O Mal Estar Cultural

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ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE FILOSOFIA E PSICANÁLISE

CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE

OTAVIANO LUCAS DUARTE SANTOS


Curso Psicanálise – Modalidade Online
O presente trabalho visa desertar sobre a
A psicanálise e a descoberta do inconsciente: pressupostos
para uma revolução social e cultural no Brasil.

Modulo: Teoria Psicanalítica de Sigmund Freud II

Belo Horizonte
2023
Belo Horizonte
2023

Nas primeiras décadas do século XX, apresentavam-se as primeiras características que


colocavam o Brasil dentro do que se chama tempos modernos. Tempos de mudanças e
também das inseguranças que estas trazem. No que diz respeito ao âmbito internacional, o
mundo adentrava-se na Primeira Guerra Mundial, que além de trazer consigo mudanças no
âmbito político, social e econômico. A industrialização firmava-se enquanto disputava o
cenário com as ideias e práticas socialistas, implantadas na Rússia, a partir de 1917.
Em outras direções, outras mudanças e transformações, a psicanálise, que trazia ao
mundo os estudos feitos por Freud sobre a existência de um inconsciente, para além da
consciência e da racionalidade, e o homem como não senhor de si mesmo. Além disso, os
demais campos, como o artístico, adotavam novos estilos que expressavam as mudanças
ocorridas.
No Brasil, a maior parte da população ainda se concentrava nos campos, enquanto as
cidades, especialmente as maiores, cresciam pelo fato de as indústrias oferecerem
possibilidades à economia e à população. Uma população de grande variedade cultural e
étnica que faz do Brasil um país singular. E com essa singularidade encontra-se a busca da
subjetividade, que está em grande parte presente no discurso psicanalítico.

Com esse breve resumo, entramos então na discussão sobre como Freud e a psicanálise
continuam atuais e para isso podemos iniciar com a citação de três pontos, três questões
do pensamento Freudiano, que se encontram muito presentes. A primeira, pode-se dizer, é
a obsessão pelo sexo, nunca se foi tão obcecado pelo sexo, o debate de gênero sendo
uma prova de que a histeria continua sendo uma das formas de negação da diferença
sexual, só que agora a conversão histérica está na política e na linguagem e não como na
epoca de Freud, onde se apresentava como sintomas, em pessoas que perdiam a
capacidade de enxergar, de se levantar, etc. Hoje a conversão histérica e a negação ou
horror quanto a diferença e escolha sexual está na linguagem, na política, na educação, no
debate de gênero em geral e também na negação de que exista homem e mulher na
espécie humana.
Outro ponto ou terreno, seria a discussão quanto ao mal-estar na civilização. Nunca
houve uma época em que se tomou tamanha quantidade de ansiolíticos e antidepressivos,
onde as pessoas mentiram tanto sobre a própria condição de vida, onde os jovens se
tornaram mais reprimidos do que eram, e em que o mundo não fosse tão repressivo como
relação a sexo como se vê na atualidade. O resultado é a existência de muito mal-estar.
Pode-se então citar a ideia do Freud quando no texto ( o mal-estar na civilização, 1930) ele
levanta a suposição de que a felicidade não faz parte dos planos da criação, que se mostra
atual, em um mundo em que se é tão obcecado com a felicidade, e que esta mesma
felicidade produz tantos sintomas de infelicidade
E um último ponto a ser citado é quanto a religião, o entendimento da psicanálise freudiana
de que a religião nasce de uma condição de desamparo. As pessoas buscam significado, e
com isso se vê um aumento nas crenças religiosas e em todo tipo de mágica, mas também a
tentativa de associação desta com teorias científicas. A humanidade continua sofrendo de
desamparo e continua ao mesmo tempo, tendo processos psicológicos regressivos para
tentar lidar com este desamparo.
Mesmo com o nosso conhecimento neurocientífico dos principais neurotransmissores
envolvidos na depressão são a serotonina e a noradrenalina, e que um desequilíbrio na
produção deles está associado a instalação da doença, mesmo que saibamos que a
funcionamentos alterados em régios do cérebro quando a um Transtorno de Ansiedade
(principalmente na região da Amígdala, crucial na aquisição e expressão do medo), e mesmo
que tenhamos produzido medicamentos que tratam estes distúrbios, ainda vemos uma
epidemia de depressão e ansiedade. O ser humano é moldado pelo ambiente em que vive,
sacrificamos muito de nossa felicidade e de nossos desejos para vivermos em segurança,
para vivermos em sociedade, reprimimos nossa agressividade natural, e por que não usar
um termo psicanalítico, reprimimos nossas pulsões, para nós encaixarmos, e isso trouxe o
benefício de conseguirmos viver em comunidade, mas também trouxe a consequência de
um eterno mal-estar, e como somos modulados pelo ambiente em que vivemos e como não
podemos mudar de ambiente, talvez esse mal estar se faça sempre presente.
Talvez essa seja uma das maiores contribuições da psicanálise no âmbito social e cultural,
a de nos fazer admitir que a infelicidade e o mal estar talvez seja de nossa natureza, do
reprimir de nossos instintos, pulsões e desejos que foram necessários para vivermos em
grupo, para convivermos com o outro, a sublimação da dicotomia nós e eles, que faz com
que nosso córtex insular se acenda num exame de RMF tanto quando sentimos nojo de um
inseto quanto quando sentimos nojo das ações de alguém. O entendimento de que talvez
para um bom convívio é necessário também um pouco de tristeza.

Referências:

Sapolsky, Robert. Comporte-se: a biologia humana em nosso melhor e pior. Edição


portuguesa. Companhia das Letras, 2021.
Sapolsky, Robert. Por Que As Zebras Não Tem Ulceras?. Edição portuguesa. Francis, 2008.
Freud, S. (1996a). O mal-Estar na civilização (Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. 21). Rio de Janeiro: Imago.
Freud, S. (1996g). Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. In J. Strachey (Ed.), Edição
standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 7, pp. 117-232).
Rio de Janeiro: Imago.
Freud, S. (1996f). A interpretação dos sonhos. In J. Strachey (Ed.), Edição standard
brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 4, pp. 1-752). Rio de
Janeiro: Imago.

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