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Em Camões, coexistiu a poesia tradicional, com uma poesia cujos modelos formais e temáticos revelam a cultura
humanística e clássica do poeta. A estas influências juntou-se ainda a sua própria experiência de vida.
Petrarca e Dante são os seus principais mestres.
Influências:
A obra lírica camoniana é marcada por uma dualidade: porum lado a poesiade carácter trovadoresco dos cancioneiros,
por outro, as novas composições introduzidas pelo Renascimento.
Influência da Tradição Lírica - Por influência tradicional, fez uso da medida velha e cultivou o verso de cinco
sílabas métricas (redondilha menor) e de sete sílabas métricas (redondilha maior), escrevendo vilancetes,
cantigas, esparsas, endechas ou trovas. As temáticas tradicionais e populares usadas por Camões são
geralmente mais ingénuas e graciosas e versam, sobretudo, o amor, natureza, o ambiente palaciano e a
saudade.
Influência Renascentista - Da influência clássica Renascentista, Camões cultivou a medida nova fazendo uso
do verso decassílabo, através do soneto (composto por duas quadras e dois tercetos) introduzido em Portugal
a partir do séc. XVI. Nas temáticas de influência Renascentista cultivou o amor platónico (amor ideal e
inacessível), a saudade, o destino, a beleza suprema, a mulher vista à luz do Petrarquismo e do Destino
(retrato idealizado da amada, cuja beleza física e qualidades morais e psicológicas resultam num quadro
perfeito, quase celestial), a mudança, a brevidade da vida e o desconcerto do mundo.
Temáticas:
A sua poesia é sustentada em polos antagónicos: mulher ideal e perfeita/mulher feiticeira; amor espiritual/amor
sensual; humildade/orgulho; inocência/sentimento de culpa; natureza como espelho da alma/natureza contrastante
com o estado de alma.
O amor - amor físico vs amor platónico; a divisão interior do sujeito poético causada pelo conflito
amoroso; o poder transformador do amor e os seus efeitos contraditórios. O amor é um sentimento
contraditório; algo indefinido e capaz de provocar efeitos contraditórios no sujeito poético. Fonte de
desconcerto emocional, é ao mesmo tempo:
2) Causa de uma dor constante (Dimensão disfórica), sobretudo: quando o simples amor espiritual não
consegue satisfazer o poeta que busca algo mais físico; quando a sua amada está ausente e as
saudades aumentam ao ponto de transformar a própria visão que outrora tinha da natureza e da sua
beleza; quando tem de se separar dela; quando os olhos claros da amada o tomam descuidado, tal
como se fosse um passarinho; quando a amada é indiferente ao seu sofrimento.
A mulher - retrato da mulher perspetivada na conceção de Petrarca e Dante; a amada surge umas vezes
como ser angélico, outras como ser maléfico; a mulher ideal é inacessível e intocável:
1) Uma mulher cuja idealização e exaltação da beleza denuncia a clara influência petrarquista. A mulher é
o reflexo da beleza divina, é a ponte para a perfeição do amador. Por isso, não é retratada com traços
físicos precisos – a sua beleza reside sobretudo no olhar, na postura “humilde” e na bondade.
O seu retrato é, sobretudo, psicológico e moral. Ela é a perfeição e a pureza. O sujeito poético regista
mais a impressão que a sua beleza causa do que a beleza em si.
Esta é a causa frequente do fascínio do sujeito lírico e da sua elevação a um estado espiritual superior,
mas também causa de dor e de sofrimento, sobretudo quando a imagem feminina não se adequa às
necessidades físicas e reais do sujeito poético.
A Natureza – encarada como fonte de recursos expressivos, sempre ligada à poesia amorosa; o locus
amoenus. A natureza aparece na lírica camoniana como:
1) Uma natureza alegre, serena, luminosa, perfumada, em que avultam o verde, o cristal das águas
límpidas, os frutos saborosos e as flores - onde se vivem sentimentos amorosos -;
4) Como cenário que se transforma diante da triste saudade do sujeito poético e que lhe provoca
mesmo aborrecimento e lhe intensifica a dor da saudade.
A saudade - faz sofrer mas inspira; a ausência da amada é insuportável e divide o sujeito poético.
O destino - é sobretudo na sua vida amorosa que Camões sente a presença maléfica do destino:
tentando lutar contra a má fortuna, o sujeito poético recorda, muitas vezes o bem passado.
Variedade formal:
Trabalhou quase todos os géneros restaurados:
Influência tradicional - vilancete, cantiga, esparsa, trova;
Influência clássica/renascentista - soneto, canção, ode, elegia, écloga.
Verso:
Medida velha - verso de 5 sílabas métricas (redondilha menor) e verso de 7 sílabas métricas (redondilha
maior);
Medida nova - verso decassílabo com acento na 6ª e 10ª sílabas (heroico) ou na 4ª, 8ª e 10ª sílabas (sáfico).
Linguagem e estilo:
Adjetivação expressiva;
Pontuação emotiva (exclamações, interrogações);
Expressividade de tempos e modos verbais;
Uso de vocabulário erudito (académico, adquirido através do estudo, oposto avocabulário popular);
Recurso à mitologia;
Predomínio de metáforas, apóstrofes, hipérboles, anáforas, hipérbatos, etc.
Alternância entre ritmo rápido e lento.
Em suma:
Momentos estruturais do poema e linhas de força dominantes ao longo da sua poesia:
Reflexão sobre a sua existência;
Invocação às forças ativas na sua desgraça;
Considerações sobre o poderdo Amor;
Apelo à mulher amada.
Os Lusíadas
Narrativa épica que faz uma leitura mítica da História de Portugal. Em estilo elevado, canta uma ação heróica passada
e analisa os acontecimentos futuros, cuja visão os deuses são capazes de antecipar.
Herói coletivo - o povo português, os seus feitos gloriosos e acontecimentos históricos mais significativos;
Epopeia do início do Império (séculos XVI, 1572) - narrativa em verso, com características clássicas a nível da
estrutura e do estilo, que narra os feitos grandiosos de um herói com interesse para toda a Humanidade:
A recompensa - os heróis têm acesso à Ilha dos Amores, prémio simbólico da heroicidade conquistada;
Traduz as façanhas e o espírito do povo português (capaz de trazer ao conhecimento da Europa e da Humanidade
povos desconhecidos, lugares ignorados e inóspitos e os caminhos marítimos para ligar os cinco continentes). Os
Lusíadas não contam apenas a viagem marítima e a História portuguesa, mas revelam também, o espírito do homem
da Renascença que acredita na experiência e nar azão. A Ilhados Amores é, no fim da obra, o símbolo da capacidade
dos Portugueses na exploração dos mares, graças às experiências marítimas e ao seu espírito de aventura, mas
igualmente, à sua vontade indómita de conhecer e estabelecer harmonia no planeta, aproximando o Oriente e o
Ocidente.
O poeta pretende conceder, através desta obra, o direito à imortalidade dos nautas portugueses pelos seus feitos
históricos.
Estrutura externa:
10 cantos; Oitavas; Versos decassilábicos; Esquema rimático: ABABABCC
4 Planos: do poeta; da viagem; da mitologia; da história de Portugal
Estrutura interna
Introdução
Proposição
Invocação às Tágides, a Calíope, às ninfas do Tejo e do Mondego e de novo a Calíope
Dedicatóriaa D. Sebastião
Desenvolvimento
O destino profético:
Profecias de Júpiter (cantos I e II)
Profecias no Consílio dos Deuses marítimos (c. VI)
Profecias na Ilhados Amores (c. X)
A História de Portugal - ação secundária (encaixada na Viagem e narrada por Vasco da Gama/Paulo Gama) -
Discursos que relatam episódios passados relativamente ao curso da viagem
Género lírico:
a fragilidade da vida humana(c. I)
as lamentações do poeta - face aos que desprezam a poesia(c. V)
o valor da glória (c. VI) e o poder do ouro (c. VIII)
a exortação aos que aspiram à imortalidade (c. IX), ao rei e às futuras glórias (c. X)
a crítica à sociedade do seu tempo - materialismo, corrupção, injustiça...
Plano da viagem: constitui a ação central relacionada com a descoberta do caminho marítimo para a Índia, chefiada
por Vasco da Gama.
Plano mitológico: intervenções dos deuses do Olimpo na viagem, em alternância com a ação principal.
Plano das reflexões do poeta: considerações de Camões, normalmente no final de cada canto, fazendo várias críticas
(nomeadamente à ignorância, desprezo pela cultura, ambição desmensurada, poder tirânico, hipocrisia, exploração
dos pobres, poder corrupto do ouro), e defendendo um modelo de homem ideal que ganhará o direito a ser recebido
na Ilha de Vénus.
Episódios
Episódio - é uma pequena narrativa, com introdução, desenvolvimento e conclusão, que se relaciona diretamente com
a trama principal, contribuindo para enriquecê-la ou até mesmo explicá-la.
Surgem inseridos na narrativa central como forma de embelezar o texto, quebrar a monotonia, dar dinamismo e
enriquecer a obra.
1) Episódios Mitológicos
Consílio dos Deuses no Olimpo – os deuses reúnem-se no Olimpo para decidir o destino dos portugueses.
Pedido de Vénus a Júpiter – Vénus intercede junto de Júpiter, a favor dos portugueses.
