Carboidratos - Parte 3. Polissacarideos - 2024

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Carboidratos 12/03/2024 Prof.

Roberto da Silva
Parte 2: 2. Estruturas químicas e reações de polissacarídeos de alimentos
Os Polissacarídeos são estruturas poliméricas de carboidratos, formadas de unidades de
monossacarídeos unidas por ligações glicosídicas. São estruturas grandes contendo mais de dez
monossacarídeos ligados, frequentemente lineares, mas às vezes ramificadas. São classificados
como homopolissacarídeos quando todas as unidades são iguais e em heteropolissacarídeos quando
mais de um tipo de monossacarídeo está presente. Os polissacarídeos possuem duas funções
biológicas principais, como forma armazenadora de combustível (energia) e como elementos
estruturais. A tabela 16 apresenta os principais polissacarídeos terrestres e suas respectivas funções
biológicas e funcionais.

Tabela 16. Principais carboidratos terrestres

Monossacarídeos
Carboidrato Importância biológica Importância tecnológica
constituintes

Armazenado no amiloplasto de Produção de xaropes, etanol de


raízes tuberosas* (mandioca, cereais e raízes. Amidos
batata doce, cenoura), caules modificados para a indústria de
Amido ≈1.400 glicose
tubérculo* (batatinha, cará), alimentos.
frutos e sementes. Principal
reserva energética dos vegetais.
Polissacarídeos

Função estrutural na célula Produção de etanol de segunda


Celulose ≈1.000 glicose vegetal, como um componente geração. Celuloses modificadas
da parede celular. para a indústria de alimentos.

Função estrutural na célula Produção de etanol de segunda


≈1.000 xilose e
Hemicelulose vegetal, como um componente geração. Adoçante xilitol para
outros
da parede celular. a indústria de alimentos.

Função estrutural na célula Produção de geléias,


≈1.000 ac.
Pectina vegetal, como um componente espessantes em doces em
galacturonico
da parede celular. caldas e produtos lácteos.

2.1. Amido
Algumas plantas armazenam amido para uso posterior. O amido da planta começa como
glicose, um produto primário da fotossíntese. As plantas não armazenam glicose, assim ele é
convertido em sacarose ou amido por meio de processos chamado polimerização. O amido é
armazenado por organelas especiais chamadas amiloplastos. Quando a planta precisa da energia ela
converte os grãos de amido de volta em glicose. Portanto, fisiologicamente ele é uma substância de
reserva, encontrada tanto em partes aérea da planta, como nos cereais trigo, milho e arroz, quanto
em partes submersas da planta como nas raízes e tubérculos (Figura 16).

18
As plantas que armazenam amido abaixo da superfície terrestre se diferenciam na forma de
acumular este nutriente. A raiz tuberosa, por ex. mandioca, batata doce, beterraba, cenoura e
rabanete, acumula o amido dentro da raiz, embaixo da terra e o caule fica acima da superfície. O
tubérculo, por ex. batata (batata inglesa ou batatinha), inhame, taro, yacon e cará, armazena os
nutrientes (amido e inulina) dentro do caule subterrâneo em formato geralmente arredondado. Neste
caso, suas raízes apenas fixam o vegetal ao solo, absorvem e conduzem água e nutrientes, sem
acumulá-los. O bulbo também apresenta um caule subterrâneo, mas não é fonte tradicional de
amido. O caule do bulbo tem formato de um disco basal (prato), como por ex. cebola e alho.

Figura 15. Fontes de amidos: terrestres e submersos


O amido constitui a principal fonte de caloria para alimentação humana nas mais diferentes
partes do mundo. Ele é constituído de duas frações de polissacarídeos: Amilose que tem a cadeia
linear e formada de glicoses unidas por ligações (1 → 4) e Amilopectina que tem a cadeia
ramificada e formada de glicoses unidas por ligações (1 → 4) e ligações  (1 → 6) nos pontos de
ramificações, conforme apresentado na figura 15. Em geral, considera-se que a maioria dos amidos
seja composto de cerca de 20 - 30% de amilose e 70 - 80% de amilopectina.
A estrutura de Meyer (Figura 16) é uma das mais comuns para a representação do amido.
Esta representação, embora hoje já se sabe obsoleta, porque não apresenta as cadeias A e B, ainda é
bastante usada nos livros textos por ser mais didática para visualização.

19
Figura 16. Componentes do amido: Amilose e Amilopectina. Abaixo: Modelo de simulação
da estrutura helicoidal (hélice, espiral) da amilose

O grânulo de amido cru apresenta tipicamente orientação radial dos depósitos de moléculas
de amilose e amilopectina sintetizadas à medida que o granulo foi se formando. Este ponto central a
partir do qual o amido se desenvolve é denominado “hilum”. O tamanho e forma do granulo variam
com a fonte botânica (Fig. 17), sendo que o tamanho também varia com a idade. Os diferentes
padrões de ordenamento estrutural do grânulo resultam em regiões cristalinas e amorfas, as quais
são responsáveis pela propriedade de birrefringencia (propriedade anisotropica) que dá origem a
uma típica “cruz de malta” (Fig. 18), observada no hilum do grânulo quando este sofre a incidência
de uma fonte de luz polarizada. Este fenômeno da birrefringência não ocorre no amido gelatinizado.

Nota: Não confundir amilose com amilóide, fibrilas proteicas envolvidas com doenças degenerativas como
o Alzheimer.
Há evidencias que em tubérculos a amilopectina, através de suas regiões lineares, é
responsável pela cristalinidade enquanto que os pontos de ramificações e a amilose são
componentes das regiões amorfas.

20
Figura 17- Diferenças morfológicas dos grânulos de amido de diferentes fontes botânicas.

Figura 18. Birrefringência do amido de milho sob luz polarizada


A característica funcional do amido depende, dentre outros fatores, da proporção de amilose
e amilopectina (Tabela 17). Devido às necessidades tecnológicas específicas diferentes tipos de
amidos foram desenvolvidos por melhoramentos genéticos, alterando-se a composição natural do
granulo, visando obter uma constituição adequada, com diferentes propriedades e aplicações
industriais (Tabela 18). Assim, temos: amido ceroso, acima de 90% de amilopectina e amido de
amilose, acima de 60% de amilose.

