AMADEUS. Direção de Miloš Forman. EUA: Warner Bros.1984. 1 DVD (158
min.)
I AUTOR
Peter Levin Shaffer (Liverpool, 15 de maio de 1926 — Condado de Cork, 6 de
junho de 2016) foi um dramaturgo e roteirista britânico. É autor de inúmeras peças teatrais, que receberam diversos prêmios, e muitas delas tornadas filmes. Um de seus trabalhos de maior destaque foi a peça Equus, que conta a história de um rapaz, Alan Strang, em tratamento psiquiátrico. A peça foi levada às telas de cinema pelo cineasta Sidney Lumet, com roteiro do próprio Shaffer.
II ESTRUTURA DA OBRA: 158 minutos. Dramático, Biográfico e Musical.
Wolfgang Amadeus Mozart, Antonio Salieri. Confissão, Sacrifício, Música, Composição Musical. Deus.
III “AMADEUS”
Escrito a partir da peça por Peter Schaffer, “Amadeus” centra-se nos
últimos anos de Mozart, quando o genial compositor residiu em Viena e produziu seus melhores trabalhos (O Rapto do Serralho, As Bodas de Fígaro, Don Giovanni e A Flauta Mágica). Todas mostradas no filme. Entretanto, opta por focar na trágica e comovente história do “rival” de Amadeu, Antonio Salieri, um sujeito cujo legado artístico de outrora evapora-se com os anos, que tenta suicidar-se e, consequentemente, protagoniza uma vida de inveja, amor e ódio com Mozart. Os eventos retratados não correspondem necessariamente à verdadeira história de Mozart e Salieri. No entanto, a perspectiva de Peter Schaffer e Milos Forman os conduziram a produzir uma obra transcendente que conecta emocionalmente o espectador à narrativa, retratando temas suficientemente universais, que independam da veracidade dos fatos apresentados. As duas principais interpretações são atemporais e inesquecíveis: Tom Hulce, como Mozart, personificando com perfeição o genial e extrovertido compositor, e F. Murray Abraham, como Salieri, encarnando aquele que é um dos maiores personagens já vistos no cinema. O filme analisa um traço da personalidade humana: A inveja. Como compositor oficial da Corte, Antonio Salieri não se contenta em aceitar a existência de alguém com o talento gênio precoce, Mozart. Tal sentimento destrutivo conduz Saliéri a dedicar-se com todas as suas forças a criar empecilhos ao sucesso do compositor que ele próprio reconhece como infinitamente superior. Mozart, um dos maiores compositores de ópera aparece no filme na mais simples faceta de sua personalidade, em sua excentricidade, espontaneidade e criatividade. Salieri, um também famoso compositor de óperas, desde o início aparece como um admirador de Mozart, mas revoltado com Deus por não lhe permitir a graça de graciosas composições, como as de Mozart. Por sua exacerbada admiração, começa a invejá-lo e interferir negativamente no reconhecimento de sua arte. Salieri, então, “interpreta” dois papéis, um como o amigo de Mozart, que o apoia e aconselha, mas que verdadeiramente, quando não está em sua presença, o crítica e influencia pessoas negativamente quanto sua obra. Independentemente de seu caráter, era Salieri um homem extremamente infeliz com o fato de Deus não o presentear com o maior dos talentos, sentindo-se um compositor medíocre, e toda essa sua raiva o fez tornar-se excepcionalmente maldoso para com Mozart. Este, no entanto, possuía um talento precoce, que se tornou reconhecido por isso, e um compositor que sustenta o desejo de tornar-se grande nome, com grandiosas obras. A loucura acaba sendo uma saída, para ambos os casos, ou uma entrada em um novo e profundo mundo, despertando ou fazendo adormecer os fantasmas e inquietações de suas mentes. Nesse cenário, ainda há a esposa de Mozart, Constanzi, um constante amparo para o mesmo, tanto dando força para a continuidade de seu trabalho quanto para suportar a inconstância e instabilidade de sua vida. A trama torna-se desgastante para ambos os personagens, Mozart, Salieri e Constanzi. Vícios foram se tornando fonte de extravasamento para toda a angústia, para Mozart. O grande talento já não compunha como antes, o esforço era muito maior, e sua instabilidade emocional e financeira o fazia decair ainda mais. Nos bastidores, Salieri o atormentava. Constanzi não suportando, vai embora de sua casa, apoiada por sua mãe, levando junto o seu filho. Mozart, em mais um momento de angústia, compõe uma de suas mais famosas óperas, mas seu desgaste é aparente: trabalha além de seus limites. Pergunta-se, à essa altura, se seria Salieri tão obcecado por Mozart, a ponto de pôr fim a vida do grande compositor ou apenas é mais uma alma transtornada pelo desconforto de se sentir desamparado por Deus? Independente do sentimento em seu íntimo, o mesmo resolve ajudar Mozart, com a composição de Requiém. Foi uma obra obscura, encomendada anonimamente por Salieri para que pudesse tocá-la no funeral de Mozart, mas o deixou ainda mais fascinado com tamanho talento do gênio. Dentro de si morava o desejo pela morte de Mozart, para então ter espaço para ser reconhecido, e planejou cumpri-lo, mas sem uma forma definida. No fim, Constanzi retorna para casa. Mozart falece, em sua cama, enquanto sua esposa tenta se livrar da presença de Salieri, para que seu marido não continue a trabalhar no Requiém, o que para ela, o adoecia. Com o tempo a pesar, Salieri confessa todos os seus sentimentos e feitos em relação à Mozart, a um padre. Sua revolta a Deus não diminui com a morte do seu ídolo, mas aumenta pelo fato de Deus ainda assim não permitir sua glória. A carga acumulada de sentimentos pelos anos conduz Salieri a um triste fim em um hospício, no ápice de sua “sensata” loucura. Isto se observa em Salieri, que possui plena exatidão do que é um ser humano, com suas virtudes e defeitos, dores e amores, paixão e ódio, saúde e loucura, mas toda a sua angústia devia- se ao simples desejo de ser um grandioso compositor, e seu reconhecimento por tal mérito o encerra em sua inveja. Era o mais puro retrato da ira para com o Deus que em sua visão, tanto abençoou a Mozart, deixando-o carente dessa graça. Uma lição fica para o espectador de Amadeus: o gosto de reconhecer os grandes talentos por trás da glória, reconhecer as pessoas humanas, que sofrem, ferem e vivem. Os gênios, ídolos, são nada mais que humanos.