Consílio dos Deuses marinhos – Baco consegue convencer os deuses marinhos a provocarem uma tempestade
para afundar a armada portuguesa.
Várias intervenções de Vénus e Baco
2) Episódios Bélicos
Batalha de Ourique – relato histórico da Batalha de Ourique, travada contra os mouros, durante o reinado de D.
Afonso Henriques.
Batalha do Salado – D. Afonso IV intercede a favor de Castela, que havia sido invadida pelos Mouros.
Batalha de Aljubarrota – Batalha travada contra o Rei de Castela, que pretendia tomar o reino português.
Portugal sai vencedor graças à bravura de D. João, Mestre de Avis e de D. Nuno Álvares Pereira.
3) Episódios Líricos
Formosíssima Maria – filha de D. Afonso IV e rainha de Castela, apela a seu pai que auxilie Castela, na luta contra
os Mouros.
Inês de Castro – relato da morte de D. Inês de Castro, amante de D. Pedro, que é condenada à morte por D.
Afonso IV.
Fogo de Santelmo – relato de um fenómeno meteorológico natural, que ocorre durante aviagem. Consiste numa
descarga elétrica luminosa.
Tromba Marítima – relato de um fenómeno meteorológico semelhante a um tornado, mas de menor dimensão.
O escorbuto – relato da doença que assola a tripulação, matando um número muito elevado de marinheiros.
A Tempestade – relato da tempestade que se abate sobre a armada de Vasco da Gama, durante o Consílio dos
Deuses Marinhos. A tempestade termina graças à intervenção de Vénus, que solicita a ajuda das "ninfas
amorosas".
5) Episódios Simbólicos
Sonho profético de D. Manuel – D. Manuel tem um sonho profético com os sucessos e perigos dos portugueses
no Oriente. Este sonho incentiva D. Manuel a enviar Vasco da Gama e a sua armada em busca do caminho
marítimo para a Índia.
Velho do Restelo – No dia da partida da armada, um velho surge no cais e fala sobre os Descobrimentos. É a voz
do bom senso, que adverte para o perigo de tal empreendimento.
O Gigante Adamastor – na passagem pelo Cabo das Tormentas (posteriormente apelidado de Cabo da Boa
Esperança), os portugueses são confrontados com o Gigante Adamastor, que ameaça a continuação da viagem.
O Gigante simboliza o medo do desconhecido.
A Ilha dos Amores – no regresso a Portugal, Vasco da Gama e a sua armada são conduzidos à Ilha dos Amores.
Esta é uma ilha de deleites e considerada a recompensa pelo esforço e coragem de um povo. Aqui, Tétis mostra
a Gama a Grande Máquina do Mundo e o futuro do povo português. Simboliza o sonho, a recompensa, a
imortalidade (o Homem ascende ao lugar dos deuses).
As personagens:
do plano da viagem: Vasco da Gama
do plano mitológico: Júpiter, Vénus,Baco
do plano da História: D. Afonso Henriques, D. Afonso IV, Inês de Castro, D. Manuel, Adamastor, Velho do
Restelo.
Padre António Vieira "Sermão de Santo António aos Peixes"
Objetivos do Sermão:
Esta obra foi proferida na cidade de São Luís do Maranhão, no ano de 1654, no decorrer de uma disputa com os
colonos portugueses no Brasil. O sermão constitui um documento de imaginação, habilidade oratória e poder de
satirização do Padre António Vieira.
O sermão tem como objetivo louvar algumas virtudes do homem, mas principalmente censurar os vícios dos colonos
(“peixes grandes que comem os pequenos”). Para isto, o padre toma vários peixes como símbolos: roncador (o
orgulhoso), voador (o ambicioso), pegador (o parasita) e o polvo (o traidor, mais traidor que o próprio Judas).
Este sermão, foi pregado no dia 13 de junho (Dia de Santo António) três dias antes de Padre António Vieira embarcar
ocultamente (a furto) para Portugal, para obter uma legislação justa para os índios.
É todo ele composto por alegorias (metáforas e comparações utilizadas para concretizar um pensamento ou uma
realidade abstrata), pois os peixes são a personificação dos homens.
Estilo:
O estilo de Padre António Vieira remete para uma vertente medieval que assenta na alegoria, mas também para o
barroco.
Barroco: o sermão insere-se no Barroco, que se caracteriza pela utilização de contrastes, pelo pessimismo, pela
presença de impressões sensoriais, pela preocupação com a duração da vida, pela linguagem erudita e trabalhada e
pela tentativa da conciliação entre a religião e o racional. É associado a exageros quer na linguagem, quer na
transmissão de ideias e pensamentos e quer também na arte.
Desta forma, nos seus sermões convivem o concetismo e o cultismo da arte barroca, na técnica do docere, do
delectare e do movere.
Para esse desempenho usou: polissíndetos, assíndetos, sinédoques, comparações, anástrofes, exclamações,
trocadilhos, paralelismos anafóricos, antíteses e anáforas.
Estrutura:
Introdução (Exórdio ou Intróito – ideia sumária da matéria que vai ser tratada)
CAPÍTULO I
Apresentação do tema, a partir do versículo de São Mateus, “Vós sois o sal da terra”, referente aos pregadores, cuja
função é “salgar”, ou seja, pregar a boa doutrina, e verificando que a terra “não se deixa salgar”, porque se
encontradominadapelacorrupção. Vieiravai pregaraos peixes, àmaneirade Santo António, que aeles pregou, pornão
ter sido atendido pelos homens.
Apresentação do tema, partindo do conceito: Vosestis sol terrae (vós sois o sal da terra);
Exploração do tema;
O capítulo começa com um conceito predicável (Vós sois o sal da terra), seguindo-se a descrição da corrupção
que se faz viver na Terra. É nos explicada a função do sal (impedir a corrupção) e é feita uma referência clara
aos padres e pregadores (aqueles que têm o ofício do sal). É nos então colocada a questão “qual a causa da
corrupção?”. Segue-sepois um trocadilho de questões, tais como: “Será a terra que não se deixa salgar (os
ouvintes não querem ouvir), ou será que os pregadores não pregam a verdadeira doutrina? Ou porque os
ouvintes a ouvem, mas não praticam o que lhes é ensinado, ou porque o pregador prega a si e não a Cristo. Ou
ainda, que os ouvintes ouvem, mas não servem a Cristo, antes sim aos seus apetites.”
É então explicado que, se o sal não salga a terra, é porque o pregador não prega a verdadeira doutrina e por
isso deve ser lançado fora como um inútil e ser pisado por todos. E à terra que não se deixa salgar, deve-se
seguir o exemplo de Santo António quando pregou contra os hereges em Itália: mudar de auditório. E é isto
que faz o padre António, à semelhança de Santo António, mudando de auditório, escolhendo como ouvintes os
peixes ao invés dos homens, que se recusam a ouvi-lo. O pregador invoca no final Nossa Senhora porque era
habitual fazê-lo nesta época, ainda mais porque Maria quer dizer Senhora do Mar.
CAPÍTULO II
Proposição - apresentação do assunto do sermão
Início da alegoria
Divisão
CAPÍTULO III
Louvores em geral e em particular.
Louvores em geral: “Ao menos têm os peixes duas qualidades de ouvintes: ouvem e não falam (…).”
No entanto são os únicos animais que não se deixam domesticar - não se deixam converter.
Início da confirmação
Louvores em particular: peixe Tobias, rémora, torpedo, quatro-olhos.
Virtudes em geral:
São obedientes, ouvem e não falam;
Foram os primeiros animais aserem criados;
São os mais numerosos e volumosos;
Não são domesticáveis, presos, virgens.
Virtudes em particular:
CAPÍTULO IV
Primeira repreensão dos peixes em geral:
1) A ictiofagia (os peixes comem-se uns aos outros)
2) Amplificação darepreensão (os maiores comemos mais pequenos)
3) Estes são comparáveis ao Homem: "Ao morto, come-o o herdeiro, come-o o testamenteiro, come-o o
legatário, o médico, o sangrador, a viúva, o coveiro, o que tange os sinos, o que lhe canta e o que o enterra. Enfim,
ainda o pobre defunto o não comeu a terra e por toda a terra já foi comido"
Ato I
Passa-se numa “câmara antiga com todo o luxo e caprichosa elegância do século XVII”, no palácio de Manuel de
Sousa Coutinho, em Almada.
Este espaço elegante pretende corresponder à felicidade e harmonia familiar que aí se vive.
Cena I a II
Madalena lê o episódio de Inês de Castro dos Lusíadas. Este permite fazer a analogia entre amores de D. Pedro e D.
Inês e de Madalena e de Manuel Sousa Coutinho. Nas duas histórias existe a pureza e a intensidade amorosa e a
morte ou separação dos amantes.
Madalena com 13 anos casou-se com D. João de Portuga, que integrou o exército liderado por D. Sebastião, na
batalha de Alcácer Quibir a 4 de Agosto de 1578. D. João de Portugal desapareceu na batalha, mas como o seu corpo
nunca foi encontrado, Madalena ordenou buscas com o objetivo de o encontrarem. Essas buscas duraram sete anos,
após os quais se casou com Manuel Sousa Coutinho com quem tem uma filha, Maria.
