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DIREITO AMBIENTAL
PARTE 2
Prof. Omar Augusto Leite Melo
omar@omar.adv.br
COMO VOCÊ VÊ...
O Direito em geral e o Direito
Esse objeto? Ambiental?
“A TEIA DA VIDA” (FRITJOF CAPRA)
◦ “Ecologia profunda”: novo paradigma para repensar e reconstruir a “dignidade da pessoa humana”.
Livro CAPRA, p. 25-26: “O novo paradigma pode ser chamado de uma visão de mundo holística, que concebe o
mundo como um todo integrado, e não como uma coleção de partes dissociadas. Pode também ser denominado visão
ecológica, se o termo ‘ecológica’ for empregado num sentido mais amplo e profundo do que o usual. A percepção
ecológica profunda reconhece a interdependência fundamental de todos os fenômenos, e o fato de que, enquanto
indivíduos e sociedades, estamos todos encaixados nos processos cíclicos da natureza (e, em última análise, somos
dependentes desses processos). Os dois termos, ‘holístico’ e ‘ecológico’, diferem ligeiramente em seus significados, e
parece que ‘holístico’ é um pouco menos apropriado para descrever o novo paradigma. Uma visão holística, digamos,
de uma bicicleta significa ver a bicicleta como um todo funcional e compreender, em conformidade com isso, as
interdependências das suas partes. Uma visão ecológica da bicicleta inclui isso, mas acrescenta-lhe a percepção de
como a bicicleta está encaixada no seu ambiente natural e social – de onde vêm as matérias-primas que entram nela,
como foi fabricada, como seu uso afeta o meio ambiente natural e a comunidade pela qual ela é usada, e assim por
diante. (...) A ecologia rasa é antropocêntrica, ou centralizada no ser humano. Ela vê os seres humanos como situados
acima ou fora da natureza, como a fonte de todos os valores, e atribui apenas um valor instrumental, ou de “uso”, à
natureza. A ecologia profunda não separa seres humanos – ou qualquer outra coisa – do meio ambiente natural. Ela vê
o mundo não como uma coleção de objetos isolados, mas como uma rede de fenômenos que estão fundamentalmente
interconectados e são interdependentes. A ecologia profunda reconhece o valor intrínseco de todos os seres vivos e
concebe os seres humanos apenas como um fio particular na teia da vida”.
OBJETIVOS DO DIREITO AMBIENTAL: MAIS
PREVENTIVO DO QUE REPRESSIVO
◦ O Direito Ambiental não pode se resumir a um mero Direito dos Desastres, ou seja, apenas como um
instrumento acionado posteriormente à ocorrência de tragédias ecológicas para remediar os danos
causados. Com isso, não se pretende negar a relevância desse objetivo, mas sim ressaltar a importância
maior da função e papel do Direito Ambiental de evitar a ocorrência dos danos ecológicos, até porque
muitos deles são irreversíveis.
◦ No STF: ADPF 708 (caso Fundo Clima), rel. Min. Luiz Roberto Barroso. Audiência pública realizada
nos dias 21 e 22/09/2020 para checar eventual “estado de coisas inconstitucional ambiental ou
ecológico”.
◦ Princípios ambientais.
INTERDISCIPLINARIDADE COM OUTRAS ÁREAS DO CONHECIMENTO
◦ O Direito Ambiental tem como uma marca peculiar a necessária interdisciplinaridade com outras ciências.
“Direito da técnica”, em razão da relação íntima com a técnica e o conhecimento científico.
◦ Talvez, seja a área jurídica que mais demanda essa trans e interdisciplinaridade.
◦ Esse caráter científico do Direito Ambiental leva à sua internacionalização.
◦ O Direito Ambiental demanda conhecimentos e diálogos científicos fora do Direito, “muito além do Direito”,
abrangendo áreas das Exatas, Ciências Naturais e Ciências Sociais, como Biologia, Engenharia (Florestal,
Industrial, Agrônoma, Ambiental, Cartográfica, de Minas etc.), Física, Geologia, Química, Medicina, Fisioterapia,
Sociologia, Filosofia, História, Antropologia, Economia, Administração etc. Sobre a indevida
“compartimentalização” do Direito: ver aqui.
◦ O conhecimento científico é o critério que diferencia dois princípios ambientais: prevenção (há certeza ou
pacificação científica) e precaução (quando ainda há dúvidas ou incertezas na comunidade científica).
