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IX SEMINÁRIO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS “HISTÓRIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO NO BRASIL”


Universidade Federal da Paraíba – João Pessoa – 31/07 a 03/08/2012 – Anais Eletrônicos – ISBN 978-85-7745-551-5

AS POSSIBILIDADES E LIMITES DA EDUCAÇÃO NA SOCIEDADE DE CLASSES1 
Paulino José Orso2 
paulinorso@uol.com.br  
(Unioeste)  
 
Resumo 
 
 Este artigo, tendo como objeto central de discussão a questão da educação, procura refletir sobre quais são suas reais 
possibilidades, assim como seus limites. Discorre até que ponto se pode afirmar que a educação é todo poderosa, a 
ponto de poder transformar a sociedade, promover o desenvolvimento econômico e redimi‐la, como era uma crença 
mais ou menos comum no passado e discute também a posição contrária, que afirma que a educação, por se ocupar 
sobretudo  com  ideias,  não  tem  nenhum  poder  transformador.  Compreendendo‐a  como  parte  integrante  da 
sociedade, a conclusão é que não se pode afirmar abstratamente que a educação, por si só, é transformadora, nem 
que  ela  não  serve  para  nada,  uma  vez  que  ela  é  aquilo  que  a  sociedade  faz  dela,  mediada  pelas  condições,  pelo 
estágio de consciência e também pelo desenvolvimento das forças produtivas materiais. 
 
Palavras‐chave: Educação. Sociedade de Classes. Possibilidades e limites da educação. 

 
Em  um  artigo  denominado  “As  possibilidades  e  os  limites  da  educação” 3,  publicado  por 
ocasião  das  comemorações  dos  130  anos  da  Comuna  de  Paris  de  1871,  realizadas  em  2001, 
concluía o mesmo afirmando que quem acredita na educação luta para transformar a sociedade. 
Pois bem, neste partimos desta premissa para tratarmos da educação na sociedade de classes. 
Muito se tem discutido, sobretudo no passado, sobre o papel da educação na sociedade, se 
ela apenas  reproduz  a  sociedade  em  que  está  inserida  ou  se  ela  é ou  pode  ser  revolucionária  a 
ponto  de  transformar  toda a  sociedade.  Entretanto,  muitos intelectuais,  ao invés de  analisá‐la  e 
compreendê‐la  de  acordo  com  a  categoria  da  totalidade,  caem  na  perspectiva  positivista  e 
simplesmente  deslocam‐na  do  conjunto  das  relações  sociais  de  produção,  embrenham‐se  pelo 
idealismo  e  apresentam‐na  como  se  fosse  capaz  de  promover  o  desenvolvimento  econômico, 
garantir o bem estar social e conduzir a todos à felicidade; fazem dela a responsável pelo sucesso 

                                                           
1
  Artigo  publicado  com  algumas  alterações  no  livro:  Educação  e  Sociedade  de  Classes,  publicado  pela  editora 
Expressão Popular, organizado por Paulino José Orso, Sebastião Rodrigues Gonçalves e Valci Maria de Mattos, em 
2008. 
2
  Doutor  em  História  e  Filosofia  da  Educação  pela  Unicamp,  docente  do  Curso  de  Pedagogia  e  do  Mestrado  em 
Educação  da  Unioeste,  Campus  de  Cascavel  e  líder do  Grupo  de  Pesquisa  em  História,  Sociedade  e  Educação  no 
Brasil – GT da Região Oeste do Paraná – HISTEDOPR. E‐mail: paulinorso@uol.com.br  
3
  Cf.  ORSO,  José  Paulino.  As  possibilidades  e os limites da educação, in:  ORSO,  José  Paulino.  A  Comuna  de  Paris  de 
1871: história e atualidade. São Paulo: Editora Ícone, 2002, pp. 89‐102. 
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ou  fracasso  de  cada  um.  E,  analisando‐a  de  forma  abstrata,  deslocada  das  contradições  e  dos 
antagonismos de classes, atribuem a ela um caráter redentor. 
Entretanto,  existem  “n”  formas  de  educação.  Por  isso,  não  é  possível  para  falar  de 
educação abstratamente, nem desconsiderando a história. Além disso, as finalidades com que se 
educa  também  não  são  as  mesmas  em  todas  as  épocas,  em  todos  os  lugares  e  em  todas  as 
sociedades.  Simplificando,  poder‐se‐ia  dividir  a  educação  em  dois  tipos:  formal  e  a  informal.  A 
primeira  refere‐se  àquela  ministrada  em  sala  de  aula,  com  professores,  programas  e  conteúdos 
organizados, com objetivos definidos, que é realizada de forma sistemática. A segunda diz respeito 
à realizada cotidianamente, baseada nos costumes, nas leis, nas tradições, nas lutas do dia‐a‐dia, 
na  rua,  no  trabalho,  nas  mobilizações,  na  aprendizagem  que  ocorre  por  meio  das  relações 
interpessoais, durante a vida.  
Ambas são formas de educação e variam de acordo com a sociedade, com as relações de 
força  envolvidas,  com  a  época,  com  o  estágio  de  desenvolvimento  e  o  lugar  em  que  ocorrem. 
Diante disso, podemos nos perguntar: Afinal de contas, o que é ou em que consiste a educação? 
Se pudéssemos estabelecer uma definição suficientemente ampla que abarcasse todos os tipos de 
educação  num  único  conceito,  se  poderia  dizer  que  a  educação  é  a  forma  como  a  própria 
sociedade prepara seus membros para viverem nela mesma.  
Ora,  se  a  educação  é  a  forma  como  a  sociedade  educa  seus  membros  para  viverem  nela 
mesma, então, para compreender a educação precisamos compreender a sociedade, uma vez que 
não  existe  educação  sem  sociedade.  Deste  modo,  na  medida  em  que  compreendermos  esta, 
também entenderemos aquela.  
Partindo  do  princípio  de  que,  após  o  surgimento  da  propriedade  privada  dos  meios  de 
produção,  a  história  da  humanidade  tem  sido  a  história  das  lutas  de  classes4  e  que  atualmente 
vivemos  no  modo  de  produção  capitalista,  baseado na  extração  da  mais‐valia,  na  exploração, na 
competição e na concorrência, a educação, submetendo‐se às determinações da base material, no 
geral,  corresponde  às  relações  dominantes  de  cada  momento  e  acaba  contribuindo  para  a 
reprodução da sociedade vigente, pois, como destaca Karl Marx, “na produção social de sua vida, 
                                                           
