


Òdí Nàná ní ewá, léwà, léwà e

A outra face de Nãnã é bonita,


A outra face de Nãnã é bonita

3 E Nàná olúwàyié e pa e pa
E Nàná olúwàyié e pa e pa

Nãnã, a senhora da terra, a senhora da terra que mata.


Nãnã, a senhora da terra, a senhora da terra que mata.

4 E taláàyà àjò olúwodò ki wa àjò


E taláàyà àjò olúwodò ki wa àjò

Senhora que pode exasperar-nos numa viajem


Senhora do rio quando estamos viajando

5 A bímon máà kú máa káwó òdé kò ríbo dé


A bímon máà kú máa káwó òdé kò ríbo dé

Que nossos filhos nascidos não morram,


que realizem (sua jornada) pelo arredores e não sejam
mal orientados e cheguem (ao seu desrtino)

6 Àwà ló bímon ayò Olokó, Nàná ayó


Àwá ló bímon ayò Olokó, Nàná ayó

Nós podemos tomar outra direção para termos a alegria dos nascimento de filhos,
Nãnã Ólócó (aquela que chama um parente morto como egungun) faça-nos felizes,
Nós podemos tomar outra direção para termos a alegria do nascimento de filhos,
Nãnã Ólócó, faça-nos felizes

7 Nàná ìyá kò lódò, Nàná e òrìsà,


Nàná e Nàná a ayò, Nàná ìyá kò lòdò

Nãnã, mãe que não tem rio, Nãnã, senhora e orixá,


Senhora Nãnã, faça-nos felizes, Nãnã, mãe que não tem rio

8 Òdí Nàná ayó ó ibi rìn sà-sà ó lóòde


Ó ibin rìn sà-sà, òdí Nàná ayó, Nàná ayó
Olùwodò sésé
O outro lado alegre de Nãnã, é ela que pode caminhar firme ao redor
Ela pode caminhar firme,
O outro lado alegre de Nãnã, faça-nos felizes
Senhora que se origina do rio, e que ali caminha com movimentos incessantes

9 Ó ibin rìn Odarà tó sé a áàrè Nàná olúwodò


Ibi rìn odará tó sé áàrè olúwa sè yìn sè yìn

Ela caminha bem, mas pode ser cansativo para nós,


Nãnã, a senhora do rio, ali caminha bem, mas para nós pode ser cansativo
Senhora que originou de si mesma, caminha com pequenos passos

10 Ibi rìn odàra tó sé àwa àárè kò mò rè dìde


Ibi rìn odàra tó sé àwa àárè Nàná olúwáyié

Ali ela caminha bem, mas para nós pode tornar-se cansativo
Pois não temos o seu conhecimento para nos mantermos de pé
Ali ela caminha bem, mas para nós pode torna-se cansativo
Nãnã é a senhora da terra

11 Ó ìyá wa òré ó ní ayalóòde


Ó ìyá wa òré ó ní ayalóòde

Ela é nossa mãe e amiga, ela a senhora da alta sociedade

12 Ni odun kéèta ti bàbá rè ikú ó ni òun náà ba ló


Tèdó níinú igbó ó ní sè ará ré sé ìyálóòdé ilú yíì

No terceiro ano após seu pai morrer ela refiguou-se


Fundou uma comunidade na floresta tornando-se a primeira dama

13 E tí mòn sòn fún omoode, e tí mòn jé ó


E tí mòn sòn fún omoode, e tí mòn jé ó

Senhora que sabe ser boa para os filhos dos caçadores, ela sabe ser boa

14 Ó ìyá àbíkú ó, ó ìyá àbíkú ó, ó ìyá àbíkú ó,


Ó, àbíkú olóyíyé, ó ìyá ábíkú ó, ó ìyá...

Ela é a mãe dos abicus, ela é a mãe dos abicus, senhora da sobrevivência dos abicus

15 E àbíkú olóyíyé, àbíkú olóyíyé, olóyíyé


Nyin won yéyé, olóyíyé nyin won yéyé
Senhora dona da sobrevivência dos Abicus
Senhora da sobrevivência dos abicus
Ela é a mãe deles

REFÊRENCIAS

Adilson de Osalá – Igbadu: A cabaça da existência


Reginaldo Prandi – Mitologia dos Orixás
Pierre Verger - Orixás

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