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CURSO CAPACITAÇÃO TEOLÓGICA

NOVO TESTAMENTO III


(Epístolas Universais e Apocalipse)

EPÍSTOLAS UNIVERSAIS
Visão Geral
Das últimas sete epístolas do Novo Testamento, duas advertem aqueles que
desprezam a autoridade do Senhor e de Sua Palavra, pois tais pessoas enfrentarão o Juízo
de Deus que virá sobre eles (2Pedro e Judas). Já as três cartas de João foram escritas
contra as ameaças da heterodoxia gnóstica.
Por sua vez, Tiago e 1Pedro falam sobre o sofrimento a que estão submetidos os
cristãos em seu contexto histórico. Estas provações emergiram de várias fontes e por
razões diferentes. Elas, contudo, eram desanimadoras, deixando os cristãos muitas vezes
perplexos quanto ao propósito dessas provações em sua experiência.
1Pedro, mais do que qualquer outra epístola, está interessada no tema do
sofrimento. Esta palavra aparece 17 vezes, referindo-se aos sofrimentos de Cristo e do
Seu povo (cf. 1Pe 4:12-19). O período de sofrimento retratado por Pedro parece referir-
se aos dias da perseguição de Nero. Desta forma Pedro escreve para dar esperança àqueles
que estão sofrendo por sua fé.

Manuscritos das Epístolas Universais


Conforme a lista mais recente, o número dos manuscritos do NT conhecidos inclui
85 papiros, 268 maiúsculos (escritos em CAIXA ALTA, ou seja, em letras maiúsculas,
também chamado de “Uncial”), 2.972 minúsculos (escritos em letras minúsculas) e 2913
lecionários. O papiro P72 (Papiro Bodmer VII e VIII) contém o texto de Judas e duas
epístolas de Pedro. Foi provavelmente escrito no III ou IV século por um escriba cuja
língua materna era o copta (proveniente do Egito). Este manuscrito oferece o texto mais
antigo ainda preservado destas três epístolas.
O P72 confirma, em extensão e conteúdo, o valor do texto das três epístolas que
se acham testemunhadas em B (chamado de “Códice Vaticano”, que é o manuscrito mais
antigo escrito em letra maiúscula). Apenas para relembrar, precisa-se dizer que a divisão
em capítulos dos livros da Escritura remonta-se ao início do 1200 d.C.. Ela é atribuída à
Stephen Langton, Arcebispo de Canterbury; e a divisão em versículos aparece pela
primeira vez com o livreiro parisiense Robert Stephanus, na edição do NT a partir do ano
1551.

EPÍSTOLA DE TIAGO

1. Título
É provável que esta epístola, como as outras do NT, por ser uma carta,
originalmente não tivesse nenhum título. O Códice Sinaítico, um dos manuscritos mais
antigos aonde se acha a Epístola de Tiago, não tem título ao começo da carta; mas termina
com o acréscimo, "Epístola de Tiago". Outros manuscritos antigos têm o singelo título
em grego, Iakobou Epistole ("Epístola de Tiago"). Manuscritos posteriores dão a esta
epístola o título de “geral” ou “católica” (que significa “universal”), porque está dirigida
a toda a igreja e não a uma comunidade específica ou a uma pessoa.
O historiador Eusébio se refere à Epístola de Tiago como à primeira das sete
epístolas chamadas "católicas", no sentido de "gerais" ou "universais" (História
eclesiástica, II, 23). Eram chamadas assim porque estavam dirigidas à Igreja em geral,
embora isto não é completamente apropriado quando se aplica a 2 e 3 João, que foram
dirigidas a pessoas. As sete epístolas desde Tiago até Judas estavam colocadas juntas
depois de Atos em todos os primeiros manuscritos, precedendo às epístolas de Paulo. A
ordem das epístolas gerais, como aparecem nas Bíblias modernas, é o que geralmente se
encontra nos manuscritos principais.

2. Autor
Na Epístola de Tiago não há suficientes evidências para identificar em forma definitiva o
seu autor. No NT há muitas referências a homens chamados "Iacobos", no grego (ou
Tiago). Este nome era muito comum entre os judeus porque representa o equivalente
grego do nome hebreu Jacó. O uso freqüente deste nome se observa até na lista dos doze
apóstolos (Mat. 10:2-3; Mar. 3:16-19; Luc. 6:14-16). Um dos apóstolos era Tiago, o filho
do Zebedeu e irmão do João; e um segundo Tiago era o filho do Alfeu. Outro personagem
bíblico chamado Tiago era o pai de um dos doze, que é identificado como Judas "de
Tiago".
É razoável supor que o autor da Epístola de Tiago é uma das pessoas cujo nome
aparece no registro das Escrituras, e não outro Tiago completamente diferente dos
conhecidos. O tom da introdução (cap. 1:1) sugere que o autor fala como um que é bem
conhecido por aqueles aos quais se dirige, e que o faz com autoridade reconhecida.
Embora, de acordo com o relato dos Evangelhos, os doze apóstolos estavam
intimamente relacionados com o Senhor Jesus, Tiago filho de Zebedeu era o mais
destacado dos dois apóstolos com esse nome. Entretanto, poucos autores lhe tem atribuído
a epístola. E até esta possibilidade parece ficar eliminada por sua morte prematura (44
d.C.) e pelo fato adicional de que a introdução (cap. 1:1) parece indicar que havia só um
Tiago proeminente na igreja no tempo quando se escreveu a epístola, e não dois ou mais.
Além dos dois apóstolos chamados “Tiago”, os autores dos Evangelhos se referem
a outro Tiago, o primeiro que se nomeia e, portanto, provavelmente o maior dos quatro
irmãos do Jesus (Mat. 13:55; Mar 6:3). Tiago o irmão de Jesus aparece com segurança só
em Gál. 1:19, onde Paulo afirma que em sua primeira visita a Jerusalém, depois de sua
conversão, de todos os apóstolos só viu a Cefas (Pedro) e a "Tiago o irmão do Senhor".
Fica, pois, em pé a pergunta: Este Tiago era o filho de Alfeu ou o “irmão” do
Senhor? Em favor de identificá-lo como filho de Alfeu, está o fato de que parece estranho
que se mencione por nome a um Tiago entre os doze (Atos 1:13-14), para que pouco
depois desapareça do relato sem que se tenha sequer notícia de sua morte, enquanto que
outro do mesmo nome aparece em forma destacada (Atos 12:17) sem nenhuma palavra
de introdução. Por outro lado, podem apresentar-se algumas evidências para identificar a
este homem com o Tiago que era irmão do Senhor. A referência que faz Paulo em Gál.
2:9 a Tiago, o dirigente da igreja, pouco depois de que o menciona como "o irmão do
Senhor" em Gál. 1:19, dá a impressão - embora não se possa provar definitivamente - de
que estes dois “Tiagos” são a mesma pessoa. Além disso, o relato que Josefo (historiador
judeu) apresenta da morte de Tiago, o irmão do Senhor, sugere que ele era um dos
dirigentes da igreja (Antiguidades XX. 9. l). A tradição cristã, pelo menos do século II,
identifica a Tiago, o dirigente da igreja de Jerusalém, como o irmão de Jesus (Eusébio,
História eclesiástica, II. 23).
Em conclusão, pode-se dizer que ainda não se definiu a paternidade literária da
Epístola de Tiago. O autor era provavelmente um dos três principais personagens que
levam o nome de Tiago no NT.

