Você está na página 1de 37

SUMÁRIO

1. Introdução...................................................................... 4
2. Epidemiologia............................................................... 4
3. Etiologia ......................................................................... 4
4. Fisiopatologia............................................................... 6
5. Manifestações clínicas.............................................. 7
6. Diagnóstico.................................................................18
7. Tratamento..................................................................21
8. Gestação e anticoncepção....................................27
9. Vacinação.....................................................................28
10. Acompanhameno do les.....................................29
11. Nefrite lúpica............................................................29
Referências bibliográficas .........................................37
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 3

1. INTRODUÇÃO No Brasil, estima-se uma incidência


aproximada de 4,8 a 8,7 casos por
O Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES)
100.000 habitantes/ano. O LES é
é uma doença inflamatória crônica,
uma doença universal encontrada em
autoimune, de etiologia pouco conhe-
todas as etnias e nas mais diversas
cida, decorrente de um desequilíbrio
áreas geográficas, mas parece ser
do sistema imunológico e de produ-
mais prevalente em afrodescenden-
ção de autoanticorpos dirigidos contra
tes. As características da doença e
proteínas do próprio organismo. Isso
sua gravidade bem como sua preva-
gera a formação de imunocomplexos
lência podem diferir em variados gru-
que, ao se depositarem em vasos de
pos étnicos.
pequeno calibre, resultam em vascu-
lite e disfunção do local acometido.
O LES compromete órgãos e tecidos 3. ETIOLOGIA
nas mais diversas combinações e em
Apesar de ainda não totalmente es-
graus variados de gravidade. Clinica-
clarecida, a etiologia de LES é multi-
mente, a doença apresenta períodos
fatorial, sendo composta por fatores
de exacerbação de atividade inflama-
genéticos, epigenéticos, hormonais,
tória, intercalados com remissão par-
ambientais e imunológicos.
cial ou completa dos sintomas. Em al-
guns pacientes, há a manutenção da À luz da genética, já é bem documen-
atividade inflamatória crônica. tada uma alta prevalência da doença
entre gêmeos monozigóticos e nos
parentes de primeiro grau. A chance
2. EPIDEMIOLOGIA de desenvolvimento de LES é 29 ve-
O LES é muito mais prevalente em zes maior para gêmeos monozigóti-
mulheres na idade reprodutiva, sen- cos e 17 vezes maior para parentes
do que os primeiros sinais e sintomas de primeiro grau de pessoas acome-
se iniciam entre a segunda e a tercei- tidas quando comparados a dados
ra décadas de vida, o que demonstra da população geral. Outro fator im-
um potencial efeito no estrógeno na portante é a deficiência de algumas
fisiopatologia da doença. Nessa faixa proteínas do sistema complemento,
etária, há um predomínio do sexo fe- especialmente C1q e C4. Também
minino, na proporção de 10:1. Nas já foram identificados polimorfismos
crianças, em que o efeito do estróge- genéticos como fator predisponente.
no é mínimo, a relação entre os sexos Além disso, é consistente a associa-
feminino e masculino é de 3:1 e, nos ção de alguns alelos do MHC (Com-
idosos, de 8:1. plexo Principal de Histocompatibili-
dade) com o LES, principalmente os
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 4

alelos DR2 e DR3 de classe II. Outras O meio ambiente, provavelmente,


associações importantes estão rela- também apresenta um papel na etio-
cionadas à assinatura do IFN (Inter- logia do LES, por seus efeitos sobre
feron). Genes ligados à imunidade o sistema imune. As infecções po-
intata, como STAT4, IRF5 e TLR7, dem intensificar respostas imunes
estão ligados à sinalização e produ- indesejáveis. Pacientes com LES,
ção de IFN-α, que tem sua expressão frequentemente, expressam altos tí-
aumentada no soro de 60 a 80% dos tulos dos anticorpos antivírus Eps-
pacientes lúpicos. tein-Barr, apresentam carga viral
Do ponto de vista hormonal, os estró- circulante desse vírus aumentada e
genos possuem papel estimulador de produzem anticorpos antirretrovírus.
várias células imunes, como macrófa- Outros microrganismos relacionados
gos, linfócitos T e B. Nesse sentido, fa- são o citomegalovírus (CMV) e a My-
vorecem a adesão de mononucleares cobacterium tuberculosis. Infecções
ao endotélio vascular, estimulam a se- por micobactérias e tripanossoma
creção de algumas citocinas, como IL- podem induzir a formação de anticor-
1, e expressão de moléculas de ade- pos anti-DNA ou mesmo sintomas
são e MHC. Do mesmo modo, a via lúpus-símile. O tabagismo é segun-
IFN do tipo I é regulada positivamen- do fator ambiental mais associado ao
te pelo estrógeno e negativamente desenvolvimento do LES. Ele também
pelos progestágenos. Os estrógenos reduz o efeito da hidroxicloroquina na
também têm ação semelhante às mo- terapêutica
léculas de BLyS/BAFF (estimulador Ainda sobre os fatores ambientais, é
de linfócitos B/fator de ativação das importante ressaltar o papel da luz
células B), reduzindo a apoptose das ultravioleta (UV) na ativação da do-
células autorreativas e acelerando sua ença, o que ocorrem em 70% dos
maturação, especialmente das células pacientes com LES. A exposição so-
B com alta afinidade pelo DNA. Os lar determina a apoptose de querati-
níveis séricos do BAFF estão frequen- nócitos com subsequente expressão
temente aumentados nos pacientes, de moléculas, como RNP, Ro, nucle-
promovendo a formação e a sobre- ossoma e fosfolipídeos nos corpúscu-
vivência das células B de memória e los apoptóticos. Também há secreção
dos plasmócitos. Esse aumento per- de citocinas, como IL-1, IL-6 e TNF-α,
sistente dos autoanticorpos não é com amplificação da resposta imune
controlado adequadamente pelos an- e ativação de macrófagos, além de
ticorpos anti-idiotípicos, pelas células processamento de antígenos, o que
T reguladoras CD4+, ou pelas células desencadeia uma resposta inflama-
T supressoras CD8+. tória sistêmica.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 5

FATORES GENÉTICOS FATORES FATORES AMBIENTAIS


HORMONAIS

ETIOLOGIA
MULTIFATORIA

Fonte: LANNOTTI J. P. The Netter Collection of Medical illustrations. 2 ed. 2013

4. FISIOPATOLOGIA CD8+ e CD4+ reguladoras, que invia-


bilizariam a evolução fisiopatológica.
A fisiopatologia é marcada por vários
defeitos no sistema imune que levam O resultado de todo esse processo é
a uma perda de autotolerância. Nesse a manutenção e produção de auto-
sentido, há uma produção anormal de anticorpos e, subsequente, imuno-
autoanticorpos, prévia ao início dos complexos, que se depositam em
sintomas, por parte dos linfócitos B, órgãos-alvo. As células-alvo lesadas
que são estimulados e mantém sua (glomérulos, células endoteliais, pla-
sobrevida por ação das moléculas quetas e outras) liberam mais antíge-
de BLyS/BAFF. Antígenos próprios nos, que perpetuam o processo.
(DNA/proteína nucleossômais, RNA/
proteína em SM, Ro e La, além de
fosfolipídeos) estão disponíveis para
o reconhecimento por pare do siste-
ma imune nas vesículas apoptóticas.
Assim, antígenos, autoanticorpos e
complexos imunes persistem por pe-
ríodos prolongados, tornando possí-
vel a inflamação e a própria doença.
Outro fator que contribui para o LES é
a produção insuficiente de IL-2 e TGF,
pelas células T e natural killer (NK),
para a sustentação das células T
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 6