◦ Exemplos: estudo de impacto ambiental e o relatório de impacto ambiental (EIA/RIMA), instrumentos essenciais nos
licenciamentos ambientais. Nos processos ambientais, a perícia técnica é quase sempre requerida e decisiva nas decisões
administrativas e judiciais (ver Processo 1005291-85.2017.8.26.0157, TJSP – multa ambiental contra Petrobrás imposta pela
Prefeitura de Cubatão - aqui). ADPF 923: Min. Luiz Fux pediu informação para EMBRAPA sobre ampliação do calendário
de semeadura de soja, pois se exige a “análise de aspectos de ordem técnico-científica que escapam à capacidade
institucional atual da Corte” (ver notícia aqui). Deferência judicial na ADI 4903 sobre o Código Florestal de 2012.
PESQUISA CIENTÍFICA E UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
◦ Sarlet, Fensterseifer, “Curso”, p. 779-780:
“Os órgãos executores do SNUC articular-se-ão com a comunidade científica com ‘o propósito de incentivar o
desenvolvimento de pesquisas sobre a fauna, a flora e a ecologia das unidades de conservação e sobre formas de uso
sustentável dos recursos naturais, valorizando-se o conhecimento das populações tradicionais’ (art. 32 da Lei nº
9.985/2000). O dispositivo ressalta a importância da articulação da pesquisa científica nas unidades de conservação, a
fim de incentivar o desenvolvimento de pesquisas sobre a fauna, a flora e os ecossistemas. O desenvolvimento
científico deve ser encarado como um aliado na proteção ecológica, notadamente com relação à nossa biodiversidade.
A produção de conhecimento científico, sobretudo dos nossos recursos naturais (e, em especial, formas sustentáveis
para a sua utilização), deve ser encarado como um forte aliado no processo de conscientização pública a respeito da
importância da proteção ecológica. As pesquisas científicas nas unidades de conservação, por sua vez, não podem
colocar em risco a sobrevivência das espécies integrantes dos ecossistemas protegidos (§1º). A realização de pesquisas
científicas nas unidades de conservação, exceto Área de Proteção Ambiental e Reserva Particular do Patrimônio
Natural, depende de aprovação prévia e está sujeita à fiscalização do órgão responsável por sua administração (§2º).
LEI DA BIOSSEGURANÇA E PAPEL DA CTNBio
◦ Lei da Biossegurança (Lei nº 11.105/2005): estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre os
organismos geneticamente modificados (OGM) e seus derivados.
◦ Art. 2º, §3º: “Os interessados em realizar atividade prevista nesta Lei deverão requerer autorização à Comissão Técnica Nacional de
Biossegurança – CTNBio, que se manifestará no prazo fixado em regulamento”.
◦ Art. 2º, §4º: “As organizações (...) financiadoras ou patrocinadoras de atividades ou de projetos referidos no caput deste artigo
devem exigir a apresentação de Certificado de Qualidade em Biossegurança, emitido pela CTNBio, sob pena de se tornar
corresponsáveis pelos eventuais efeitos decorrentes do descumprimento desta Lei ou de sua regulamentação”. Regulamento:
Decreto nº 5.591/2005.
◦ Art. 10. A CTNBio, integrante do Ministério da Ciência e Tecnologia, é instância colegiada multidisciplinar de caráter consultivo e
deliberativo, para prestar apoio técnico e de assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e implementação da
PNB de OGM e seus derivados, bem como no estabelecimento de normas técnicas de segurança e de pareceres técnicos referentes à
autorização para atividades que envolvam pesquisa e uso comercial de OGM e seus derivados, com base na avaliação de seu risco
zoofitossanitário, à saúde humana e ao meio ambiente”.
◦ Art. 29. Produzir, armazenar, transportar, comercializar, importar ou exportar OGM ou seus derivados, sem autorização ou em
desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização: Pena – reclusão, de 1
(um) a 2 (dois) anos, e multa.
◦ Site da CTNBio: http://ctnbio.mctic.gov.br/inicio .