4
 MARX, K & ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. In: Revista de Estudos Avançados da USP. São Paulo: Vol. 12, 
nº 34, set./dez., 1998, p. 7. 
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os  homens  contraem  determinadas  relações  de  produção  necessárias  e  independentes  da  sua 
vontade,  relações  de  produção  que  correspondem a uma determinada  fase  de desenvolvimento 
das forças produtivas materiais”5.  Neste sentido, a educação tende a “refletir” a sociedade que a 
produz, pois, expressa o nível de compreensão dos que a fazem, permitida pela sociedade de cada 
época, de acordo com a etapa de desenvolvimento e das relações sociais. 
Quanto  à  educação  formal,  ela  geralmente  se  parece  mais  como  uma  forma  de 
adestramento, disciplinarização, treinamento e docilização dos indivíduos, do que como meio de 
transformação, de revolução e libertação social. Mesmo quando tem a preocupação de ser crítica, 
de  subverter  a  ordem  acadêmica  e  de  questionar  o  sistema  vigente,  o  que  é  um  tanto  raro  e 
incomum nos tempos atuais, é envolvida por um amplo aparato disciplinar e burocrático, quando 
não  repressivo,  que  deixa  pouco  espaço  para  a  flexibilidade,  a  criatividade,  a  liberdade,  para  a 
realização de experiências alternativas e para o desenvolvimento integral do homem. Além disso, 
na  maioria das  vezes,  os  conteúdos  estão  mais  voltados  para  ensinar  que  “a  Eva  viu  a  uva”,  ou 
seja,  conteúdos  abstratos,  do  que  para  compreender  a  vida  concreta,  isto  é,  a  matemática  da 
fome, o português da violência, a geografia e a história da exploração e dos problemas sociais, a 
ciência da história da vida real dos homens e voltam‐se mais para a adaptação, para a alienação e 
para o conformismo do aluno ao meio do que para desmistificar, para questionar as condições de 
vida e o status quo.  
Na  tentativa de  superar  esta  realidade,  muitas  vezes  os  autores,  intelectuais,  professores 
tem  defendido  que  se  deve  trabalhar  com  conteúdos  concretos,  com  o  contexto,  com  os 
cotidiano.  Contudo,  o  que  entendem  por  tais  conteúdos?  Em  geral,  por  falta  de  uma  formação 
mais sólida e fundamentada, o que entendem por concreto, contexto, cotidiano não passa de sua 
acepção  mais  estreita possível, a  sua  mera  existência  física  fora do  pensamento  e  não  enquanto 
objetos  multideterminados  social  e  historicamente.  Neste  sentido,  pode‐se  dizer  que,  quando 
falam do concreto, não passa de uma simples abstração e quando falam de abstração, não passa 
de um simples objeto concreto, físico e exterior ao pensamento. 