3. Marco Histórico
A quantidade de alusões geográficas que há nesta epístola sugere que ela foi
escrita na Palestina. Pode-se conjecturar que o autor: 1) vivia em uma terra onde
abundavam o azeite, o vinho e os figos; 2) que não estava longe do mar; 3) que muito
perto haviam fontes de água doce e amarga; 4) que a terra estava exposta a secas; 5) e que
a chuva era de grande importância.
Não há maneira segura para determinar a data da epístola. Como já se fez notar,
parece que foi escrita quando só havia um Tiago que se destacava na igreja, ou seja,
depois de 44 d.C., quando foi morto Tiago o filho de Zebedeu. A evidência interna
localiza esta epístola entre os primeiros documentos do NT.

4. Tema
Esta epístola ensina um cristianismo prático, mostrando os resultados ou as obras
que uma fé vivente e genuína produz na vida de um discípulo. Em toda a carta se destaca
o contraste entre as manifestações, os efeitos e os resultados da verdadeira e da falsa
religião. Esta epístola homilética está cheia de belas e atraentes ilustrações. O estilo é
singelo e direto. Os pensamentos estão em grupos claramente diferenciados entre si, e não
dispostos em um plano evidente.
Tiago escreve com liberdade o que brota da abundância de seu coração; ocupa-se
dos temas à medida que surgem em sua mente. Há também muitas alusões ao Sermão do
Monte (Mateus 5, 6 e 7). Nesta epístola existem ainda diversas passagens paralelas com
os escritos de Paulo (cf. Tg. 1:22; Rom. 2:13) e com os escritos de Pedro (cf. Tg 4:7;
1Ped. 5:8-9).
PRIMEIRA EPÍSTOLA DE PEDRO

1. Título
O título desta epístola nos manuscritos gregos mais antigos se reduz a Pétrou A
("De Pedro I"). A frase "epístola universal" refere-se a que esta carta não está dirigida a
um indivíduo ou a uma congregação, mas à igreja em geral, na maior parte da Ásia Menor.
Por esta mesma razão às vezes é chamada epístola "católica" ou "geral".

2. Autor
Na epístola se diz que Pedro é seu autor (cap. 1:1). Apresentaram-se diversas
teorias para indicar que não foi em realidade Pedro, mas outra pessoa, quem escreveu a
carta. A teoria mais comum sugere que seu autor foi Silvano (cap. 5:12). Mas, de modo
geral, não há razão para duvidar da autoria petrina da epístola.

3. Marco Histórico

O apóstolo Pedro escreveu o que poderia chamar-se de uma carta circular dirigida
a "expatriados da dispersão no Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitinia". Estas cinco
zonas incluíam quase tudo o que hoje chamamos a Ásia Menor. A maioria dos crentes
dessas igrejas era de gentios; os cristãos de origem judia constituíam uma minoria. Pedro,
como missionário enviado a este grupo minoritário (Gál. 2:9), tinha um interesse especial
nos judeus.
Não se pode determinar a data precisa quando se escreveu esta epístola. Provavelmente
foi escrita de Roma, como o sugere o nome "Babilônia" (5:13). Isto pode significar que
foi escrita perto do fim da vida do apóstolo. O fato de que não haja nenhuma referência
nas cartas que Paulo escreveu de Roma, a que Pedro houvesse estado nessa cidade,
sugere-se que Pedro não chegou ali a não ser até "aos dias da detenção final de Paulo"
(Atos dos Apóstolos, p. 418) ao redor do ano 66 d.C.
Portanto, embora não se pode afirmar nada definitivo quanto à data quando foi
escrita 1Pedro, o que se tem dito sugere como uma data provável os anos de 64-66 do
século I.

4. Tema
Pedro tinha um propósito pastoral ao escrever esta epístola. O “fio” com o qual se
entrelaça a trama do conselho do apóstolo, é o perigo da perseguição, a iminência do
"fogo de prova" (cap. 4:12) e a certeza dos tempos difíceis nos quais viviam os crentes.
Tendo em conta tal situação, Pedro procura fortalecer a fé de seus leitores, os chama a
uma conduta irrepreensível, a serem cidadãos exemplares, a testemunharem lealmente
por Cristo, e a se prepararem devidamente para encontrar-se com seu Senhor. E para
ajudá-los a alcançar estas metas, Pedro inclui conselhos específicos para os criados (cap.
2:18), as esposas (cap. 3:1-6) os maridos (cap. 3:7), os anciões (cap. 5:1-4) e os membros
mais jovens da igreja (cap. 5:5-9).
Através de toda a carta se vinculam um tenro espírito com firme sentido de
liderança, ambos santificados mediante um elevado conceito de Cristo.
SEGUNDA EPÍSTOLA DE PEDRO

