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Princípios em Autoimunidade

Tizard, Ian. Imunologia Veterinária.


Disponível em: Minha Biblioteca, (10th
edição). Grupo GEN, 2023.

Capítulo 36
Doenças Autoimunes: Compreendendo a
Complexidade
• Doenças autoimunes são relativamente comuns. Elas
afetam cerca de 5% dos humanos e provavelmente uma
proporção semelhante de mamíferos domésticos.

• A maioria resulta do surgimento de clones de linfócitos


“mal comportados” dirigidos contra componentes normais
do corpo.

• O fato de que tendem a se desenvolver tardiamente


sugere que essas doenças, assim como o câncer, devem
ser resultado de inúmeros defeitos aleatórios.
Princípios gerais
• Essa regulação é tão essencial para homeostase do
organismo que uma vez quebrada a tolerância, o sistema
imune passa a responder altamente contra antígenos do
próprio organismo, desencadeando assim,
autoimunidades.

• Nem toda autoimunidade é patológica, pois pode ser


fisiológica.

• Pode haver uma forte predisposição genética para o


desenvolvimento de autoimunidade.
Origens das Doenças Autoimunes
• DA podem ser o resultado de uma resposta imune normal
contra um antígeno anormal ou pouco usual, ou podem
ser o resultado de uma resposta imune anormal contra um
antígeno normal. A segunda categoria é provavelmente a
mais comum.

• Nesses casos, os mecanismos que costumam prevenir o


desenvolvimento de células T e B autorresponsivas
falham.
Origens das Doenças Autoimunes
Antígenos Ocultos em Células ou Tecidos
(Antígenos Crípticos)
• Muitas respostas autoimunes são desencadeadas quando
células T não tolerantes encontram autoantígenos que
estavam escondidos.

• Céls. T só podem ficar tolerantes aos autoantígenos se


tiverem sido expostas a eles. Existem muitos
autoantígenos que não induzem tolerância simplesmente
porque ficam escondidos dentro das células ou dos
tecidos, onde não encontram as células T (ex. Antígenos
nucleares)
Antígenos Crípticos
• Algumas respostas autoimunes têm funções fisiológicas.
• Eritrócitos envelhecidos têm uma proteína de transporte aniônico denominada CD233
(ou proteína banda 3) gradualmente oxidada, expondo novo epítopo. É, então,
reconhecido por autoanticorpos IgG. Autoanticorpos + eritrócitos velhos = fagocitose
pelos macrófagos esplênicos.

• Muitos autoantígenos são encontrados em locais onde eles nunca encontram


linfócitos circulantes.
• Nos testículos, novos antígenos aparecem somente na puberdade – fato este que
ocorre muito tempo depois que o sistema de linfócitos T se desenvolveu e tornou-se
tolerante aos autoantígenos. Injúria aos testículos pode permitir que proteínas dos
tecidos danificados alcancem a circulação sanguínea, encontrem células sensíveis
aos autoantígenos e estimulem autoimunidade.

• Os antígenos ocultos também podem ser encontrados dentro das células.


• Após um ataque cardíaco, autoanticorpos podem ser produzidos contra as
mitocôndrias das células musculares cardíacas. Em cães com hepatite crônica, os
animais desenvolvem anticorpos contra proteínas de membrana dos hepatócitos.
Antígenos gerados por alterações
moleculares
• Epítopos novos em proteínas normais podem levar a
produção de autoanticorpos. Fatores reumatóides
(RFs) e as imunoconglutininas (IKs, da derivação
alemã).

• RFs-Imunoglobulinas. Produzidos em doenças em que


grandes quantidades de imunocomplexos são
geradas: doença autoimune das articulações
denominada artrite reumatóide e lúpus eritematoso
sistêmico (SLE), nas quais os linfócitos B respondem a
muitos autoantígenos diferentes. Anticorpo+antígeno=
alteração do formato da molécula de imunoglobulina.
Novos epítopos são expostos em sua região Fc. Estes
novos epítopos podem estimular a formação de RF.
Antígenos gerados por alterações
moleculares
• IKs-componentes do sistema complemento C2, C4 e,
especialmente, C3.
• Os epítopos que estimulam a formação de IK são expostos
quando estes componentes do sistema complemento são
ativados. O nível sérico de IKs reflete a quantidade de ativação
do complemento, sendo um bom indicador para mensurar o nível
de estimulação antigênica do animal. Esses são indicadores
inespecíficos da prevalência de doenças infecciosas dentro de
uma população animal. Seu papel fisiológico é ainda incerto,
mas eles podem aumentar a opsonização mediada pelo
complemento.
Edição do Receptor
• Gerados por rearranjo gênico aleatório.

• Resulta na geração de receptores de antígeno não funcionais e


autorreativos.