COMPOSIÇÃO CTNBio
◦ Lei nº 11.105/2005. art. 11. A CTNBio, composta de membros titulares e suplentes, designados pelo Ministro de Estado da
Ciência e Tecnologia, será constituída por 27 (vinte e sete) cidadãos brasileiros de reconhecida competência técnica, de
notória atuação e saber científicos, com grau acadêmico de doutor e com destacada atividade profissional nas áreas de
biossegurança, biotecnologia, biologia, saúde humana e animal ou meio ambiente, sendo: I – 12 (doze) especialistas de
notório saber científico e técnico, em efetivo exercício profissional, sendo: a) 3 (três) da área de saúde humana; b) 3 (três) da
área animal; c) 3 (três) da área vegetal; d) 3 (três) da área de meio ambiente; II – um representante de cada um dos seguintes
órgãos, indicados pelos respectivos titulares: a) Ministério da Ciência e Tecnologia; b) Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento; c) Ministério da Saúde; d) Ministério do Meio Ambiente; e) Ministério do Desenvolvimento Agrário; f)
Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; g) Ministério da Defsa; h) Secretaria Especial de Aqüicultura
e Pesca da Presidência da República; i) Ministério das Relações Exteriores; III – um especialista em defesa do consumidor,
indicado pelo Ministro da Justiça; IV – um especialista na área de saúde, indicado pelo Ministro da Saúde; V – um
especialista em meio ambiente, indicado pelo Ministro do Meio Ambiente; VI – um especialista em biotecnologia, indicado
pelo Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; VII – um especialista em agricultura familiar, indicado pelo Ministro
do Desenvolvimento Agrário; VIII – um especialista em saúde do trabalhador, indicado pelo Ministro do Trabalho e Emprego.
§1º Os especialistas de que trata o inciso I do caput deste artigo serão escolhidos a partir de lista tríplice, elaborada com a
participação das sociedades científicas, conforme disposto em regulamento. §2º Os especialistas de que tratam os incisos III a
VIII do caput deste artigo serão escolhidos a partir de lista tríplice, elaborada pelas organizações da sociedade civil, conforme
disposto em regulamento.
OUTROS ÓRGÃOS TÉCNICOS AMBIENTAIS
◦ Lei nº 6.938/1981 (PNMA): o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) está assim estruturado: Conselho
de Governo (órgão superior – “político”), CONAMA (órgão consultivo e deliberativo), Ministério do Meio
Ambiente (político), IBAMA e ICMBio (órgão executores), secretarias estaduais (órgãos seccionais – políticos e
técnicos) e secretarias municipais (locais – políticos e técnicos).
◦ Lei nº 7.802/1989 (agrotóxicos): necessidade de registro na ANVISA (Resolução ANVISA 4/2012).
◦ Lei nº 8.723/1993 (redução de emissão de poluentes por veículos): necessidade de licença para uso na configuração
de veículos ou motor, emitida pelo IBAMA.
◦ Lei nº 11.445/2007 (saneamento básico): participação de entidades técnicas, organizações da sociedade civil e de
defesa do consumidor no controle social dos serviços públicos de saneamento básico (art. 47).
◦ Lei nº 12.305/2010 (resíduos sólidos): planos nacional, estaduais, microrregionais e municipais elaborados pelo
Ministério do Meio Ambiente (federal), secretarias estaduais e municipais do meio ambiente, assegurada “ampla
publicidade ao conteúdo dos planos de resíduos sólidos, bem como controle social em sua formulação (art. 14).
COMPETÊNCIA COMUM E COOPERAÇÃO INSTITUCIONAL
(TÉCNICA)
◦ Delegação de competência de um ente federado para outro condicionada à existência de “órgão ambiental capacitado”
e de “conselho de meio ambiente”.
◦ Art. 5º, LC 140/2011. O ente federativo poderá delegar, mediante convênio, a execução de ações administrativas a ele atribuídas
nesta Lei Complementar [competência comum ambiental], desde que o ente destinatário da delegação disponha de órgão
ambiental capacitado a executar as ações administrativas a serem delegadas e de conselho de meio ambiente. Parágrafo único.
Considera-se órgão ambiental capacitado, para os efeitos do disposto no caput, aquele que possui técnicos próprios ou em
consórcio, devidamente habilitados e em número compatível com a demanda das ações administrativas a serem delegadas.
◦ Competência supletiva no licenciamento ambiental, quando a entidade originalmente competente não dispõe de
“órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente”.