Imunidade Inata IL1 e TNF Inflamação

IMUNOCOMPLEXOS

Consumo do fator Diminui o cleareance dos imunocomplexos


complemento e restos apoptóticos

Paralelamente aos eventos descri- menos de 5% dos pacientes, mas


tos acima, ainda ocorre a ativação pode ser o primeiro sinal da doença.
do sistema complemento, levando à Cerca de 42% dos pacientes podem
liberação de citocinas, quimiocinas, ter febre como manifestação do lú-
peptídeos vasoativos, oxidantes e pus ativo, principalmente observada
enzimas destrutivas. Esse contexto é em crianças e adolescentes. Linfade-
acompanhado pelo influxo de células nopatia generalizada ou localizada,
T, monócitos, macrófagos e células com predomínio das cadeias cervi-
dendríticas para os tecidos-alvo, bem cal e axilar, pode ser observada em
como pela ativação de macrófagos mais de um terço dos casos, assim
residentes e células dendríticas. Du- como a presença de hepato e/ou
rante a inflamação crônica, o acúmulo esplenomegalia.
de fatores de crescimento e de pro-
dutos da oxidação crônica contribui
para o dano tecidual irreversível aos PELE E ANEXOS
glomérulos, artérias, pulmões e ou- As manifestações cutâneas são ex-
tros tecidos. tremamente importantes para o diag-
nóstico. Ocorrem em 70% dos pa-
cientes no início da doença e em até
5. MANIFESTAÇÕES
80 a 90% durante sua evolução. As
CLÍNICAS
principais lesões compreendem o lú-
Sintomas gerais como anorexia e per- pus cutâneo agudo, subagudo e
da de peso podem ser observadas discoide (crônico).
como quadro inicial da doença e pre- A principal lesão cutânea aguda é o
ceder o aparecimento de outras ma- rash malar ou eritema em “asa de
nifestações em meses. Diminuição do borboleta”, identificada em 30 a 60%
apetite, febre, poliadenopatias, mial- dos casos, sendo altamente fotossen-
gia e artralgia também podem fazer sível. Também chamado de rash em
parte do quadro. O lúpus é causa de vespertílio, essa lesão se apresenta
febre de origem indeterminada em
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 7

como eritema na região malar e no Outros tipos de lesões agudas são


dorso do nariz, dando o aspecto de máculas, pápulas ou placas erite-
“asa de borboleta”, transitório ou mais matosas, algumas com tonalida-
persistente. Geralmente poupa o sul- de violácea, que podem apresentar
co nasolabial e seu aparecimento leve descamação. As lesões não são
acompanha os períodos de atividade pruriginosas e primariamente ocor-
da doença. Pode ainda apresenta-se rem em áreas expostas ao sol, como
como erupção maculopapular discre- face, tórax, ombros, face extenso-
ta e descamativa, e cura sem deixar ra dos braços e dorso das mãos, re-
cicatriz. Sua forma generalizada é gredindo sem deixar atrofia. O lúpus
conhecida como rash maculopapular bolhoso e necrose epidérmica tóxica
ou dermatite lúpica fotossensível e se são também outras formas de lesões
apresenta como erupção exantema- agudas da doença, juntamente com a
tosa ou morbiliforme generalizada. fotossensibildade.

Figura 1. Manifestação cutânea do Lupus: rash malar


LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 8

O lúpus cutâneo subagudo manifes- A forma mais comum de lúpus eri-


ta-se como placas eritematosas em tematoso cutâneo crônico é o lúpus
áreas expostas e com intensa fotos- eritematoso discoide, caracteriza-
sensibilidade, habitualmente asso- do por lesões maculosas ou papu-
ciada ao anticorpo anti-Ro. Clinica- losas, eritematosas, bem definidas,
mente observam-se duas variedades com escamas firmes e aderentes à
de lesão: a papuloescamosa e anular. superfície das lesões. Podem ocorrer
Inicialmente, as lesões apresentam- na ausência de manifestações sistê-
-se como um pápula ou pequena pla- micas. Comumente, em sua evolução,
ca eritematosa levemente descama- essas lesões tornam-se confluentes,
tiva. Na variante papuloescamosa, as formando placas recobertas por es-
lesões progridem e confluem forman- camas espessas e ceratose, que se
do placas psoriasiformes em arranjo estende para o interior do folículo pi-
muitas vezes reticulado. Já na varian- loso dilatado. Os locais mais acome-
te anular ocorre progressão periférica tidos são: couro cabeludo, pavilhão
das lesões, com eritema e fina des- auricular, região torácica anterior e
camação na borda. Ocasionalmente porção superior dos braços. Na face,
surgem hipopigmentação e telangec- as sobrancelhas, as pálpebras, o na-
tasias no centro das lesões anulares. riz e as regiões mentoniana e malar
estão frequentemente envolvidas. As
lesões cutâneas são crônicas, per-
sistentes e podem regredir deixando
áreas cicatriciais discrômicas, além de
telangectasias e alopecia cicatricial.

Figura 2. Placas eritematosas como manifestação do


lúpus cutâneo subagudo
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 9

Figura 3. Lúpus Discoide

ocorrer rigidez matinal, semelhante à


SE LIGA! Existem ainda algumas ma- da artrite reumatoide. Outro achado
nifestações cutâneas que representam importante é a artropatia de Jaccoud,
formas de apresentação de vasculite,
identificada em 8 a 10% dos casos,
como púrpura palpável, a urticaria, o li-
vedo reticular, o eritema periungueal, que é caracterizada por desvio ulnar
as ulcerações digitais ou em membros dos dedos, subluxação das articula-
inferiores e o fenômeno de Reynaud, ções matacarpofalangianas, deformi-
presente em até 50% dos pacientes, as
quais indicam doença ativa.
dades reversíveis do tipo “pescoço de
cisne” e polegar em “Z” decorrentes
do acometimento inflamatório de ten-
MUSCULOESQUELÉTICAS dões e ligamentos. Essas estruturas
sofrem frouxidão na vigência do pro-
A presença de artralgia e/ou artrite
cesso inflamatório. Também podem
pode ser identificada no início da do-
ser encontrados hálux valgo, dedos
ença em 75 a 85% dos casos e na
em martelo e subluxação das articu-
maioria dos pacientes durante a evo-
lações matatarsofalangianas nos pés.
lução. Embora não possua um pa-
Essas deformidades articulares tam-
drão específico de acometimento, na
bém são comuns à artrite reumatoide,
maioria das vezes observa-se um po-
porém, no lúpus, não são observa-
liartrite simétrica aditiva, na qual pode
das erosões.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 10

Figura 4. Artropatia de Jaccoud

A persistência de dor, edema e calor


em apenas uma articulação, princi-
palmente no joelho, no ombro ou no
quadril, levanta a suspeita de osteo-
necrose ou artrite séptica. A preva-
lência de osteonecrose é aumentada
em doentes com lúpus, principalmen-
te naqueles em uso de corticoides. O
quadril (cabeça do fêmur) é a articula-
ção mais frequentemente envolvida.
Outra complicação articular é a artri-
te séptica. As infecções são comuns
nestes indivíduos, especialmente
naqueles com doença renal crôni-
ca, tanto por bactérias típicas quanto
pelas atípicas, lembrando sempre da
tuberculose.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 11