1. Título
Nos manuscritos gregos mais antigos, a epístola simplesmente se intitulava Pétrou
B ("De Pedro II").

2. Autor
Em primeiro lugar, ou 2Pedro foi escrita pelo apóstolo, ou é sem dúvida uma
falsificação. Não só começa na forma comum: "Simão Pedro, servo e apóstolo de Jesus
Cristo", para identificar a seu autor, mas também quem a escreveu afirma que foi um dos
que estiveram com Cristo no monte da transfiguração (2Ped. 1:17-18; cf. Mat. 17:1). O
autor não pode ser outro a não ser o apóstolo Pedro, a menos que se trate de uma evidente
falsificação.
Embora seja um fato que o estilo da linguagem de 2Pedro é diferente do da
primeira epístola, pode explicar-se razoavelmente, pois é provável que Pedro - um
palestino de pouca cultura, cuja língua materna era o aramaico - sem dúvida recorreu à
ajuda de um secretário para a redação de uma epístola que foi escrita em grego. Se Paulo,
que conhecia a língua grega com desenvoltura, evidentemente usou secretários, é ainda
mais lógico supor que Pedro houvesse procurado a ajuda de pessoas que tivessem
influenciado muito na redação de suas cartas em grego. De modo que dois secretários
diferentes muito bem puderam ter escrito duas epístolas com diferente redação.
Embora os argumentos contra a autenticidade de 2Pedro tenham peso quando se
considera de um ponto de vista puramente científico, não podem ser considerados como
provas. Mas quando as mensagens do livro mesmo são consideradas de um ponto de vista
espiritual, são uma poderosa razão para rechaçar qualquer teoria que relegue a epístola
aos dias posteriores aos apóstolos, especialmente se se considera que muitos dos
aparentes problemas da paternidade literária de Pedro podem explicar-se
satisfatoriamente.

3. Marco Histórico
A carta de 2Pedro está dirigida "aos que conosco obtiveram fé igualmente
preciosa" (cap. 1:1), o que presumivelmente se refere aos leitores da primeira epístola, o
que parece confirmar-se na passagem de 3:1.
Como Pedro provavelmente foi martirizado não depois do ano 67 d.C., acredita-
se que sua segunda epístola foi escrita pouco antes dessa data. Não se pode saber onde se
escreveu a epístola; o lugar mais provável foi Roma.

4. Tema
O tema, como o de 1Pedro, é pastoral. O autor convida seus leitores a continuarem
crescendo na graça e em conhecimento espiritual para que se possa cumprir o propósito
de Deus em sua chamada e eleição. No cap. 1, Pedro os anima referindo-se à sua própria
experiência e à palavra profética. No cap. 2, os admoesta contra os falsos professores. No
cap. 3, depois de tratar a zombaria sobre a promessa do retorno de Cristo por parte dos
gozadores, o autor conclui com uma afirmação da certeza da segunda vinda e uma
exortação a fim de que estejam preparados para esse grande acontecimento.
PRIMEIRA EPÍSTOLA DE JOÃO

1. Título
Nos manuscritos gregos mais antigos o título desta epístola é simplesmente
Ioannou A, literalmente: "De João, I"; quer dizer, “a primeira (epístola) de João”. Não se
sabe se esta foi a primeira epístola pastoral que João escreveu, mas é a primeira das que
foram conservadas pela igreja cristã.

2. Autor
João não se identifica em nenhuma das epístolas do NT que lhe atribuem;
entretanto há uma similitude tão grande entre a primeira epístola e o Evangelho de João,
que a maioria dos eruditos aceitam que o autor de ambos é o mesmo. Se aceitarmos que
o quarto Evangelho foi escrito pelo discípulo amado (João 21:20-24), identificado como
o apóstolo João, um dos filhos de Zebedeu, temos razões válidas para afirmar que ele
também é o autor da primeira epístola que leva o nome do João. Uma relação similar une
a primeira epístola com a segunda, e a segunda com a terceira.
Além dos paralelismos, há muitas outras similitudes que facilmente se percebem
entre a epístola e o Evangelho. Ambos começam em forma súbita, sem nenhuma
introdução própria da forma epistolar. A epístola começa com "O que era desde o
começo... [o] Verbo de vida"; o Evangelho, com "No princípio era o Verbo". Há uma
grande semelhança em estilo, vocabulário, sintaxe, uso de preposições, construção
gramatical e diversas antíteses como “trevas e luz”, “morte e vida”, “ódio e amor”, que
são tipicamente características joaninas (de João). A diferença em propósito e dimensão
dos dois livros admite uma grande divergência, mas o tema de ambos é tão similar, que a
epístola poderia servir como um resumo dos temas sobressalentes do Evangelho.
Apesar de tudo, a opinião dos eruditos ainda se acha dividida quanto à paternidade
literária de 1João. Algo proveniente da insistência em não aceitar ao apóstolo João como
autor da epístola possivelmente se deva a um subconsciente hábito de duvidar. O cristão
sensato pode dizer com justiça que tem uma base adequada para afirmar que o autor desta
epístola é João - o discípulo amado.