Tabela 17. Proporções de amilose e amilopectina em diferentes amidos


Tipo Amido Amilose (%) Amilopectina (%)
Mandioca (tuberosa) 17 83
Batata (tubérculo) 20 80
Arroz (cereal) 19 81
Trigo (cereal) 25 75
Milho (cereal) 25 75
Millho ‘waxy’ (melhoramento genético) <1 >99
Milho alta amilose (melhoramento genético) 55-70 45-35

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Tabela 18. Características e aplicações dos amidos
Amido ceroso (alta amilopectina) Amido com alto teor de amilose
- alta proporção de amilopectina - alta proporção de amilose
- menor temperatura de gelatinização - maior temperatura de gelatinização
- baixa estabilidade em alta temperatura - alta estabilidade a tratamento térmico
- baixa retrogradação - alta retrogradação
- maior viscosidade a quente - baixa absorção de óleo
- pasta mais clara (translucida) - alta capacidade de formação de filmes
Aplicações
Amidos cerosos Amidos com alto teor de amilose
- alimentos conservados sob refrigeração - produtos fritos (menor absorção de gordura)
- produtos em que necessitam pastas claras - snacks
- base para modificação química
- indústria têxtil (engomar)

Uma importante reação de complexação do amido ocorre com o iodo resultando em


coloração azul intensa, desenvolvida pela oclusão (aprisionamento) do iodo nas cadeias lineares e
em hélices da amilose. A intensidade da coloração azul tem sido empregada como padrão analítico
de hidrólise do amido. Cada volta da hélice contém seis unidades de glicoses que complexam uma
molécula de iodo e, por isto, a interação e consequentemente, a cor depende do número de voltas
(Figura 19). No amido não hidrolisado a cor é azul intensa, à medida que sofre hidrólise a cor vai
gradativamente perdendo a intensidade devido a redução de interação, até se tornar incolor,
indicando amido completamente hidrolisado.
Amilose + iodo = azul
Amilopectina + iodo = vermelho
Amido + iodo = azul
Amido hidrolisado + iodo = incolor
Reagente Iodo - KI: O iodo não é muito solúvel em água, então o reagente de iodo é feito
dissolvendo o iodo (I2) em água contendo Iodeto de potássio (KI), que aumenta a solubilidade. Isto
produz um complexo linear de íon tri-iodeto que é solúvel. O íon tri-iodeto encaixa dentro da volta
da hélice causando uma cor azul escura intensa. A solução de iodo-iodeto é geralmente conhecida
como solução de Lugol em homenagem ao médico francês J. G. A. Lugol, que a descreveu pela
primeira vez em trabalho relacionado a ação antisséptica e desinfetante do iodo. A solução de Lugol
é uma solução de I2 (1%) em equilíbrio com KI (2%) em água destilada.

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Amilose + iodo = azul
Amilopectina + iodo = vermelho
Amido + iodo = azul
Amido hidrolisado + iodo = incolor

Figura 19. Reação do amido com iodo. Pelo menos 18 moléculas de glicoses são necessárias para a
cor azul.

2.1.1. Gelatinização e Retrogradação: São duas outras importantes características do amido.


Gelatinização: O amido seco quando é aquecido em água, absorve até quatro vezes o seu peso em
água. O aquecimento rompe as ligações fracas intermoleculares e intramoleculares abrindo espaços
para as moléculas de água. Este inchamento do grânulo, acompanhado de aumento da viscosidade e
tamanho é denominado de gelatinização do amido (Figura 20). No granulo gelatinizado, há quebra
do padrão de cristalinidade (Fig. 21) e consequente perda da birrefringência. Cada tipo diferente de
amido tem uma faixa característica temperatura de gelatinização (Tabela 19).

Tabela 19. Faixa de temperatura de gelatinização (perda de birrefringência)


Amidos Inicial Media Final % amilose Retrogradação
Mandioca 52 59 64 17 Baixa
Batata 58 62 66 20 Media
Trigo 59,5 62,5 64 25 Alta
Milho 62 66 70 25 Alta

Figura 20 – Gelatinização do amido Figura 21 – Arranjo das moléculas em um segmento de


um grânulo de amido. Antes (a) e depois (b) do
inchamento.

Retrogradação: Após a gelatinização, quando a solução é deixada resfriar, outro fenômeno ocorre
no qual a água separa-se do amido por sinérese ao mesmo tempo que as moléculas de amido

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começam a se associar através de pontes de hidrogênio, formando partículas de maior tamanho e
favorecendo uma estrutura mais ordenada. Este fenômeno se chama retrogradação (Figura 22).

Figura 22 - Retrogradação
Um exemplo de retrogradação é o envelhecimento do pão. Em regra, considera-se a amilose
retrógra-se ao longo de minutos a horas e a amilopectina ao longo de horas a dias, dependendo da
capacidade das cadeias ramificadas de formar associações. A retrogradação da amilose em
alimentos processados é considerada importante pelas propriedades relacionadas à viscosidade,
capacidade de absorção de água e digestibilidade, enquanto a retrogradação da amilopectina é
provavelmente um determinante mais importante no envelhecimento de pães e bolos. O
comportamento de gelatinização e os perfis de pasta da misturas amido-água são comumente
monitorados usando um Rapid Visco Analyzer (RVA), que é um viscosímetro de aquecimento e
resfriamento que mede a resistência de uma amostra ao cisalhamento controlado.

2.1.2. Produção e utilização de amidos modificados em produtos alimentícios industrializados.


As necessidades industriais de amidos com propriedades especiais para cada tipo de
aplicação, levaram ao desenvolvimento de amidos modificados. O amido pode ser modificado por
processos Genéticos (amido ceroso (waxy) e amido com alto teor de amilose), Físicos, Químicos e
Enzimáticos. São exemplos das necessidades industriais:
- Alimentos instantâneos: capacidade espessante a frio
- Bebidas: solubilidade a frio
- Alimentos infantis: estabilidade a altas temperaturas
-Molhos para salada, maionese, temperos: estabilidade ao baixo pH
- Alimentos congelados: estabilidade a congelamento / descongelamento
- Alimentos a serem aquecidos em fornos de micro-ondas:
- Resistência a tratamento térmico
- Baixa sensibilidade à migração de água
- Alimentos fritos: regulador de absorção de óleo.

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- Industria Têxtil: para engomagem de fios (urdume) visando aumentar a resistência e coesão das
fibras e reduzir atrito com parte mecânica do tear.
2.1.2.1. Amido Pré-gelatinizado
O amido sofre pré-tratamentos físicos que modificam suas características. Ele é gelatinizado, seco e
moído (ou pulverizado). A água fica bem distribuída ligada às moléculas de glicoses tornando o
amido facilmente hidratável. Os grânulos do amido se tornam intumescidos mesmo em água fria
(amido CWS, cold water swelling starch). São usados em pudins instantâneos e sopas.
Vantagens:
- são instantâneos
- são recomendados para alimentos especiais para micro-ondas
- Apresentam melhor palatabilidade e brilho que os naturais
Desvantagem:
- Consistência menor que o natural

O amido pre-gelatinizado pode ser obtido por Secagem por rolos (Rollers drying) ou
Secagem por pulverização (Spray drying) conforme as figuras 23 e 24 abaixo, respectivamente.