Figura 5. Osteonecrose da cabeça do fêmur

CARDIORRESPIRATÓRIAS clínicos de insuficiência cardíaca agu-


da, geralmente coma alterações no
O envolvimento cardiovascular em
mapeamento cardíaco e enzimas
pacientes com LES inclui o pericár-
musculares. O diagnóstico baseia-se
dio, o endocárdio, o miocárdio, as
em dispneia, palpitações, febre, pre-
artérias coronárias e o sistema de
sença de sopros cardíacos com ritmo
condução, com significante morbida-
de galope e cardiomegalia.
de e mortalidade.
As alterações valvulares pode se ma-
A pericardite pode ser a primei-
nifestar como espessamento valvar,
ra manifestação do LES em 5% dos
massas ou vegetações, regurgita-
quadros, podendo aparecer isolada-
ção e, raramente, estenose. Durante
mente ou associada a serosite gene-
o curso da doença, essas alterações
ralizada, particularmente associan-
podem aparecer pela primeira vez,
do-se à pleurite. Os quadros variam
resolver, persistir ou piorar. Pacien-
desde assintomáticos até tampona-
tes que apresentam essas alterações
mento cardíaco, podendo ser detec-
possuem maior incidência de AVE,
tado por atrito pericárdico, alterações
embolia periférica, insuficiência car-
ecocardiográficas ou na tomografia.
díaca, endocardite infecciosa e mor-
A miocardite sintomática pode ser te, quando comparados a pacientes
suspeitada na presença na presen- sem valvopatia. Cerca de 43% dos
ça de taquicardia persistente e sinais portadores de lúpus apresentam
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 12

vegetações conhecidas como endo-


cardite de Libman-Sacks. Consis- SE LIGA! Os quadros de pneumonite
tem em acúmulos estéreis de imuno- aguda e crônica no lúpus são menos
frequentes.
complexos, células mononucleares,
corpos de hematoxilina e trombos
de fibrina e plaquetas. Essas lesões
podem se desenvolver em qualquer SE LIGA! A Síndrome do pulmão en-
parte da superfície endocárdica, po- colhido é uma complicação rara no LES.
Ela é caracterizada por dispneia pro-
rém são mais encontradas nas valvas gressiva e a radiografia de tórax mos-
do coração esquerdo, particularmen- tra redução significativa dos campos
te na superfície atrial da valva mitral. pleuropulmonares sem acometimento
do parênquima, diafragmas elevados e
Sua cicatrização leva à fibrose e, em
imagens de atelectasia nas bases.
alguns casos, à calcificação.
Dentre as manifestações pulmonares,
a pleurite é a mais frequente e ocorre
em 30 a 60% dos pacientes, sendo
que derrame pleural é observado em
16 a 40% durante o curso da doença.
A hemorragia alveolar difusa é ou-
tra condição que determina dispneia
de início súbito, associada à redução
dos níveis de hemoglobina. A hiper-
tensão pulmonar pode ocorrer em
decorrência da própria em decorrên-
cia da própria doença ou secundária
a valvopatia cardíaca, doença inters-
ticial pulmonar ou embolia pulmonar.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 13

Figura 6. Fonte: LANNOTTI J. P. The Netter Collection of Medical illustrations. 2 ed. 2013

RENAIS E HEMATOLÓGICAS alguns pacientes com LES podem ter


alterações histopatológicas significa-
O envolvimento renal é um dos princi-
tivas na biópsia renal sem qualquer
pais determinantes da morbimortalia-
sinal clínico de envolvimento renal.
de nos pacientes com LES. Manifes-
ta-se clinicamente em 50 a 70% dos Além das síndromes nefrítica e ne-
pacientes, mas praticamente 100% frótica que ocorrem em quadros de
deles têm doença renal à microscopia nefrite lúpica, alterações do sedimen-
eletrônica. Em geral, as manifesta- to urinário também são comuns du-
ções renais surgem nos primeiros 2 a rante as repercussões renais. A pre-
5 anos da doença e, quando se apre- sença de hematúria, leucocitúria e
sentam como a manifestação inicial cilindros celulares, são os parâme-
do LES, pioram o prognóstico desses tros mais importantes para a carac-
pacientes. As manifestações clínicas terização de glomerulonefrite em ati-
subestimam a verdadeira frequên- vidade. A proteinúria também pode
cia do comprometimento renal, pois indicar a atividade inflamatória nos
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 14

rins. Redução filtração glomerular, gastroesofágico, e, raramente, ulcera-


proteinúria nefrótica e presença de ções por vasculite.
hipertensão sugerem maior gravida- A dor abdominal pode está presente
de e pior prognóstico. em até 30% dos pacientes e indica
Em relação às manifestações hema- um diagnóstico diferencial amplo: pe-
tológicas, a leucopenia e linfopenia ritonite, úlcera péptica, vasculite me-
são encontradas com alta frequência sentérica e infarto intestinal, pancre-
no LES. A plaquetopenia pode ser atite e doença inflamatória intestinal.
a primeira manifestação da doença. Icterícia também pode está presente
Clinicamente observam-se peté- e, em geral, é consequência de hepa-
quias ou equimoses, principalmen- tite, pancreatite ou hemólise. A ente-
te de membros inferiores, além de ropatia perdedora de proteínas tem
fenômenos hemorrágicos. A anemia sido descrita em pacientes com LES
hemolítica Coombs positivo também e é caracterizada por edema e hipo-
pode ocorrer de forma isolada no iní- albuminemia na ausência de nefrite.
cio da doença, porém, o achado mais É mais comum em mulheres jovens, e
frequente é a anemia de doença diarreia pode está presente em 50%
crônica. dos casos. A biópsia da parede do in-
A pancitopenia nos pacientes lúpi- testino delgado demonstra depósitos
cos pode ser relacionada com efei- de C3 na parede dos capilares, o que
to colateral dos imunossupresso- provoca aumento da permeabilidade
res, com complicação de infecções capilar.
ou com manifestações da síndrome
hemofagocítica NEUROPSIQUIÁTRICAS
O lúpus neuropsiquiátrico compre-
GASTROINTESTINAIS ende diversas síndromes neurológi-
Ocorrem em 25 a 40% dos pacientes, cas, envolvendo o sistema nervoso
sendo que grande parte são queixas central, periférico e autonômico, além
inespecíficas, como dor abdomi- de síndromes psiquiátricas e psico
nal, náuseas e vômitos, que podem funcionais. As manifestações neurop-
traduzir desde uma peritonite esté- siquiátricas podem preceder, ocorrer
ril até efeitos colaterais dos medica- simultaneamente ou algum tempo
mentos. A queixa de boca seca pode após o início da doença durante os pe-
aparecer secundária como parte da ríodos de atividade ou quando o LES
síndrome de Sjogren secundária. se encontra inativo. Podem ser pri-
Disfagia pode ocorrer por hipomoti- márias, ou seja, decorrentes do dano
lidade esofagiana, doença do refluxo imunológico ou de tromboembolismo,
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 15

ou podem ser secundárias a diversas diabetes, uso de alguns medica-


situações clínicas a que está sujeito o mentos, hipertensão podem levar a
paciente com uma doença sistêmi- síndromes neuropsiquiátricas não
ca. Infecções, distúrbios metabólicos, imunomediadas.

PRINCIPAIS SÍNDROMES NEUROPSIQUIÁTRICAS RELACIONADAS AO LES

Sistema Nervoso Central Sistema Nervoso Periférico

Estado confucional agudo Neuropatia craniana

Distúrbios cognitivos Polineuropatia

Psicose Plexopatia

Desordens de humor Mononeuropatia simples/múltipla

Desordens de ansiedade Polirradiculopatia inflamatória aguda (Guillain-Barré)

Cefaleia Desordens autonômicas

Doença cerebrovascular

Mielopatia

Desordens do movimento

Síndromes desmielinizantes

Convulsões

Meningite asséptica

Tabela 1. Fonte: Carvalho MA. Reumatologia - Diagnóstico e Tratamento. 4ª ed. 2014.


LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 16

Pleurite
Rash malar em asa de borboleta
Pneumonite lúpica
Lúpus discoide
Miocardite
Alopecia
Infarto
Fotossensibilidade
Hemorragia pulmonar

Endocardite de Libman-Sacks
Pele e anexos
Grave: sistema Embolia pulmonar
nervoso, miocárdio, Cardiorrespiratória
pulmonar, vasculite Hipertensão

Pericardite
Segue “padrão” nos
Gastrointestinal
primeiros 5 anos
Úlceras orais

Hepatite
+ Comum: cutâneo-
Renal Isquemia intestinal
articular
Pancreatite

Sintomas
Sanguínea Urina muito espumosa
constitucionais
Nefrite lúpica

Insuficiência renal
Musculoarticulares Articular
Hematúria

Artrite Artralgia inflamatória “Anemia hemolítica”


Mialgia Poliartrite simétrica Trombose
Artralgia Artropatia de Jaccoud Plaquetopenia
Não erosiva Leucopenia
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 17

6. DIAGNÓSTICO com lúpus sistêmico é necessário que


estejam presentes no mínimo, qua-
O diagnóstico de LES baseia-se na
tro critérios, incluindo pelo menos um
combinação de manifestações clíni-
clínico e um imunológico (do total de
cas e alterações laboratoriais, desde
seis). Alternativamente, a doença é
que outras doenças sejam excluídas.
considerada quando a nefrite é con-
Recentemente, em 2012, o grupo do
firmada por biópsia na presença de
Systemic Lupus Collaborating Clínics
FAN positivo ou anticorpo anti-dsD-
(SLICC) publicou a atual proposta de
NA positivo. O critério SLLIC apre-
classificação de pacientes com LES.
senta especificidade de 92% e sensi-
Para um indivíduo ser classificado
bilidade de 94%.

MANIFESTAÇÃO CLÍNICA

Lúpus cutâneo agudo, incluindo: eritema malar (não discoide), lúpus bolhoso, necrólise epidérmica tóxi-
ca – variante lúpus, eritema maculopapular, eritema fotossensível do lúpus ou lúpus cutâneo subagudo
(psoriasiforme/anular)

Lúpus cutâneo crônico: lúpus discoide, lúpus hipertrófico/verrucoso, lúpus profundus (paniculite), lúpus
túmido, lúpus mucoso, sobreposição líquen plano/lúpus discoide

Úlcera mucosa: palato, cavidade oral, língua ou úlcera nasal (na ausência de outras causas)

Alopecia não cicatricial

Artrite/Artralgia
- Sinovite (edema/derrame articular) ≥ 2 articulações
- Artralgia (dor) em 2 ou + articulações com rigidez matinal ≥ 30 min

Serosite
- Pleurite (dor ≥ 1 dia/derrame pleural/atrito pleural)
- Pericardite (dor ≥ 1 dia/derrame/atrito/alterações ECG)

Nefrite: proteinúria 24h > 500mg ou relação prot/creat > 500 mcg/mg (mg/g), cilindro eritrocitário

Neurológica: convulsão, psicose, mononeurite múltipla, mielite, neuropatia periférica/craniana, estado con-
fusional agudo (na ausência de outras causas)

Anemia hemolítica

Leucopenia (<4.000/mm3, em pelo menos uma ocasião) ou linfopenia (<1000/mm3, em pelo menos uma
ocasião)

Plaquetopenia (<100.000/mm3, em pelo menos uma ocasião)


LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 18

Alteração imunológica

FAN Hep2 positivo

Anti-DNA positivo

Anti-Sm positivo

Anticorpo antifosfolípide positivo: anticoagulante lúpico positivo, anticardiolipina positivo (título modera-
do/alto – IgA/IgM/IgG), VDRL falso positiva, anti-α2 glicoproteína 1 positivo

Complemento baixo: C3, C4, CH50

Coombs direto positivo (na ausência de anemia hemolítica)

O paciente deverá preencher pelo menos 4 critérios (incluindo 1 clínico e 1 imunológico) OU ter nefrite lú-
pica comprovada por biópsia renal com presença de FAN positivo ou anti-DNAn posito.

Tabela 2. Fonte: Carvalho MA. Reumatologia - Diagnóstico e Tratamento. 4ª ed. 2014.

A atividade da doença é avaliada por Desta forma, o teste é relevante pelo


meio da combinação de história clíni- seu alto valor preditivo negativo
ca, exame físico, testes funcionais e (VPN).
estudos sorológicos. Sua quantifica- O anti-dsDNA nativo tem importân-
ção pode ser de grande importância cia não só pela sua especificidade no
para o acompanhamento dos pacien- LES, mas também devido ao fato de
tes, tanto na prática clínica quanto altos títulos representarem atividade
nos estudos clínicos. de doença, principalmente renal. A
As anormalidades imunológicas são presença do anticorpo anti-Sm indica
as mais características e incluem a especificidade para o LES, apesar de
presença de autoanticorpos e redu- ser positivo em cerca de apenas 30%
ção do complemento. A maioria dos dos casos. O anti-Ro/SS-A também
pacientes (mais de 98%) tem o teste é encontrado no lúpus e na Síndrome
do fator antinuclear (FAN) positivo de Sjogren, geralmente assiciado ao
em títulos altos, em particular durante anti-LA/SS-B. É detectado em cerca
os períodos de atividade de doença. de 80% dos pacientes com lúpus eri-
A positividade desse exame não é tematoso cutâneo subagudo. O an-
específica do LES e pode ocorrer em ti-Ro está relacionado com o lúpus
outras doenças autoimunies, além de neonatal e bloqueio congênito em
doenças infecciosas e neoplásicas e crianças nascidas de mães com esse
até mesmo em indivíduos saudáveis. autoanticorpo, mesmo que estas não
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 19

tenham nenhuma doença evidente. Com relação aos exames que refle-
Os anticorpos antiproteína P ribosso- tem envolvimento dos órgãos e sis-
mal (anti-P) são marcadores especí- temas: o hemograma pode revelar
ficos de LES, ocorrendo em 10 a 20% anemia, leucopenia e trombocitope-
dos casos e, possivelmente, apresen- nia; o exame de sedimento urinário
tando associação com manifestações pode apresentar proteinúria, hamatú-
neuropsiquiátricas da doença. ria, leucocitúria e cilindrúria; a biópsia
Outros anticorpos, os antifosfolípi- renal reflete a classe histológica da
des, são autoanticorpos que intera- nefrite; as enzimas musculares pode
gem com fosfolipídeos associados confirma a suspeita de miosite; as en-
a um cofator no endotélio vascular, zimas hepáticas podem fornecer in-
provocando tromboses arteriais e ve- dícios de hepatite; entre outros. Esses
nosas, plaquetopenia e abortos de exames complementares devem ser
repetição, além de insuficiência adre- realizados de acordo com a suspeita
nal, pré-eclâmpsia, livedo reticular, de acometimento de órgãos/sistemas,
valvopatia, entre outras. Os grupos exceto para os quadros hematológico
mais comuns de anticorpos antifosfo- e renal que devem ser avaliados in-
lípides são o anticoagulante lúpico dependentemente da manifestação.
(LA) e os anticorpos anticardiolipi- Os exames que refletem alterações
na (aCL). inflamatórias são inespecíficos e in-
cluem VHS e PCR. No lúpus, a PCR,
Também podem ser encontrados an- geralmente, não se eleva muito, salvo
ticorpos anti-histona nos casos de quando existe infecção associada.
lúpus induzido por medicamentos.
Esses são de caráter temporário e
desaparecem poucos meses após o
término do tratamento com medica-
ção indutora.
Outra característica que auxilia no
diagnóstico e acompanhamento do
pacientes é a avaliação do sistema
complemento. O consumo do com-
plemento (C3, C4 e complemen-
to hemolítico total) é uma alteração
importante.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 20

