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TEORIA GERAL

DO DIREITO DO
TRABALHO
Profa Pollyanna Santos Silva e Silva
PRINCÍPIOS DO DIREITO DO
TRABALHO
 Os princípios devem iluminar tanto o legislador, ao
elaborar as leis dos correspondentes sistemas, como o
intérprete, ao aplicar as normas ou sanar omissões do
respectivo ordenamento legal.
 Os princípios do Direito do Trabalho são as ideias
fundamentais e informadoras do ordenamento jurídico
trabalhista, ou seja, constituem postulados e diretrizes que
inspiram as normas que regulam as relações de trabalho
A importância dos princípios do Direito do Trabalho:
eles são o alicerce científico, as vigas de sustentação de
toda a construção doutrinária e normativa relativa aos
seus fundamentos.
A Reforma Trabalhista introduzida pela Lei n.
13.467/2017, porém, trouxe profundas e significativas
modificações no Direito do Trabalho no Brasil, a ponto
de, como se verá adiante, afetar concretamente alguns
dos seus princípios, fragilizando o seu alicerce científico
e relativizando muitos de seus fundamentos.
 os princípios do Direito do Trabalho e suas funções devem, a partir de
agora, ser analisados, interpretados e aplicados de acordo com as
modificações decorrentes da Reforma Trabalhista.
 Os princípios têm como função a criação, a aplicação e a interpretação
do Direito do Trabalho.
 Segundo Rodriguez:
 Função informadora → criação de norma/inspiração ao legislador
 Função normativa → integração do Direito em caso de lacuna/fonte
supletiva
 Função interpretativa → critério orientador na interpretação do Direito
 Para cumprir a função integrativa do direito, o intérprete conta com
técnicas que são indicadas pelo ordenamento jurídico, entre elas a
utilização dos princípios gerais de direito e dos princípios específicos
do Direito do Trabalho.
 Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (art. 4º), que é
uma lei de aplicação geral, e o Código de Processo Civil (art. 126,
CPC/73 e art. 140, CPC/2015) autorizam o juiz, quando a lei for
omissa, a decidir de acordo com a analogia, os costumes e os
princípios gerais de direito.
 Da mesma forma, a CLT, em seu art. 8º, estabelece que as autoridades
administrativas e a Justiça do Trabalho podem, para sanar omissões,
socorrerem -se dos princípios e normas gerais de direito,
principalmente do Direito do Trabalho.
Art. 4º, LINDB: “Quando a lei for omissa, o juiz
decidirá o caso de acordo com a analogia, os
costumes e os princípios gerais do direito”.
Art. 126, CPC/73: “O juiz não se exime de
sentenciar ou despachar alegando lacuna ou
obscuridade da lei. No julgamento da lide caber -
lhe -á aplicar as normas legais; não as havendo,
recorrerá à analogia, aos costumes e aos
princípios gerais de direito”.
 Art. 140, CPC/2015: “O juiz não se exime de decidir sob a
alegação de lacuna obscuridade do ordenamento jurídico”.
 Art. 8º, caput, CLT: “As autoridades administrativas e a Justiça
do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais,
decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por
equidade e outros princípios e normas gerais de direito,
principalmente do direito do trabalho e, ainda, de acordo com
os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira
que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o
interesse público”.
 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS GERAIS
 A Constituição Federal de 1988 não enumerou
expressamente os princípios do Direito do Trabalho
 No entanto, é inquestionável a existência no texto
constitucional de princípios explícitos ou induzidos que
são aplicáveis no âmbito do Direito do Trabalho.
 O art. 1º da Constituição Federal estabelece os
fundamentos da República Federativa do Brasil, entre os
quais se destacam a dignidade humana (III) e os valores
sociais do trabalho (IV).
 Todas as normas trabalhistas devem sempre ter por base o
respeito à dignidade humana do trabalhador, além de visar os
valores sociais do trabalho.