◦ Art. 15, LC 140/2011. Os entes federativos devem atuar em caráter supletivo nas ações administrativas de licenciamento e na
autorização ambiental, nas seguintes hipóteses: I - inexistindo órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente no
Estado ou no Distrito Federal, a União deve desempenhar as ações administrativas estaduais ou distritais até a sua criação; II -
inexistindo órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente no Município, o Estado deve desempenhar as ações
administrativas municipais até a sua criação; e III - inexistindo órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente no
Estado e no Município, a União deve desempenhar as ações administrativas até a sua criação em um daqueles entes federativos.
XXXIII EXAME OAB
Determinado empreendedor requereu ao órgão ambiental competente licença ambiental para indústria geradora de significativa
poluição atmosférica, que seria instalada em zona industrial que, contudo, já está saturada. Após a análise técnica necessária,
feita com base nos riscos e impactos já de antemão conhecidos em razão de certeza científica, concluiu-se que os impactos
negativos decorrentes da atividade não poderiam sequer ser mitigados a contento, diante da sinergia e cumulatividades com as
atividades das demais fábricas já existentes na localidade. Assim, o órgão ambiental indeferiu o pedido de licença, com objetivo
de impedir a ocorrência de danos ambientais, já que sabidamente a atividade comprometeria a capacidade de suporte dos
ecossistemas locais.
Assinale a opção que indica o princípio de Direito Ambiental em que a decisão de indeferimento do pedido de licença está
fundada específica e diretamente.
A) Princípio da precaução, eis que a operação do empreendimento pretendido causa riscos hipotéticos que devem ser evitados.
B) Princípio da prevenção, eis que a operação do empreendimento pretendido causa perigo certo, com riscos previamente
conhecidos.
C) Princípio do poluidor-pagador, eis que a operação do empreendimento pretendido está condicionada à adoção das cautelas
ambientais cabíveis para mitigar e reparar os danos ambientais.
D) Princípio da responsabilidade ambiental objetiva, eis que a operação do empreendimento pretendido está condicionada ao
prévio depósito de caução para garantir o pagamento de eventuais danos ambientais.
Resposta certa...
Alternativa “B”.
B) Princípio da prevenção, eis que a operação do empreendimento pretendido causa perigo
certo, com riscos previamente conhecidos.
• Princípio da precaução: sem certeza científica. Prevenção: quando há essa certeza científica.
• Poluidor-pagou: poluiu, pagou (punição). Evitar externalidades negativas, de tal forma que o
poluidor deve assumir o custo, e não a sociedade.
• Responsabilidade objetiva: independentemente de culpa.
XXII EXAME OAB/FGV
A sociedade empresária Alfa opera, com regular licença ambiental expedida pelo órgão federal competente,
empreendimento da área de refino de petróleo que está instalado nos limites do território do Estado da Federação Beta e
localizado no interior de unidade de conservação instituída pela União. Durante o prazo de validade da licença de
operação, o órgão federal competente, com a aquiescência do órgão estadual competente do Estado Beta, deseja delegar a
execução de ações administrativas a ele atribuídas, consistente na fiscalização do cumprimento de condicionantes da
licença ambiental para o Estado Beta. Sobre a delegação pretendida pelo órgão federal, consoante dispõe a Lei
Complementar nº 140/2011, assinale a afirmativa correta.
A) É possível, desde que o Estado Beta disponha de órgão ambiental capacitado a executar as ações administrativas a
serem delegadas e de conselho de meio ambiente.
B) É possível, desde que haja prévia manifestação dos conselhos nacional e estadual do meio ambiente, do Ministério
Público e homologação judicial.
C) Não é possível, eis que a competência para licenciamento ambiental é definida por critérios objetivos estabelecidos na
legislação, sendo vedada a delegação de competência do poder de polícia ambiental.
D) Não é possível, eis que a delegação de ações administrativas somente é permitida quando realizada do Município para
Estado ou União, ou de Estado para União, vedada a delegação de atribuição ambiental federal.
RESPOSTA CERTA...
Alternativa “A”.
É possível, desde que o Estado Beta disponha de órgão ambiental capacitado a executar as ações
administrativas a serem delegadas e de conselho de meio ambiente.
◦ Conferir: art. 5º da LC 140/2011.
DEVER ESTATAL DE EMBASAMENTO CIENTÍFICO NOS ASSUNTOS
AMBIENTAIS
◦ ADI 6428-MC, rel. Luís Roberto Barroso: deve ser levado em consideração a observância, pelas autoridades de
standards, normas e critérios científicos e técnicos, como estabelecidos por organizações e entidades internacional e
nacionalmente conhecidas.