D. Madalena pede a Telmoque não faça nenhuma referência junto de Maria a possibilidade do regresso de D.
Sebastião que desapareceu na batalha de Alcácer Quibir. D. Madalena pretende proteger a sua filha da dúvida que
ensombra a sua família, uma vez que o regresso de D. João de Portugal implicaria o fim do seu casamento com
Manuel de Sousa Coutinho e a desonra da sua filha.
Cena III a IV
É feito o retrato físico e psicológico de Maria.
Retrato físico: aspeto frágil; é doente havendo várias referências a sua saúde frágil. Teria provavelmente tuberculose,
(séc. XIX)
doença comum na época da produção/escrita da obra. Lema das características atribuídas aos doentes era
extraordinária capacidade auditiva. Maria era capaz de ouvir sons que mais ninguém conseguia ouvir.
Retrato psicológico: é perspicaz, possuí uma intuição premonitória (prevê o futuro), que é alimentada pelos sonhos
e pelas deduções a partir do que vê, do que ouve e do que lê. É corajosa e destemida, idealista, utópica.
Cena VI
A entrada de Manuel de Sousa Coutinho desencadeia os seguintes acontecimentos: É dada como certa a vinda dos
governadores de Lisboa para Almada, concretamente, para casa de Manuel de Sousa Coutinho; É transmitida a
decisão que este tomou em relação à saída da família daquela casa; É dada a informação de que sairão naquela noite
para a casa que tinha pertencido a D. João de Portugal.
Ato II
Acontece “no palácio que fora de D. João de Portugal, em Almada; salão antigo, de gosto melancólico e pesado, com
grandes retratos de família…”.
Cena I a III
Maria cita o início da novela “Menina e moça”, de Bernardim Ribeiro autor do século XVI. A Frase citada por Maria
pode ser um indício de que situação semelhante pode acontecer com ela “Menina e moça me levaram de casa dos
meus pais”.
Maria entusiasma-se na descrição do incendio do palácio de seu pai, considerando-o um espetáculo bonito e, para
além disso, sente-se orgulhosa da atitude de seu pai. Ao contrário,
D. Madalena ficou aterrorizada pois no incendio perdeu o retrato do marido e pensa que essa perda é apenas um
prenúncio de desgraça maior.
Durante a conversa com Telmo, Maria identificou o retrato de D. Sebastião e de Luís Camões. Telmo não quer que
Maria conheça a identidade do terceiro retrato porque se trata de D. João de Portugal.
É Manuel de Sousa Coutinho que revela a identidade do retrato, caracterizando-o como alguém nobre e corajoso.
Cena IV a VIII
Maria quer ir com o pai a Lisboa, pois deseja visitar a Sóror Joana de Castro, uma freira, de comum acordo com o
marido decidiu separar-se indo cada um para o seu convento.
Embora num primeiro momento tenha mostrado relutância em leva-la devido a peste existente em Lisboa, Manuel
de Sousa Coutinho decidiu fazer a vontade a filha por considerar que ela precisava de respirar outros ares, alegrar-
se um pouco e fugir ao clima pesado do palácio.
Madalena fica assustada e ansiosa com a ida do marido e da filha a Lisboa porque está com receio de os perder.
Mostra também que não está de acordo com a atitude da Sóror Joana (deixar tudo e professar numa ordem religiosa).
Telmo procura acalmar D. Madalena, dizendo-lhe que a peste já tinha acabado e que Manuel já não seria preso por
ter negado acolhimento aos governadores incendiando o seu palácio.
A calma de D. Madalena dura pouco quando sabe pelo marido que é sexta feira, dia azarado para ela e que ficará
sozinha no palácio com Frei Jorge.
Cena IX a X
Frei Jorge está preocupado porque, ao ver a angústia dos seus familiares, sente que está a ser contagiado por ela.
D. Madalena teme que aquele dia lhe traga alguma desgraça porque foi numa sexta feira que D. Sebastião
desapareceu em Africa, foi nesse dia da semana que casou com D. João de Portugal e foi ainda numa sexta feira
Manuel de Sousa Coutinho. Ela considera que cometeu um bravo pecado quando viu Manuel de Sousa Coutinho e
se apaixonou por ele porque ainda estava casada com D. João de Portugal e foi como se o tivesse traído.
Cena XI a XV
A partida de Manuel de Sousa Coutinho para Lisboa deixa D. Madalena ansiosa e, por isso, esta pede a Miranda
(criado) que esteja atento ao regresso de seu marido.
Miranda informa D. Madalena e Frei Jorge que um Romeiro vindo da Palestina lhe trazia um recado e, somente a ela
o podia entregar.
Depois de alguma hesitação, D. Madalena recebe o Romeiro, ficando a saber que este esteve cativo na Palestina
durante vinte anos, onde sofreu maus tratos e passou fome, que não tem filhos, a família julga-o morto e conta
apenas com um único amigo. O Romeiro diz a D. Madalena que deve a sua liberdade a outro cativo, de quem não
sabe o nome e que lhe pediu que entregasse um recado a D. Madalena.
Perante as afirmações do Romeiro Frei Jorge pede-lhe que identifique o emissor do recado, nos quadros que estavam
na sala. O Romeiro aponta para o retrato de D. João de Portugal, o que faz com que D. Madalena saia da sala
aterrorizada.
À pergunta de Frei Jorge, o Romeiro identifica-se como sendo ninguém.
Ato III
Passa-se na capela, que se situa na “na parte baixa do palácio de D. João de Portugal”. “É um casarão vasto sem ornato
algum”.
O espaço simboliza e carateriza o mundo da espiritualidade em que os bens materiais não fazem sentido.
Cena I a II
Manuel de Sousa Coutinho sente-se desesperado, infeliz e revoltado devido ao regresso de D. João de Portugal. Sente
que cometeu um grave erro que tem que ser reparado e que o vai separar da mulher e da filha.
Perante a situação trágica em que a família se encontra, Manuel de Sousa Coutinho está indeciso sobre o destino
que quer para sua filha. Por outro lado, deseja que ela viva, pois Maria não tem culpa dos erros dos pais, é apenas
uma vítima dos seus pecados; Por outro lado, sabe que, caso ela viva vai ser muito infeliz porque a sociedade irá
desprezar.
Cena III a IV
Telmo debate-se com grande dilema. Após a partida para a guerra de D. João de Portugal, Telmo sentiu sempre o
desejo forte do seu regresso. Depois do nascimento de Maria, afeiçoou-se de tal modo preferia não ver mais D. João
de Portugal. Com o seu regresso, Telmo sabe que Maria não resistirá.
Cena V a VI
Telmo pede a Deus que conserve a vida de quem ajudou a criar e o Romeiro pensa que esta prece é a seu favor, pois
também a ele Telmo o criou.Além disso, ainda não sabe da existência de Maria.
Na conversa com Telmo, D. João de Portugal consta que o seu regresso não é bem vindo e que causará infelicidade
então, ordena a Telmo que vá dizer a D. Madalena que o Romeiro era um impostor, um enviado dos inimigos de
Manuel de Sousa Coutinho e que já tinha ido embora D. João de Portugal toma esta atitude para não manchar o
nome de D. Madalena e também a sua honra. Confessa que o seu regresso foi imprudente, injusto e cruel.
Cena VIII a X
Ao constatar que as noticias a cerca de D. João de Portugal irão dissolver o seu casamento e desonra-la a ela e a filha,
D. Madalena tenta convencer-se de que se precipitou ao acreditar nas palavras de um vagabundo que ninguém
valoriza as suas desconfianças, ainda que contrariada, aceita o seu destino.
D. Madalena e Manuel de Sousa Coutinho tomam a mesma atitude de Sóror: entrar para um convento. No entanto,
ao contrário desta, D. Madalena foi forçada a faze-lo.
Cena XI e XII
Durante a cerimónia religiosa em que D. Madalena e Manuel de Sousa Coutinho tomam o hábito, Maria surge
desesperada e muito debilitada, culpabilizando D. João de Portugal, a quem apelida de “O outro”, pela desgraça que
se abateu sobre a sua família.
Maria quando ouve a voz do Romeiro (D. João de Portugal) morre, a cerimónia religiosa prossegue.
Os Maias
Romance onde, através do fio condutor da família Maia, se vê Portugal através três gerações diferentes tanto cultural
como historico-politicamente: desde o avô do protagonista, Afonso, até ele mesmo, Carlos. Neste romance são
desfiladas três histórias individuais diferentes:
a de Afonso da Maia;
a de Pedro da Maia, seu filho;
a de Carlos da Maia, filho de Pedro e neto de Afonso.
Admitindo que Carlos da Maia é o protagonista, e que toda a narrativa gira à volta do seu caso, podemos organizar o
romance como se segue:
As origens de Carlos - o Ramalhete; histórias de Afonso e de seu filho Pedro (Cap. I e II);
A educação de Carlos (Cap. III e IV);
Vida em Lisboa até ao encontro com Maria Eduarda (Cap. V);
O idílio, com projetos de vida em comum (Cap. XII e XIII);
A verdadeira identidade de Maria Eduarda (Cap. XIV a XVII);
Epílogo da tragédia - Carlos como vencido da vida (Cap. XVIII).