FAN

ANTI-dsDNA
MANIFESTAÇÕES
CRITÉRIO DE CLÍNICAS
CLASSIFICAÇÃO ANTI-RO
(SLICC) MARCADORES
IMUNOLÓGICOS
ANTI-P

DIAGNÓSTICO
HEMOGRAMA
ANTI-HISTONA

SUMÁRIO DE URINA COMPLEMENTO


EXAMES QUE PODEM
(C3, C4)
REVELAR DISFUNÇÃO
ORGÂNICA
BIÓPSIA RENAL

ENZIMAS HEPÁTICAS/
MUSCULARES

VHS/PCR

SE LIGA! O diagnóstico de Lúpus Cutâ- 7. TRATAMENTO


neo é diferente do LES. As manifesta-
ções cutâneas isoladamente não refle- Em decorrência da grande variabili-
tem, necessariamente, a existência de
dade fenotípica e das manifestações
uma doença sistêmica.
clínicas, o tratamento de portadores
de LES requer inicialmente a definição
da extensão e gravidade da doença.
Medidas gerais também apresentam
grande valia e são tão importantes
quanto ao tratamento medicamento-
so. Quando não são levadas em con-
ta, podem contribuir para o insucesso
na condução do caso.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 21

MEDIDAS GERAIS DO TRATAMENTO DO PACIENTE COM LES

I) Educação: informar, ao paciente e aos familiares, o que é a doença, sua evolução, riscos
e os recursos disponíveis para diagnóstico e tratamento. Recomenda-se a necessidade de
cumprimento das medidas estabelecidas pelo médico.

II) Apoio psicológico: transmitir otimismo e motivação para o tratamento, além de estimular
os projetos de vida. O paciente deve ser capaz de levar sua vida social, profissional e afetiva
de forma normal.

III) Atividade física: repouso nos períodos de atividade sistêmica da doença e medidas visan-
do melhora do condicionamento físico (estimular a atividade física regular).

IV) Dieta: recomenda-se a adoção de uma dieta balanceada, evitando-se excessos de sal,
carboidratos e lipídeos.

V) Proteção: contra luz solar e outras forma de irradiação ultravioleta (protetores solares,
roupas, chapéus, sombrinhas).

VI) Evitar: tabagismo, pois está implicado na patogenia da doença cardiovascular e exacer-
bação das lesões discoides.

Tabela 3. Fonte: Carvalho MA. Reumatologia - Diagnóstico e Tratamento. 4ª ed. 2014.

Outro ponto importante, no tratamen- além da presença de comorbidades


to, é a identificação de fatores asso- e danos associados ao LES e/ou seu
ciados à reativação da doença, como tratamento.
exposição à irradiação UV, infecções
superpostas e distúrbios emocionais,
que deveram ser evitados. Um as- TRATAMENTO MEDICAMENTOSO
pecto que deve ser constantemente O tratamento medicamentoso deve
avaliado é a não adesão do paciente ser individualizado para cada pacien-
ao tratamento. Talvez esse fator seja te e dependerá dos órgãos ou siste-
uma das mais importantes causas de mas acometidos e da gravidade das
não controle da doença. Por isso é manifestações. A terapia de pacien-
fundamental a educação do pacien- tes com comprometimento de múl-
te e seus familiares sobre a provável tiplos sistemas deverá ser orientada
evolução natural da doença e poten- para o comprometimento mais gra-
cial gravidade dos acometimentos, ve. Quando houver manifestação que
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 22

não responda a um medicamento, possível, deve haver redução gradual


pode ser necessário fazer uso conco- da dose empregada. Nos pacientes
mitante de diversos medicamentos. que não conseguem atingir uma dose
Independentemente do órgão ou sis- de manutenção <7,5 mg/dia, está in-
tema afetado, o uso de antimaláricos dicada a associação de outro medica-
é indicado para reduzir a atividade mento para poupar corticoide. Entre
da doença e tentar poupar o uso de esses, além dos antimaláricos, estão
corticoide. O difosfato de cloroquina indicados a azatioprina, o metotrexa-
(4mg/kg/dia) e o sulfato de hidroxi- to (MTX) ou ciclosporina na mani-
cloroquina (6mg/kg/dia) são os fár- festação cutânea, hematológica e na
macos mais bem empregados nesse vasculite. É importante o diagnóstico
sentido. A manutenção dessa classe diferencial entre atividade da doença
medicamentosa em pacientes con- e infecção, lembrando da possibilida-
trolados reduz a possibilidades de de de coexistência de ambas, assim
novo surto de atividade. Além disso, como da presença de comorbidades.
melhora o perfil lipídico, diminuindo Novas alternativas para o tratamento
os níveis de LDL, melhora a glicemia de pacientes com LES não responsi-
e reduz o risco de trombose. Os an- vo à outras terapias têm sido estuda-
timaláricos não aumentam o risco de das, especialmente medicamentos
infecções e seu uso é seguro na gra- imunobiológicos. O belimumabe foi
videz. Apesar de todos os benefícios, aprovado pelas agências regulatórias
esses fármacos apresentam toxicida- para uso na prática clínica. Trata-se
de ocular e podem gerar maculopatia, de um anticorpo monoclonal cujo me-
uma complicação rara e improvável canismo de ação se dá pela ligação ao
para indivíduos com função renal nor- BLyS solúvel, impedindo sua matura-
mal e período de uso inferior a 7 anos. ção, diferenciação e sobrevida. É in-
Uma avaliação oftalmológica semes- dicado, particularmente, nos quadros
tral está indicada para pacientes que musculoesqueléticos ou cutâneos,
fazem uso contínuo dos antimaláricos. que mesmo em uso de antimalárico
O corticoide é a classe medicamen- associado a doses baixas de corticoi-
tosa mais utilizada no tratamento. A de e falha de pelo menos dois imu-
dose indicada varia de acordo com nossupressores utilizados em doses
a gravidade da manifestação. De- adequadas por 3 a 6 meses. Deve
vido aos múltiplos efeitos colaterais ser considerada a descontinuação do
(desvantagens), como catarata e os- belimumabe quando não houver me-
teoporose, o corticoide deve ser utili- lhora no controle da doença após 6
zado na dose efetiva para o controle meses.
da atividade da doença, e, assim que
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 23