• Rearranjos são contínuos, mesmo após formações ideais. Linfócito B


imaturo: receptor+autoantígeno= desenvolvimento bloqueado. Porém,
a cadeia leve de seu receptor continua sofrendo recombinação,
podendo uma cadeia leve ser trocada por outra que torne a célula não
mais autorreativa.

• A edição de receptores ocorre somente em linfócitos B imaturos.


Linfócitos B maduros, que se ligam aos autoantígenos, não sofrem
edição do receptor e são induzidos a sofrer apoptose.
Respostas imunes anormais
• Após a injeção, os camundongos não só criam anticorpos
contra as células de rato, mas também desenvolvem uma
resposta autoimune transiente e autolimitada contra suas
próprias hemácias.

• Essa resposta autoimune é rapidamente controlada por células


regulatórias e dura apenas alguns dias.

• No entanto, se a atividade regulatória desses camundongos


estiver prejudicada, como ocorre nos camundongos New
Zealand Black (NZB), por exemplo, esses autoanticorpos
podem persistir e causar destruição de hemácias e anemia.
Respostas imunes anormais
• É comum encontrar doenças autoimunes associadas com
tumores linfoides. Por exemplo, a miastenia grave, uma
doença autoimune envolvendo a junção neuromuscular,
costuma estar associada com a presença de carcinoma
tímico.

• Em humanos, a incidência de artrite reumatoide é quatro


vezes maior em pacientes com tumores linfoides
malignos, e existem evidências de associações
semelhantes em outros mamíferos.
Autoimunidade Induzida por Infecção
• Bactérias como Streptococcus pyogenes, Borrelia
burgdorferi e Leptospira interrogans podem desencadear
doenças autoimunes: endocardite, artrite e uveíte,
respectivamente. O parasita protozoário Trypanosoma
cruzi desencadeia uma cardiomiopatia autoimune.

• De que maneira os vírus conseguem induzir doenças


autoimunes não é sabido, mas três mecanismos principais
são reconhecidos: mimetismo molecular, espalhamento de
epítopos e ativação bystander.
Exemplos de Mimetismo
• o parasita T. cruzi contém antígenos que reagem de maneira cruzada
com neurônios e músculo cardíaco de mamíferos. Indivíduos
infectados com T. cruzi criam autoanticorpos que causam doença no
sistema nervoso e no coração

• Anticorpos contra a proteína M da parede celular de Streptococcus do


grupo A fazem reação cruzada contra a miosina cardíaca

• Jovens infectados com certas cepas de Streptococcus do grupo A


produzem anticorpos antimiocárdio e desenvolvem a doença cardíaca.
Algumas cepas de Spreptococcus podem causar glomerulonefrite
aguda em crianças como resultado da produção de anticorpos que
fazem reação cruzada com a membrana basal glomerular.
Exemplos de Mimetismo
• Na pneumonia enzoótica suína causada por Mycoplasma
hyopneumoniae, os anticorpos contra o micoplasma fazem
reação cruzada com os pulmões do porco.

• Na pleuropneumonia contagiosa bovina, ocorre reação cruzada


entre antígenos do Mycoplasma mycoides e o pulmão bovino.
Não se conhece a extensão da contribuição desses
autoanticorpos para a patogênese de tais doenças.

• Existe uma relação causal mais clara entre a infecção por


Leptospira interrogans e o desenvolvimento da uveíte
recorrente equina ou oftalmia periódica, a principal causa de
cegueira em cavalos
Propagação de epítopos
Ativação Bystander
Microquimerismo
Fatores predisponentes
Predisposição genética
• Fatores genéticos são os determinantes de suscetibilidade a doença;

• Existência de 25 genes em camundongos que contribuem para a


autoimunidade se forem perdidos ou superexpressados;

• Mutações lpr pu gld são doenças resultantes de um defeito em um


único gene;

• No entanto, nenhum gene específico é necessário ou suficiente para a


expressão da doença. Os genes influenciam a gravidade da doença;

• Apresentação da doença evidente pode depender da carga genética


do animal
Fatores genéticos
• A complexidade genética e na análise genética ocorrem pois genes
suscetíveis podem ou não interagir. Elas contribuem para as
apresentações da doença.

• Genes do MHC são os predominantemente associados a doenças


autoimunes, que determinam resistência ou suscetibilidade a muitas
doenças;

• Quase todas as doenças autoimunes estão ligadas a múltiplos loci


MHC. Por exemplo, em humanos, a combinação de HLA-A1, -B8 e -
DR3 está associada a maior risco para diabetes tipo 1, miastenia grave
e SLE;

• Resposta autoimune: depende da estrutura da fenda de encaixe para o


antígeno no MHC
“Gargalos” genéticos
• Das doenças imunomediadas, é a mais comum em cães e
gatos, acometendo os cães com mais frequência. Dos
animais mais acometidos, encontram-se os de meia idade
a senil. As raças predispostas são Akita, Bearded Collie,
Chow Chow, Dachshund, Doberman e Terra Nova.
“Gargalos” genéticos
• Por exemplo, o DRB1*04 é encontrado na maioria dos
Boxers, o DRB1*2401 pode estar restrito aos Akitas, o
DRB1*01 é predominante nos West Highland White Terriers,
o DQA*0203 é restrito aos Dobermans, existe uma alta
incidência do DQA*0102 nos Wolfhounds Irlandeses e nos
Chows, e o DRB1*0101 é comum em Setters Irlandeses.