◦ É comum a realização de perícias e de audiências públicas em assuntos ambientais, exatamente para se ouvir técnicos, em razão
da falta de “capacidade institucional” do Judiciário para entrar nessa profundidade técnica.
◦ O art. 5º da Lei da Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019) tornou obrigatório o uso Análise de Impacto Regulatório para
antecipar “propostas de edição e de alteração de atos normativos de interesse geral de agentes econômicos ou de usuários dos
serviços prestados, editadas por órgão ou entidade da administração pública federal”. Ver artigo aqui.
◦ Qual peso devem ter as evidências científicas para o legislativo? Ver aqui artigo que trata sobre legística.
◦ Produção antecipada de provas no processo ambiental: ver aqui.
◦ STF, Pleno, rel. Dias Toffoli, ADI 3937 (caso amianto), j. em 08/2017: diante da alteração dos fatos e conhecimento
científico sobre o tema, a legislação federal que autorizada o uso de amianto passou por um “processo de
desconstitucionalização” e, no momento atual, não mais se compatibiliza com a Constituição Federal de 1988. Nas
palavras do ministro relator, “hoje, o que se observa é um consenso em torno da natureza altamente cancerígena do
mineral e da inviabilidade de seu uso de forma efetivamente segura, sendo esse o entendimento oficial dos órgãos
nacionais e internacionais que detêm autoridade no tema da saúde em geral e da saúde do trabalhador”.
◦ STF, ADI 5553 (caso isenção fiscal para agrotóxicos): rel. Min. Edson Fachin, de ofício, pediu manifestação de várias
instituições para ajudar a esclarecer dúvidas técnicas sobre os agrotóxicos. Ver notícia aqui e artigo aqui. Placar no STF:
4x2 pela constitucionalidade – ver aqui e aqui.
STJ E ART. 375 DO CPC
◦ CPC/2015, art. 375. O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela
observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica,
ressalvado, quanto a estas, o exame pericial.
◦ STJ, 3ª Turma, REsp 1.786.046, rel. Min. Moura Ribeiro: conhecimento empírico ou científico que
já caiu em domínio público para julgar as causas que se lhe apresentam, porque, em relação a essas
questões, não há necessidade de produzir prova. Não está autorizado, porém, a julgar com base no
conhecimento pessoal que possui a respeito de algum fato específico, obtido sem o crivo do
contraditório".
◦ Ver: aqui.
A ALOCAÇÃO DE RISCOS AMBIENTAIS
DEPENDE DE CONSENSO CIENTÍFICO
◦ A alocação de recursos financeiros públicos não é discricionária, não se limitando a um juízo político ilimitado ou irresponsável,
mas sim de consenso científico.
◦ ADI 6241, Rel. Min. Roberto Barroso, em 21.05.2020: STF assentou as seguintes teses: “1. Configura erro grosseiro o ato
administrativo que ensejar violação ao direito à vida, à saúde , ao meio ambiente equilibrado ou impactos adversos à economia, por
inobservância: (i) de normas e critérios científicos e técnicos; ou (ii) dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção. 2.
A autoridade a quem compete decidir deve exigir que as opiniões técnicas em que baseará sua decisão tratem expressamente: (i) das
normas e critérios científicos e técnicos aplicáveis à matéria, tal como estabelecidos por organizações e entidades internacional e
nacionalmente reconhecidas; e (ii) da observância dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção, sob pena de se
tornarem corresponsáveis por eventuais violações a direitos”.
◦ ADPF 708 (“Fundo Clima”), rel. Min. Roberto Barroso, 07/2022: “os dados objetivos trazidos acima evidenciam uma situação de colapso
nas políticas públicas de combate às mudanças climáticas, sem dúvida alguma agravada pela omissão do Executivo atual. Em contextos
como esse, é papel das supremas cortes e dos tribunais constitucionais atuar no sentido de impedir o retrocesso. O princípio da vedação do
retrocesso é especialmente proeminente quando se cuide de proteção ambiental. E ele é violado quando se diminui o nível de proteção do
meio ambiente por meio da inação ou se suprimem políticas públicas relevantes sem a devida substituição por outras igualmente adequadas”.
