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TRATAMENTO DAS DOENÇAS NEUROMUSCULARES

A UTILIZAÇÃO DA GASTROSTOMIA ENDOSCÓPICA PERCUTÂNEA NA


DOENÇA DO NEURÓNIO MOTOR – ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA

A alimentação entérica é de uma grande relevância para as pessoas com alterações da


deglutição – disfagia, lesões orofaringeas, ou por incapacidade de efectuar uma
alimentação oral adequada às suas necessidades nutricionais.
A Gastrostomia Percutânea Endoscópica (PEG), é uma alternativa eficaz às
formas convencionais de alimentação entérica prolongada. Consiste na inserção de uma
sonda no estômago através da pele sob controlo endoscópico.
Apresenta um conjunto considerável de vantagens, tais como a curta duração do
procedimento; a baixa taxa de complicações; a boa aceitação por parte do doente, uma
vez que a sonda de gastrostomia pode ser ocultada debaixo da roupa e é fácil de
manusear pelo próprio; a possibilidade de permanecer por tempo prolongado e
diminuição do tempo de administração dos alimentos.
Os cuidados de enfermagem prestados à pessoa portadora de uma gastrostomia
baseiam-se essencialmente, na administração da alimentação/medicação e cuidados ao
estoma, contribuindo assim para a melhoria do estado nutricional e para a redução da
incidência de complicações, com o objectivo de promover o conforto e a qualidade de
vida.
É considerada por muitos autores como a melhor alternativa para a pessoa que
requer nutrição entérica prolongada ou permanente, e que não apresenta alterações do
trato gastrointestinal. O acesso ao estômago e a colocação da sonda de gastrostomia
podem ser realizados por meio de laparotomia (gastrostomia cirúrgica) ou através da
pele com apoio de endoscopia (Gastrostomia Endoscópica Percutânea – PEG)

Sondas de Gastrostomia Endoscópica Percutânea (PEG)


As sondas de PEG são produzidas basicamente de dois tipos de material, silicone ou
poliuretano, com diâmetros que variam de 18 a 28 F.
Como característica comum, as sondas de gastrostomia possuem um retentor

Fig. 1 - Retentor interno da sonda de


gastrostomia posicionado na parede anterior
da transição corpo-antro do estômago

interno, cujo objectivo básico é prevenir a saída ou remoção acidental da sonda. Além
disso, com a sua colocação contra a parede anterior do estômago, o retentor funciona
como um tampão que impede o extravasamento da dieta e de secreções gástricas pelo
estoma. A estrutura dos retentores internos varia para cada modelo, mas o desenho
básico tem a forma de disco plano, placa triangular ou gaiola.

Os modelos iniciais apresentavam retentores internos pequenos e rígidos, que


necessitavam de remoção endoscópica obrigatória. Nos últimos anos, porém, houve
uma grande evolução nos materiais e desenhos das sondas PEG. Actualmente os
modelos disponíveis no mercado apresentam como característica, o retentor interno
macio, permitindo ser retirado por tracção externa, sem necessidade de recurso a uma
abordagem endoscópica (ou cirúrgica) para a sua remoção. Esses retentores, de acordo
com a forma de construção e material e utilizado, diferem entre si na quantidade de
força necessária para a sua remoção por tracção externa.

Fig. 2 - Diferentes modelos de


sondas de PEG

Características de um Kit de PEG


Embalagem com kit completo;
Retentor interno”travão” flexível;
Retentor externo “travão”que não seja traumático;
Fixador do retentor externo ajustável;
Comprimento longo para que se possa cortar em caso de deterioração;
Radiopaco com marcadores externos;
Luz ampla;
Adaptável à infusão em bólus e por bomba (contínuo, gota a gota);
Permite a adaptação de JPEG;
Possibilidade de remoção por remoção externa;
Material inerte, flexível e durável;
Baixo preço.

Fig. 3 – Kit completo de PEG,


com o material necessário para
realização do procedimento (W.
Cook)

Indicações
A utilização da PEG está recomendada em doentes com necessidades de alimentação
enteral prolongada por dificuldade ou impossibilidade de deglutição ou em doentes com
necessidades de suplementos alimentares.
As patologias mais comuns para indicação de uma PEG são as doenças
metabólicas, as doenças neurológicas, neoplasias da cabeça e pescoço, a caquexia e a
fibrose quística.

Contra-indicações
As contra-indicações da PEG podem ser absolutas como nos casos em que existem
perturbações graves da coagulação. No entanto, as alterações da coagulação, se
corrigidas, não são contra-indicação para PEG. São ainda contra-indicações a
hepatomegália ou ascite (acentuadas) e estenose do esófago.
A colocação da PEG é dificultada nos doentes com obesidade severa e não deve
ser utilizada como apoio nutricional quando existe obstrução do tracto gastrointestinal.
Nos casos de intolerância à alimentação enteral por sonda nasogástrica, no
refluxo gastroesofágico e em neoplasias ou lesões infiltrativas da parede abdominal a
contra-indicação é relativa e está dependente da opção médica.