Outro imunobiológico atualmente mais hipertróficas, está indicado


empregado, em pacientes com doen- corticoide alta potência associa-
ça grave e refratária, é o rituximabe. do ao ácido salicílico para obten-
Essa droga é um anticorpo mono- ção de efeito ceratolítico. As lesões
clonal quimérico que desencadeia a agudas geralmente respondem ao
depleção de linfócitos B. Utiliza-se, tratamento indicado para outras
geralmente, em ciclos com dose to- manifestações do LES, como cor-
tal de 1.000 mg intravenoso, tendo ticoide e imunossupressores. O
cada aplicação o intervalo de 2 sema- uso de antimaláricos isolados ou
nas. Os ciclos são repetidos a cada 6 em combinação com prednisona é
meses. eficaz para tratar a lesão do lúpus
cutâneo subagudo. Nos casos re-
fratários, o uso de talidomida na
TRATAMENTOS ESPECÍFICOS dose de 100-200 mg/dia mostrou-
• Manifestação cutânea -se eficaz em 75% dos pacientes,
mas deve ser indicada somente
O tratamento vai depender do tipo
para indivíduos do sexo masculino
e da extensão das lesões de pele
ou para mulheres sem qualquer ris-
e da gravidade das manifestações
co de gravidez, na pós menopausa
extracutâneas. Considerando a ra-
ou com anticoncepção definitiva,
diação UV como principal causa-
pois tem efeito teratogênico.
dora de fotossensibilidade e de-
sencadeante das lesões de pele,
protetores solares com fator de • Manifestação hematológica
proteção solar (FPS) de 15 até 30
O tratamento de escolha da ane-
devem ser utilizados em quanti-
mia hemolítica autoimune é fei-
dade generosa pela manhã e rea-
to com prednisona em dose alta
plicados mais uma vez ao dia, em
(1mg/kg/dia), por 4 a 6 semanas
geral, no horário do almoço. Os pa-
com posterior redução. Também
cientes também devem ser orien-
pode ser utilizada a pulsoterapia
tados quanto ao uso de roupas,
venosa com uso de metilpredniso-
chapéus e sombrinhas devido não
lona por 3 dias seguidos. Cerca de
haver nenhum creme protetor solar
65% dos casos respondem a esta
que bloqueia toda a radiação UV.
terapêutica de maneira satisfatória.
Nas lesões localizadas, está indi- A pulsoterapia com metilpredniso-
cada terapia tópica com corticoi- lona deve ser indicada para casos
de de baixa ou média potência na graves, em que se requer respos-
face e áreas de flexão. Em lesões ta mais rápida, e a manutenção é
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 24

feita com prednisona por via oral


em dose baixa. Nos casos refratá- SE LIGA! Pacientes que estão em uso
rios à corticoterapia, ou se forem de prednisona 5 mg por pelo menos três
meses tem indicação para profilaxia de
necessárias altas dose de manu-
osteoporose induzida por glicocor-
tenção, pode-se associar imunos- ticoide. A profilaxia é feita com suple-
supressores, com azatioprina, mi- mentação de vitamina D, ingesta diária
cofenolato de mofetil, ciclosfamida de cálcio pela dieta, preferencialmente,
e exercício físico com carga.
ou danazol.
Para a leucopenia, o tratamento
com prednisona deve ser instituí- • Manifestação articular
do quando a contagem de leucó- As artrites agudas, quando não
citos for < 2.000/ mL. Em situação acompanhadas de comprometi-
de grave neutropenia, pode ser mento sistêmico, podem ser tra-
indicada a pulsoterapia com me- tadas com anti-inflamatórios
tilprednisolona associada a fator não esteroidais (AINES), desde
estimulador de colônia de granu- que não sejam contraindicados.
lócitos. As plaquetopenias leves (< Caso não haja melhora, pode-se
50.000) não requerem tratamento substituir ou associar prednisona
específico. A prednisona em dose em dose baixa. Nas artrites com
alta é o tratamento de escolha para evolução crônica ou com recidivas
plaquetopenia sintomática. A pul- frequentes, está indicado o uso de
soterapia pode ser utilizada para antimalárico. Nos casos não res-
plaquetopenia grave, quando se ponsivos ou em que os antimalá-
requer resposta mais rápida. ricos sejam contraindicados, pode-
Nos casos graves e refratários de -se associar metotrexato.
anemia hemolítica autoimune ou
plaquetopenia pode haver benefí-
cio do uso de rituximabe. Imuno-
globulina intravenosa mostrou ser
eficaz em pacientes com anêmica
hemolítica autoimune e pode ser
indicada em pacientes com con-
traindicação ou toxicidade a outras
terapias.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 25

MANIFESTAÇÃO CUTÂNEA

MANIFESTAÇÃO HEMATOLÓGICA

MANIFESTAÇÃO ARTICULAR
DIFOSFATO DE
CLOROQUINA
DEMAIS MANIFESTAÇÕES ANTIMALÁRICOS
SULFATO DE
HIDROXICLOROQUINA
TRAMENTOS
ESPECÍFICOS A
DEPENDER DO
PREDNISONA
ACOMETIMENTO
CORTICOIDES

METILPREDNISOLONA

TRATAMENTO MEDICAMENTOSO AZATIOPRINA

IMUNOSSUPRESSORES MICOFENOLATO

CICLOFOSFAMIDA
MEDIDAS GERAIS

BELIMUMABE
IMUNOBIOLÓGICOS
PROTEÇÃO (LES REFRATÁRIO)
RITUXIMABE

CESSAR TABAGISMO

DIETA

ATIVIDADE FÍSICA

APOIO PSICOLÓGICO

EDUCAÇÃO
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 26

8. GESTAÇÃO E aleitamento materno pode determinar


ANTICONCEPÇÃO riscos para a criança se houver uso
de prednisona em doses > 20 mg/dia.
A gestação nas pacientes com LES
Por isso, é recomendado um intervalo
deve ser considerada de alto ris-
de 4 horas entre o uso dessa medi-
co, necessitando acompanhamen-
cação e a amamentação. Quando in-
to multidisciplinar, até o puerpério,
viável o uso de imunossupressores, a
devido à possibilidade de exarceba-
opção é azatioprina em doses baixas
ção da doença. Na gravidez, podem
(100 mg/dia). O tratamento da ativi-
ocorrer eritemas palmar e facial, ar-
dade do LES será feito com corticoide
tralgias e elevação da VHS, dificul-
na dose indicada segundo a manifes-
tando o diagnóstico diferencial com
tação, associado à hidroxicloroquina.
a atividade inflamatória do lúpus. A
Ciclofosfamida e metotrexato são
presença do anti-dsDNA e/ou ele-
contraindicados.
vação dos seus títulos e consumo do
complemento podem auxiliar na dife- A contracepção em mulheres com
renciação entre atividade de doença e LES é um desafio. Os contraceptivos
pré-eclâmpsia. orais são raramente prescritos, por
causa da preocupação com poten-
A pesquisa dos anticorpos antifosfo-
ciais efeitos negativos do estrógeno
lípides, anti-Ro/SS-A e anti-La/SSB é
nas pacientes. A anticoncepção pode
importante devido à possibilidade da
ser feita com progesterona e méto-
ocorrência da síndrome antifosfo-
dos de barreira ou com associação
lípide e do lúpus neonatal, respec-
de ambos. Os progestágenos podem
tivamente. Há maior incidência de
ser utilizados uma vez que não indu-
retardo de crescimento intrauteri-
zem piora da doença.
no, prematuridade, hipertensão in-
duzida pela gravidez e diabetes. O
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 27