2.1.2.2. Amido dextrinizado


Hidrolise parcial do amido por método químico (ácido) ou enzimático, formando Maltodextrinas.
As quais são polímeros de glucose, com um DE < 20.
Características:
- alta dispersabilidade (solubiliza mais rápido em baixa temperatura)
- baixa higroscopicidade
- sabor suave
- baixo poder adoçante
- alta viscosidade (menor que a do amido natural)
- poder de retardar o crescimento de cristais de gelo
Aplicações:
- balas, maioneses, meio dispersor de adoçantes
- produtos com reduzidas calorias, como substitutos de gordura
- bebidas lácteas e sucos
- encapsulador de aromas

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Figura 23. Secador de Rolos

Figura 24. Spray dryer

2.1.2.3. Amido oxidado


A oxidação branda do amido com hipoclorito de sódio (NaClO) resulta em compostos com
hidroxilas substituídas por grupos carboxila ou carbonilas. Estes grupos são mais volumosos e
carregados que as hidroxilas originais, as cadeias ficam mais afastadas evitando a retrogradação.

Figura 25. Amido oxidado, mostrando grupos carbonil (CO) e carboxil (COOH)

26
Aplicações:
• Pudins e alimentos refrigerados (baixa retrogradação)
• Ligante em massas e recheios.
• Emulsificante.
• Condicionador de massa, em panificação.
• Formador de filme em cobertura de alimentos.
• Em balas de goma
2.1.2.4. Amido modificado por substituição
O tratamento do amido com certos reagentes químicos que resultem em grupos mais
volumosos que a hidroxila, forma produtos com características semelhantes aos amidos oxidados.
Os seguintes reagentes podem ser usados para a substituição:

a) Metilação:

b) Fosfatação:

Figura 26. Amidos modificados por substituições


As propriedades dependem da fonte de amido, do processo de produção e do grau de substituição
(G.S.). Quanto maior o grau de substituição
> a claridade
> a estabilidade a ciclos de congelamento e descongelamento (baixa retrogradação)
> poder emulsificante
> viscosidade
< capacidade de formação de gel
Aplicações
- alimentos armazenados sob refrigeração ou congelados
- indústria têxtil

2.1.2.5. Amido modificado por ligação cruzada


Compostos como epicloridrina, anidrido succinico etc. reagem com duas hidroxilas unindo dus
cadeias de amilose. São mais resistentes ao pH baixo, o que é importante para frutas, geralmente
acidas.
Ex. reação do amido com epicloridrina:
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Figura 27. Amido modificado por ligação cruzada

Características
• manutenção da estrutura do grânulo
• aumento da temperatura de gelatinização
• resistência a altas temperaturas, a baixos pH e à ação mecânica.
• pastas com texturas suaves ( pouco coesivas)
• menor solubilidade
• maior viscosidade a quente que o amido sem modificar (com poucas ligações)
• menor viscosidade a quente que o amido sem modificar (com muitas ligações)
• menor adesividade

Aplicações
• molhos ácidos
• alimentos esterilizados
• alimentos submetidos a processos de preparação drásticos (alta temperatura ou alto
cisalhamento).

2.1.2.7. Amido resistente: é definido como a fração do amido que escapa da digestão no intestino
delgado devido ao difícil contato enzima/amido ou à força das regiões cristalinas formadas tanto no
amido nativo quanto naqueles retrogradados. Possuindo assim, baixo índice glicêmico. Ele ocorre
naturalmente em alguns alimentos, mas também pode ser produzido por processamentos. Ele pode
ser fermentado no intestino grosso pela microflora bacteriana, o que é benéfico à saúde humana
devido à produção de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC): acetato, propionato e butirato,
aumento da massa bacteriana. Os AGCC são rapidamente absorvidos e oxidados pelos colonócitos
(células do cólon), suprindo as necessidades energéticas destas células. Também estimulam a
proliferação celular do epitélio, o fluxo sanguíneo visceral e o aumento da absorção de água e sódio.
Podendo, assim, ser classificado com alimento funcional. A biomassa de banana verde é rica em
amido resistente. O amido resistente também pode ser usado como espessante em alimentos
industrializados.

28
2.2. Celulose
Celulose é o principal polissacarídeo estrutural da célula vegetal, estando presente nos
troncos, folhas e frutos destes vegetais. Ela ocorre na forma de fibras associadas a hemicelulose,
pectina e lignina da parede celular. Ela é um polímero linear e plano (Fig. 28), constituído de
resíduos de glicose unidos por ligações  (1→ 4), que são muito resistentes a hidrólise ácida ou
enzimática. Naturalmente, ele é hidrolisada apenas por celulases produzidas por microrganismos, os
quais estão presentes no rúmen e intestino grosso de animais, trato digestivo de insetos
(cupins/protozoários) e em material em decomposição na natureza. Com o envelhecimento da célula
vegetal ocorre o encrustamento da celulose pela lignina reduzindo a ação hidrolítica das celulases
sobre o tecido vegetal. Ele não é hidrolisado pelo humano, porque não possui celulases. Nos
ruminantes a digestão é devida a presença de bactérias no rumem, que degradam e produzem AG
que são absorvidos e metabolizados produzindo energia (ver em bioquímica dos processos).

Figura 28. Molécula de celulose, formada por  10.000 resíduos de glicose

A regularidade da disposição dos grupos hidroxilas faz com que as cadeias vizinhas se
entrelacem através de pontes de hidrogênio intermoleculares formando regiões de alta proporção de
cristalinidade ( 70%) correspondentes a fibras de celulose, de pouca solubilidade em água.

Estrutura da parede celular vegetal:


Lamela média: formada principalmente de pectina (quando nova é chamada de protopectina, sua
forma mais solúvel, com o amadurecimento se torna mais insolúvel), que tem ação cimentante
(pectato de cálcio) entre as células, como mostra a figura 28.
Parede primaria: formada principalmente de hemicelulose, pectina e celulose
Parede secundaria: formada de hemicelulose, pectina, celulose e lignina, é mais grossa e resistente.

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Figura 29. Estrutura da parede celular vegetal (caule).
Nas frutas e vegetais comestíveis, como as hortaliças, tem-se a célula parenquimática (sem
lignina) e a estrutura que melhor representa a sua parede vegetal é mostrada na figura 30. A parede
celular de uma célula parenquimática contém apenas a camada primária, formada de celulose,
pectina, hemicelulose e algumas proteínas.