Complicações
As complicações da PEG são pouco frequentes. As referenciadas incluem a infecção
local, a peritonite, a septicemia, a deslocação da sonda para a parede abdominal e
hemorragia da mucosa gástrica. Podem ainda ocorrer complicações minor, mas mais
frequentes, como a formação de tecido de granulação no local do estoma, a obstrução da
sonda e a exsudação pelo local da gastrostomia. O tecido de granulação é tratado
inicialmente mediante a aplicação de nitrato de prata, optando-se pela electrocoagulação
se persistir

Cuidados ao Doente Portador de uma Sonda PEG

Alimentação
A alimentação pode ser iniciada ao fim de 6 a 24 horas de acordo com a técnica
anestésica usada e depois de avaliado o funcionamento do sistema gastrointestinal,
nomeadamente pela presença de ruídos intestinais. A sua administração poderá ser
efectuada em bólus ou de modo contínuo (através de bomba infusora) de acordo com o
esquema nutricional estabelecido.
Antes de iniciar a alimentação deve ser confirmada a posição da sonda,
ajustando bem a patela externa através de uma tracção suave. O resíduo gástrico é
sempre verificado e caso seja significativo deve ser contactado o médico. Os alimentos
são administrados à temperatura ambiente em bólus (em tempo superior a 15 minutos)
ou por gravidade, evitando a entrada de ar para não causar desconforto.
Para a administração de alimentos pela gastrostomia o doente deve ficar sentado ou
semi-sentado e não se deitar logo a seguir à sua introdução. Deverá permanecer semi-
sentado, cerca de 60 minutos após a alimentação, podendo deambular.
Verificar se a sonda fica bem fechada de modo a prevenir o extravasamento do
conteúdo gástrico.
A temperatura dos alimentos a administrar deverá ser morna ou à temperatura ambiente.
Poderá utilizar preparados já existentes no mercado ou alimentos cozinhados bem
triturados e diluídos, tal como a medicação administrada pela sonda deverá ser de
preferência líquida (xaropes).
Sempre que possível, deve ser incentivado o auto-cuidado, ensinando o doente a
alimentar-se pela gastrostomia, respeitando o esquema nutricional. A família / familiar
de referência deve ser incluída neste processo e instruída o mais precocemente possível
adoptando estratégias que permitam o seu envolvimento, orientando, supervisando e
reavaliando as suas capacidades. O acompanhamento familiar durante o internamento
permite ao enfermeiro programar e promover processos de ensino, partilhando
conhecimentos e técnicas apropriadas a cada família.
A família deve estar consciente das principais complicações, atenta para o seu
despiste precoce e informados a quem recorrer, sempre que surjam dúvidas ou
problemas.
Quando as condições o permitirem deve estimular-se a alimentação pela boca,
não consistindo os dispositivos de gastrostomias qualquer impedimento a esse processo.
Alimentação por Bólus/Seringa
- Reunir todo o material - recipiente de alimentação e seringa de 60ml ou 100ml por
uma questão de economia de tempo;
- Explicar o procedimento à pessoa para diminuir a ansiedade e obter a sua colaboração;
- Proporcionar um ambiente agradável, calmo, sem cheiros desagradáveis;
- Colocar a pessoa na posição sentada, ou Fowler elevado, quando se encontra em
repouso no leito, para reduzir o risco de regurgitação e de aspiração;
- Lavar as mãos e se em ambiente hospitalar, calçar luvas limpas para prevenir
contaminação e infecções cruzadas.
- Verificar a marca que se encontra na sonda, confirmando a posição da sonda;
- Avaliar o resíduo gástrico e reintroduzi-lo, excepto se contra-indicado, avaliando
assim a tolerância à alimentação e evitando a perda excessiva de electrólitos;
- Clampar a extremidade proximal da sonda, para evitar a entrada de ar para o
estômago;
- Conectar a seringa com alimentação à sonda PEG e administrar a alimentação
lentamente, para evitar intolerâncias e distúrbios gastrointestinais, náuseas, vómitos e
diarreias;
- Lavar a sonda com 30-50cc de água, após a alimentação e de 8 em 8 horas, para
prevenir problemas de obstrução da sonda, contaminação e diminuir o risco de
desidratação e défice de volume de líquidos;
-Manter a pessoa com o tronco elevado por um período cerca de 60 minutos, após a
alimentação pela gastrostomia, para favorecer o esvaziamento gástrico e reduzir o risco
de regurgitação e de aspiração dos alimentos;
- Recolher e dar o destino adequado a todo o material, de modo a prevenir a
contaminação do ambiente;
- Lavar as mãos, para prevenir a infecção cruzada;
- Avaliar o peso periodicamente, para controlar e avaliar o estado nutricional e fazer-se
as correcções nutricionais adequadas.
Fig. 4 – Adaptação do canhão para
alimentação