3. Marco Histórico
Na epístola não há nenhuma referência específica ao autor, às pessoas as quais foi
dirigida a carta, ao lugar do qual foi escrita, ou ao tempo quando se escreveu; portanto,
as conclusões relativas a seu marco histórico têm que deduzir-se da evidência interna
(retiradas da própria epístola). Essa evidência deve unir-se estreitamente com as
conclusões aceitas sobre o autor e a data do quarto Evangelho.
Qual dos dois se escreveu primeiro, o Evangelho ou a epístola? Não é possível dar
uma resposta definitiva, e a opinião dos eruditos se inclinou em uma ou outra direção;
mas é difícil negar que a epístola pressupõe o conhecimento que já tinham os cristãos do
Evangelho de João, e que se apóia nele. Se lhe dá seu devido valor a este argumento,
então parece que a epístola foi escrita depois do Evangelho, e até poderia pensar-se que
foi um apêndice dele. Além disso, é fácil reconhecer que antes de registrar por escrito
suas lembranças e profundas meditações, o apóstolo teve que ter pensado muito quanto
ao conteúdo de seu Evangelho e havê-lo ensinado ao povo. Por isso é possível que a
epístola seja anterior ao Evangelho. Por estas e outras considerações mais técnicas não é
possível que, pela evidência interna somente, se chegue à uma conclusão firme quanto às
datas da escrita de ambos os livros.
Mas o que é claro é que a epístola foi escrita por um ancião ao que o parecia
apropriado dirigir-se a seus conversos como a "filhinhos" (cap. 2:1, 12, 18, 28; 3:7, 18;
4:4; 5:21). Não se esclarece para os quais se dirigiu a carta, mas é óbvio que foi enviada
a um grupo conhecido de cristãos com os quais tinha trato pessoal o reverenciado autor.
Ainda não se apresentou nenhuma razão concludente para rechaçar a tradição,
amplamente aceita, de que João escreveu-a em sua velhice para os crentes de Éfeso, ou
da Ásia Menor, onde ele tinha exercido seu ministério. A data quando se escreveu poderia,
então, localizar-se entre o ano 90 e o 95 d.C.

4. Tema
O propósito principal da epístola também é pastoral. João escreve com amor a
seus filhos espirituais para que possam estar melhor preparados para viverem a vida cristã.
O amor é a nota dominante da carta. O marco é uma exortação singela embora
profundamente espiritual. Deus é amor (cap. 4:8); o amor vem de Deus (v. 7); Deus nos
amou e enviou a Seu Filho; portanto, devemos nos amar mutuamente (vv. 10-11). Mas
esses elevados temas projetam-se dentro de um marco de oposição, o que dá à epístola
um propósito tão polêmico como pastoral.
É claro que algumas heresias tinham perturbado à igreja, e que alguns falsos
professores dentro dela tinham tratado de perverter a fé (cap. 2:18-19). Embora já
tivessem deixado a igreja, sua influência perdurava e continuamente a ameaçava,
prejudicando-a. João escreve para rebater esse perigo, para afiançar aos membros nas
doutrinas cristãs essenciais e para fazer com que a verdade seja tão atraente que os
seguidores de Cristo não sejam seduzidos pelo engano.
A heresia básica contra a qual luta João foi identificada como uma espécie de
protognosticismo (anterior ao gnosticismo), que ensinava um conhecimento (gnosis)
falso. Pela ênfase que lhe dá na epístola, parece que a oposição provinha de duas
principais formas de gnosticismo: o docetismo e o ensino de Cerinto. A heresia de ambos
se referia à natureza de Cristo. O docetismo negava a realidade da encarnação e ensinava
que Cristo tinha um corpo humano só na aparência. A segunda heresia se originou em
Cerinto, um dos contemporâneos de João, que se educou no Egito e logo ensinou na Ásia
Menor e propagou ensinos judaizantes. Cerinto ensinava que Jesus tinha nascido em
forma natural de José e Maria, e Cristo “entrou” no corpo de Jesus por ocasião de Seu
batismo, mas que se retirou ou saiu antes da crucificação. Os originadores e pregadores
dessas heresias são graficamente descritos por João como "anticristos" (cap. 2:18, 22;
4:3) e "falsos profetas" (cap. 4:1). Para combater esses enganos, João destaca a realidade
da natureza humana e visível de Cristo durante a encarnação (cap. 1:1-3), que o Salvador
veio na carne (cap. 4:2) e que os crentes podem desfrutar desse verdadeiro conhecimento
(cap. 5:20), em oposição à falsa gnosis.
Estas controvérsias antigas têm um grande significado em nosso tempo, pois ainda
hoje seguem-se questionando a divindade de Cristo. Um estudo desta epístola fortalecerá
a mente do leitor à verdade da encarnação e permitirá que capte uma elevada visão do
Filho de Deus, o qual foi enviado para ser a propiciação pelos pecados de todo o mundo.
SEGUNDA EPÍSTOLA DE JOÃO

1. Título
Nos antigos manuscritos gregos o título é simplesmente Ioannou B. Não dispomos
de nenhuma evidência externa pela que possamos saber se esta carta é segunda em ordem
cronológica, mas por meio de uma comparação do texto das três epístolas atribuídas a
João, parece provável que esta foi escrita depois da primeira.

2. Autor
Se João estava escrevendo a um indivíduo ou a um grupo que lhe era bem
conhecido, não tinha necessidade de usar outra identificação fora do qualificativo
afetuoso com que já era conhecido por seus leitores. A identificação do "presbítero”
depende em grande medida da relação que se descobre entre a segunda epístola e a
primeira, e entre ambas e o quarto Evangelho. As similitudes evidentes entre a segunda
carta e a primeira sugerem um autor comum. A palavra "anticristo" é exclusiva do v. 7 e
de 1João 2:18, 22; 4:3. Quanto ao estilo similar, compare-se "andando na verdade" (2Jo
4) com "andamos em luz" (1Jo 1:7); "um novo mandamento" (2Jo 5) com "um
mandamento novo" (1Jo 2:8); "amemo-nos uns aos outros" (2Jo 5; 1Jo 3:11); "tem ao Pai
e ao Filho" (2Jo 9) com "tem ao Filho" (1Jo 5:12). Como se apresentou na introdução da
primeira epístola, há razões válidas para aceitar ao apóstolo João como o autor desta carta,
assim como do Evangelho que leva seu nome. Se se aceitarem essas razões, também pode
aceitar-se que João é o autor desta epístola.

3. Marco Histórico
Pelas razões já expostas, é provável que esta carta foi escrita depois da primeira;
e se se aceita a João como o autor, então ela foi escrita pouco depois da primeira carta,
devido à idade do apóstolo. O fator adicional que manifesta a segunda epístola é que
falsos professores estavam abusando da hospitalidade cristã para propagar doutrinas
falsas.