Figura 30. Estrutura da parede celular de um vegetal comestível

Devido a organização da parede celular vegetal há diferenças na resposta à hidrólise dos


componentes da parede. A seguinte ordem de facilidade hidrólise tem sido aceita: Hemicelulose >
celulose > lignina (maior dificuldade)
A celulose por ter  ligação e formar estrutura cristalina é muito resistente a ação enzimática
e outros tratamentos de degradação, portanto, a obtenção de glicose a partir de celulose é possível,
mas é difícil.

Métodos de hidrólise da celulose: Químicos (tratamento com Ácido), Físicos (Auto hidrólise
explosão ou Explosão com Vapor e Irradiação com raio ) e enzimáticos (emprego de enzimas). A

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celulose hidrolisada é matéria prima para produção do bioetanol (será tratado em Bioquímica dos
processos)

2.2.1. Celulose modificada.


Assim como o amido, a celulose também pode ser modificada para alterar suas propriedades
físicas e químicas. Os principais tipos de celuloses modificadas são:

2.2.1.1. Carboximetil celulose (CMC): É um polímero derivado da celulose formador de matriz


hidrofílica. São solúveis em água fria, estáveis entre pH 5 e 11. Elas têm muito efeito sobre a
atividade de água e são muito empregadas em alimentos como sorvetes, porque evitam a formação
de cristais de gelo e açúcar.

Figura 31. Carboximetil celulose

2.2.1.2. Metil celulose (MC): Apresentam características semelhantes às CMC e são usadas com as
mesmas finalidades.

Figura 32. Metil celulose


Usada em produtos extrusados, fritos, molhos, estabilizante de misturas.

2.2.1.3. Hidroxipropil metil celulose: Também apresentam características semelhantes às CMCs


(matriz hidrofílica) e são empregados em formulações de cápsulas com liberação lenta do fármaco e
também como agente suspensor, viscosificante, espessante em fórmulas tópicas e oftálmicas.

31
Figura 33. Hidroxipropil metil celulose

2.2.2. Aplicações da celulose natural em alimentos – Além dos diversos usos das diferentes
celuloses modificadas, carboximetil celulose, metil celulose e hidroxipropil metil celulose. A
celulose natural também tem suas aplicações:
1. Fibras em alimentos: os seres humanos não conseguem digerir a celulose ingerida, porque ele não
produz celulases. Alguns animais, como os ruminantes, o que inclui o boi e o veado, conseguem
digerir a celulose indiretamente, porque possuem bactérias em seus tratos digestivos que produzem
enzimas capazes de metaboliza-la. Assim, para os humanos a celulose funciona como fibra
alimentar e melhora o movimento peristáltico (aumenta o trânsito intestinal), auxilia no controle de
apetite (aumento de volume no intestino), diminui a absorção dos nutrientes como gorduras
(dietético) e pode ser usado em pão branco para aumentar fibras;
2. Aumento da viscosidade em alimentos (melhora textura): molhos de tomate, ketchup, molhos de
saladas;
3. Melhora a dispersibilidade de alimentos em pó (evita “empelotamento” em água fria ou quente) e
em produtos instantâneos (bebidas, sobremesas, achocolatados);
4. Melhora textura de alimentos congelados (sorvetes), inibe a formação de cristais de gelo,
promove a fusão lenta e diminui sinérese (exsudação da água);
5. Melhora acondicionamento de produtos em pó, como queijo ralado. A celulose micro cristalina
em pó serve para revestir o queijo ralado e impedir que ele se aglomere, bloqueando a umidade.
Recentemente, estudos realizados pela companhia finlandesa de investigação e tecnologia
VTT mostram que os compostos derivados da parede celular vegetal: 1) A xilana (comercialmente
extraída da bétula) pode melhorar a suavidade do iogurte e fazer a sua textura ficar mais estável,
isto é, impedir que o soro do leite se separe e vá para o topo. A equipe testou diferentes
concentrações de xilana e descobriu que 1,5 por cento era suficiente para produzir o efeito desejado.
2) Outro ingrediente derivado de madeira foi a celulose fibrilada, produzida por meio da quebra das
fibras de celulose em filamentos muito mais finos. A celulose fibrilada pode ser implementada no
setor de lácteos fermentados como um agente de espessamento e estabilização. Ela também tem
potencial para ajudar a diminuir os níveis de colesterol devido à sua capacidade de se ligar a ácidos
biliares livres que ajudam a digestão das gorduras alimentares. 3) O terceiro composto de polpa de
32
madeira foi a lignina, uma substância orgânica responsável pela firmeza e rigidez das plantas. As
propriedades elásticas da lignina e a sua capacidade de reduzir a tensão superficial entre dois
líquidos imiscíveis poderiam ser empregadas para preparar emulsões, por exemplo, uma mistura de
água e óleo, com uma textura melhor. Os cientistas também descobriram que a lignina tem
propriedades antioxidantes que podem ser utilizadas na conservação de alimentos.

2.3. Pectinas
As pectinas são polissacarídeos formados de resíduos de ácido galacturônicos unidos entre si
por ligações glicosídicas (1→4) com grau variável de metoxilação (esterificação) nos seus
resíduos de ac. galacturônicos. São os principais componentes da lamela média da parede celular
vegetal. São ricas ainda em ácido galacturônico, ramnose, arabinose e galactose. O grande interesse
industrial pelas pectinas reside na sua propriedade de formar gel na presença de água e sob
condições favoráveis (Fig. 34).

Figura 34. Estrutura da Pectina e representação do gel de pectato de cálcio ou magnésio

Se por um lado a presença da pectina é interessante na tecnologia de alimentos, por ex., para a
formação do gel em geleias ou agente espessante em molhos, sua presença, porém, desfavorece a
extração e clarificação de sucos de frutas. Neste caso sua degradação se torna necessária pela adição
de enzimas pectinolíticas.
Comercialmente, a pectina é extraída da casca das frutas cítricas e da maçã por hidrólise
ácida à quente seguida de precipitação alcoólica ou alcalina. Ela é submetida a seguir à purificação,