                                                           
5
 MARX, K. Prefácio à “Contribuição à Crítica da Economia Política”. in: Obras Escolhidas. São Paulo: Alfa‐Omega, s/d, 
p. 301. 
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Com isso, caem no praticismo, no utilitarismo, no cotidiano, na ausência de história em que 
resta apenas o presente, o aqui agora e o imediato, adequado à reprodução do existente. 
Esta forma de educação corresponde à essa sociedade, que tem na alienação da força de 
trabalho  e,  consequentemente,  da  consciência  um  meio  de  se  reproduzir  e  se  perpetuar.  E  não 
poderia admitir outra, pois se isso ocorresse, corresponderia a outra sociedade e não à de classes. 
Entretanto,  como  ela  não  é  constituída  por  um  bloco  monolítico,  também  é  permeada  por 
contradições e, eventualmente, até pode permitir a realização de algumas experiências diferentes, 
com  uma  certa  margem  de  rebeldia  e de  contestação. Todavia, no  geral,  predomina  um  tipo  de 
educação  abstrata,  necessária  à  essa  sociedade,  pois,  sendo  o  determinante  maior  a  base 
material,  ela  condiciona  a  consciência  estabelecendo‐se  assim  um  tipo  de  educação 
correspondente  a  ela.  Ou  seja,  uma  educação  voltada  para  estimular  o  individualismo,  para 
fomentar  a  competição, para enaltecer  a  concorrência, para premiar  pela produtividade  e  punir 
pelos resultados não desejados, permitindo, assim, selecionar os mais aptos e mais adaptados, de 
acordo com os valores vigentes nessa sociedade – uma educação para a subserviência. 
Ao  lado  desta,  na  América  Latina,  têm  surgido  uma  série  de  experiências  de  educação 
popular;  umas  de  forma  institucionalizadas  outras  não.  No  Brasil,  por  exemplo,  tivemos  a 
experiência realizada por Paulo Freire, em que o aluno, ao mesmo tempo em que aprendia a ler e 
escrever, também era “levado” a ler, compreender e interpretar o mundo e a sociedade em que 
vivia. Todavia, a ditadura militar se encarregou de esmagar a experiência e exilar seu idealizador. 
Em substituição a esse método, implantaram o Movimento Brasileiro de Alfabetização – Mobral, 
que  visava  eliminar  um determinado  conteúdo político  e ideológico  e  substituí‐lo por  outro,  por 
uma educação moral e cívica, adequada ao militarismo desenvolvimentista da época.  
Mas, se a educação está mais voltada para a adaptação do indivíduo ao meio e se este se 
constitui  numa  sociedade  capitalista  em  que  um  homem  explora  e  domina  o  outro,  porque  se 
preocupar  em  alfabetizar  e  educar  milhões  de  seres  humanos  que  não  sabem  ler  e  escrever? 
Nossa sociedade é uma sociedade gráfica, isto é, baseada na escrita. Saber ler e escrever significa 
ter acesso a um mínimo de sociabilidade, ter um mínimo de autonomia individual.  
Entretanto,  a  escrita  foi  inventada  por  volta de  6.500  anos  e um  bilhão  de pessoas  ainda 
não sabe ler e escrever. No Brasil, por exemplo, ainda temos aproximadamente 18 a 20 milhões de 
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analfabetos,  sem  contar  os  analfabetos  funcionais,  que  mal  ou  apenas  sabem  ler  e  escrever. 
Portanto, alfabetizar e possibilitar o acesso ao conhecimento formal, não significa fazer nenhuma 
grande  revolução  social.  Mas,  pelo  menos,  significa  permitir  que  as  pessoas  saiam  do  estado 
vegetativo  e  conquistem  um  mínimo  de  autonomia  e  independência  perante  o  mundo  em  que 
vivem; significa possibilitar ao menos uma condição mínima de sobrevivência na atual sociedade, 
da  qual  podem  decorrer  outras  possibilidades,  ainda  que  isto  seja  insuficiente  para  que  se 
libertem real e efetivamente e vivam com dignidade. 
Mas, mesmo nessa sociedade capitalista, é possível garantir que todas as pessoas tenham 
acesso  a um  mínimo  de  educação  formal  ou  até  mesmo  à  escola  pública  e  gratuita?  Sim.  Para  a 
sociedade capitalista, em sua forma pública ou privada, em princípio não há nenhum problema em 
oferecer educação para todos. Aliás, paulatinamente estamos vendo que o acesso à escola está se 
popularizando e sendo estendido para cada vez mais pessoas, a ponto de que, mais dia menos dia, 
talvez até possa ser universalizada.  
No  campo  da  educação,  nesse  momento  também  vemos  a  iniciativa  privada  avançar  a 
passos  largos.  Contudo,  é  possível que  em algum  momento, de acordo  com o  grau de  exigência 
social, a chamada educação pública possa vir a ser ofertada a todos (tese esta um tanto difícil, mas 
perfeitamente  possível).  Se  ela  preservar,  não  questionar  e  não  pôr  em  risco  a  propriedade 
privada,  se  houver  condições  econômicas  suficiente  para  bancá‐la,  ainda  que  como  diria  Adam 
Smith, em dose homeopática, não há nenhum problema em universalizá‐la.  
Entretanto, sabemos que a extensão da educação a mais ou menos pessoas, dependerá da 
pressão  da  sociedade,  da  exigência  social  e  ou  das  necessidades  do  capital  em  cada  época.  Por 
isso,  ainda  que  em  determinado  momento  existam  as  condições  materiais  necessárias  para 
possibilitá‐la  a  todos,  poderá  não  ser  estendida  ou  somente  será  oportunizada  quando  existir 
pressão popular suficientemente forte e capaz de transformar o potencial em algo real. Pois, ela 
pode ser utilizada como uma moeda de negociação e canalização das lutas sociais. Por outro lado, 
se  ela  for  paga,  o  problema  será  menor  ainda.  Pois,  ela  até  pode  servir  como  um  campo  de 
extensão e de ampliação do capital em um momento de crise de acumulação, por exemplo. 
No momento em que o capital passa por uma profunda crise de superprodução, em que se 
encontra  estrangulado,  existem  duas  saídas para  resolvê‐la.  Por  um lado, pode  ser  realizada  por 
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meio da imposição da flexibilização e liberalização das fronteiras, no rompimento das barreiras e 
na desburocratização para abrir novos espaços e campos para o seu desenvolvimento, que pode 
ocorrer  de  forma  pacífica,  por  meio  da  “adesão”  e  da  “democrática”  ou  por  meio  de  métodos 
grosseiros,  da  violência  e das  guerras.  Por  outro, pode‐se  lançar  mão da estratégia da queima  e 
destruição  das  forças  produtivas,  por  exemplo,  da  eliminação  do  conhecimento,  da  aniquilação 
das  forças  de  trabalho  e  do  destroçamento  da  tecnologia,  sob  pena  de  provocar  o  próprio 
aniquilamento.  Então,  a  desestatização  e  a  privatização  transformam‐se  em  alternativas  que 
permitem  desafogar,  ao  menos  temporariamente,  a  crise  do  capital  e  garantir  um  novo,  porém 
pequeno,  período  de  desenvolvimento,  até  que  as  contradições  se  acirram  novamente  e 
provoquem uma nova crise.  
O  sucateamento da  escola pública  e  a  expansão  da  escola privada  inserem‐se  dentro  das 
necessidades  do  capital,  uma  vez  que,  “os  processos  educacionais  e  os  processos  sociais  mais 
abrangentes  de  reprodução  estão  intimamente  ligados”6.    Assim,  para  compreender  as 
características  da  escola,  para  entender  o  processo  de  expansão  e  ou  de  retração  da  escola 
pública,  bem  como,  da  expansão  da  escola  particular  é  preciso  entender  o  processo  de 
desenvolvimento do capital, seus ciclos de desenvolvimento e de crise. 
Portanto, é um equívoco centrar as discussões educacionais em torno de debates abstratos 
da defesa das teses de que ela é ou não é reprodutora, de que é ou não transformadora, se ela é 
ou  pode  ser  revolucionária.  Como  a  sociedade  não  é  homogênea,  como  está  permeada  de 
contradições,  de  lutas  e  antagonismos  de  classes,  a  educação  se  transforma  de  acordo  com  o 
movimento  da  sociedade,  que  ao  se  transformar  e  ser  transformada,  também  possibilita  uma 
educação  de  tipo  diferente,  adequada  à  nova  realidade.  Assim,  em  cada  época  e  em  cada 
sociedade, a educação “reflete” as condições do desenvolvimento social, a exigência e consciência 
social, o nível de desenvolvimento das forças produtivas e as relações de forças travadas entre as 
classes envolvidas.  
Desse  modo,  falar  da  educação  numa  sociedade  de  classes,  numa  sociedade  capitalista, 
significa  dizer  que  ela  está  voltada  à  conservação  do  status  quo  e  à  legitimação  das  estruturas 