4. Tema
Uma leitura superficial da epístola é suficiente para captar sua natureza íntima.
Evidentemente é uma carta pessoal, mas se foi dirigida a um indivíduo ou a um grupo,
isso depende da interpretação que se dê à frase: "à senhora eleita e a seus filhos" (v. 1).
Dentro destes limites, o tema da epístola demonstra satisfação pelo estado espiritual dos
leitores, anima-os na jornada cristã; é uma admoestação contra os falsos professores e
sugere como tratar aos enganadores. A carta revela o espírito tenro e amável do autor e a
beleza da intimidade espiritual que podia existir entre os irmãos na fé da igreja primitiva.
Sugeriu-se que o tamanho quase idêntico da segunda epístola e da terceira se
deveu à dimensão da folha de papiro que em geral se usava na época.
TERCEIRA EPÍSTOLA DE JOÃO

1. Título
Nos antigos manuscritos gregos o título simplesmente é Ioannou C, literalmente,
"De João 3".

2. Autor
Se não houvesse uma segunda epístola seria muito discutível a paternidade
literária desta terceira carta; mas a similitude de estilo entre estas duas curtas epístolas
indica um autor comum. Uma vez que se reconhece a João como o que escreveu a segunda
epístola, ele também pode ser reconhecido como o autor da terceira.

3. Marco Histórico
Esta epístola é evidentemente uma carta pessoal escrita a um tal Gaio, que não é
identificado. Trata-se de um cristão fiel, muito elogiado por sua bondosa hospitalidade
para com os professores itinerantes. Nomeiam-se outros dois personagens: Diótrefes,
dirigente dado à polêmica, e Demétrio, que possivelmente era um dos professores
itinerantes. O quadro que se deduz pelo que está escrito sobre estes três personagens,
apresenta-nos uma notável evolução na igreja cristã e sugere que esta epístola foi escrita
depois da segunda, portanto ainda mais perto da morte de João. Parece ficar bem
estabelecido o ministério dos pregadores itinerantes ou de irmãos visitantes (vv. 5-8).
Diótrefes se atribui o poder de expulsar da igreja, possivelmente mediante uma espécie
de “excomunhão” (v. 10), àqueles a quem não simpatiza pessoalmente.
Tudo isto indica que a situação revelada na segunda epístola evoluiu, e isto
transforma a terceira epístola na última das três cartas de João que chegaram até nós. Isto
não quer dizer que João não escreveu outras cartas. Não se pode provar que a carta ou
escrito que se menciona no vers. 9 seja a segunda epístola, embora é uma boa
possibilidade de que assim fora; nem tampouco se pode determinar quanto tempo
transcorreu entre a redação da segunda e da terceira epístolas; mas parece provável que o
intervalo foi breve, pois ambas se parecem tanto em estilo como em conteúdo.

4. Tema
O tema desta 3ª carta é singelo e direto. A segunda epístola foi escrita para advertir
contra os falsos professores itinerantes, mas a terceira se envia para opor-se às ocorrências
cismáticas exemplificadas pelas ações de Diótrefes.
É provável que Diótrefes fosse o ancião da igreja e que tivesse aceitado alguns
dos falsos ensinos dos gnósticos. Quando João escreveu às igrejas para refutar esses falsos
ensinos, parece que Diótrefes se opôs a que a carta fora lida diante dos membros da igreja
(v. 9). Também se impediu que se escutasse aos ministros itinerantes que possam ter sido
enviados por João, e os que os escutaram em particular foram excomungados
publicamente por Diótrefes, aparentemente um homem arrogante.
Quando João escreve a Gaio, ele se esforça por assegurar-se que sua mensagem
chegue aos irmãos leais. Pode ter estado preparando-os para que aceitassem uma mudança
de anciões de igreja quando ele chegasse e lhes "recordasse" as ações de Diótrefes (v. 10).
Nesta carta, como nos outros escritos de João, se manifesta o mesmo espírito de
terno afeto pessoal; mas por cima do propósito imediato da epístola brilha a beleza do
caráter do apóstolo e a inspiração que tem proporcionado a seus leitores através dos
séculos.

EPÍSTOLA DE JUDAS

1. Título
Nos manuscritos gregos mais antigos o título desta epístola é simplesmente Ioudas
("Judas"). As palavras "A epístola universal" se referem a que esta carta não foi dirigida
a uma pessoa específica, ou a determinada igreja ou grupo de igrejas, mas "aos chamados
[quer dizer, a todos], amados". Por esta mesma razão às vezes é chamada "epístola
católica", pois católico significa “universal”.

2. Autor
O autor se chama a si mesmo "Judas, servo de Jesus Cristo, e irmão de Tiago" (v.
l). Não há, pois, razão para duvidar da identificação, embora as palavras podem
interpretar-se em mais de uma forma.
No NT se mencionam vários Judas: Judas Iscariotes (Mar. 3:19), Judas "não o
Iscariotes" (João 14:22), Judas o galileu (Atos 5:37), Judas de Damasco (Atos 9:11),
Judas, com o apelido do Barsabás (Atos 15:22). Geralmente se concorda em que Tiago,
o irmão do Senhor, é o Tiago que presidiu o concílio de Jerusalém (cf. Atos 12:17; 15:13)
e que possivelmente mais tarde escreveu a Epístola de Tiago. Portanto, o autor da epístola
de Judas bem pôde ter sido o irmão deste Tiago e, portanto, irmão do Senhor Jesus. Esta
relação tenderia a fazê-lo proeminente na igreja e lhe daria o grau de autoridade que se
reflete em sua epístola. O fato de que não manifesta explicitamente sua relação familiar
com o Senhor, mas sim se chama a si mesmo "servo de Jesus Cristo" (v. l), poderia
explicar-se como um ato de delicada discrição que demonstra que não aproveitava para
benefício próprio sua relação com Jesus.