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secagem, moagem e homogeinização. O controle das fases do processo de extração permite a
obtenção da pectina sob duas formas:
- Pectinas de alto teor de metoxílas (ATM), com grau de esterificação maior que 50%;
- pectinas de baixo teor de metoxílas (BTM), com grau de esterificação menor que 50%.
O grau de esterificação do ácido galacturônico pode ser indicado pela quantidade de grupos
metoxílicos (— OCH3) esterificados aos grupos carboxílicos, e é calculada em relação (%) ao
número total de unidades de ácido galacturônico (Tabela 19). Assim, quando todos os grupos
carboxílicos estão esterificados, temos um grau de esterificação de 100% e um conteúdo de grupos
metoxilicos de 16,4%, em relação à massa total do polímero.
A pectina ATM forma géis com conteúdo de sólidos solúveis (açúcares) acima de 55% e pH
de 2,0 a 3,5 (Figura 35). Este gel se estabiliza por interações hidrofóbicas dos grupos éster
metoxílicos e por formação de pontes de hidrogênio intermoleculares. O pH ácido provoca a
protonação dos grupos carboxílicos, diminui a repulsão eletrostática entre as cadeias e aumenta a
formação de pontes de H. A adição de um sólido solúvel (como a sacarose), diminui a atividade de
água, diminuindo a disponibilidade de água livre para solvatar o polissacarídeo, aumentando as
interações hidrofóbicas entre os grupos éster metoxílicos. O gel ATM (acima de 69%) se forma
rapidamente e pode ser utilizado em geleias contendo pedaços ou poupa de fruta em iogurte líquido,
sucos concentrados, bebidas lácteas, etc., pois a gelificação rápida sob alta temperatura mantém os
pedaços de frutas bem distribuídos na massa, evitando-se a decantação ou afloramento dos pedaços
de frutas.

Tabela 19. Substituição de grupos carboxílicos em pectinas


Tipo de pectina Grau de esterificação (%) Grau de metoxilação
(GM)
Protopectina 100 16
Pectina normal 50 8
Pectina de baixa metoxilação 12 - 25 2-4

A pectina BTM pode ser utilizada em geleias de baixo teor de sólidos (15 - 60%), geleias
dietéticas, iogurtes, doces de leite, entre outros. Para a formação de géis a pectina BTM necessita de
sais de cálcio solúveis que podem estar presentes nas frutas, no leite ou podem ser adicionadas
como soluções diluídas de seus sais como fosfato, cloreto ou lactato de cálcio. O gel de pectina
BTM se estabiliza por interações entre os grupos carboxílicos e íons divalentes (cálcio) e forma gel
rígido. Esta pectina não necessita de açúcar para gelificar (por isto é indicada para geleia diet ou
dietética), porém a adição de 10 a 20% de açúcares melhora a textura do gel, tornando mais elástico
e menos frágil.

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Figura 35. Grau de esterificação e formação de gel
A relação entre pectina, açúcar e acidez é a causa da formação de géis, os quais podem ser
de diferentes consistências. A pectina precisa ter um grau de polimerização relativamente grande
para formar gel, abaixo de um determinado tamanho não forma gel, independente da situação
empregada. A relação entre pectina, açúcar e acidez é relacionada pelo Diagrama de Spencer (Fig.
36). Nos limites indicados a diminuição de um dos componentes pode ser compensada pelo
aumento do outro.

Figura 36. Diagrama de Spencer


A partir da pectina ATM é possível obter geleia diet, da seguinte forma:
a) Pectina ATM + Pectinase = Pectina BTM.
b) Pectina BTM + Ca++ (ou Mg++) = Gel

2.3.1. Fabricação de geleia


Para a fabricação da geleia são necessários pelo menos água, pectina, ácido e açúcar.
1. Efeito da pectina: a pectina é o hidrocoloide responsável pela estrutura tridimensional (rede) em
meio aquoso que é o gel. A concentração usual é de 0,5 a 1,0 %. Se o suco (polpa) é pobre em
pectina, pode aumentar a concentração por meio da ebulição (evapora a água) ou adicionar mais

35
como pectina comercial. Por exemplo, pêssego apresenta gel fraco porque contém pectina com
grupos acetiis. Já os citrus (laranja) formam um gel bom, pois são ricos em pectina normal. O poder
de gelificação de uma pectina é geralmente expresso em graus SAG que representa o número de
gramas de sacarose necessários para gelificar um grama de pectina. Uma pectina muito comum no
mercado é a 150 sag, ou seja, um grama desta pectina gelifica 150 gramas de sacarose, formando
um gel de 65 Brix finais em pH=3,0 e uma determinada consistência.

2. Efeito do ácido: Os ácidos atuam neutralizando a carga dos grupos carboxila (-COO-) da pectina,
reduzindo a repulsão e aumentando a tendência das moléculas se associarem para formar o gel (o
gel se forma abaixo de pH 3,5). A acidez também contribui para o sabor e se o suco da fruta é pobre
em ácido, adiciona-se ácido cítrico ou suco de limão para reduzir o pH, aumentando a concentração
de H+ e assim evitando a dissociação dos grupos carboxílicos. A rigidez da estrutura é afetada pela
concentração do açúcar e acidez. O ácido enrijece as fibras da rede, mas a alta acidez afeta a
elasticidade, devido à hidrólise da pectina, podendo ocorrer sinérese, ou seja, exsudação do líquido
da geleia.

3. Efeito do açúcar: A característica hidrofílica do açúcar o torna ideal para esta aplicação, ao
adicionar açúcar em quantidades adequadas, a água interage com o açúcar causando sua
desidratação da pectina, facilitando a interação das moléculas de pectinas e a formação da rede
necessária para formar o gel. As condições típicas para o fabrico de compota são: pH de 2,8-3,4,
concentração de pectina de 0,5-1% e teor de açúcar de 60-65% como sólidos solúveis. Ele também
funciona como conservante, pois reduz o crescimento microbiano devido à redução da atividade de
água da geleia. A concentração de sólidos reflete no cozimento final, em que a temperatura pode
atingir cerca de 104,5 °C (propriedade coligativa). Assim, durante o cozimento parte da sacarose é
hidrolisada para açúcar invertido que irá desfavorecer a cristalização do açúcar na geleia.

3. Carboidratos com função de gomas


As gomas podem ser definidas como polissacarídeos complexos de alto peso molecular com
propriedades coloidais e com capacidade aumentar a viscosidade da solução ou de produzir géis em
contato com solventes apropriados. São bastante utilizadas em diferentes indústrias, como a
química, farmacêutica e de alimentos. Na indústria de alimentos são utilizadas principalmente como
agentes espessantes, gelificantes, emulsionantes e estabilizantes. Também são utilizadas como
adesivos, agentes ligantes, inibidores de cristais, agentes clarificantes, agentes encapsulantes,
agentes floculantes, agentes de inchamento, estabilizadores de espuma, etc. As gomas são

36
encontradas nas plantas aquáticas (algas), nas sementes de plantas, nos exsudados (seiva) de plantas
e produzidas por micro-organismos. Como veremos a seguir:

3.1. Gomas obtidas de carboidratos estruturais de plantas aquáticas (algas)


3.1.1. Ágar. É um polissacarídeo extraído de algas do gênero Gelidium. É uma galactana com
ligações , 1-4 e 1-3, contendo grupos hidroxílicos esterificados com ácido sulfúrico. Ele é formado
por duas frações: agarose e agaropectina, na proporção de 70 e 30%, respectivamente.
Agarose é um polímero linear com um peso molecular de cerca de 120.000, consistindo em
D-galactose alternada e 3,6-anidro-L-galactopiranose ligada por ligações glicosídicas α-(1 → 3) e β-
(1 → 4), livre de grupos sulfato e é responsável pela gelificação. Agaropectina é um polímero
heterogêneo de menor PM e também de menor ocorrência no ágar. Ele é constituído por unidades
alternadas de D-galactose e L-galactose fortemente modificadas com grupos laterais ácidos, tais
como o sulfato (ou piruvato) e isoladamente, forma géis muito fracos.
Soluções de ágar a 1% formam géis duros termo reversíveis. Os géis de ágar sofrem sinérese. A
viscosidade é pouco afetada pela variação do pH entre 4 e 9. O ágar além do tradicional uso no
preparo de meios de cultura em microbiologia é usado também em confeitaria, produtos cárneos e
laticínios. Agarobiose é a unidade repetitiva no ágar.