 No mesmo sentido, a regra insculpida no art. 193 da Carta
Magna, segundo a qual “a ordem social tem como base o
primado do trabalho, e como objetivo o bem -estar e a justiça
sociais”.
 O art. 170 da Constituição Federal indica como princípios
gerais da atividade econômica a valorização do trabalho
humano (caput), a justiça social (caput), a função social da
propriedade (III — esta também prevista no art. 5º, XXIII,
CF) e a busca do pleno emprego (VIII).
Também o princípio da isonomia enunciado pelo art. 5º,
caput e I, da Constituição é inegavelmente aplicável ao
Direito do Trabalho.
Da mesma forma, aplicam -se ao Direito do Trabalho a
inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra
e da imagem (art. 5º, X, CF), a liberdade de trabalho
(art. 5º, XIII, CF), a liberdade de associação (art. 5º,
XVII a XX, CF), a não discriminação (art. 5º, XLI e
XLII, CF).
Em relação à não discriminação em matéria
trabalhista, o art. 7º da Constituição Federal proíbe
a diferença de salários, de exercício de funções e de
critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou
estado civil (inciso XXX), proíbe qualquer
discriminação no tocante a salário e critérios de
admissão do trabalhador portador de deficiência
(inciso XXXI) e proíbe a distinção entre trabalho
manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais
respectivos (inciso XXXII).
PRINCÍPIOS ESPECÍFICOS DO DIREITO DO TRABALHO
 Os principais princípios:

princípio protetor, ou de proteção;


princípio da irrenunciabilidade;
 princípio da continuidade da relação de emprego;
 princípio da primazia da realidade;
princípio da razoabilidade;
 princípio da boa-fé.
 Princípio protetor
 O princípio protetor é o critério que orienta todo o Direito do
Trabalho e com base no qual as normas jurídicas devem ser
elaboradas, interpretadas e aplicadas e as relações jurídicas
trabalhistas devem ser desenvolvidas.
 Este princípio tem por fundamento a proteção do trabalhador
enquanto parte economicamente mais fraca da relação de
trabalho e visa assegurar uma igualdade jurídica entre os sujeitos
da relação, permitindo que se atinja uma isonomia substancial e
verdadeira entre eles.
“Seu propósito consiste em tentar corrigir
desigualdades, criando uma superioridade jurídica em
favor do empregado, diante da sua condição de
hipossuficiente”.
No entanto, com a Reforma Trabalhista trazida pela
Lei n. 13.467/2017, a sistemática do Direito do
Trabalho brasileiro, fundada na proteção do trabalhador
enquanto parte hipossuficiente na relação laboral,
restou modificada, o que alterou significativamente o
princípio em estudo.
 Verifica-se, portanto, que a Reforma Trabalhista adota
posicionamento no sentido de considerar que o trabalhador
tem condições de negociar diretamente com o empregador em
diversos aspectos decorrentes da relação de emprego, não
entendendo aquele como parte economicamente mais fraca da
relação, e afastando, portanto, o conceito de hipossuficiência
 o legislador passa a entender, ainda, que existem trabalhadores
que não podem ser considerados economicamente mais fracos
e sobre os quais não se pode pressupor desigualdade em
relação ao empregador
O parágrafo único do art. 444 da CLT, acrescido pela
Lei n. 13.467/2017, considera como hipersuficientes os
trabalhadores portadores de diploma de nível superior e
que percebam salário mensal igual ou superior a duas
vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral
de Previdência Social, autorizando a livre estipulação
por esses trabalhadores sobre os direitos em relação aos
quais a negociação coletiva foi ampliada (art. 611-A,
CLT).
Outra das grandes modificações introduzidas pela Lei
n. 13.467/2017 é a prevalência do negociado sobre o
legislado. o legislador valorizou a negociação coletiva,
considerando-a válida mesmo que esta contrarie certos
preceitos legais
Nesse sentido, citam-se, em especial, as previsões
contidas no § 3º do art. 8º, no art. 611-A, caput e
parágrafos, no parágrafo único do art. 611-B e no
art. 620, todos da CLT.