Podemos ainda induzir este resumo a uma versão reduzida, em que se traduzem as traves mestras do drama:
A história de Carlos até ao seu encontro com Maria Eduarda (Cap. I a XI);
O idílio entre ambos (Cap. XII e XIII);
A tragédia do incesto e as suas consequências para ambos (Cap. XIV a XVIII).
Esta é uma estrutura do romance enquanto realização do desígnio de Eça de estudar uma "paixão ou drama
excecional", no caso do incesto.
Estrutura trágica:
Momentos da tragédia:
1) peripécia – mudança súbita e radical do curso dos acontecimentos;
2) reconhecimento - revelação de dados novos;
3) catástrofe - desenlace com punição, geralmente morte física ou moral
Presença do destino
Presságios
Temática do incesto
Personagens:
Pedro da Maia (Personagem naturalista) - Apresentado pelo narrador na infância e adolescência, apresenta uma
enorme instabilidade emocional que deixa entrever uma mente pouco equilibrada, fruto da hereditariedade não
corrigida pela educação (fraco como a mãe e fruto de uma educação portuguesa). Alia a valentia física à cobardia
moral (o suicídio face à fuga da mulher);
Carlos da Maia (Personagem realista) - Rico, bem educado, adivinha-se culto, de gostos requintados, e é o resultado
de uma educação à inglesa, em contraposição à figura de Pedro (seu pai). Não teme o esforço físico, é corajoso e
frontal - forte como os Maias. Sofre, no entanto, de diletantismo (é incapaz de se fixar num projeto sério).
Maria Eduarda (Personagem híbrida) - Bondosa, culta e requintada no gosto. Herda a beleza da mãe, resulta de uma
educação de convento e vem de um meio ambiente decadente e boémio.
Afonso da Maia - A personagem mais duradoura no romance: a sua figura acompanha toda a história, enquanto que
a figura de Carlos só entra verdadeiramente em cena depois de esgotada a história de Pedro (Cap I e II). Homem de
carácter, culto e requintado. Partidário das ideias liberais, ama o progresso. Tem altos e firmes princípios de que não
abdica.
Maria Monforte - "Pobre, formosa, doida, excessiva. " - Pobre apenas na fase final da vida, é nela que radicam
todas as desgraças da família Maia (pelo menos o drama em causa, note-se que faz o mal não por maldade mas por
paixão).
A obra está repleta de figurantes, usados por Eça para representar os defeitos caracterizadores da sociedade da
segunda metade do séc. XIX.
RESUMO DO ROMANCE
No Outono de 1875 fixa-se em Lisboa Afonso da Maia e o seu único neto, Carlos, que após se ter formado em medicina,
regressade uma longa viagem e traz grandes projetos de trabalho profissional.
Carlos era o último descendente dos Maias. Após o casamento de seu pai, Pedro da Maia, (contra a vontade de Afonso)
com a negreira Maria Monforte, de quem tem dois filhos (um menino e uma menina), a esposa acabaria por o
abandonar para fugir com um Napolitano, levando consigo a filha, de quem nunca mais se soube o paradeiro. Carlos
da Maia viria a ser entregue aos cuidados do avô, após o suicídio de Pedro da Maia.
Carlos passa a infância com o avô, formando-se depois, em Medicina em Coimbra. Carlos regressa a Lisboa, ao
Ramalhete, após a formatura, onde se vai rodear de alguns amigos, como o João da Ega, Alencar, Dâmaso Salcede,
Palma de Cavalão, Euzébiozinho, o maestro Cruges, entre outros. Seguindo os hábitos dos que o rodeavam, Carlos
envolve-se com a Condessa de Gouvarinho, que depois irá abandonar. Um dia fica deslumbrado ao conhecer Maria
Eduarda, que julgava ser mulher do brasileiro Castro Gomes. Carlos seguiu-a algum tempo sem êxito, mas acaba por
conseguir uma aproximação quando é chamado a Maria Eduarda para a visitar, como médico da governanta.
Começam então os seus encontros com Maria Eduarda, visto que Castro Gomes estava ausente. Carlos chega mesmo
a comprar uma casa onde instala a amante.
Castro Gomes descobre o sucedido e procura Carlos, dizendo que Maria Eduarda não era sua mulher, mas sim sua
amante e que, portanto, podia ficar com ela.
Entretanto, chega de Paris um emigrante, que diz ter conhecido a mãe de Maria Eduarda e que a procura para lhe
entregar um cofre destaque, segundo ela lhe disse, continha documentos que identificariam e garantiriam para a filha
uma boa herança. Essa mulher era Maria Monforte – a mãe de Maria Eduarda era, portanto, também a mãe de Carlos.
Os amantes eram portanto irmãos.
Contudo, Carlos não aceita este facto e mantém abertamente a relação – incestuosa – com a irmã. Afonso da Maia, o
velho avô, ao receber a notícia morre de desgosto. Ao tomar conhecimento, Maria Eduarda, agora rica, parte para o
estrangeiro; e Carlos, para se distrair, vai correr o mundo. O romance termina com o regresso de Carlos a Lisboa,
passados 10 anos, e o seu reencontro com Portugal e com Ega, que lhe diz: - "Falhámos a vida, menino!".
Cesário Verde
Características realistas:
Supremacia do mundo externo, da materialidade dos objetos; impõe o real concreto à sua poesia.
Predomínio do cenário urbano (o favorito dos escritores realistas e naturalistas).
Situa no espaço e no tempo as cenas apresentadas.
Atenção ao pormenor, ao detalhe.
A seleção temática: a dureza do trabalho; a doença e a injustiça social; etc.
A presença do real histórico: a referência a Camões e o contexto sociopolítico.
A linguagem burguesa, popular, coloquial, rica em termos concretos.
Poesia estimulada pelo real, que inspira o poeta, que se deixa absorver pelas formas materiais e concretas.
Características modernistas:
A poesia de Cesário Verde reflete acrise do naturalismo e o desencanto pela estética realista. Mais do que a
representação do real importa a impressão do real, que suplanta o real objetivo. A realidade é mediatizada pelo
olhardo poeta, que recria, a partir do concreto, uma super-realidade através da imaginação transfiguradora,
metamorfoseando o real num processo de reinvenção ou recontextualização precursora da estética surrealista.
Valoriza a sensação em detrimento do objeto real.
Características estilísticas:
A estrutura narrativa dos seus poemas possui uma estrutura deambulatória que configura uma poesia itinerante: a
exploração do espaço é feita através de sucessivas deambulações, numa perspetiva de câmara de filmar, em que se
vão fixando vários planos. É uma espécie de olhar itinerante e fragmentário, que reflete o passeio obsessivo pela
cidade (e também no campo em alguns poemas).
Características temáticas:
Oposição cidade/campo - sendo a cidade um espaço de morte e o campo um espaço de vida – valorização do
natural em detrimento do artificial. O campo é visto como um espaço de liberdade, do não isolamento; e a cidade
como um espaço opressor, símbolo da morte, da humilhação, da doença.
Oposição passado/presente - em que o passado é visto como um tempo de harmonia com a natureza, ao
contrário de um presente contaminado pelos malefícios da cidade.
A preocupação com as injustiças sociais - o poeta coloca-se ao lado dos desfavorecidos, dos injustiçados, dos
marginalizados e admira a força física, a pujança do povo trabalhador. Cesário interessa-se pelo conflito social do
campo e da cidade, procurando documentá-lo e analisá-lo, embora sem interferir.
O sentimento anti-burguês.
Binómio Cidade/Campo
O contraste cidade/campo é um dos temas fundamentais da poesia de Cesário e revela-nos o seu amor ao rústico e
natural, que celebra por oposição a um certo repúdio da perversidade e dos valores urbanos aque, no entanto,
adere.
A cidade personifica a ausência de amor e, consequentemente, de vida. Ela surge como uma prisão que
desperta no sujeito “um desejo absurdo de sofrer”. Éum foco de infeções, de doença, de morte. É um símbolo
de opressão, de injustiça, de industrialização, e surge, por vezes, como ponto de partida para evocações,
divagações
O campo, por oposição, aparece associado à vitalidade, à alegria do trabalho produtivo e útil, nunca como
fonte de devaneio sentimental. Aparece ligado à fertilidade, à saúde, à liberdade, à vida. A força inspiradora
de Cesário é a terra-mãe. O poeta encontra a energia perdida quando volta para o campo, anima-o,
revitaliza-o, dá-lhe saúde. O campo é, para Cesário, uma realidade concreta, observada tão rigorosamente e
descrita tão minuciosamente como a própria cidade o havia sido: um campo em que o trabalho e os
trabalhadores são parte integrante, um campo útil onde o poeta se identifica com o povo.
A oposição cidade/campo conduz simbolicamente à oposição morte/vida. É a morte que cria em Cesário uma
repulsa à cidade por onde gostava de deambular mas que acaba por aprisioná-lo.
Cidade Campo
Doença, estagnação, morte, ausência de afeto; Saúde, vitalidade, harmonia, vivência plena de
Vida marcada pela artificialidade epela afetos;
desumanidade; Vida marcada pela naturalidade e pelos ciclos
Progresso industrial e domínio da máquina, do ferro biológicos e comunitários do Homem;
e do betão. Agricultura e domínio do Homem e da Natureza;
Aprisionamento e opressão. Liberdade;
Exploração, pobreza, injustiça social. Valores tendencialmente igualitários e justiça social.