ESTUDOS TÉCNICOS NAS LICITAÇÕES DE OBRAS E SERVIÇOS
AMBIENTAIS
◦ Ver artigo sobre o planejamento de contratações relativas a resíduos sólidos: aqui. Silvia Maria Ascenção Guedes
Gallardo, engenheira civil , agente da fiscalização do TCE/SP:
Art. 18 da nova Lei de Licitações (Lei 14.133/2021): a fase preparatória do processo licitatório se caracteriza pelo planejamento e deve ser
compatível com o plano de contratações anual e com as leis orçamentárias.
“Apesar da importância da matéria, muitas prefeituras não desenvolvem o planejamento das contratações com o nível de precisão
requerido pela Lei, relegando ao particular o desenvolvimento do dimensionamento, a definição dos preços e da forma de execução da
contratação. Portanto, um primeiro ponto importante a se considerar dentro do planejamento é a necessidade do desenvolvimento de
documentos técnicos, estudos e projetos por profissionais habilitados. Esta premissa, que é tão clara na contratação de obras, parece não
ter o mesmo reconhecimento de sua importância, quando se trata de serviços de engenharia. (...) O planejamento de serviços de
engenharia, sejam ou não classificados como comuns pela nova Lei, requer conhecimento detalhado do objeto. Nas contratações referentes
a resíduos sólidos, este conhecimento deve partir dos estudos contidos nos planos de gestão de resíduos sólidos dos municípios, em que
muitas das questões levantadas na etapa do estudo técnico preliminar já terão sido objeto de análise. (...) Os serviços relativos ao manejo
de resíduos são próprios de cada localidade e sofrem grande influência de questões locais, como a composição gravimétrica dos resíduos, a
perio-dicidade e frequência necessária dos serviços, conforme perfil local da população, a existência ou não de aterros nas proximidades,
etc. Com isso, torna-se ainda mais importante o correto dimensionamento, evitando-se a utilização de simples pesquisas de mercado para a
elabora-ção dos preços.Por fim, o planejamento adequado dos serviços é capaz de demonstrar quais são as exigências de qualificação
técnica imprescindíveis para aferição da capacidade de profissio-nais e empresas e a necessidade ou não da permissão da participação de
consórcios e/ou da subcontratação de parte dos serviços, resultando em contratações mais eficientes e eficazes”.
LAUDO TÉCNICO DE REPAÇÃO DO DANO
AMBIENTAL NA LEI Nº 9.605/1998
Art. 17. A verificação da reparação a que se refere o § 2º do art. 78 do Código Penal [sursis penal, da execução da pena] será feita
mediante laudo de reparação do dano ambiental, e as condições a serem impostas pelo juiz deverão relacionar-se com a proteção ao
meio ambiente.
Art. 28. As disposições do art. 89 da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995 [suspensão condicional do processo = sursis
processual], aplicam-se aos crimes de menor potencial ofensivo definidos nesta Lei, com as seguintes modificações: I - a declaração
de extinção de punibilidade, de que trata o § 5° do artigo referido no caput, dependerá de laudo de constatação de reparação do dano
ambiental, ressalvada a impossibilidade prevista no inciso I do § 1° do mesmo artigo; II - na hipótese de o laudo de constatação
comprovar não ter sido completa a reparação, o prazo de suspensão do processo será prorrogado, até o período máximo previsto no
artigo referido no caput, acrescido de mais um ano, com suspensão do prazo da prescrição; III - no período de prorrogação, não se
aplicarão as condições dos incisos II, III e IV do § 1° do artigo mencionado no caput; IV - findo o prazo de prorrogação, proceder-se-á
à lavratura de novo laudo de constatação de reparação do dano ambiental, podendo, conforme seu resultado, ser novamente prorrogado
o período de suspensão, até o máximo previsto no inciso II deste artigo, observado o disposto no inciso III; V - esgotado o prazo
máximo de prorrogação, a declaração de extinção de punibilidade dependerá de laudo de constatação que comprove ter o acusado
tomado as providências necessárias à reparação integral do dano.
SACRIFÍCIO DE ANIMAIS: LIBERDADE RELIGIOSA
vs. DIREITO DOS ANIMAIS
◦ STF: por unanimidade, julgou constitucional lei gaúcha que permite sacrifício de animais em ritos religiosos de matriz
africana. RE 494.601, j. 03/2019. Ver notícia: aqui.