                                                           
6
 MÉSZÁROS, István. Educação para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2005. 
3845 
 
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sociais  vigentes.  Se  quisermos  ter  outro  tipo  de  educação  não nos  resta  outra alternativa  senão 
lutar pela transformação da sociedade.  
A  sociedade  centralizada,  hierárquica,  especializada,  elitista  e  seletiva  como  está 
organizada  atualmente,  bloqueia,  cerceia  e  inibe  as  iniciativas  que  possam  desafiá‐la.  Nesse 
contexto, as iniciativas escolares, as ações dos profissionais da educação e dos alunos têm limites. 
Como diz Harper,  
[...]é certo, porém, que estas experiências, ao aproveitarem as brechas existentes 
e ao utilizarem os espaços disponíveis, esgotam o campo do possível no interior 
do  sistema  escolar.  Os  educadores,  os  pais  de  alunos  e  os  estudantes  que 
conseguirem criar esses espaços de liberdade e de experimentação fazem de sua 
prática educativa uma negação viva do modo de organização social dominante e 
do tipo de escola seletiva e elitista que lhe é funcional7.  
 
O  bom  profissional  da  educação,  ao  esmerar‐se  na  realização  de  seu  trabalho,  também 
perceberá  os  limites  dele  e  de  sua  ação no interior da  sala de  aula;  perceberá  que  sua luta  não 
poderá circunscrever‐se à escola, apesar de ser este o local de seu trabalho. 
Entretanto,  a  transformação  da  sociedade  depende do processo  de  desenvolvimento das 
forças produtivas, das relações sociais e das contradições gestadas no seu interior. Pois, como diz 
Marx: 
[...] ao chegar a uma determinada fase de desenvolvimento, as forças produtivas 
materiais da sociedade se chocam com as relações de produção existentes [...]. De 
formas  de  desenvolvimento  das  forças produtivas,  estas  relações  se  convertem 
em obstáculos a elas. E se abre, assim, uma época de revolução social. Ao mudar a 
base  econômica,  revoluciona‐se,  mais  ou  menos  rapidamente,  toda  a  imensa 
superestrutura erigida sobre ela8.  
 
Noutras palavras, pode‐se dizer que cada processo de desenvolvimento suscita e produz o 
seu contrário. O movimento se produz colocando em questão a ordem e os elementos existentes, 
forçando  uma  mudança  para  resolver  os  novos  desafios  criados  pela  desestabilização  da  ordem 
anterior.  
É nesta condição que também se coloca a educação. Neste sentido, ela não é reprodutora 
nem  propriamente  redentora,  também  não  é  revolucionária.  Ela  expressa  as  contradições  e  a 
                                                           