• Esses haplótipos limitados garantem que os cães dessas


raças responderão a um repertório reduzido de antígenos,
diminuindo, portanto, sua resistência a doenças infecciosas.
Esses cães também serão mais suscetíveis a doenças
imunológicas.
Castração
Microflora Intestinal
• Consiste em mais de 800
espécies bacterianas;

• Influencia o desenvolvimento de
tolerância imunológica, podendo
afetar desenvolvimento de
doença autoimune;

• As bactérias comensais são


responsáveis por estimular a
produção de IgA, por meio da
penetração da mucosa intestinal;
Doenças
• Anemia Hemolítica Auto-imune
• Artrite Reumatoide
• Hipotireoidismo
• Lúpus Eritematoso Discóide
• Lúpus Eritematoso Sistêmico
• Pênfigo Foliáceo
• Diabete Mellitus
Doenças
• Anemia Hemolítica Auto-imune
• Normalmente o animal apresenta palidez, fraqueza e letargia
acompanhadas por febre, icterícia e hepatoesplenomegalia. A anemia
pode se associar com outros sinais clínicos, tais como a taquicardia,
anorexia, vômito ou diarréia. Os sinais clínicos precisos dependem da
velocidade do desenvolvimento da doença, da sua severidade e do
mecanismo de destruição de hemácias.

• Artrite Reumatoide
• Nesta doença os anticorpos atacam a membrana sinovial, tecido que
preenche os espaços intra-articulares e promove a lubrificação para o bom
funcionamento das articulações. Quando esse tecido é lesado, ocorre uma
inflamação. As articulações do carpo são as mais acometidas, tendo como
outros sinais clínicos rigidez, claudicação, dor, fadiga muscular, perda de
peso, apatia e hipertermia.
Doenças
• Hipotireoidismo
• Os cães sofrem uma tireoidite auto-imune de ocorrência natural, que
pode ser assintomática ou pode resultar em uma doença clínica
significativa. Os sinais clínicos da tireoidite auto-imune são os do
hipotireoidismo ou seja, os animais ficam gordos e inativos, exibem uma
alopecia macular e ficam relativamente inférteis.

• Lúpus Eritematoso Discóide


• É uma doença que atinge a pele dos cães e gatos. As lesões são
usualmente no plano nasal e na face, podendo ser observadas diversas
feridas, com despigmentação, eritema (vermelhidão) e descamação.
Lesões semelhantes podem envolver lábios, ponte nasal, tegumento
periocular, pavilhão auricular e menos comumente, parte distal dos
membros e genitália. No caso dos gatos, as lesões nasais são incomuns.
Doenças
• Lúpus Eritematoso Sistêmico
• Essa é uma doença imunomediada multissistêmica, caracterizada pela produção
de vários autoanticorpos, podendo atingir órgãos e tecidos diferentes. Tem caráter
crônico e progressivo. Rara em gatos e incomum em cães. Os sintomas cutâneos
são comuns, podendo haver erosões ou úlceras mucocutâneas ou em mucosas.
Lesões multifocais ou difusas como erosões, eritema, alopecia, crostas,
escoriações podem se instalar em qualquer parte do corpo, porém as mais comuns
são face, orelhas e extremidades distais.

• Pênfigo Foliáceo
• Outra dermatopatia imunomediada, esta doença atinge várias espécies. Das
doenças imunomediadas, é a mais comum em cães e gatos, acometendo os cães
com mais frequência. Dos animais mais acometidos, encontram-se os de meia
idade a senil. A enfermidade acomete a pele e as mucosas com a formação de
pústulas superficiais como lesões primárias. Já as secundárias incluem erosões
superficiais, crostas, escamas, colares epidérmicos e alopecia. A doença
frequentemente tem início na ponte nasal, ao redor dos olhos e no pavilhão
auricular antes de se generalizar
Doenças
• Diabetes Mellitus
• O DM canino assemelha-se ao DM tipo 1 em humanos, no qual
ocorre destruição de células B no pâncreas e incapacidade de
produção de insulina. As causas mais comuns de destruição de
células B são processos autoimunes e pancreatite. Esse tipo de
diabetes é irreversível, o que torna o animal insulinodependente.
Obrigado!
giovanni.ribeiro@uniceplac.edu.br

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