3. Marco Histórico
Na epístola não há nenhuma afirmação direta quanto às circunstâncias que
determinaram sua redação, nem qualquer indício sobre a congregação à qual foi dirigida;
mas por seu conteúdo podem deduzir-se certas informações. É evidente que na igreja
tinham entrado dissimuladamente elementos perturbadores (vv. 4, 8, etc.) que tinham
afastado a muitos da pureza do Evangelho. Em Colosenses, nas epístolas pastorais e no
Apocalipse há alusões que indicam que as heresias gnósticas tinham começado a penetrar
nas igrejas da Ásia Menor; por isso é possível que a carta de Judas fora dirigida a essas
igrejas.
Surge uma pergunta interessante devido ao fato de que uma grande parte do
material de Judas também se encontra em 2Pedro (cf. Jud. 4-18 com 2Ped. 2:1 a 3:3). Em
muitos casos se usam as mesmas palavras e são freqüentes os mesmos pensamentos
expressos com algumas palavras de caráter insólito. Tomou Judas algo de 2Pedro, ou
Pedro de Judas? Ou tomaram ambos de uma fonte comum agora desconhecida?
Esta pergunta não pode ser respondida com certeza. A maioria dos eruditos
bíblicos pensa que Judas é anterior a 2Pedro, pois é difícil explicar por que Judas ia
escrever uma carta se era muito pouco o que tinha que adicionar ao já escrito em 2 Pedro.
Tais estudiosos afirmam que é fácil explicar como Pedro pôde ter usado pensamentos
expressos na breve epístola de Judas, acrescentando depois algo mais. Os estudos
literários demonstram que a mais curta de duas obras similares, em geral, se escreveu
primeiro. Apesar disso, uma minoria de eruditos sustenta que 2Pedro se escreveu antes
que Judas, e entre as razões que apresentam estão as seguintes:

(1) 2Ped. 2:l fala da futura aparição de professores falsos, enquanto isso Judas dá a
impressão de que esses professores já estavam em ação (Jud. 4);
(2) Judas adverte quanto à vinda de céticos como algo passado (vv. 17-18), enquanto que
Pedro apresenta sua advertência como algo referente ao futuro (2Ped. 3:3).

Ambas as linhas de argumentos não são suficientemente decisivas para determinar


qual das duas epístolas (Judas ou 2 Pedro) escreveu-se primeiro. Por esta razão, é
impossível fixar uma data para a carta de Judas. Se se escreveu antes de 2Pedro, teve que
ser redigida antes do ano 67 d.C., o provável ano da morte de Pedro; se a epístola de Judas
foi escrita depois, foi entre os anos 70 e 85 d.C.

4. Tema
Segundo o v. 3, parece que o autor teve o propósito de escrever uma verdadeira
epístola pastoral para confirmar aos crentes em sua fé cristã; mas as notícias dos estragos
que estavam causando os professores libertinos induziram-no, sob a condução do Espírito
Santo, a trocar seu plano original e a insistir a seus leitores para que defendessem
decididamente a fé. E para animá-los nessa obra, ele desmascara aos enganadores, mostra
a relação que tinham com anteriores rebeldes contra a autoridade divina, e aconselha a
igreja para que deixem de lado esses enganadores e se dediquem a preparar-se para
encontrar-se com seu Senhor em glória.
Para entender o conteúdo da epístola necessitam-se freqüentes referências e
comparações com 2Pedro.

APOCALIPSE DE JOÃO
1. Título
Os mais antigos manuscritos gregos em existência e os escritos de vários pais da
igreja, começando com Ireneo (c. 130 – 202 d.C.), dão a este livro o singelo título de
Apocalipse de João. Mas em alguns manuscritos medievais posteriores se ampliou o título
para Apocalipse de João o teólogo e evangelista e Apocalipse de São João o teólogo. A
palavra grega apokálupsis, "apocalipse", "revelação", refere-se a tirar um véu ou
descobrir algo, e particularmente em linguagem religiosa, a abrir o véu do futuro. A forma
apocalíptica foi comum entre os judeus do período intertestamentário (desde Malaquias
até Cristo) e os primeiros cristãos , e também entre certos escritores da igreja primitiva.

2. Autor
O autor de Apocalipse se identifica repetidas vezes como "João" (cap. 1:1, 4, 9;
21:2; 22:8) - Ioannes, a forma grega deste nome (ver Luc. 1:13), e o nome comum hebreu
Yojanan, o qual aparece numerosas vezes nos últimos livros do AT, nos livros apócrifos
e em Josefo. Isto identifica ao autor como um judeu.
Várias evidências indicam claramente que João era o nome do autor, e não um
pseudônimo, como aparecia em muitas obras apocalípticas apócrifas entre os primeiros
cristãos. A primeira é que o autor do Apocalipse se identifica como João sem tentar dar-
se a conhecer como um que ocupava algum cargo na igreja. Vários “apocalipses” judeus
e cristãos são atribuídos a patriarcas e profetas hebreus e a apóstolos cristãos. Se assim
acontecesse com o Apocalipse, é de esperar que seu autor procurasse identificar-se
especificamente como apóstolo.
Mas a singela declaração de que seu nome é João "seu irmão" (Apoc. 1:9; cf. a
referência de Pedro a Paulo em 2Ped. 3:15), atesta que o que escreve dá seu nome
verdadeiro. É evidente que o autor era tão conhecido nas igrejas, que seu nome bastava
para identificá-lo e dar validez ao relato de suas visões.