7
 HARPER, s/d. 
8
 MARX, K. Prefácio à “Contribuição à Crítica da Economia Política”. In: MARX, K & ENGELS, F.. Obras Escolhidas. São 
Paulo: Alfa‐Omega, s/d, p. 301. 
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própria sociedade em que está inserida. A sociedade estabelece os limites e as possibilidades da 
educação; estabelece sua qualidade e sua quantidade, sua forma e seu conteúdo. Isto significa que 
lutar somente pela educação, é lutar em vão, pois, significa entende‐la equivocadamente como se 
ela  fosse  independente  da  totalidade  social  e,  portanto,  absoluta  e  todo  poderosa.  Por  isso,  é 
necessário  superar  esta  ilusão.  Nesta  perspectiva,  Marx  nos  diz:  “a  exigência  de  abandonar  as 
ilusões sobre sua condição é a exigência de abandonar uma condição que necessita de ilusões”9.  
Assim,  compreendendo  a  educação  como  expressão  das  relações  sociais,  é  preciso  lutar  pela 
educação lutando simultaneamente pela transformação da sociedade.  
Mas, a superação das ilusões, bem como daquilo que as produz, não ocorre por um ímpeto 
voluntarista. Entretanto, nessas condições o acesso ao conhecimento científico, que se identifica 
com o domínio da organização e do funcionamento da realidade, com a compreensão da dinâmica 
da natureza e da sociedade, aparece como uma condição sine qua non à transformação, mas isto 
ainda não é suficiente por si só.  
O  acirramento  das  contradições  e  antagonismos  sociais,  produzidas  pelas  lutas  que  se 
travam no interior da sociedade, desencadeiam as condições para a mobilização social. Até não se 
apresentar  uma  situação  limite  que  corrói  a  base  existente  e  que  coloque  em  questão  a 
sobrevivência  do  homem,  imperará  o  individualismo,  a  competição,  a  concorrência,  a  busca  de 
saída  de  tipo  personalista  e,  no  geral,  de  cada  um  a  suas  custas.  Se  a  base  material  exige  o 
estabelecimento de relações necessárias e independentes da vontade, somente no momento em 
que  uma  situação  nova  revelar  a insuficiência das  relações  anteriores  e  exigir  outras  novas,  elas 
serão desencadeadas.  
De  que  adianta  falar  que  é  preciso  mudar  de  mentalidade,  que  é  preciso  deixar  de  ser 
individualista,  que  é  preciso  ser  solidário,  que  é  preciso  pensar  no  outro,  que  é  necessário  ser 
fraterno,  que  é  preciso  deixar  o  egoísmo  de  lado,  que  é  preciso  ter  amor  no  que  se  faz,  que  é 
preciso  vestir a  camisa,  se  isso não  passar  de  palavras  e  frases  de  efeito  e  de  tipo  moralistas;  se 
não  o amor  não  passar  de  um  mero  sentimento  interior;  se  as  ações  não  passarem  de  atitudes 
focadas,  deslocadas  do  contexto  geral,  se  desconsiderarem  as  ações  e  relações  mais  amplas,  se 
                                                           
9
 MARX, K. Introdução à crítica da filosofia do direito de Hegel. In: MARX, K. A questão judaica. 5ª edição, São Paulo: 
Centauro, 2000, p. 86. 
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servir  apenas  para  desviar  a  atenção  da  totalidades  social?  Por  isso,  é  necessário  considerar  o 
modo  como a  sociedade  está  organizada;  considerar  as interrelações  entre  todos  os  elementos; 
considerar as ações, as interpenetrações e determinações recíprocas. As pessoas até podem não 
querer explorar e dominar os outros; podem querer ser fraternas e solidárias; podem querer amar 
e respeitar, mas são forçadas a fazer o contrário devido ao modo de produção dominante. 
Portanto,  não  basta  dizer  que a  educação  é  mediadora.  Afinal,  ela  é  mediadora  para  “n” 
coisas  e  pode  ser  para  qualquer  coisa.  Assim  como  é  inócuo  pensar  que  basta  diferenciar 
educação de formação ou mudar a denominação e ao invés de aluno (sem luz própria) chamar de 
educandos.  Da  mesma  forma,  não  basta  estabelecer  novos  “paradigmas”  de  produção  do 
conhecimento, pois, impõe‐se a mesma observação feita por Marx na Tese 3 sobre Feuerbach, em 
que afirmava: 
A  doutrina  materialista  da  transformação  das  circunstâncias  e  da  educação 
esquece que  as  circunstâncias  têm  de  ser  transformadas  pelos homens  e que  o 
próprio  educador  tem  de  ser  educado.  (...)  A  coincidência  da  mudança  das 
circunstâncias e da atividade humana ou autotransformação só pode ser tomada 
e racionalmente entendida como práxis revolucionária10. 
 
Ou  seja,  assim  como  Marx  chamava  atenção  dos  filósofos  idealistas  alemães,  não  basta 
substituir uma palavra, denominação ou frase por outras e achar que com isso mudou a realidade.  
O  autor  reforça  a  tese  de  que,  quem  de  fato  educa  o  homem  é a  sociedade,  tanto  pelas 
pessoas que a fazem quanto pelas condições em que vivem. A educação corresponde ao nível de 
desenvolvimento  das  forças  produtivas  e das  relações  de produção de  cada  sociedade,  em  cada 
época.  Assim,  a  educação  se  transforma  ou  é  transformada  à  medida  em  que  também  se 
transforma  a  sociedade,  em  que a luta  se acirra,  em  que as  contradições  se  estabelecem.  Novas 
relações de produção exigem novas relações sociais e, portanto, também novas representações.  
Para  ser  transformadora  a  educação  não  pode  se  limitar  a  reação  natural,  das  de  tipo 
espontâneas ou do tipo estímulo‐resposta. A realidade transformada suscita novas investigações, 
que por sua vez, pressupõem outras representações ideais, novas teorias, novos conceitos, novas 
ideias,  condição  para  novas  ações  e  novas  práticas,  para  mudanças  que  possam  ir  além  do 
imediatismo  e  da  mera  continuidade. Dessa  forma, impõe‐se  mais  do  que  nunca,  conhecer  cada 
                                                           