Domínio da burguesia (comercial e industrial). Afirmação do povo e dos valores rurais.
Mesmo na cidade emergem imagens e sugestões campestres, como que a lembrar a vocação do ser humano para
uma vida harmoniosa e natural, que só no campo se encontra e que a cidade desumaniza. Isto enfatiza a crítica
social e a oposição cidade/campo, e pode ser entendido como um convite à fuga para o campo.
Características formais:
As suas descrições têm pouco de poético – prosaísmo lírico –, pois procura explorar a notação objetiva e sóbria
das graças e dos horrores da vida da cidade ou a profunda vitalidade da paisagem campestre – características
de um realista.
Fernando Pessoa conta e chora a insatisfação da alma humana. A sua precariedade, a sua limitação, a dor de pensar,
a fome de se ultrapassar, a tristeza, a dor da alma humana que se sente incapaz de construir e que, comparando as
possibilidades miseráveis com a ambição desmedida, desiste, adormece “num mar de sargaço” e dissipa a vida no
tédio.
Os remédios para esse mal são o sonho, a evasão pela viagem, o refúgio na infância, a crença num mundo ideal e
oculto, situado no passado, a aventura do Sebastianismo messiânico, o estoicismo de Ricardo Reis, etc.. Todos estes
remédios são tentativas frustradas porque o mal é a própria natureza humana e o tempo a sua condição fatal. É uma
poesia cheia de desesperos e de entusiasmos febris, de náusea, tédios e angústias iluminados por uma inteligência
lúcida – febre de absoluto e insatisfação do relativo.
Fingimento Artístico:
Nova conceção de arte. A poesia está, não na dor experimentada ou sentida mas, no fingimento dela, apesar do
poeta partir da dor real “a dor que deveras sente”. Não há arte sem imaginação, sem que o real seja imaginado de
maneira a exprimir-se artisticamente e ser concretizado em arte. Esta concretização opera na memória a dor inicial
fazendo parecer a dor imaginada mais autêntica do que a dor real. Podemos chegar à conclusão de que há 4 dores:
a real (inicial), a que o poeta imagina (finge), a dor real do leitor e a dor lida, ou seja, intelectualizada, que provém
da interpretação do leitor.
A expressão dos sentimentos e sensações intelectualizadas (intelectualização dos sentimentos) são fruto de uma
construção mental, a imaginação impera nesta fase de fingimento poético. O fingimento é obtido com a junção de
vários fatores como: a intelectualização dos sentimentos, a despersonalização (fragmentação do eu) e a grande
capacidade de dramatização do poeta.
O pensamento e a sensibilidade são conceitos fundamentais na ortonímia, o poeta brinca intelectualmente com as
emoções, levando-as ao nível da arte poética.
O poema resulta, então, de algo intelectualizado e pensado .O fingimento está, pois, em toda a arte de Pessoa. O
Saudosismo que se encontra na obra de Pessoanão é mais do que “vivências de estados imaginários”. Pessoa conclui
que o poeta é um fingidor tal como um racionalizador de sentimentos.
Fragmentação do eu:
Pessoa adquire uma grande capacidade de despersonalização, permitindo-lhe a heteronímia (criar diferentes
personalidades), possibilitando-lhe exprimir estados de alma e consciência distintos. Permite assim expressar
melhor a apreensão da vida, do Ser e do mundo, de modo a "sentir tudo de todas as maneiras" (experienciar todas
as possibilidades do "eu" e atingir o mundo inteligível). A fragmentação do eu e o fingimento artístico estão
fortemente interligados.
Motivos poéticos:
Sentimentos dominantes:
tédio
angústia existencial
náusea
melancolia
frustração
ânsia
ceticismo
desejo de evasão
saudade
A poesia ortonímica, ora segue, formalmente, os modelos da poesia tradicional portuguesa, ora procura experiências
modernistas. Na vertente tradicional, com poemas de métrica curta, abundam aliterações e rimas internas, numa
linguagem sóbria e intimista, mas de grande sua vida de musical e rítmica. Na vertente modernista, há uma rutura que
lhe permite inovações como a do paulismo, caracterizado pelo vago, pelo subtil e pelo sonho, com refinamento de
processos simbolistas, ou o intersecionismo, que mistura diversas sensações numa só, que incorpora a sensação de
realidades observáveis e sentidas com a sensação de realidades desejáveis e idealizadas.
Estilo e linguagem:
Vocabulário simples
Associações inesperadas e, por vezes, desvios sintáticos;
Uso frequente de frases nominais;
Pontuação expressiva - exclamação, interrogação, reticências, etc.;
Recurso a adjetivação expressiva, comparações, metáfora, paralelismo e repetições, oxímoros, etc.;
Grande sentido de musicalidade – eufonia (sons agradáveis), transporte, aliteração;
Versificação regular e tradicional, reminiscência da lírica popular - repetições, métrica curta (redondilha menor
e maior), estrofes curtas (recurso frequente à quadra).
Fernando Pessoa – Heterónimos
Alberto Caeiro
Poeta que deambula pelo campo; poeta sensacionista objetivo; poeta da natureza; poeta antimetafísico.
Nasceu em 1889, em Lisboa, e morreu em 1915, mas viveu quase toda a sua vida no campo. Não teve profissão, nem
educação quase nenhuma: apenas a instrução primária. Era de estatura média, frágil, mas não o aparentava. Era
louro, de olhos azuis. Ficou órfão de pai e mãe muito cedo e deixou-se ficar em casa a viver dos rendimentos. Vivia
com uma tia velha, tia-avó. Escrevia mal o Português. É o pretenso mestre de Álvaro de Campos e de Ricardo Reis. É
anti metafísico; é menos culto e complicado do que Ricardo Reis, mas mais alegre e franco. É sensacionista.
Características:
Negação da metafísica e valorização da aquisição do conhecimento através das sensações não
intelectualizadas; é contra a interpretação do real pela inteligência; para ele o real é a exterioridade e não
devemos acrescentar-lhe as impressões subjetivas;
Negação de si mesmo;
Atração pela infância, como sinónimo de pureza, inocência e simplicidade, porque a criança não pensa, conhece
pelos sentidos como ele, pela manipulação dos objetos pelas mãos;
Poeta da Natureza, na sua perpétua renovação e sucessão, da Aurea Mediocritas, da simplicidade da vida rural;
A vivência da passagem do tempo não existe, são só vivências atemporais: o tempo é ausência de tempo. Só
existe a realidade do presente, de cada instante, de cada momento. O passado e o futuro são os instantes que
refletem a unidade do próprio tempo vivido em cada presente.
Alberto Caeiro só se importa em ver de forma objetiva e natural a realidade, com a qual contacta a todo o
momento. Daí o seu desejo de integração e de comunhão com a natureza.
Para Caeiro, “pensar” é estar doente dos olhos. Ver é conhecer e compreender o mundo, por isso, pensa vendo
e ouvindo. Recusa o pensamento metafísico, afirmando que “pensar é não compreender”. Ao anular o
pensamento metafísico e ao voltar-se apenas para a visão total perante o mundo, elimina a dor de pensar que
afeta Pessoa.
Caeiro é o poeta da Natureza que está de acordo com ela e a vê na sua constante renovação. E porque só existe
a realidade, o tempo é a ausência de tempo, sem passado, presente ou futuro, pois todos os instantes são a
unidade do tempo.
Mestre dos outros heterónimos e do próprio ortónimo, Caeiro dá especial importância ao ato de ver, mas é
sobretudo inteligência que discorre sobre as sensações, num discurso em verso livre, em estilo coloquial e
espontâneo. Passeando ao bservar o mundo, personifica o sonho da reconciliação com o universo, com a
harmonia pagã e primitiva da Natureza.
É um sensacionista a quem só interessa o que capta pelas sensações e a quem o sentido das coisas é reduzido à
perceção da cor, da forma e da existência: a intelectualidade do seu olhar volta-se para a contemplação dos objetos
originais. Constrói os seus poemas apartir de matéria não-poética, mas é o poeta da Natureza e do olhar, o poeta da
simplicidade completa, da objetividade das sensações e da realidade imediata (“Para além da realidade imediata não
há nada”), negando mesmo a utilidade do pensamento. No entanto, muitas vezes não consegue escapar à
racionalização, e é esse facto que lhe provoca alguma tristeza.
“Alberto Caeiro parece mais um homem culto que pretende despir-se da farda pesada da cultura acumulada
ao longo dos séculos.”
Vê o mundo sem necessidade de explicações, sem princípio nem fim, e confessa que existir é um facto
maravilhoso; por isso, crê na “eterna novidade do mundo”. Para Caeiro o mundo é sempre diferente, sempre
múltiplo; por isso, aproveita cada momento da vida e cada sensação na sua originalidade e simplicidade.
Para Caeiro fazer poesia é uma atitude involuntária, espontânea, pois vive no presente, não querendo saber
de outros tempos, e de impressões, sobretudo visuais, e porque recusa a introspeção, a subjetividade, sendo
o poeta do real objetivo.
Caeiro canta o viver sem dor, o envelhecer sem angústia, o morrer sem desespero, o fazer coincidir o ser com o
estar, o combate ao vício de pensar, o ser um ser uno, e não fragmentado.