◦ Tese: “É constitucional a lei de proteção animal que, a fim de resguardar a liberdade religiosa, permite o sacrifício
ritual de animais em cultos de religiões de matriz africana”.
◦ O Min. Relator Marco Aurélio votou condicionando o abate ao consumo humano, mas não foi seguido pelos demais
ministros. Todos os ministros ressaltaram a vedação de práticas cruéis e tortura.
◦ Min. Barroso afirmou que as sustentações orais (“técnicas”) contribuíram para o fornecimento de informações e para a
melhor compreensão da matéria. Ele ressaltou que, de acordo com a tradição e as normas das religiões de matriz
africana, não se admite nenhum tipo de crueldade com o animal e são empregados procedimentos e técnicas para que
sua morte seja rápida e indolor. “Segundo a crença, somente quando a vida animal é extinta sem sofrimento se
estabelece a comunicação entre os mundos sagrado e temporal”, assinalou. Além disso, o ministro destacou que, como
regra, o abate não produz desperdício de alimento, pois a proteína animal é servida como alimento tanto para os deuses
quanto para os devotos e, muitas vezes, para as famílias de baixo poder aquisitivo localizadas no entorno dos terreiros
ou casas de culto. “Não se trata de sacrifício para fins de entretenimento, mas para fins de exercício de um direito
fundamental que é a liberdade religiosa”, concluiu.
“TRADUÇÃO”, “JURIDIQUÊS”, VISUAL LAW E LEGAL DESIGN
◦ Em razão desse diálogo técnico com outras áreas científicas, os temas e documentos jurídicos ambientais
demandam uma comunicação diferenciada (linguagem, a maneira de se expressar, petições, decisões, retórica),
que consiga traduzir o “juridiquês” e termos técnicos de outras áreas para uma linguagem mais acessível que
permita um diálogo.
◦ Giorgia Sena Martins, Elementos da Teoria Estruturante do Direito Ambiental, São Paulo, editora Almedina,
2018: “readequação da linguagem”, “sensibilização ecológica”.
“Diante da complexidade da matéria ambiental, torna-se necessário ‘traduzir’ o texto normativo por meio de uma linguagem
clara, exemplificativa, precisa, que consiga atrair a atenção do interlocutor. (...) Em vez de atrair o leitor, a linguagem
hermética e rebuscada causa distração, sobretudo ao tratar de um tema desconhecido, como muitas vezes é o Direito
Ambiental, suas categorias e conceitos”. (...) “A abordagem tradicional de transcrição de lei, doutrina e jurisprudência e
pouco sedutora e muito distrativa: não dá conta de explicar a magnitude das implicações que envolvem um processo
ambiental, sua influência diferida no tempo e no espaço, além de diversos aspectos não diretamente comtemplados pela
norma. (...) Não é raro ver um operador do Direito confundir, por exemplo, APP (área de preservação permanente) com APA
(área de preservação ambiental). Não se pode pressupor, em termos ambientais, a obviedade. Nada é óbvio e tudo precisa ser
explicado quando se trata de risco/dano ambiental. (...) Na dialética processual, há uma tendência em contar os fatos segundo
a ordem cronológica de acontecimentos. É normal que as petições historiem os fatos conforme eles aconteceram, citando
ofícios, comunicações, memorandos e uma séria de fatos de menor importância. Datas, números, detalhes irrelevantes
poluem o texto, não prendem a atenção. No caso do Direito Ambiental, muitas vezes o interesse em jogo (o bem ambiental
discutido)fica diluído no meio de uma séria de dados secundários”.
READEQUAÇÃO DA LINGUAGEM EM PETIÇÕES
AMBIENTAIS
◦ Direito:
◦ regula e disciplina o comportamento humano através de normas jurídicas.
REGULA/DECIDE ANALISA
Comportamento
humano
ANALISA RELATA/ORIENTA/INTERPRETA
◦ Lei 12.305/2010 (Resíduos Sólidos), art. 3º, XVII: “responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos:
conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos
consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar
o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à
qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos, nos termos desta Lei”. Arts. 7º, XII, 8º, III, 19, XV, 21,
VII, 30 a 36.
◦ Lei nº 9.433/1997 (Recursos Hídricos), art. 1º, VI: “A Política Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes
fundamentos: VI - a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder
Público, dos usuários e das comunidades”. Art. 19.