SEMPRE CONSIDERADA
DE ALTO RISCO

SÍNDROME
ANTIFOSDOLÍPIDE
ACOMPANHAMENTO
GESTAÇÃO
MULTIDISCIPLINAR

LÚPUS NEONATAL

REPERCUSÕES DO LES
RETARDO DO
CRESCIMENTO
INTRAUTERINO

PROGESTERONA

HIPERTENSÃO
CONTRACEPÇÃO

MÉTODOS DE BARREIRA

9. VACINAÇÃO pneumococo, influenza e HPV são


seguras e têm eficácia quase seme-
Portadores de LES possuem o risco
lhante à da população geral. No en-
aumentado de infecção quando com-
tanto, não devem ser administradas
parados com indivíduos normais. Esse
nos períodos de atividade da doença.
risco mais elevado está relacionado
A imunização contra a hepatite B
com condições próprias da doença
está indicada apenas nos pacientes
de base e também com a terapêu-
expostos ao risco de infecção.
tica imunossupressora empregada
no tratamento. Além disso, podem
ocorrer suscetibilidades específicas, SE LIGA! Vacinas com vírus vivos, como
sarampo, caxumba e rubéola não devem
como asplenia funcional observada ser prescritas a pacientes com LES.
em alguns pacientes que resulta em
maior risco de infecções por bacté-
rias encapsuladas, como pneumoco-
cos, meningococos e Haemophilus
influenzae tipo B. A vacina contra o
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 28

de LES, são importantes para acom-


panhar a intercorrências infecciosas.
VACINAÇÃO Ademais, Urina I com pesquisa para
dismorfismo eritrocitário é uma im-
portante ferramenta de rastreio para
a nefrite lúpica. Também é solicitado
ANTIPNEUMOCÓCICA junto ao sumário de urina (Urina I) a
relação proteína/creatinina.
INFLUENZA EXAMES SOLOCITADOS PARA O
ACOMPANHAMENTO DO LES

HPV Anti-DNA e complemento

Hemograma, função hepática e função renal

HEPATITE B Perfil osteometabólico

Albumina

NÃO ADM EM PERÍODOS DE VHS e o PCR


EXACERBAÇÃO DO LES
Urina I com pesquisa para dismorfismo
eritrocitário

Relação proteína/creatinina

10. ACOMPANHAMENTO Tabela 4

DO LES
11. NEFRITE LÚPICA
Periodicamente, os pacientes com lú-
pus precisam ser monitorados quanto A nefrite lúpica é frequente no LES,
a atividade da doença. Nesse sentido, uma vez que 74% dos pacientes se-
marcadores imunológicos como an- rão acometidos em algum momento
ti-DNA e complemento se mostram na evolução da doença, sendo um in-
úteis. Para a avaliação de toxicidade dicado de pior prognóstico. Essa pa-
medicamentosa da terapêutica podem tologia renal ocorre por depósito de
ser solicitados hemograma, função imunocomplexos circulantes ou for-
hepática e função renal. Também é mação local desses complexos nos
importante o perfil osteometabólico glomérulos levando à ativação do
devido ao uso recorrente de corticoi- complemento e subsequentemente
des no tratamento do LES. A albumina recrutamento de células inflamató-
pode ajudar a reconhecer danos renais rias. Além do processo inflamatório,
(proteinúria). O VHS e o PCR, apesar da necrose e da formação de cicatri-
de não serem marcadores a atividade zes nos glomérulos, a patologia renal
se caracteriza por lesões vasculares
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 29

como microangiopatia trombótica e CLASSIFICAÇÃO DA NEFRITE LÚPICA


vasculite extraglomerular, além de SEGUNDO A INTERNATIONAL SOCIETY OF
acometimento tubulointersticial com NEPHROLOGY/RENAL PATHOLOGY SOCIETY
atrofia tubular e fibrose intersticial. 2003

CLASSE DESCRIÇÃO

CLASSIFICAÇÃO I Mesangial mínima

A nefropatia lúpica pode ser classifi- II Mesangial proliferativa


cada de acordo com elementos pri- III Nefrite focal
mariamente acometidos, ou seja, os
glomérulos, os túbulos e/ou interstício IV Nefrite difusa

e os vasos sanguíneos. Na realidade, V Membranosa


o envolvimento de um desses com-
VI Esclerótica avançada
ponentes acaba por lesar os demais.
Tabela 5
A classificação é feita mediante a bi-
ópsia renal que é indicada quando:
• Houver elevação da creatinina • Glomerulonefrite Mesangial Mí-
sérica sem causa aparente e po- nima (CLASSE I)
tencialmente associada ao LES Essa classe é raramente diagnos-
(Piora da função renal). ticada porque os pacientes com
esse tipo de acometimento renal
• Proteinúria isolada ≥ 1 g/24h
frequentemente têm um exame de
• Proteinúria ≥ 0,5 g/24 associa- urina normal, proteinúria ausente
da à hematúria dismórfica glo- ou mínima e creatinina sérica nor-
merular e/ou cilindros celulares. mal. Nesses casos a biópsia renal
não é solicitada. Pacientes com
doença classe I apresentam depó-
Segundo a International Society of
sitos imunes mesangiais identifi-
Nephrology/Renal Pathology (2003),
cados pela técnica de imunofluo-
as desordens glomerulares podem
rescência e microscopia eletrônica.
ser divididas em 6 diferentes classes
a partir de características histológicas
encontradas na biópsia renal. • Glomerulonefrite Mesangial Pro-
liferativa (CLASSE II)
A microscopia óptica caracteriza-
-se por hipercelularidade mesan-
gial discreta ou moderada ou por
extensão da matriz mesangial.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 30

São visualizados poucos depó- • Glomerulonefrite Difusa (CLAS-


sitos isolados subendoteliais ou SE IV)
subepiteliais de imunoglobulinas É a forma mais comum e mais gra-
e complemento pelas técnicas de ve de acometimento renal em pa-
imunofluorescência e microsco- cientes com LES. É definida his-
pia eletrônica. Clinicamente, ma- tologicamente pelo acometimento
nifesta-se como hematúria e/ou de mais de 50% dos glomérulos
proteinúria discreta, geralmente, pela microscopia óptica. As lesões
aparecendo de forma intermitente. podem ser segmentar (menos de
Hipertensão é incomum e os pa- 50% do tofo glomerular acometi-
cientes raramente evoluem para do) ou global (mais de 50% do tofo
síndrome nefrótica e insuficiên- glomerular acometido). Os pacien-
cia renal. Em geral, a evolução é tes apresentam hematúria ma-
benigna. cro ou microscópica, proteinú-
ria, além de cilindrúria hemática
e celular. A maioria dos pacientes
• Glomerulonefrite Focal (CLASSE
evoluem com hipertensão arterial
III)
e insuficiência renal (quando não
É definida histologicamente pelo tratados em tempo hábil). Todas
acometimento de pelo menos 50% essas características clínicas deno-
dos glomérulos pela microscopia tam a vigência de uma síndrome
óptica, com envolvimento quase nefrítica, que é tão típica nesse
sempre segmentar (acomete me- estágio. Os pacientes com insu-
nos de 50% do tofo glomerular). O ficiência renal, geralmente, ainda
quadro clínico é caracterizado por apresentam hipocomplemente-
hematúria recorrente e proteinú- mia significativa (redução de C3
ria leve a moderada. A evolução principalmente) e níveis séricos
é habitualmente favorável, sem elevados do anticorpo anti-DNA,
sequelas importantes. Porém, há especialmente durante a doença
pacientes que apresentam evolu- ativa.
ção desfavorável em consequência
de surtos repetidos de inflamação
SE LIGA! Pacientes com lesão renal
aguda ou de comprometimen-
classe III ou IV podem apresentar sín-
to glomerular progressivo ou que drome nefrítica, característica de hiper-
evoluem para forma mais grave de tensão, anti-DNA positivo, hipocomple-
envolvimento renal, como a glo- mentemia e proteinúria.
merulonefrite difusa.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 31