Possuía uma linguagem estética direta, concreta e simples mas, ainda assim, bastante complexa do ponto de vista
reflexivo.
Características:
Objetivismo - apagamento do sujeito; atitude antilírica; atenção à "eterna novidade do mundo", integração
e comunhão com a natureza; poeta deambulatório;
Sensacionismo – poeta das sensações tal como elas são; poeta do olhar; predomínio das sensações visuais
("Vi como um danado") e das auditivas; o "Argonauta das sensações verdadeiras";
Anti metafísico - "Há bastante metafísica em não pensar em nada"; recusa do pensamento ("Pensar é estar
doente dos olhos"); recusa do mistério; recusa do misticismo;
Panteísmo Naturalista - tudo é Deus, as coisas são divinas ("Deus é as árvores e as flores/ E os montes e o
luar e o sol..."); paganismo; desvalorização do tempo enquanto categoria conceptual ("Não quero incluir o
tempo no meu esquema"); contradição entre "teoria" e "prática".
RESUMO:
Poeta da Natureza;
Panteísmo sensualista: relação íntima e direta com a Natureza; vivência de acordo com as suas leis;
Poeta sensacionista (sensações): predomínio dos sentidos (privilegia o conhecimento sensorial da realidade);
especial importância do ato de ver;
Privilégio da sensação em detrimento do pensamento;
Pensamento como fonte de sofrimento, de enganos, não permitindo conhecer o real
Vê a realidade de forma objetiva e natural;
Aceitação da realidade tal como é, de forma tranquila (tal como se apresenta, sem contestação nem interferência
do pensamento); vê um mundo sem necessidade de explicações, sem princípio nem fim; existir é um facto
maravilhoso;
Visão pagã da existência: a única verdade das coisas é a sensação;
Recusa da filosofia, do pensamento metafísico (“pensar é estar doente dos olhos”), o misticismo e o
sentimentalismo social e individual;
Personifição sonho da reconciliação do Universo, com a harmonia pagã e primitiva da Natureza;
Inexistência de tempo (unificação do tempo);
Inocência, ingenuidade e constante novidade das coisas;
O real como único meio de atingir a verdade e a felicidade;
Mestre de Pessoa e dos outros heterónimos;
Relação com Pessoa Ortónimo – elimina a dor de pensar.
Ricardo Reis
Disciplinamental; efemeridade da vida; iminência da morte; domínio dos deuses; fuga à dor; atitude estóico-
epicurista, baseada na ataraxia (ausência de perturbação).
Ricardo Reis, nasceu no Porto em 1887, foi educado num colégio de jesuítas e é médico. É latinista por educação
alheia e semi-helenista por educação própria. Viveu no Brasil e expatriou-se voluntariamente por ser monárquico.
Demonstra interesse pela cultura Clássica, Romana (latina) e Grega (helénica). Fisicamente é um pouco mais baixo,
mas forte, mais seco do que Caeiro; moreno de cara rapada.
Reis é um latinista que olha e segue os modelos estéticos da Antiguidade Clássica (Grega e Latina). O mundo greco-
latino é um modelo para o poeta. Este discípulo de Caeiro aceita a antiga crença nos deuses, enquanto disciplinador
das nossas emoções e sentimentos, mas defende, sobretudo, a busca de uma felicidade relativa alcançada pela
indiferença à perturbação. Este é o heterónimo que exige a Pessoa um maior distanciamento e um maior poder de
despersonalização.
A filosofia de Ricardo Reis é a de um epicurismo triste, pois defende o prazer do momento, o “carpe diem”, como
caminho da felicidade, mas sem ceder aos impulsos dos instintos. Apesar deste prazer que procura e da felicidade
que deseja alcançar, considera que nunca se consegue a verdadeira calma e tranquilidade – ataraxia.
Ricardo Reis propõe, pois, uma filosofia moral de acordo com os princípios do epicurismo e uma filosofia estóica:
“Carpe diem”(aproveita o dia), ou seja, aproveita a vida em cada dia, como caminho da felicidade;
Busca da felicidade com tranquilidade (ataraxia);
Não ceder aos impulsos dos instintos (estoicismo);
Procurar a calma, ou pelo menos, a sua ilusão;
Seguiro ideal ético da apatia que permite a ausência da paixão e a liberdade (sobre esta apenas pesa o
Fado - destino).
Epicurismo: fuga à dor (através da moderação dos prazeres e aceitação do fado); não temer a morte; modera o
prazer (busca dos prazeres simples da vida, sem excessos); atinge a ataraxia (ausência de perturbações/
tranquilidade da alma).
Estoicismo: aceitação calma e serena da ordem das coisas e do destino (aceitar a ordem universal das coisas, incluindo
a morte); dominar as paixões (permanecendo indiferente tantos a estas como à dor, ambas perturbações da razão);
auto disciplina.
Horacianismo: carpe diem; aurea mediocritas (felicidade possível no sossego do campo – proximidade de Caeiro).
Paganismo: crença nos deuses; crença na civilização da Grécia; sente-se um estrangeiro fora da sua pátria, a Grécia.
Neste sentido, este heterónimo afirma-se crente nos deuses, que estão acima dos homens, mas acima dos dois está
ainda o destino (fado). Tenta assumir a postura dos deuses, adquirido através de um exercício de autodisciplina,
calma e indiferença, face a um destino já traçado.
Ricardo Reis, que adquiriu a lição do paganismo espontâneo de Caeiro, cultiva um neoclassicismo neopagão (crê
nos deuses e nas presenças quase divinas que habitam todas as coisas), recorrendo à mitologia greco-latina, e
considera a brevidade, a fugacidade e a transitoriedade da vida, pois sabe que o tempo passa e tudo é efémero (de
curta duração). Acredita num destino inelutável de uma maneira tranquila (tranquila resignação ao destino).
Considera que a verdadeira sabedoria de vida é viver de forma equilibrada e serena, “sem desassossegos grandes”.
A filosofia de Reis rege-se pelo ideal “Carpe Diem” – a sabedoria consiste em saber-se aproveitar o presente, porque
se sabe que a vida é breve. Há que nos contentarmos com o que o destino nos trouxe. Há que viver com moderação,
sem nos apegarmos às coisas, e por isso as paixões devem ser comedidas, para que a hora da morte não seja
demasiado dolorosa.
As linhas ideológicas presentes na poesia de Reis refletem um homem que sofre e vive o drama da transitoriedade
da vida, facto que lhe provoca sofrimento (por imaginar antecipadamente a morte). Somos seres frágeis, seres-para-
a-morte, tal como tudo o que nos rodeia.
Características poéticas:
Epicurismo;
Estoicismo;
Autodisciplina, abdicação, recusa de compromissos afetivos e sociais;
Neopaganismo e neoclassicismo – crença nos deuses, louvor da civilização grega, tema horaciano do
carpe diem;
Efemeridade da vida e do tempo/obsessão pela morte;
Presença constante do Fado, do destino, da fatalidade;
Intelectualização das emoções;
Tom sentencioso – caráter moralista da sua poesia.
Sentimentos dominantes:
Submissão
Dor
Indiferença
Conformação
Características de estilo e linguagem:
Estilo laboriosamente construído (construído com extremo rigor);
Forma métrica mais usada – ode;
Linguagem erudita e alatinada no vocabulário e na sintaxe;
Uso do hipérbato e da anástrofe (inversão da ordem natural das palavras na frase);
Recurso ao gerúndio e ao imperativo (exortativo);
Predomínio das frases subordinadas;
Resumo:
Disciplinamental
Intelectualização das emoções;
Domínio dos deuses;
Obsessão da efemeridade da vida, do tempo; aceita a relatividade e a fugacidade das coisas;
Iminência e irreversibilidade da morte (morte como única certeza do percurso existencial; aceitação pacífica
desta);
Busca do prazer moderado (procura da ataraxia), como meio de fuga à dor;
Aparente tranquilidade, na qual se reconhece a angústia existencial do ortónimo;
Espírito grave, ansioso de perfeição;
Atitude de quase indiferença perante a vida ("A sabedoria de deixar passar a vida placidamente, sem a
viver"); inutilidade de qualquer compromisso;
Necessidade do predomínio da razão sobre a emoção, como uma defesa contra o sofrimento;
Presença do fatalismo - o destino é força superior ao homem; aceitação calma do destino;
”epicurista triste”- (Carpe Diem) – busca do prazer moderado e da ataraxia;
Estoicismo – aceitação calma e serena da ordem das coisas;
Moralista – pretende levar os outros a adotar a sua filosofia de vida, não se cansa de dar conselhos;
Poeta inteletual, sabe contemplar: ver intelectualmente a realidade;
Aceitação do Fado, da ordem natural das coisas;
Privilegia a ode, o epigrama e a elegia;
Usa a inversão da ordem lógica, favorecendo o ritmo das suas ideias disciplinadas;
Estilo densamente trabalhado, de sintaxe alatinada, hipérbatos, apóstrofes, metáforas,
comparações, gerúndio e imperativo;
Verso irregular e decassilábico.
Álvaro de Campos
Tédio; Histeria; Excesso; Sensações vividas febrilmente; Vanguarda; Futurismo; Angústia existencial
Nasceu em Tavira a 15 de Outubro de 1890. Teve uma educação vulgar de liceu. Foi para a Escócia estudar engenharia,
primeiro mecânica e depois naval (Glasgow). Um tio beirão que era padre ensinou-lhe Latim. Inativo em Lisboa.