Reconhecido como o princípio mais importante
do Direito do Trabalho, o princípio protetor se
expressa sob três formas distintas (regras de
aplicação) e que, no entanto, também foram
afetadas pela Reforma Trabalhista:
a regra in dubio pro operario;
a regra da norma mais favorável;
a regra da condição mais benéfica.
 A regra in dubio pro operario é regra de interpretação de
normas jurídicas, segundo a qual, diante de vários sentidos
possíveis de uma determinada norma, o juiz ou o intérprete
deve optar por aquele que seja mais favorável ao trabalhador.
 No entanto, tal regra foi mitigada pela Reforma Trabalhista
introduzida pela Lei n. 13.467/2017, em especial no que tange
à restrição de interpretação imposta à Justiça do Trabalho em
relação ao conteúdo das convenções coletivas e dos acordos
coletivos de trabalho (art. 8º, § 3º, e art. 611-A, § 1º, CLT).
A regra da norma mais favorável determina que,
havendo mais de uma norma aplicável a um caso
concreto, deve -se optar por aquela que seja mais
favorável ao trabalhador, ainda que não seja a que se
encaixe nos critérios clássicos de hierarquia de normas.
A aferição da norma mais favorável deve-se basear em
um critério de comparação entre as mesmas, o que,
segundo Alice Monteiro de Barros, caracteriza um
“problema de ordem técnica”, tendo em vista existirem
três critérios distintos:
 teoria do conglobamento — a aferição da norma mais favorável
se dá após o confronto da integralidade das normas em
comparação (“confronto em bloco”).
 teoria da acumulação — a aferição se dá a partir da seleção, em
cada uma das normas objeto da comparação, das previsões mais
favoráveis ao trabalhador, utilizando-se, de cada uma delas, a
que for mais favorável.
 teoria do conglobamento orgânico ou por instituto — a aferição
da norma mais favorável deve ser feita pela comparação entre
partes das normas ou entre grupo de matérias .
 Mauricio Godinho Delgado entende que se deve fazer a
comparação com base na teoria do conglobamento, admitindo,
excepcionalmente, a adoção da teoria do conglobamento
orgânico ou por instituto: “o operador do direito deve buscar a
regra mais favorável enfocando globalmente o conjunto de
regras componentes do sistema, discriminando, no máximo, os
preceitos em função da matéria, de modo a não perder, ao
longo desse processo, o caráter sistemático da ordem jurídica
e os sentidos lógico e teleológico básicos que sempre devem
informar o fenômeno do direito”.
 Alice Monteiro de Barros, ao contrário, entende que se deve
sempre adotar a teoria do conglobamento orgânico ou por
instituto, tendo em vista tratar-se definição do legislador
brasileiro: “a legislação brasileira adotou, no nosso
entendimento, a teoria do conglobamento parcial, orgânico,
mitigado ou por instituto, como se infere do art. 3º, I, da Lei n.
7.064, de 1982, que estabelece: ‘a aplicação da legislação
brasileira de proteção ao trabalho, naquilo que não for
incompatível com o disposto nesta Lei, quando mais favorável
do que a legislação territorial, no conjunto de normas e em
relação a cada matéria’”
 A aplicação da regra da norma mais favorável torna flexível a
hierarquia das normas trabalhistas, devendo ser considerada
como mais importante, em cada caso concreto, a norma mais
favorável ao trabalhador, ainda que esta não seja a
Constituição Federal ou uma lei federal.
 Destaque-se, porém, que a nova redação do art. 620 da CLT,
dada pela Lei n. 13.467/2017, fragiliza a regra da norma mais
favorável, na medida em que dispõe que as condições fixadas
em acordo coletivo de trabalho sempre prevalecerão sobre as
estipuladas em convenção coletiva de trabalho.
 Segundo a regra da condição mais benéfica, a aplicação de
uma nova norma trabalhista nunca pode significar diminuição
de condições mais favoráveis em que se encontra o
trabalhador.