AGAROSE AGAROPECTINA
Figura 37: Frações de agarose e agaropectina.

3.1.2. Alginato. O alginato é extraído de algas marrom como Laminaria digitata e Macrocystis
pyrifera, mas também por algumas bactérias do gênero Azotobacter. Eles são polissacarídeos
constituídos por quantidades variáveis de ácido β-D-manurônico e seu epímero ácido α-L-
gulurônico unidos por 1-4 ligações glicosídicas (Figuras 38). Os monômeros são distribuídos em
blocos de resíduos contínuos de resíduos de guluronato (G), manuronato (M) ou resíduos alternados
(MG). Os alginatos de Azotobacter são verdadeiros copolímeros de blocos, compostos de regiões
homopoliméricas de resíduos M e G, separados por regiões de estrutura alternada. Ao contrário dos
alginatos produzidos por algas, os alginatos bacterianos são acetilados numa extensão variável nas
posições O-2 e/ou O-3 dos resíduos de manuronato. A variabilidade na massa molecular, na
estrutura de monômero e no grau de acetilação influenciam as características físico-químicas e
reológicas do polímero. Em alimentos, o alginato é usado em sorvetes, queijos e como estabilizante
37
em molhos e espessante para sucos naturais. Tem uso como estabilizante de emulsões óleo-água e
como estabilizante de espumas.

Figura 38: Estruturas químicas de blocos de ácidos urônicos encontrados em alginato

3.1.3. Carragenana ou carragenina: A carragenana é uma goma extraída das algas vermelha. Ela
é uma galactana de elevado PM constituídas por unidades de galactose e 3,6 anidrogalactose (3,6-
AG), sulfatadas e não sulfatadas. As unidades são unidas alternando as ligações glicosídicas α-1,3 e
β-1,4. Existem três principais classes comerciais de carrageninas: 1) Iota (ι) forma géis moles na
presença de íons cálcio. É produzido principalmente a partir de Eucheuma denticulatum; 2) a Kappa
(κ) forma géis fortes e rígidos na presença de íons de potássio; reage com proteínas lácteas. É
originária principalmente da alga Kappaphycus alvarezii; 3) a Lambda () não gelifica. As
principais diferenças que influenciam as propriedades destas carrageninas é o número e posição dos
grupos sulfatos nas unidades repetidas de galactoses. Quanto maior o número de ésteres de sulfatos,
menor a temperatura de solubilidade da carragenina. Principais usos são em laticínios, sorvetes e
sopas, como espessante e pela sua capacidade de formar géis com sais de potássio e algumas
proteínas.

Figura 39: Principais gomas carragenanas

3.2. Gomas obtidas de carboidratos de sementes de plantas terrestres


3.2.1. Goma guar. A goma guar é uma galactomanana neutra contendo manose e galactose na
proporção de 2:1 Ela é extraída da leguminosa Cyamopsis tetragonolobus. E uma goma de alto peso
38
molecular, estável ao calor e muito viscosa. Por causa de sua alta viscosidade, tem sua adição a
alguns produtos alimentícios dificultada. A solução para o problema, encontrada pela indústria de
alimentos, é a hidrólise parcial, transformando-a em um oligossacarídeo, a goma guar parcialmente
hidrolisada (GGPH). O produto final é menos viscoso e também é solúvel em água. Pessoas com a
doença celíaca não podem comer massas que têm glúten, presente na farinha de trigo. Assim, a
goma guar é uma boa alternativa para dar corpo e textura às massas produzidas sem a adição de
farinha de trigo (contem glúten) e usando, por ex., amidos de mandioca ou batata. Isto é importante
para dietas de celíacos, alérgicos ao glúten. A goma de guar é barata e está disponível em lojas
especializadas em produtos para celíacos e também em lojas de produtos macrobióticos. A
viscosidade é pouco afetada pelo pH nos valores entre 4-9. É usada como espessante e estabilizante
em bebidas, molhos e sorvetes. Nutricionalmente vem sendo usada para baixar colesterol e
emagrecer por baixar a taxa de absorção de carboidrato, que aumenta tempo de estomago e
sensação de saciedade.

Galactose
(-1,6)

Manose
(-1,4)
Figura 40: Goma guar
3.2.2. Goma "locusta" ou “Carob ou “alfarroba”. É uma goma obtida da semente da Ceratonia
siliqua (alfarrobeira). Estrutura do polissacarídeo é constituída de um esqueleto linear de unidades
de manoses ligadas β(1-4) com unidades simples de galactoses ligadas ao esqueleto por α(1–6). Ela
é uma galactomanana neutra menos ramificada que goma guar. É menos solúvel que a guar, sendo
dispersível apenas em água quente, pode ser usada com outras gomas, retardando a sinérese. É
usada como estabilizante para sorvetes e molhos e em mistura com outros polissacarídeos, para
evitar os efeitos da sinérese em géis.

Figura 41: Goma locusta


3.2.3. Goma algarroba. É uma galactomanana obtida das sementes da Prosopis juliflora
(algarrobeira), e com peso molecular médio de 250.000. Semelhante a alfarroba, ela também
apresenta estrutura constituída de um esqueleto linear de unidades de manoses ligadas β(1-4) com
39
unidades simples de galactoses ligadas ao esqueleto por α(1–6). Ela é uma galactomanana neutra
menos ramificada que goma guar. Forma soluções viscosas em concentrações próximas de 1%.
Possui características semelhantes àquelas da goma "locusta".