Administração dos Medicamentos Prescritos


Também podem administrar-se medicamentos através da sonda de PEG. Os
comprimidos devem ser esmagados e dissolvidos em 30 – 50cc água morna, para
poderem ser introduzidos pelo tubo, se tal não alterar as suas propriedades. Sempre que
possível, devem utilizar-se medicamentos líquidos, (solução ou suspensão).
No final, lava-se a sonda com 50 – 100cc de água para impedir obstruções. Deve evitar-
se a administração conjunta com a alimentação, de modo a prevenir alterações na
farmacocinética.
Obstrução da Sonda PEG
Para impedir eventuais obstruções da sonda com alimentos ou medicamentos, lavar a
mesma após cada utilização com uma seringa de 60cc cheia com 30 – 50cc de água.
Quando se verificar a obstrução da sonda devem tomar-se as seguintes medidas:
- Irrigar a sonda com 60cc de água quente, nunca lavando o tubo com nenhum outro
líquido a não ser água;
- Massajar a sonda para facilitar a desobstrução, não exercendo pressão excessiva sobre
o tubo;
- Se estas intervenções não resultaram, contactar o médico.

Cuidados com a Pele e Estoma


Visam essencialmente proteger e manter a integridade da pele junto ao estoma.
Assim as intervenções preconizadas são as seguintes:
- Abrir o clamp do “travão” externo, (retentor externo), verificando a posição da sonda
(marca em cm que se encontra mais próxima da extremidade desta);
- Limpar a pele à volta do local de inserção com água e sabão neutro, prestando especial
atenção à zona que se encontra sob o “travão”, (retentor externo). Pode limpar os restos
de sujidade que se encontram à volta da sonda e no local de inserção com um algodão;
- Enxaguar toda a zona com água limpa;
- Deixar a pele à volta da sonda de PEG secar completamente;
- Procurar eventuais sinais de infecção na pele. Entre esses sinais incluem-se a
exsudação, sensibilidade anormal, vermelhidão, tumefacção, aumento da temperatura ou
fuga de conteúdo gástrico, necrose. Avisar o médico se surgir algum destes sinais. Não
é recomendada a utilização de ligaduras ou pensos. É preferível deixar a zona exposta
ao ar. Não deixar compressas debaixo do “travão”, retentor externo;
- Evitar adesivos de fixação
- Mergulhar e lavar os adaptadores com tampas (sem os desligar do doente) numa bacia
com água com sabão para remover todos os resíduos. Enxaguar abundantemente e
deixar secar ao ar;
- Colocar o clamp no “travão”, na marca registada;
- Rodar a sonda diariamente;

Pele com eritema ou macerada


- Na presença de sinais inflamatórios na pele deve-se:
 Lavar com água;
 Aplicar protector cutâneo na área ruborizada diariamente;
 Comunicar ao médico se não se observarem melhorias;
- Pode tomar duche após os primeiros 8 dias.

Cuidados com a Sonda de PEG


- A sonda está marcada em centímetros. Verificar pois a sua posição correcta antes do
início da cada administração, verificando a marca junto ao suporte externo;
- Antes de iniciar a alimentação verificar se existem resíduos gástricos;
- Após a alimentação e a administração de medicamentos, a sonda deverá ser lavada
com 30 – 50 cc de água. A mesma quantidade de água deve ser introduzida se for
utilizado o método de administração intermitente ou em bólus de 8/8h, excepto se
contra-indicação médica;
- Clampar a sonda quando não a utiliza, excepto se pretender uma descompressão
gástrica;
Não repuxar a sonda pelo risco de necrose tecidular e de saída prematura;
Se houver quebra ou ruptura da sonda, contacte o médico, existem kits de reparação;

Remoção acidental da sonda de PEG


Em primeiro lugar não entrar em pânico. Guardar a sonda e entrar imediatamente em
contacto com o médico/enfermeiro. Quando a PEG é removida, o orifício do estômago
fecha-se rapidamente.

É a técnica de eleição quando se prevê uma alimentação enteral prolongada, justificada


pela facilidade de execução técnica e número reduzido de complicações,
O enfermeiro é um elemento importante desde o início de todo o processo,
criando um clima de confiança e de apoio para que o doente e a família possam colocar
as dúvidas e receios. Durante o internamento é importante considerar o cuidador
informal como um colaborador na prestação de cuidados, pois seguramente isso
traduzir-se-á num menor tempo de internamento e garante à equipa de saúde a
continuidade dos cuidados.

Enfermeiro Luis Sacramento

Coordenador da Comissão Técnica

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