• Glomerulonefrite Membranosa a função renal, geralmente é nor-


(CLASSE V) mal ou levemente alterada.
É definida histologicamente por
espessamento difuso da parede
• Glomerulonefrite Esclerosante
capilar glomerular à microscopia
Avançada (CLASSE VI)
óptica e pela presença de depó-
sitos imunes subepiteliais tando É definida histologicamente por
global quanto segmentar à micros- esclerose global de mais de 90%
copia eletrônica e imunofluores- dos glomérulos. Representa o es-
cência. A principal manifestação tágio avançado das glomerulone-
clínica é a presença de proteinúria frites classe III, IV ou V crônicas. Os
nefrótica (>3,5 g/24 h), hipopro- pacientes evoluem com insuficiên-
teinemia, especialmente hipoal- cia renal progressiva em associa-
buminemia (albumina <3 g/24 h), ção com proteinúria, e o sedimento
edema e hiperlipidemia. Todos urinário apresenta poucas altera-
esses achados levam ao diagnós- ções. Nesse estágio a terapia imu-
tico de síndrome nefrótica, que nossupressora não apresenta mais
é característica nesse estágio. Na benefícios.
apresentação do quadro também
podem ser vistas hematúria mi- LESÕES RENAIS NO LES
croscópica e hipertensão arterial, e

A. TIPO MESANGIAL B. TIPO PROLIFERATIVA FOCAL

PAS: H & E:
Glomérulos mostran- Glomérulos mostrando
do aumento da matriz proliferação focal e ade-
mesangial são de tufos glomerulares

Imunofluorescência: Imunofluorescência:
Depósito mesangial Depósitos granulares
de imunocomplexos de imunocomplexos nas
imunofluorescência paredes dos capilares
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 32

C. TIPO PROLIFERATIVA DIFUSA D. TIPO MEMBRANOSA

H & E:
Glomérulos apresentando PAS:
modificações proliferati- Espessamento difuso da
vas, necrose e corpos de membrana basal
hematoxilina (seta)

Imunofluorescência:
Imunofluorescência:
Depósito granular e
Depósitos maciços de
homogêneo difuso nas
imunocomplexos
paredes capilares

Diagrama:
Diagrama:
Depósito suben-
Depósitos subendoteliais
dotelial maciço de
difusos
imunocomplexos

Tabela 6. Fonte: LANNOTTI J. P. The Netter Collection of Medical illustrations. 2 ed. 2013

DIAGNÓSTICO TRATAMENTO
Na prática clínica, nem sempre é pos- O tratamento da nefrite lúpica é di-
sível fazer a biópsia renal, embora vido em fases de indução e manu-
esse seja um procedimento relati- tenção. Ele é direcionado a pacientes
vamente simples quando feito por que apresentem lesão renal classe III,
profissionais experientes. A biópsia IV ou V. Para indivíduos que tenham
permite o reconhecimento de mar- lesão renal classe I ou II a conduta é
cadores diagnósticos e prognósticos expectante na maioria das vezes, sal-
que podem influenciar a escolha te- vo se houver proteinúria persistente
rapêutica. Para os pacientes não sub- ≥ 1 g/24. Nessa condição, considera-
metidos à biópsia renal, e para todos -se indução e manutenção com uso
ao longo da evolução, usam-se mar- de azatioprina ou micofenolato de
cadores clínicos e laboratoriais que mofetila. A lesão renal classe VI é se-
auxiliam a caracterizar a gravidade e quelar e não benefício de terapêutica
atividade da glomerulonefrite e orien- medicamentosa.
tam o uso dos agentes imunomodu- A fase de indução do tratamento
ladores e/ou imunossupressores. tem duração variável, sendo habitual
3 meses a 1 ano, mas em média apre-
senta duração de cerca de 6 meses.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 33

Em pacientes com doença renal ativa com prednisona 0,5 a 1 mg/kg/dia


grave envoluindo com insuficiência por um período de 6 a 8 semanas,
renal aguda e manifestações extrar- seguindo-se sua redução progressiva
renais importantes, está indicado o até 0,25 mg/kg/dia. As diretrizes ame-
tratamento inicial com pulsoterapia ricana e europeia ainda recomendam
de metilprednisolona 0,5 a 1g por a associação dos corticosteroides
3 dias para induzir um rápida melho- com a ciclofosfamida ou micofeno-
ra. Em pacientes com função renal lato mofetil durante o tratamento de
normal, recomenda-se o tratamento indução.

INDUÇÃO

PULSOTERAPIA PULSOTERAPIA

Ciclofosfamida
Metilprednisolona
EV - 500 a 1 g/m² por mês
EV - 1 grama ao dia por 3 dias

Após: Prednisona
Ou
VO - 0,5 a 1 mg/kg/dia
Micofenolato mofetil 3 g/dia

Na fase de manutenção os pacien- menos tóxicos, com o objetivo de re-


tes devem receber, por um período duzir a frequência das recidivas. Es-
prolongado, o tratamento de ma- tudos evidenciaram que o tratamento
nutenção com imunossupressores de manutenção com micofenolato
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 34

de mofetil ou azatioprina é seguro e Recomenda-se que o tratamento de


mais efetivo que o tratamento com ci- manutenção seja realizado por pelo
clofosfamida endovenosa e que, pos- menos 18 a 24 meses.
sivelmente, o micofenolato está as-
sociado a menor número de recaídas.

MANUTENÇÃO
(3 a 5 anos)

Azatioprina
2 a 3 mg/kg/dia
Micofenolato motefil
2 g/dia
Dose de prednisona:
10 mg em desmame
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 35

Mulher em idade fértil

Estrógeno

Afrodescentes
Inflamação de diversos órgãos Rara: crianças e idosos
Dano tecidual
Não é igual a Complexa e multifatorial
Epidemiologia
Formação e deposição de lúpus cutâneo
imunocomplexos Hormonal

Doença autoimune sistêmica Fatores ambientais


Definição Etiologia
Produção de anticorpos Genética

Variado (conforme estágio do paciente) BAFF/Blys e Linf. T reg


Tratamento Fisiopatologia
Fotoproteção para todos Linf. B auto anticorpos

Cloroquina Interação multifatorial perda


da auto tolerância
Prednisona se doença ativa Diagnóstico Anticorpos
Imunocomplexos
Pulsoterapia: grave
“Quebra-cabeças” Anti-RO Imunidade inata IL1 e
Metil-predinisolona TNF inflamação
Clínico Complemento
Consumo do complemento
Ciclofosfamida
Laboratorial FAN clearance dos
imunocomplexos e restos
Critérios classificatórios Anti-histona apoptóticos

Específico Anti-P
SLICC 2012
Atividade clínica Anti-ds DNA

Anti-ds DNA Anti-Sm

Anti-P
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 36

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
CARVALHO MA; LANNA CCD; BERTOLO, MB; FERREIRA, GA. Reumatologia - Diagnóstico
e Tratamento. 4ª ed. São Paulo: AC Farmacêutica, 2014.
VASCONCELOS, José Tupinambá Sousa; NETO, João Francisco Marques; SHINJO, Samuel
Katsuyuki; RADOMINSK, Sebastião Cezar. Livro da Sociedade Brasileira de Reumatologia 1
ed. 2019.
Consenso da Sociedade Brasileira de Reumatologia para o diagnóstico, manejo e tratamento
da nefrite lúpica. REV BRAS REUMATOL. 2015.
KASPER, Dennis L. et al. Medicina interna de Harrison. 19. ed. Porto Alegre: AMGH, 2017.
GOLDMAN, Lee; AUSIELLO, Dennis. Cecil Medicina Interna. 24. ed. SaundersElsevier, 2012.
LANNOTTI, J. P; PARKER, R.D. The Netter Collection of Medical illustrations. 2 ed. 2013.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO 37

Você também pode gostar