3.3. Gomas obtidas de carboidratos de exsudatos de plantas terrestres


3.3.1. Goma arábica. É um exsudato (saída de líquidos orgânicos através das paredes celulares) de
plantas do gênero Acacia (Acacia Senegal ou Acacia seyal). É um heteropolissacarídeo que contém
L-arabinose, L-ramnose, D-galactose e ácido D-glucurônico. Possui estrutura ramificada. É muito
solúvel em água (50%). Suas soluções são pouco viscosas e a viscosidade diminui na presença de
íons. É usada como espessante e estabilizante de emulsões; tem larga aplicação como agente
microencapsulador para corantes, aromas pela baixa viscosidade e alta solubilidade.

Figura 42. Os principais blocos de construção químicos da goma arábica. (A) D-galactopiranose,
(B) L-arabinofuranose, (C) L-ramnopiranose e (D) ácido D-glucopiranosurónico.

3.3.2. Goma karaya. Exsudato da Sterculia urens. É um heterospolissacarídeo de elevado peso


molecular, contendo L-ramnose, D-galactose, ácido D-galacturônico. Contém grupos acetílicos que
são perdidos com o tempo, dando cheiro de ácido acético. A viscosidade diminui com a adição de
íons e com pH baixo.

3.3.3. Goma tragacante. Exsudato da Astragalus gummifer. É formada de duas frações: bassorina,
que corresponde a 60-70% do peso da goma e que absorve água, mas não é solúvel e tragacantina,
solúvel. É um heteropolissacarídeo contendo: ácido D-galacturônico, D-galactose, D-xilose, L-
arabinose e íons de cálcio, magnésio e potássio. É uma das que forma dispersões mais viscosas
dentre as gomas de vegetais terrestres. É estável a pH ácido (2,0). É usada como estabilizante de
emulsões.

40
3.4. Gomas obtidas de carboidratos produzidos por micro-organismos
A tendência atual é produção de gomas por esta via, em função do maior controle de
produção e da redução de custos que pode gerar.
3.4.1. Goma xantana. Produzida pela Xantomonas campestris, a xantana tem em sua cadeia: D-
glucose, manose e ácido glucurônico. Ela gelifica somente em presença de outras gomas,
especialmente goma "locusta". Forma soluções viscosas e a viscosidade é pouco afetada pelo pH e
temperaturas de até 1 00 °C.
A goma xantana é um heteropolissacarídeo com uma estrutura primária que consiste de
“blocos repetidos” constituídos de duas unidades de glucose, duas unidades de manose e uma
unidade de ácido glucurônico (Fig. 43). A sua cadeia principal é constituída por unidades de glicose
ligadas por β(1- 4) (idêntica à da celulose). As cadeias laterais são trissacarídeos contendo uma
unidade de ácido D-glucurônico entre duas unidades de D-manoses por ligações β(1-2) e β(1-4).
Uma das manoses está ligada por α(1-3) a um dos resíduos de glicose na cadeia principal.
Aproximadamente, metade das D-manoses das extremidades terminais contêm um resíduo de ácido
pirúvico ligado, via ceto grupo, nas posições 4 e 6. A unidade de D-manose ligada à cadeia
principal contém um grupo acetil na posição O-6. A presença de ácidos acéticos e pirúvico produz
um polissacárido do tipo aniônico.

Figura 43. Goma xantana


3.4.2. Goma dextrana. É produzida pelas bactérias Leuconostoc mesenteroides e L. dextranicum.
A cadeia linear consiste em ligações glicosídicas α-1,6 entre as moléculas de glicose, enquanto as
ramificações se iniciam a partir de ligações α-1,3. Esta ramificação característica distingue uma
dextrana de uma dextrina, que é um polímero de glicose de cadeia linear unidas por ligações α-1,4
ou α-1,6. E utilizada na área de saúde, como diluente de plasma sanguíneo (chamado plasma
expander, que é usado como substituto temporário do sangue em transfusões de emergência) ou
como espessante em colírios. Ele também é usado em laboratórios e indústria bioquímica como

41
matrizes de resinas de cromatografia de exclusão por tamanho para separação de polímeros como
proteínas e carboidratos, como o nome de Sephadex (marca registrada pela indústria Pharmacia).

Figura 44: Goma dextrana


3.4.3. Goma curdlana. É produzida por Alcaligenes fecalis. É um polimero formado por unidades
de D-glucose unidas em -1,3. Não é solúvel em água. Forma géis irreversíveis a 80°C. Os géis
são estáveis ao congelamento e esterilização. Os géis apresentam sinérese. Pode ser usada como
fibra dietética pois não é absorvida pelo organismo humano.

Figura 45: Goma curdlana


As gomas citadas são apenas alguns exemplos das gomas produzidas por micro-organismos.
As gomas produzidas por micro-organismos não foram, na sua grande maioria, aprovadas para uso
em alimentos. Entretanto, suas propriedades bem como a facilidade de sua obtenção certamente
constituem incentivo para que os estudos sobre seus efeitos na alimentação humana sejam
intensificados para permitir seu uso nos alimentos.

Referências Bibliográficas:
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dos alimentos. Editora Atheneu, Rio de Janeiro, 2018, 420 p.

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da Unicamp, p. 2003. 207.

42
DAMODARAN, S.; PARKIN, K.L.; FENNEMA, O.R. Química de Alimentos de Fennema. 4ª ed.
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43
GELATINIZAÇÃO E RETROGRADAÇÃO DE AMIDOS

Material
- Becker, Bico de Bunsen, Tela de amianto, Termômetro, Bastão de vidro, Amidos de diferentes
fontes botânicas (milho, mandioca, arroz e batata).

Procedimento
- Pese 22g de amido em um Becker de 400ml;
- Adicione 330 ml de água;
- Aqueça e quando a temperatura atingir os valores determinados, retire 50 ml de amostra e transfira
para o copinho de papinha;
- Deixe as amostras resfriarem à temperatura ambiente, observe a rigidez, transparência e a
temperatura em que cada amido gelatinizou;
- Deixe uma amostra de cada tipo de amido em geladeira por 24 horas
- No dia seguinte observe e avalie o grau de retrogradação e sinérese de cada amido.

Resultados
Tipo de Temperatura (°C)
amido aquecimento Temp. Grau % %
gelatiniz. Retrograda. amilose amilopectina
Arroz 65 70 75 80 85 90
Batata 65 70 75 80 85 90
Mandioca 65 70 75 80 85 90
Milho 65 70 75 80 85 90
Trigo 65 70 75 80 85 90
Muito +++; Médio ++; Pouco +; Ausente 0

MICROSCOPIA DOS GRANULOS DE AMIDO

Material
Lâmina e lamínulas, Amostras de amidos, Solução de glicerina água 1:1, Pipetas de Pasteur e
Microscópio.

Procedimento
- Adicionar uma quantidade mínima de amostra na lâmina, adicionar uma gota da solução de
glicerina;
- Espalhar cuidadosamente ate homogeneização e cobrir com a lamínula;
- Observar ao microscópio sob diferentes aumentos e fazer desenhos dos diferentes grânulos.