3. Marco Histórico
Os eruditos modernos estão divididos quanto a se o momento quando se escreveu
o Apocalipse deve fixar-se em uma data relativamente recente, durante os reinados de
Nero (54-68 d.C.) ou de Vespasiano (69- 79 d.C.), ou em uma data posterior, para o fim
do reinado de Domiciano (81-96 d.C.).
Muitos estudiosos preferem uma data mais antiga para o Apocalipse, e geralmente
identificam a perseguição citada nas cartas às sete igrejas com a que sofreram os cristãos
no reinado do Nero (64 d.C.), ou possivelmente mais tarde no tempo de Vespasiano,
embora não é claro até que ponto este último imperador perseguiu a igreja. Acreditam
que o mundo convulsionado descrito no Apocalipse reflete as dificuldades que
perturbaram a cidade de Roma dos últimos anos de Nero até os primeiros anos de
Vespasiano. Vêem na besta que sofre uma ferida mortal e é curada (cap. 13:3), e na besta
que "era e não é; e está para subir do abismo" (cap. 17:8), uma representação de Nero, de
quem dizia uma lenda popular que apareceu depois de sua morte, e que reapareceria
algum dia. Também acreditam que o número simbólico 666 (cap. 13:18) representa a
Nero César, escrito em consoantes hebréias (Nrwn Qsr). Estas evidências induziram a
certo número de destacados eruditos a localizarem a redação do Apocalipse a fins das
décadas dos anos 60 ou 70 do século I.
Este raciocínio, embora indubitavelmente apoiado em fatos históricos, depende,
para ser admitido, da interpretação que se dê a certas declarações do Apocalipse. Mas
uma interpretação tal obviamente é subjetiva, e não tem sido aceita por muitos destacados
eruditos do passado. Tampouco a aceita os Adventistas do 7º Dia, pois acreditamos que
as profecias do Apocalipse se aplicam também ao que está além da situação imediata e
local daquela época (cf. 1:11). Qualquer evidência para a data da redação do Apocalipse
deve apoiar-se, em primeiro lugar, pelo menos em outras classes de evidências e
raciocínios.
O testemunho dos primeiros escritores cristãos é quase unânime no sentido de que
o livro de Apocalipse foi escrito durante o reinado de Domiciano. Ireneo, que afirma que
teve relação pessoal com João por meio de Policarpo (discípulo direto de João); Victorino
(+c. 303 d.C.); Eusébio (História Eclesiástica III. 20. 8-9). Um testemunho cristão tão
antigo levou aos estudiosos Adventistas a fixarem o momento quando se escreveu o
Apocalipse ao final do reinado do Domiciano, ou seja antes de 96 d.C.
4. Tema
Desde seu começo (cap. l:l) este livro se anuncia como um apocalipse ou
“revelação”, como um abrir do véu dos mistérios do futuro, que culminam com o triunfo
de Jesus Cristo. Os escritos Apocalipses haviam sobressaído entre a literatura religiosa
judia durante mais de dois séculos. Em verdade, o primeiro “apocalipse” que se conhece
(o livro de Daniel), apareceu no tempo do cativeiro babilônico no século VI a.C.
Mediante as guerras dos Macabeus, quando os judeus recuperaram sua independência
política 400 anos mais tarde, cresceram as esperanças messiânicas que se enfocavam no
desejado novo reino judeu, e apareceu um conjunto de literatura apocalíptica que seguia
em maior ou menor grau a forma literária e os símbolos de Daniel.
No seguinte século, quando a conquista romana desfez as esperanças dos judeus
de que houvesse um reino messiânico mediante os asmoneus, as expectativas messiânicas
chegaram a ser ainda mais intensas ao despertarem nos judeus a espera por um Messias
que vencesse aos romanos. Durante o século I a.C. e o século I d.C., tais esperanças
continuaram sendo um incentivo para que houvesse mais obras apocalípticas.
Portanto, não há por que surpreender-se de que no NT, escrito principalmente - ou
quase todo - por judeus e para uma igreja que era principalmente judia em seu fundo
religioso, Deus colocasse um livro de caráter Apocalipse que expõe o ponto de vista
cristão dos eventos que levariam até o estabelecimento do reino messiânico. Em Suas
mensagens aos homens por meio dos profetas, Deus expressa Sua vontade em linguagem
humana e em formas literárias com as quais estava familiarizada a gente a quem se
dirigiram originalmente Suas mensagens.
Embora o Apocalipse seja, na verdade, uma profecia, ele difere de outras profecias
bíblicas (como as de Isaías, Jeremias, Ezequiel e os profetas menores) em vários aspectos
importantes, entre as quais se sobressaem as seguintes:

1. O alcance cósmico do Apocalipse. Enquanto que a maioria das profecias do AT se


referem aos problemas nacionais e internacionais que giram em volta da história do Israel
e o glorioso futuro que poderia ter sido deles, o Apocalipse desempenha seu papel no
cenário maior do Universo, e tem como tema central o grande conflito entre Deus e Cristo
contra Satanás, e vice-versa.
2. A base do Apocalipse em visões e sonhos. O escritor de Apocalipse registra os sonhos
e visões que recebeu enquanto estava "no Espírito" (cf. l:10). Freqüentemente é
arrebatado e levado a lugares distantes onde contempla cenas de majestade e grandeza
que sobrepujam toda descrição que possa fazer-se em linguagem humana, e ali conversa
com anjos. Embora também se registram estas experiências repetidas vezes nos outros
profetas, são particularmente características dos escritores apocalípticos; em realidade,
formam virtualmente todo o conteúdo das seções apocalípticas de Daniel e do Apocalipse.
3. O uso de alegorias no Apocalipse. Em termos gerais, na profecia do AT os símbolos
são lições objetivas e concretas da vida diária; por exemplo, o “oleiro e a argila” (Jer.
18:1-10), o “jugo” (Jer. 27:2) e o “tijolo cru” (Eze. 4:1-2). Por outra parte, na profecia do
Apocalipse os símbolos empregados são quase sempre seres que nunca se vêem na vida
real, como bestas de muitas cabeças, anjos que voam no céu e animais que falam e
trabalham com inteligência. Os lapsos proféticos, embora estranhos nas profecias
comuns, se dão geralmente ali em anos literais (cf. Jer. 29:10), enquanto que em Daniel
e no Apocalipse aparecem lapsos proféticos repetidas vezes e geralmente devem
entender-se de acordo com o princípio de dia por ano (cf. Ap 13:5).
4. A forma literária do Apocalipse. Muitas das profecias do AT estão em forma poética,
enquanto que a profecia apocalíptica (incluindo a não-canônica) está quase inteiramente
em prosa, exceto uma inserção ocasional de poesia, particularmente de hinos (Apoc. 4:
11; 5:9-10; 11: 17-18; 15:3-4; 18:2-24; 19:1-2, 6-8).

Estas considerações destacam a regra de que, para ser devidamente interpretada,


a literatura apocalíptica deve ser entendida em termos de sua estrutura literária
característica e de sua ênfase teológica. O centro de sua mensagem é o tema do grande
conflito, que enfoca especialmente o fim catastrófico deste mundo e o estabelecimento de
outro, novo. Tudo isto se apresenta em linguagem eminentemente simbólica, que nem
sempre permite uma exata interpretação (cf. Eze. 1:10). Ao falar das coisas sobrenaturais,
a linguagem literal é às vezes completamente inadequada para apresentar as mais
primorosas realidades do céu. A linguagem figurada do Apocalipse é em alguns aspectos
semelhante à das parábolas, e devem ser tomadas as mesmas precauções ao interpretar
ambas.