Fisicamente: usa monóculo, é alto, magro e tem cabelo liso; cara rapada, tipo judeu português. Viajante, vanguardista
e cosmopolita.
Fernando Pessoa considera que Campos se encontra no “extremo oposto, inteiramente oposto, a Ricardo Reis”, apesar
de ser como este um discípulo de Caeiro.
Campos é o “filho indisciplinado da sensação" e para ele a sensação é tudo. O eu do poeta tenta integrar e unificar
tudo o que tem ou teve existência ou possibilidadede existir.
Este heterónimo aprende de Caeiro a urgência de sentir, mas não lhe basta a «sensação das coisas como são»: procura
a totalização das sensações e das perceções conforme as sente, ou como ele próprio afirma “sentir tudo de todas as
maneiras”.
É configurado “biograficamente” por Pessoa como vanguardista e cosmopolita, espelhando-se este seu perfil
particularmente nos poemas em que exalta, em tom futurista, a civilização moderna e os valores do progresso.
O poeta procura incessantemente “sentir tudo de todas as maneiras”, seja a força explosiva dos mecanismos, seja a
velocidade, seja o próprio desejo de partir. Campos tanto celebra, em poemas de estilo torrencial, amplo, delirante e
até violento, a civilização industrial e mecânica, como expressão de desencanto do quotidiano citadino, adotando
sempre o ponto de vista do homem da cidade.
Álvaro de Campos é o heterónimo que apresenta uma evolução mais nítida, podendo na suao bra distinguir-se três
fases:
Decadentista (fase do "Opiário") - exprime o tédio de viver, o enfado, o cansaço, a náusea, o abatimento e a
necessidade de novas sensações; traduz a falta de um sentido para a vida e a necessidade de fuga à monotonia;
inadaptado ao mundo e à vida.
Futurista/Sensacionista (civilização moderna/excesso de sensações - "Ode Triunfal") - Campos celebra o triunfo
da máquina, da civilização moderna. Sente-se nos poemas uma atração quase erótica pelas máquinas, símbolo
da vida moderna. Intensidade e totalização das sensações. A par da paixão pela máquina, há a náusea,
provocada pela poluição física e moral da vida moderna. Nesta fase, a sensação é mais intelectualizada.
Sensacionismo excessivo e conturbado.
Abúlica (pessimista e intimista) - Perante a incapacidade de unificar em si pensamento e sentimento, mundo
exterior e interior, traz de volta o abatimento (o cansaço, o tédio, solidão). Conflito entre a realidade e o poeta.
Este sente-se vazio, um marginal, incompreendido. Angustiado e cansado. Revela, tal como Pessoa, a mesma
angústia existencial, ceticismo, dor de pensar e nostalgia de infância.
A grande viragem na poesia de Campos (segunda fase) acontece depois de ter conhecido Caeiro, seu Mestre, que o
introduziu no universo do sensacionismo. Mas enquanto Caeiro acolhe tranquilamente as sensações (considerando
a sensação captada pelos sentidos como única realidade), Campos experimenta-as febrilmente, excessivamente,
não rejeitando o pensamento e assim, afastando-se de Caeiro). Tão excessivamente que, querendo "sentir tudo de
todas as maneiras", parece esgotar-se a seguir, caindo numa espécie de apatia melancólica, desvaneio nostálgico
que o aproxima do Ortónimo (com quem partilha o ceticismo, dor de pensar, procura do sentido no que está para
além da realidade, fragmentação do eu, nostalgia da infância irremediavelmente perdida). Desta forma é Campos
que reconhece os limites do humano, a apatia e o cansaço de quem quis ser máquina e não conseguiu por ser
Homem.
Características poéticas:
poeta modernista
futurismo – apologia da civilização industrial e técnica, rutura com a lírica tradicional e transgressão da moral
estabelecida, êxtase, exaltação da força, da violência, do excesso;
sensacionismo - excesso de sensações, euforia desmedida;
pessimismo e intimismo - evasão, inadaptação do real, abulia, tédio, cansaço, solidão, frustração e tristeza,
dor de ser lúcido;
nostalgia da infância, irremediavelmente perdida;
auto-ironia e autodepreciação (angústia existencial);
fragmentação do "eu"; domínio do pensar e da consciência; incapacidade de sentir; solidão e
isolamento.
Após a descoberta do futurismo e de Walt Whitman, Campos adota (para além do verso livre) um estilo esfuziante,
torrencial, espraiado em longos versos, vivificado pela fantasia verbal duradoura e inesgotável.
Características de estilo e linguagem:
Poeta modernista
1ª Fase - tédio e desencanto; busca de novas sensações;
2ª fase - delírio sensorial - sensacionismo (excesso de sensações, euforia desmedida); canto da civilização
moderna - futurismo (apologia dacivilização industrial e técnica - moderna); erotismo doentio e febril;
3ª fase - regresso ao abatimento, ao cansaço da vida, angústia, tédio; nostalgia da infância irremediavelmente
perdida; incapacidade de sentir; desencanto da vida; pessimismo; inadaptação ao presente/à realidade;
fragmentação do eu; domínio do pensar e da consciência.
Pessoa - Inadaptação ao real; incapacidade de "viver" e ser feliz; opção pela solidão; incapacidade de sentir; domínio
do pensamento, da consciência; fascínio pelo racional; incapacidade de agir.
Caeiro - A relação faz-se através de sensações, de forma equilibrada; abolição do pensamento; aceitação calma da
vida; anulação do que no ser humano pode originar sofrimento; o olhar inocente como modo privilegiado de conhecer
o mundo; deambulismo.
Reis - Primado do pensamento sobre a sensação; desejo de manter a integridade mas renunciando a tudo o que é
fator de perturbações; busca da ataraxia; conciliação de resignação e moderação prazer.
Campos - Excesso de sensações conducente a estados de euforia/disforia; interferência do pensamento - dor de ser
lúcido; inadaptação ao real; masoquismo; ser dividido entre o sonho e a realidade.
Fernando Pessoa – Mensagem
Fernando Pessoa, no poema épico-lírico, canta, de forma fragmentária e numa atitude introspetiva, o império
territorial, mas retrata o Portugal que "falta cumprir-se", que se encontra em declínio a necessitar de uma força
anímica. Projeta-nos numa dimensão cíclica centrada na esperança de um novo recomeço.
Características:
Nas duas primeiras partes da Mensagem é possível um diálogo com Os Lusíadas; em O Encoberto, Pessoa
situa-se no momento em que o Império Português parece desmoronar-se por completo e, assume, então, o
cargo de anunciador de um novo ciclo que se anuncia, o Quinto Império, que não precisa de ser material, mas
civilizacional.
Procura anunciar um novo império civilizacional. O “intenso sofrimento patriótico” leva-o a antever um
império que se encontra para além do material.
2ª Parte – Mar Português (o sonho marítimo e a obra das descobertas) - Surge a realização e a vida; refere
personalidades e acontecimentos dos Descobrimentos que exigiram uma luta contra o desconhecido e os elementos
naturais. Expansão de Portugal no mundo, passando pelos Descobrimentos e terminando com o declínio.
3ª Parte – O Encoberto (encobrimento resultante da morte e ligação ao messianismo) – Representa a esperança num
futuro associado a um messias e ao mito sebastianista, através da ressurreição, que nos impulsiona para um Quinto
Império num domínio espiritual - antecipação profética de um acontecimento grandioso que está escrito no destino
português.
Os Lusíadas e a Mensagem
Ao fim de dezasseis anos no Brasil, Ricardo Reis desembarca em Lisboa e hospeda-se no Hotel Bragança,
I
onde vê, pela primeira vez, Marcenda, figura que lhe desperta interesse por ter a mão esquerda paralisada.
Ricardo Reis lê jornais para se inteirar das notícias sobre a morte de Fernando Pessoa e, posteriormente,
II visita o túmulo do poeta no Cemitério dos Prazeres.
Já no Bragança, contacta pela primeira vez com Lídia, criada do hotel, cujo nome o deixa surpreso.
Ricardo Reis presencia o “bodo do Século”, onde foram distribuídos dez escudos a cada um de mais de mil
necessitados.
III
Na noite da passagem de ano, depois de regressar do Rossio, Reis depara-se no quarto com a visita de
Fernando Pessoa, que o informa de que tem ainda oito meses para circular à vontade no mundo dos vivos.
Ricardo Reis tem o primeiro contacto físico com Lídia – põe-lhe a mão no braço – e diz-lhe que a acha bonita.
No entanto, estes atos fazem-no sentir-se ridículo.
IV Fernando Pessoa volta a encontrar-se com Ricardo Reis, na esquina da rua de Santa Justa, e os dois
conversam sobre a multiplicidade de eus e sobre a vida e a morte.
Ricardo Reis envolve-se com a criada, que entra no seu quarto, durante a noite, deitando-se com ele.
Ricardo Reis vai ao Teatro D. Maria com a intenção de travar conhecimento com o doutor Sampaio e com
V Marcenda. À noite, recebe a visita de Fernando Pessoa no seu quarto e os dois falam sobre Lídia e sobre o
fingimento. Lídia volta a dormir com Ricardo Reis.