DISCUSSÃO / RELATÓRIO

- Pelo que foi observado no laboratório, qual a faixa de gelatinização de cada um dos tipos de
amido? Esses valores concordam com a literatura?
- Quais as diferenças observadas entre os diferentes tipos de amido no que diz respeito a
transparência e tendência à retrogradação? Relacione essas duas características.
- Pelos dados obtidos de tendência a retrogradação tente comparar os tipos de amido com relação
a proporção de amilose/amilopectina que seria esperada.
- Explique as diferenças entre amido ceroso (waxy maize) e amido de alta amilose (high amilose
starch) e suas tendências para retrogradar.
- Desenhe as formas dos grânulos de cada amido observadas ao microscópio.
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GOMAS (Códigos) ESTRUTURA PROPRIEDADES APLICAÇÕES
EXUDATO DE PLANTAS TERRESTRES
ARÁBICA(Acacia) Galactose, ac. glucurônico, Alta solubilidade e baixa viscosidade. Soluções ++++ Encapsulador de corantes e aromas.
(EP V ou ET II) ramnose, arabinose pouco opacas Emulsões,balas,cerveja. Limite máximo 0,5%.
TRAGACANTE (Astragalus) Xilose, arabinose, ramnose, ac. Cara. Muito resistente à ácidos. Duas frações: +Estabilizante de emulsões. Produtos de confeitaria. Limite
(EP IV ou ET L) glucurônico, manose, Tragacantina(solúvel) e Bassorina(insolúvel). máximo 0,5%
Ca++,Mg++,K + Mais solúvel das gomas
KARAYA(Sterculia) Ramnose, galactose, ac. Quase insolúvel, mas incha em água fria dando + Mais usada em produtos farmacêuticos.
(EPIV ou ET LI) glucurônico soluções viscosas; Barata Espessante de Laticínios. Estabilizante de emulsões. Limite
máximo 0,5%
EXTRAÍDAS DE SEMENTES
GUAR(Cyamopsis) Galactose e manose (1:2) Hidrata em água fria dando soluções viscosas; +++ Espessante e estabilizante em sorvetes, pudins gelados,
(EP VII ou ET XXI) Estrutura ramificada. Forma gel com boratos; Barata, Estável ao calor e ketchup, bebidas. Limite máximo 0,085 a 0,5%.
pH;
LOCUSTA (Ceratonia) Galactose e manose (1:4). Só hidrata a quente dando soluções viscosas e ++
(EP VIII ou ET LII) opacas. Pouco afetada pelo pH. Não gelifica. Estabilizabnte de emulsões, sorvetes, gomas, biscoitos, bolos,
Evita sinérese requeijão. Limite máximo de 0,2 a 0,5%.
ALGARROBA (Prosopis) Galactose e Manose. Semelhante à LOCUSTA Semelhante à LOCUSTA
PRODUZIDAS POR MICRORGANISMOS
XANTANA(Xantomonas) Glucose, manose e ácido. Gelifica somente na presença de outra Emulsões, pós para pudins. Limite máximo 0,15 a 1%.
(ET XXVII ou EP XIII) glucurônico. goma(Locusta). Soluções muito viscosas. Estável
a T e pH.
DEXTRANA(Leuconostoc) Glucose Facilmente solúvel em água.
CURDLANA(Alcaligenes) NN soluvel. Forma gel a 80°C. Fibra dietética
Glucose
EXTRAÍDAS DE ALGAS MARINHAS (PLANTAS AQUÁTICAS)
AGAR(Gelidium) Galactose (1→4, 1→3) Cadeias esterificadas com ác. sulfúrico; Duas +
(EP I ou ET XXI) frações: agarose e agaropectina; Solúvel à quente, Produtos de panificação e cárneos, geléias. Limite máximo 0,2 a
forma géis duros c/ íons bivalentes sofrendo 0,5%.
sinerese; Alto custo.
ALGINATO (Laminaria ou Ac. glucurônico e manurônico Soluções de viscosidade variável, forma géis com ++
Macrocystis) (1→4). cálcio a frio; pouco estável a pH ácido (< 4,0) Molhos, sucos não muito ácidos, cerveja, iogurte. Limite
(EP II) máximo 0,01 a 1%.
CARRAGENA Galactose, grupos sulfato Solúvel em quente dando soluções viscosas; ++ Sopas, pós para pudim, leites aromatizados e refrescos.
(Rhodophyceae)(EP X) (mistura de vários polissacarídeos Forma gel com cálcio ou potássio; pouco estável Limite máximo 0,01 a 3%.
diferentes) a pH ácido.
+, ++, +++, ++++ - indicam proporção em que essas gomas são empregadas (USA).

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EXEMPLOS DE POLISSACARIDEOS APLICAÇÃO FUNÇÃO
Amido Glacês Adesivo
Guar, carragenatos Embutidos, alimentos para animais Agente ligante
Alginatos, carragenatos Produtos dietéticos Agente de corpo
Goma arábica, guar Sorvetes, xaropes de açúcar Inibidor de cristalização
Alginatos, carragenatos Cerveja, vinho Agente clarificante
Pectina, guar, CMC Sucos de fruta Turvante
Goma arábica Confeitos Revestimento
Alginatos, carragenatos Molhos para saladas Emulsificante
Goma arábica Aromas em pó Encapsulante
Alginatos, locusta Revestimento de embutidos Formador de filme
Agar, carragenato Vinho Agente de floculação
Goma arábica, alginato Coberturas batidas, cerveja Estabilizante de espuma
Gelatina, carragena Sobremesas (pudins, mouses), confeitos Agente gelificante
Pectina, alginatos Balas de goma Agente de moldagem
Alginatos, carragenatos Molhos para saladas, sorvetes Estabilizante
Locusta, guar Queijos, congelados Inibidor de sinerese
Alginatos, pectina Geléias, recheios de torta, molhos Espessante
Gelatina, alginatos Chantilly imitação, coberturas, marsmallows Agente de batimento (incorporação de ar)
Cereais, pães Fibra dietética

Espessante - substância capaz de aumentar nos alimentos a viscosidade de soluções, emulsões e suspensões

Estabilizante - substância que favorece e mantém as características físicas de emulsões e suspensões

Para informação sobre os produtos em que podem ser adicionados e as quantidades permitidas para cada um:
ANTUNES, A. J. e CANHOS, V. P. Aditivos em Alimentos. Série Tecnologia Agroindustrial
ABIA Compêndio de Legislação de Alimentos
ABEA / FERMENTA / GRINDSTEAD Aditivos na indústria Alimentícia (apostila).

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