10
 MARX, K. Teses sobre Feuerbach. In: A ideologia alemã. Lisboa: edições avante, 1981, p. 104. 
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vez  melhor  a  sociedade,  conhecer  como  ela  se  movimenta,  como  se  transforma,  para  poder 
intervir nela nos momentos adequados.  
A  verdadeira  aprendizagem  se  dá  na  luta  concreta, na  percepção  de  que  a  sociedade  de 
classes e a sociedade capitalista é inviável ao ser humano, ou então, como diria István Mészáros11, 
o  capital  é  incorrigível  e irreformável,  isto,  não por  sua  “maldade”,  mas  sim  devido  à  sua  lógica 
interna,  à  sua  essência,  à  sua  forma  de  funcionamento.  Por  isso,  é  necessário  desmistificar  e 
destruir  as  promessas  e  ilusões  burguesas.  Isso  ocorre  com  as  transformações  sociais,  que  vão 
provocando  novas  relações  e  que,  por  sua  vez,  vão  minando  o  sistema  e  desencadeando  novas 
formas de se organizar e se viver socialmente e junto com isso, podem possibilitar novas formas 
de consciência e, portanto, também de luta. As formas de organização baseadas no individualismo 
e na competitividade, vão sendo superadas por formas de organização baseadas no coletivo e na 
cooperação,  na  negação  do  individualismo;  vão  rompendo  com  o  personalismo  e  com  a 
competitividade e levam à descoberta da necessidade de luta, de cooperação e do outro. 
Como  se  pode  perceber,  nesta  sociedade,  a  educação,  ainda  que  seja  um  espaço  de 
contradição, em geral, prepara o indivíduo para o mercado, para explorar ou para ser explorado, 
ou  seja,  para  a  adaptação  e  reprodução  das  condições  vigentes.  Portanto,  o  que  é  que  de  fato 
importa?  Importa  é que a  classe  trabalhadora  se  liberte,  que  supere a  dominação  e  conquiste  a 
liberdade,  não  a  ilusória  e  falsa  liberdade  burguesa,  mas  sim  a  efetiva  liberdade  humana;  que 
construa uma nova humanidade e um novo homem, resultados do fim da propriedade privada e 
das classes sociais. Num sistema que submete tudo e todos à sua incorrigível lógica é insuficiente 
promover  reformas  pontuais,  periféricas  e  marginais,  defender  simplesmente  a  transparência,  a 
democracia,  a  ética.  Mas,  como  conseguir  isso?  Vou  citar  três  exemplos,  dentre  tantos,  que 
permitem perceber que é possível construir uma nova humanidade. 
O primeiro é o da Comuna de Paris, que em 1871 demonstrou que se quisermos construir 
uma  nova  humanidade  e  ter  uma  nova  educação  que  permita  que  o  homem  se  desenvolva 
integralmente,  não  basta  promover  reformas,  é  preciso  acabar  com  o  modo  de  produção 
capitalista,  com  a  sociedade  de  classes  e  com  o  Estado.  A  Comuna  de  Paris  demonstrou  não 

                                                           
11
 MÉSZÁROS, István. Educação para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2005, p. 34‐25. 
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apenas a possibilidade, mas a necessidade da unidade de classe dos trabalhadores como condição 
para o enfrentamento da classe dominante e a transformação radical da sociedade. 
O segundo é o exemplo das Madres da Praça de Maio da Argentina. As Madres que tiveram 
seus  filhos  perseguidos,  presos,  torturados,  exilados  e  mortos  por  lutar  e  defender  uma  nova 
sociedade, inicialmente, passaram a procurar e buscar por seus filhos cada uma individualmente. 
Depois,  os  desafios  fizeram  com  que  elas  se  unissem  e  percebessem  que  o  problema  não  era 
individual;  perceber  que  outras  mães  também  tinham  filhos  sequestrados,  exilados  e  mortos. 
Então passaram  a  se  organizar  e  a  lutar  coletivamente.  Na  luta,  perceberam  que  a  comissão  de 
direitos  humanos,  a  igreja,  os  juízes,  os  políticos,  aos  quais  apelavam,  acreditando  que 
sinceramente pudessem ajudar a recuperar seus filhos, além de não resolver seus problemas, de 
não  trazê‐los  de  volta,  na  sua  maioria,  eram  cúmplices  dos  desaparecimentos  e das atrocidades. 
Por  isso,  perceberam  que  era  inútil  recorrer  a  eles.  Na  luta  compreenderam  que  a  causa  dos 
problemas não estava nos indivíduos, nas suas aparentemente boas ou más intenções, mas sim na 
sociedade de classes, na sociedade capitalista e que a única saída que havia para superá‐los, para 
que  não  mais  ocorressem  esses  atos  brutais,  essas  truculências  e  barbaridades,  era  lutar  pela 
transformação radical da sociedade. Ou seja, de donas de casa, a luta levou as Madres a superar 
suas diferenças individuais, seus interesses pessoais e imediatos, e fez com que percebessem que 
a única condição dos fracos se fortalecerem é na unidade. Com isso, perceberam a necessidade de 
se transformarem em revolucionárias12.  
O terceiro exemplo é o do MST – Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. Os sem‐terra 
também  cansaram  da  enganação,  das  ilusões  e  das  promessas  burguesas;  cansaram  das 
promessas  de  liberdade  e  de  democracia;  cansaram  das  promessas  de  que,  “primeiro  é  preciso 
fazer crescer o bolo para depois dividi‐lo”; de que é preciso promover o crescimento econômico 
para depois  promover  a  distribuição  de  renda; de que primeiro  é  preciso  acabar  com  a  inflação, 
para depois promover a distribuição de renda; de que é preciso fazer a reforma agrária dentro da 
lei, de forma democrática, dentro da negociação.  