◦ Lei nº 12.187/2009 (Mudança do Clima), art. 3º, I: "Art. 3o A PNMC e as ações dela decorrentes, executadas sob a
responsabilidade dos entes políticos e dos órgãos da administração pública, observarão os princípios da precaução, da
prevenção, da participação cidadã, do desenvolvimento sustentável e o das responsabilidades comuns, porém
diferenciadas, este último no âmbito internacional, e, quanto às medidas a serem adotadas na sua execução, será
considerado o seguinte: I - todos têm o dever de atuar, em benefício das presentes e futuras gerações, para a redução
dos impactos decorrentes das interferências antrópicas sobre o sistema climático“. Arts. 4º, V; 5º, V.
SOBRE DEVERES FUNDAMENTAIS AMBIENTAIS
◦ Sarlet e Fensterseifer (“Curso”, p. 325):
“A Carta da Terra ressalta a existência de deveres e limitações de cunho ecológico impostos ao exercício de
direitos. Reconhece o seu texto, a respeito dos deveres e limitações ambientais, que ‘todos os seres vivos são
interdependentes e cada forma de vida tem valor, independentemente de sua utilidade para os seres humanos’
(Princípio 1, ‘a’), que ‘com o direito de possuir, administrar e usar os recursos naturais vem o dever de impedir o
dano causado ao meio ambiente e de proteger os direitos das pessoas’ (Princípio 2, ‘a’), bem como se deve ‘impor
o ônus da prova àqueles que afirmarem que a atividade proposta não causará dano significativo e fazer com que os
grupos sejam responsabilizados pelo dano ambiental’ (Princípio 6, ‘b’). Mais recentemente, também na
perspectiva do direito-dever inerente à tutela do ambiente, a Convenção de Aarhus (1998) reconheceu, no plano
internacional, que ‘todos os indivíduos têm o direito de viver num ambiente propício à sua saúde e bem-estar, e o
dever, quer individualmente quer em associação com outros indivíduos, de proteger e melhorar o ambiente em
benefício das gerações presentes e futuras’, bem como ‘que, para poderem exercer esse direito e cumprir esse
dever, os cidadãos devem ter acesso à informação, poder participar no processo de tomada de decisões e ter acesso
à justiça no domínio do ambiente, e reconhecendo que, neste contexto, os cidadãos podem necessitar de assistência
para poderem exercer os seus direitos’. Tal contexto normativo internacional caminha alinhado com o tratamento
constitucional de direito-dever empregado pela CF/1988 à proteção do ambiente”.
SOBRE DEVERES FUNDAMENTAIS
AMBIENTAIS
◦ Sarlet e Fensterseifer (“Curso”, p. 504):
“O cenário jurídico-constitucional delineado para a tutela ecológica está solidificado no princípio da solidariedade, sem
prejuízo das possibilidades no campo da assim designada eficácia do direito (mais propriamente, do complexo de direitos
e deveres) fundamental à proteção e promoção do meio ambiente nas relações entre particulares (também denominada de
eficácia horizontal dos direitos fundamentais), o que, no seu conjunto, e diante do quadro de risco existencial imposto
pela degradação ecológica, impôs maior carga de responsabilidade pelas ações e omissões de particulares (pessoas físicas
e jurídicas), que, de alguma forma, possam, mesmo que potencialmente – em face da aplicação do princípio e dever de
precaução-, comprometer o equilíbrio ecológico.
Os deveres fundamentais de proteção ecológica, portanto, vinculam juridicamente os particulares no sentido de exigir-
lhes não apenas a adoção de medidas negativas, o que ocorre no caso de impedir o particular de realizar determinada
atividade que, mesmo potencialmente, possa acarretar dano ambiental, como desmatar a área de mata ciliar ou despejar
produto químico no córrego de um rio, como também medidas positivas (de cunho prestacional) necessárias à
salvaguarda do equilíbrio ecológico, como ocorre na hipótese de medidas voltadas à conservação do patrimônio
ambiental ou à reparação de um dano ecológico. O art. 5º, parágrafo único, da Lei 6.983/81 reforça normativamente (e
converte em obrigações legais) a dimensão dos deveres fundamentais e proteção ambiental dos particulares, ao assinalar
expressamente que ‘as atividades empresariais públicas ou privadas serão exercidas e consonância com as diretrizes da
Política Nacional do Meio Ambiente’”.
FIM
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