 As condições mais favoráveis devem ser verificadas em
relação às situações concretas anteriormente reconhecidas ao
trabalhador, e que não podem ser modificadas para uma
situação pior ou menos vantajosa
 Situações pessoais mais vantajosas incorporam-se ao
patrimônio do empregado, por força do próprio contrato de
trabalho, e não podem ser retiradas, sob pena de violação ao
art. 468 da CLT.
A cláusula contratual mais vantajosa reveste-se de
caráter de direito adquirido (CF, art. 5º, XXXVI).
Essa regra também foi impactada pela Reforma
Trabalhista introduzida pela Lei n. 13.467/2017, em
razão da ampliação da autonomia individual e da
validação das pactuações decorrentes de acordo direto
entre empregado e empregador, especialmente em
relação aos empregados considerados pelo parágrafo
único do art. 444 da CLT como hipersuficientes...
 (que têm diploma de nível superior e recebem salário igual ou superior a
duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de
Previdência Social), sendo vistas como válidas as estipulações por eles
negociadas diretamente com o empregador em relação aos direitos
indicados no art. 611-A da CLT.
 Reforma Trabalhista:Assim, a análise do que é condição mais benéfica
restou relativizada, já que o conceito de mais benéfico deixou de ser
considerado pelo legislador como decorrência da ideia de proteção da
parte economicamente mais fraca da relação de emprego, passando a ser
inserido no âmbito da autonomia da vontade do trabalhador, ou seja, de
um modo geral, se o trabalhador negociou, exercendo livremente sua
autonomia da vontade, é porque considerou que, para ele, essa nova
condição é mais benéfica.
 O princípio da irrenunciabilidade é aceito de forma unânime
na doutrina como uma das principais bases do Direito do
Trabalho e constitui -se no reconhecimento da não validade do
ato voluntário praticado pelo trabalhador no sentido de abrir
mão de direito reconhecido em seu favor.
 Portanto, a irrenunciabilidade, que está vinculada à ideia de
indisponibilidade de direitos, diz respeito à impossibilidade de
que o trabalhador prive-se voluntariamente, em caráter amplo e
por antecipação, de direitos que lhe são garantidos pela
legislação trabalhista.
 Sempre se entendeu que a interpretação do princípio da
irrenunciabilidade deve ser o mais ampla possível,
abrangendo tanto a privação total de direitos como a parcial,
e tanto a que se realize por antecipação como a que ocorra
posteriormente à extinção da relação jurídica da qual decorre
o direito que é objeto da renúncia.
 Como fundamento desse princípio, a doutrina trabalhista
apresenta diversos argumentos, entre eles o princípio da
indisponibilidade, o caráter imperativo das normas
trabalhistas, a noção de ordem pública e a limitação à
autonomia da vontade.
 A adoção da irrenunciabilidade como regra geral sempre
decorreu do fato de que a legislação trabalhista brasileira
não continha previsão explícita sobre a permissão ou não
da renúncia, sendo apenas previsto pela CLT, em seu art.
9º, que são considerados nulos de pleno direito os atos
destinados a impedir, fraudar ou desvirtuar a aplicação dos
seus preceitos.
 No entanto, a irrenunciabilidade de direitos trabalhistas foi
mitigada pela Reforma Trabalhista introduzida pela Lei n.
13.467/2017, com a inserção no ordenamento jurídico
(parágrafo único, art. 444, CLT) da figura do trabalhador
hipersuficiente, assim considerado o portador de diploma de
nível superior (hipersuficiência técnica) e com salário mensal
igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios
do Regime Geral de Previdência Social (hipersuficiência
econômica), a quem é permitida a livre estipulação em relação
ao rol dos direitos previstos no art. 611-A da CLT.
Assim, aos referidos trabalhadores é permitido
negociar condições de trabalho menos benéficas, em
comparação com os direitos trabalhistas previstos na
legislação, salvo aqueles garantidos pela
Constituição Federal, ainda que isso signifique
renúncia a tais direitos.

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