                                                           
12
  Aqui,  nos  referimos  ao  momento  em que  as  Madres  estavam  em  franco  movimento  durante a ditadura  militar e 
logo após à abertura política, até o início do século XXI, quando o governo Kirchner assume o poder. 
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Todas  essas  estratégias  burguesas  revelaram‐se  ilusões.  Entretanto,  disso  tudo  resultou a 
aprendizagem de que, só pela organização e pela luta o povo consegue conquistar seus “direitos”; 
só o povo organizado pode revolucionar e transformar a sociedade em que vive. Como diz Marx, a 
liberação dos trabalhadores será uma conquista dos próprios trabalhadores ou não será de mais 
ninguém. Os sem‐terra também perceberam que não basta conquistar um pedaço de terra, pois o 
sistema  produz  um  número  infinitamente  maior  de  sem‐terra  do  que  os  que  conseguem 
conquistar um pedaço de chão.  
Diante  disso,  de  uma  luta  voltada  apenas  para  a  conquista  da  terra  individualmente, 
perceberam que mesmo que a luta fosse apenas por ela, no plano individual seria muito difícil de 
conquista‐la. Dessa aprendizagem resultou a compreensão de que a luta deveria ser coletiva, pois 
os  problemas  também  eram  comuns.  Além  disso,  entenderam  que  se  a  luta,  mesmo  sendo 
coletiva,  tivesse  seu  fim  apenas  na  conquista  da  terra  e  não  fosse  parte  de  um  processo  mais 
amplo, que estivesse articulada com a luta pela superação do modo de produção capitalista, mais 
dia, menos dia, seus os problemas e os de dos demais voltariam a ser os mesmos13.  
Se quiséssemos enumerar teríamos mais uma série de exemplos semelhantes a estes para 
citar, nos quais se revela que a verdadeira aprendizagem ocorre na luta. Mas, penso que estes já 
são suficientes para ajudar os educadores a percebem que também precisam aprender com a luta 
e  com  a  história.  Basta  olhar  um  pouco  para  a  história  para  perceber  as  mentiras  seculares 
propagadas pela burguesia e deixar de acreditar em suas promessas de progresso, de bem estar, 
de redenção pela educação. Portanto, é preciso perder a ilusão, deixar de ser ingênuo. É preciso 
partir  para  a  luta,  tendo  como  referência  a  identidade  de  classe.  Como  afirma  Marx,  ou  se 
resolvem os problemas na prática ou não se resolve.  
As  armas  da  crítica  não  podem,  de  fato,  substituir  a  crítica  das  armas;  a  força 
material tem de ser deposta pela força material, mas a teoria também se converte 
em  força  material  uma  vez  que  se  apossa  dos  homens.  A  teoria  é  capaz  de 
prender os homens desde que demonstre sua verdadeira face ao homem, desde 

                                                           
13
 De modo assemelhado ao das Madres da Praça de Maio da Argentina com o kircherismo, no Brasil, com a ascensão 
do PT ao governo também ocorre uma retração no movimento dos Sem Terra, que passa a uma prática de caráter 
reformista. 
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que  se  torne  radical.  Ser  radical  é  atacar  o  problema  em  suas  raízes.  Para  o 
homem, porém, a raiz é o próprio homem14. 
 