Ricardo Reis e Marcenda conversam na sala de estar do hotel sobre a sua debilidade física e a jovem pede-
VI lhe a sua opinião profissional. Nessa noite, Ricardo Reis janta com o doutor Sampaio e com Marcenda e Lídia
não o visita porque está com ciúmes.
Ricardo Reis lê a Conspiração, obra que lhe foi recomendada pelo doutor Sampaio e que relata a lealdade da
jovem Marília ao sistema.
VII Lídia volta a dormir com Ricardo Reis ao fim de cinco dias.
Ricardo Reis encontra Fernando Pessoa num café do bairro e, a propósito da vitória da esquerda em Espanha,
falam sobre o comunismo e o regresso de Reis
Ricardo Reis fica doente, com febre, e Lídia dispensa-lhe todos os cuidados. Dias depois, ele recebe uma
intimação para se apresentar na PVDE − Polícia de Vigilância e Defesa do Estado, situação que desperta a
desconfiança entre o pessoal e entre os hóspedes do hotel.
Lídia fica preocupada e tenta prevenir Reis das práticas dessa instituição.
VIII
Marcenda marca um encontro com Ricardo Reis, no Alto de Santa Catarina. Enquanto aguarda por ela, Reis
é “visitado” por Fernando Pessoa, que o questiona sobre as suas relações amorosas.
Durante o encontro, a filha do doutor Sampaio pede a Ricardo Reis que lhe escreva a dar notícias da
entrevista para que fora intimado.
Ricardo Reis vai à polícia e é interrogado num clima de suspeição. Regressado ao hotel, diz a Lídia que tudo
correu bem e escreve a Marcenda tranquilizando-a. Mais tarde, informa a criada de que vai deixar o
IX
Bragança, e esta prontifica-se a ir visitá-lo nos seus dias de folga. Ricardo Reis aluga casa no Alto de Santa
Catarina, defronte à estátua do Adamastor.
Ricardo Reis escreve a Marcenda para a informar da nova morada. Dias depois deixa o hotel. Na sua primeira
X
noite na casa alugada, recebe a visita de Fernando Pessoa e falam sobre solidão.
Lídia vai visitar Ricardo Reis para verificar se está bem instalado e ele acaba por beijá-la na boca. Dias depois,
XI
recebe a visita de Marcenda, que, pela primeira vez na vida, é beijada por um homem.
Lídia prontifica-se a cuidar da limpeza da nova casa e os dois acabam por se envolver.
Ricardo Reis escreve uma carta confusa a Marcenda. Começa, entretanto, a trabalhar, substi- tuindo
XII
temporariamente um colega especialista em coração e pulmões. Esta situação leva-o a escrever novamente
a Marcenda. Entretanto, quase ao fim de um mês, recebe uma carta da jovem, de Coimbra, anunciando que
o visitará no consultório.
Ricardo Reis encontra-se com Fernando Pessoa junto à estátua do Adamastor e os dois conver- sam acerca
da relação de Reis com Lídia e com Marcenda e sobre a vida e a morte.
Ao chegar a casa, Ricardo Reis depara-se com Victor e, a propósito disso, falam da ida de Ricardo Reis à
polícia, de Salazar e de Hitler.
XII
Lídia, enquanto faz limpeza, é seduzida por Reis. Contudo, percebendo que está com um problema de
impotência, o médico repele-a, o que a deixa tristíssima e sem perceber o que se passava.
Marcenda aparece no consultório e Ricardo propõe que se casem. Ela recusa, alegando que não seriam
felizes.
Reis recebe uma carta de Marcenda a assegurar que nunca mais se voltarão a ver, a pedir-lhe para nunca
mais lhe escrever e a informá-lo de que irá a Fátima.
XIV
Restabelece-se, entretanto, a relação de Reis com Lídia, mas o médico vai a Fátima, com o intuito de ver
Marcenda. No entanto, não consegue encontrá-la.
Ricardo Reis fica a saber que o colega que está a substituir vai retomar o seu lugar e isso leva-o a começar a
pensar em regressar ao Brasil.
XV
Fernando Pessoa visita novamente Ricardo Reis e os dois falam sobre o facto de Reis continuar a ser vigiado
por Victor, sobre as relações amorosas de ambos e sobre o destino e a ordem.
Ricardo Reis escreve um poema dedicado a Marcenda.
Lídia comunica-lhe que está grávida e que não tenciona abortar.
XVI Fernando Pessoa faz nova visita a Ricardo Reis e os dois falam sobre a perspetiva do regime em relação a
diferentes personalidades e sobre o seu obscurantismo. Durante a conversa, Ricardo Reis confessa-lhe que
vai ser pai e que ainda não decidiu se vai ou não perfilhar a criança.
Ricardo Reis vai visitar Fernando Pessoa ao Cemitério dos Prazeres e dialogam sobre o golpe militar ocorrido
XVII
em Espanha.
Enquanto lava a loiça na cozinha de Ricardo Reis, Lídia questiona-se sobre o seu papel naquela casa e chega
a pensar em não voltar mais.
XVIII
Ricardo Reis vai assistir a um comício em defesa do Estado Novo e de Salazar. Dias depois, envia para
Marcenda o poema que lhe dedicou.
Lídia chega a casa de Ricardo Reis, chorosa, e anuncia que o seu irmão e outros marinheiros se vão revoltar.
No dia seguinte, Ricardo Reis assiste ao bombardeamento do Afonso de Albuquerque, barco onde seguia o
irmão de Lídia, e do Dão.
XIX
Ricardo Reis vai ao Hotel Bragança à procura de Lídia, mas não a encontra. Mais tarde fica a saber que Daniel
morreu.
Fernando Pessoa visita pela última vez Ricardo Reis e este decide acompanhá-lo em direção à morte.
Representações do amor
Marcenda Lídia
Mulher passiva, sem vontade e sem Mulher ativa, perspicaz e questionadora, preocupada
convicções, deficiente – representa a com o mundo que a rodeia – representa a possibilidade
inércia, a apatia, a desistência de de Ricardo Reis vingar e viver sem o seu criador,
Ricardo Reis. transformando-se num agente ativo e não num mero
espetador.
Aquela que murcha, que não é Contrasta com a Lídia das odes – platónica, tranquila,
eterna – contrasta com as musas das quieta.
odes.
Paródia do verso de Os Lusíadas “Onde a terra se acaba e o mar começa” no início e no fecho da
obra.
Citação de versos de Os Lusíadas, como “esta apagada e vil tristeza”, com vista a ridicularizar
a tão propagada prosperidade do país.
Luís de
Presença constante da estátua de Camões e do Adamastor, como forma de realçar a
Camões
produção ca- moniana enquanto marco de fundamental importância na literatura portuguesa
(“todos os caminhos portugueses vão dar a Camões”).
Denúncia da subversão e do aproveitamento das palavras e da figura de Camões por parte do
regime.
Configuração do espaço da cidade de Lisboa como uma realidade confinadora e destrutiva
(“Ricardo Reis atravessou o Bairro Alto, descendo pela Rua do Norte chegou ao Camões, era
como se estivesse dentro de um labirinto que o conduzisse sempre ao mesmo lugar”).
Cesário Deambulação geográfica como ponto de partida para outras evasões (viagem literária).
Verde Comiseração e identificação do narrador com certas figuras do povo observadas.
Remissão para a evocação de um passado glorioso contrastante com a estagnação de um
presente moribundo.
Visualismo de pendor impressionista e convergência dos sentidos.
Construção da personagem Ricardo Reis à luz das características físicas, psicológicas e
Fernando literárias fixadas pelo seu criador, patentes, por exemplo, nas conversas entre o heterónimo
Pessoa e o ortónimo.
Citações, alusões, paródia e paráfrases de versos do ortónimo e dos principais heterónimos.
Estrutura da obra
Tom oralizante Estilo/pontuação
Externa Interna
Estrutura circular: Marcas de coloquialidade. Uso exclusivo do
Uso paródico do Diálogo com o narratário. ponto final e da
verso de Comentários do narrador. vírgula.
Camões “Onde a Estruturas morfossintáticas Uso da vírgula e da
terra se acaba e simples. maiúscula para
o mar começa”. Provérbios e expressões marcar as falas em
19 Viagem de Reis populares com ou sem discurso direto (é o
capítulos para Lisboa e, variações. contexto que ajuda o
depois, em Mistura de vários modos de relato leitor a perceber
direção ao do discurso. quando se trata de
cemitério dos Coexistência de segmentos uma declaração, de
Prazeres. narrativos e descritivos uma exclamação ou
Citação “Mestre, são plácidas todas as horas que nós perdemos” (cap. I)
Discurso
“é Fernando Pessoa quem primeiro fala, Soube que me foi visitar” (cap. III)
direto
“os espanhóis descruzavam a perna impaciente, mas o doutor Sampaio retinha-os,
Discurso
garantia-lhes que em Portugal poderiam viver em paz pelo tempo que quisessem” (cap.
indireto
VIII)
“Já todo o pessoal do hotel sabe que o hóspede do duzentos e um, o doutor Reis, aquele
Discurso
que veio do Brasil há dois meses, foi chamado à polícia, alguma ele teria feito por lá” (cap.
indireto livre
VIII)