O Apocalipse é uma "revelação de Jesus Cristo" em ação para aperfeiçoar um


povo na terra a fim de que possa refletir Seu caráter imaculado, e para guiar a Sua igreja
através das vicissitudes da história para a realização do propósito eterno de Deus. Aqui,
em uma forma mais completa que em qualquer outra parte das Sagradas Escrituras, o
“véu” que oculta o invisível do visível se abre e “afasta-se a cortina, e contemplamos ao
fundo, em cima, e em toda a marcha e contramarcha dos interesses, poderio e paixões
humanas, a força de um Ser todo misericordioso, a executar, silenciosamente,
pacientemente, os conselhos de Sua própria vontade"

O Apocalipse tem quatro divisões principais ou “linhas proféticas”:

(1) as sete igrejas (cap. 1-3);


(2) os sete selos (cap. 4 a 8:1);
(3) as sete trombetas (cap. 8:2 a 11) e
(4) os eventos finais do grande conflito (cap. 12-22).

Se se tiver em conta que a linguagem do livro é extremamente figurada, é essencial


descobrir a intenção e o propósito de seu autor inspirado e o significado da obra para os
leitores a quem originalmente se dirigia. De outro modo, a interpretação de suas figuras -
e portanto de sua mensagem - pode refletir uma simples opinião pessoal. Os primeiros
leitores eram cristãos que falavam grego, os quais, fossem judeus ou gentios,
consideravam os escritos do cânon do AT como a Palavra inspirada de Deus (cf. João
5:39; Atos 24:14; 2Tim. 3:16-17) e estavam dispostos a interpretar a nova revelação em
estreita relação com a antiga. Portanto, as seguintes observações e princípios serão de
utilidade para uma correta interpretação do Apocalipse:

• “No Apocalipse se encontram e terminam todos os livros da Bíblia, e é, em um
sentido especial, o complemento do livro de Daniel" (Atos dos Apóstolos, p. 585). Muito
do que estava “selado” no livro de Daniel (cf. Dan. 12:4) é revelado no livro do
Apocalipse, e os dois devem estudar-se juntos (cf. Ap. 10).
• O Apocalipse contém citações ou alusões de 28 dos 39 livros do AT. De acordo
com um erudito, há 505 citações e alusões desse tipo, das quais 325 são dos livros
proféticos (Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel em particular). Dos profetas menores são
mais comuns as referências a Zacarias, Joel, Amós e Oséias. Dos livros do Pentateuco se
faz uso especialmente de Êxodo. Das seções poéticas se emprega os Salmos (cf. Luc.
24:44).
• Alguns também encontram ecos dos seguintes livros do NT: Mateus, Lucas, 1 e
2 Coríntios, Efésios, Colossenses e 1 Tessalonicenses.
• Um exame das citações e alusões revela que João traduzia diretamente do AT
hebraico, embora às vezes sob a influência da Septuaginta (LXX) ou uma versão grega
posterior.
• Uma compreensão clara destas citações e alusões em seu marco histórico original
no AT, é o primeiro passo para a compreensão das passagens onde estas citações
aparecem no Apocalipse. Então pode-se estudar o contexto em que as usa João para
descobrir o significado que ele lhes dá. Isto se aplica particularmente aos nomes de
pessoas e lugares, e a coisas, fatos e eventos.
• Como muitos dos símbolos do livro do Apocalipse já eram conhecidos na
literatura apocalíptica judaica, essa literatura às vezes ajuda a esclarecer o significado
desses símbolos.
• Os que estão familiarizados com a história romana desse tempo também
observarão que a linguagem de João descreve freqüentemente o Império Romano e as
vicissitudes da igreja sob seu domínio. Portanto, um estudo da história romana desse
período esclarece algumas passagens que de outra maneira seriam obscuras.

• Finalmente deve prestar-se atenção às formas de pensamento e expressão da


época à luz do fundo cultural desse tempo.

Ao determinar o significado das cenas sucessivas que foram mostradas a João em


visão, convém ainda recordar que o Apocalipse foi dado para guiar, consolar e fortalecer
a igreja não só daquela época mas também através da Era Cristã até o fim do tempo. Nele
foi predita a história da igreja para o benefício e vital conselho dos crentes dos tempos
apostólicos, dos cristãos das eras futuras e dos que vivessem nos últimos dias da história
da Terra, a fim de que todos pudessem ter uma compreensão inteligente dos perigos e
conflitos que os aguardavam.

• Por exemplo, os nomes das sete igrejas são símbolos da Igreja em diferentes
períodos da história. A igreja local de Éfeso chegou a ser símbolo de toda a comunidade
cristã dos tempos apostólicos, mas a mensagem dirigida a ela foi registrada para animar
aos crentes de todas as épocas.

É razoável, portanto, inferir que a descrição da igreja de Éfeso e a admoestação


que recebe eram particularmente apropriadas para as necessidades daquela igreja na época
em que foi escrita a mensagem. Também eram apropriadas para as necessidades de toda
a igreja cristã no período apostólico e, em resumo, representa o que estava acontecendo
durante esse período da história da igreja. Registrou-se para inspiração e ânimo dos
crentes de todas as idades, porque os mesmos princípios podem aplicar-se em
circunstâncias similares. Por analogia, o mesmo é certo em relação às mensagens das
outras igrejas. Já que as quatro linhas maiores de profecia enfocam as cenas finais da
história do mundo, as mensagens do livro do Apocalipse têm uma importância particular
para a igreja atual.
Que uma só passagem profética possa ter mais de um cumprimento, é evidente
(cf. Deut.18:15). Algumas dessas profecias têm um cumprimento imediato e outro mais
remoto, e além disso há nelas princípios que podem aplicar-se em geral em todas as
épocas.

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