Pode‐se  depreender  que  a  capacidade  de  análise,  de  conhecimento  e  de  crítica  são 
importantes, diria indispensáveis, contudo, não são suficientes, pressupõem a luta prática, a força 
material para que a realidade possa ser revolucionada praticamente. 
 Mas,  se  é  a  sociedade  que  educa,  qual  o  papel  que  cabe  ao  professor?  Não  nos 
esqueçamos  que  ele  também  faz  parte  da  sociedade  e  também  da  classe  trabalhadora.  E, nesse 
sentido, tem uma tarefa importante para cumprir.  
O professor realiza um trabalho social específico, não melhor, nem mais nobre ou superior, 
mas  sim  diferente  dos  demais  trabalhadores;  o  professor  não  é  um  sacerdote.  Se  não  fosse 
professor, como um trabalhador que precisa vender sua força de trabalho para poder sobreviver, 
possivelmente estaria realizando um outro tipo de trabalho qualquer e vendendo sua força como 
padeiro,  marceneiro,  agricultor,  confeiteiro,  vendedor,  pedreiro,  coveiro,  escriturário,  motorista, 
enfermeiro,  etc.  –  estaria  educando  e  sendo  educado  em outro local.  Ou  seja,  seria  membro da 
classe trabalhadora, submetido à mesma lógica do modo de produção capitalista como os demais 
trabalhadores,  mas  exercendo  uma  outra  função  social.  Muitas  vezes,  pelo  fato  de  o  professor 
trabalhar com as ideias, tem a impressão de que não é trabalhador, de que não pertence à mesma 
classe  dos  demais.  Daí  a  importância  de  se  reconhecer  como  trabalhador,  como  membro  da 
mesma  classe,  com  a  “missão”  de,  por  intermédio  do  trabalho  que  realiza,  contribuir  para  a 
compreensão da sociedade e superação de sua própria condição social, assim como, do conjunto 
da classe trabalhadora. 
Enfim,  o  professor  é  um  trabalhador  que  se  especializou  na  arte  de  ensinar/aprender  e, 
assim como os demais trabalhadores, deve realizar seu trabalho da melhor maneira possível, nas 
condições  em  que  se  encontra.  Para  isso,  não  pode  se  dar  ao luxo  de  fazê‐lo  de  qualquer  jeito, 
confiar apenas na sua experiência, nos seus anos de trabalho, na sua própria sorte.  
Como profissionais da educação realizam um tipo de trabalho de certa forma privilegiado 
que,  ao  mesmo  tempo,  permite  que  os  educandos  tenham  acesso  ao  saber  científico 
                                                           
14
 MARX, K. Introdução à crítica da filosofia do direito de Hegel. in: MARX, K. A questão judaica. 5ª edição, São Paulo: 
Centauro, 2000, p. 94. 
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historicamente acumulado e fazer a crítica radical do conhecimento e da própria sociedade que o 
produz.  Dependendo  da  forma  como  for  realizado,  o  trabalho  pode  revelar  a  própria  condição 
existencial  dos  trabalhadores  em  educação  e  também  dos  demais  trabalhadores,  possibilitando 
identificar‐se  como  pertencentes  a  uma  classe,  à  classe  trabalhadora.  O  reconhecimento  dos 
trabalhadores em geral e dos da educação como classe e o reconhecimento das condições a que 
esta  classe  está  submetida,  exige  que,  por  meio  do  trabalho  que  realizam,  contribuam  para  a 
superação de sua condição.  
No mínimo seria um contra‐senso os trabalhadores da educação fazerem de conta que esta 
é  uma  instância  neutra  e  limitarem‐se  à  sua  própria  reprodução.  Quando  esta  compreensão  se 
generalizar, quando  a  classe  trabalhadora  compreender  isto, quando  sua  consciência  for  tal que 
não  mais  aceite  sua  condição  de  explorado  e  de  classe,  ela  própria  se  transformará  na  força 
material que deporá as estruturas que a produzem e construirá as condições para humanização do 
homem.  Cabe  ao  professor,  por  meio  do  trabalho  que  realiza,  portanto,  ajudar  a  preparar  o 
alunos,  que  em  sua  maioria,  também  são  trabalhadores,  para  uma  nova  sociedade;  a  ajudar  ao 
aluno transitar do estado de consciência alienada para a superação de seu estado de classe; servir 
de ponte entre a realidade atual e a que se quer construir. 
Os  três  exemplos  acima,  apesar  de  reforçarem  o  papel  da  luta  organizada  para  educar  e 
transformar  a  sociedade  não  desprezam  a  educação  escolarizada,  mesmo  que  dentro  de  suas 
limitadas  possibilidades,  dado  o  caráter  dependente  em  relação  às  demais  estruturas  sociais. 
Tanto  a  Comuna  de  Paris,  quanto  as  Madres  da  Praça  de  Maio  como  os  sem‐terra  trataram  de 
construir  suas  próprias  escolas  e  elaborar  suas  próprias  propostas  educacionais,  adequando‐as, 
porém, às suas concepções e aos seus projetos de mundo e de sociedade.  
Em  suma,  ou nos  organizamos  e lutamos  pela  transformação  da  sociedade  ou  então  não 
teremos uma educação de novo tipo, nem construiremos um homem novo. 
 

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IX SEMINÁRIO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS “HISTÓRIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO NO BRASIL”
Universidade Federal da Paraíba – João Pessoa – 31/07 a 03/08/2012 – Anais Eletrônicos – ISBN 978-85-7745-551-5

 
Referências 
 
MARX, K & ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. In: Revista de Estudos Avançados da USP. São Paulo: Vol. 12, 
nº 34, set./dez., 1998. 
 
MARX,  K.  Prefácio à  “Contribuição  à  Crítica da  Economia  Política”.  In:  MARX,  K  & ENGELS,  F. Obras Escolhidas.  São 
Paulo: Alfa‐Omega, s/d. 
 
________. Introdução à crítica da filosofia do direito de Hegel. In: MARX, K. A questão judaica. 5ª edição, São Paulo: 
Centauro, 2000. 
 
________. Teses sobre Feuerbach. In: A ideologia alemã. Lisboa: edições avante, 1981, p. 104. 
 
ORSO, José Paulino. As possibilidades e os limites da educação. In: ORSO, José Paulino. A Comuna de Paris de 1871: 
história e atualidade. São Paulo: Editora Ícone, 2002.  
 
 
 

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