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IIIII87"5157
II
Seleção, tradução e ensaio
MAUW~CIO ARRUDA MENBONP
O 1999
Maurício Arruda Mendonqa
Revisáo
Maurício Arruda Mendonga
Caligrafias
Shinshiti Minowa
Fotografias
Acervo particular da família Sato
ISBN
85-87515-01-2
Da tradução ....................................................11
Notas ............................................................... 99
NENPUKU SATO:
um mestre de haikai no Brasil ...................... 167
Meus agradecimentos hs pessoas que ajudaram a tornar
este trabalho realidade: Fumiko Sugimoto, Shinshiti
Minowa, Futaro Sato, família Kenjiro Sato, Tokui
Gyudoshi Sato, Eliane Eme Sato, Ademir Assunção, Vera
e Benício A. Mendonça, Maysa Previdello, Jacqueline
Sasano e Silvio Kazushi Sano.
Incumbido por seu mestre, o grande Takahama Kyoshi, de
semear e cultivar a poesia japonesa em solo brasileiro, Kenjiro
"Nenpuku" Sato dedicou 50 anos de sua vida ao ensino e prática
do "haiku", o poema curto japonês, também conhecido no
Brasil como "haicai".
Nenpuku Sato trabalharia incessantemente para estimular
e manter integrada uma comunidade de cerca de 6.000 adeptos
do haicai em todo o Brasil. E tal número de praticantes não é
exagero, uma vez que a prática do haicai não se desenvolve
apenas solitariamente, mas pressupõe as chamadas "haiku-kai",
as reuniões nas quais os poetas mantêm a língua e a tradição
vivas, trocam impressões e se aprimoram, orientados por um
professor experiente.
Assim, neste ano em que se completam 20 anos de fale-
cimento do poeta, com a publicação do presente trabalho de
Maurício Arruda Mendonça, que reúne quarenta e dois haicais
do mestre, vejo finalmente um antigo sonho realizado.
Na condição de filho de Nenpuku Sato, junto meus esforços,
pois acredito que a contribuição literária deste que é con-
siderado um dos dez mais importantes mestres de haicai pela
prestigiosa revista "Hototogisu", tenha qualidade para
transcender o âmbito da colônia japonesa e chegar até os poetas,
leitores e estudiosos deste nosso querido Brasil multicultural.
Os haikais que constam da presente coletânea foram
extraídos dos seguintes volumes: Nenpuku-kushu nQ 1 e
Nenpuku-kushu no 2, ambos publicados pela editora Kurashi
no Techo, Tokyo, respectivamente em 1953 e 1961.
Selecionamos quarenta e dois haikais segundo o critério de
amostragem de temas e situações e, também, de traduzibilidade,
visando uma melhor adaptação ao português. Utilizamo-nos,
por vezes, de uma versão poético visual icônica propondo ao
leitor um desvendamento criativo à semelhança dos pictogra-
mas japoneses e das imagens sugeridas pelos próprios haikais.
Os primeiros vinte e quatro haikais pertencem à antologia
Nenpuku-kushu no I e os demais a Nenpuku-kushu no 2.
Gostaria de expressar o meu profundo agradecimento à Sra.
Fumiko Sugimoto que por muitos anos me incentivou e
auxiliou na leitura paciente dos quase dois mil haikais das duas
antologias mencionadas, bem como nas resoluções de dúvidas
sobre a tradução. Agradeço igualmente ao Sr. Shinshiti
Minowa pelas belíssimas caligrafias deste volume.
Seleção e Tradução
Maurício Arruda Mendonqa
vela sobre a terra
vida que se esvai
orvalho nessa relva'
suave ali
céu fluem
ando
borboletas
tr on c o s
e nt re v er
O V e re sta
d e um ent erro
a cerca já era
nos chifres do touro
coroade rosas
Jcí na
~zcirirrid~~crcle,
corn Kyo P
feito no Parand.
No interior de seu
escritório, em março de
1979, ano de sua morte.
Ao,funclo, o mestre,
Kyoslzi Ezkahnrna.
NENPUKU SATO:
UM MESTRE DE HAIKAI NO BRASIL
Lavre a terra
feito um deus como
Kunitokotatchi no Mikoto
Lavrando a terra
plante também
um país de haikai
Eram como se fossem verdadeiros "haikais-mandamentos"
recebidos das mãos de seu mestre Takahama Kyoshi (1874-
1959) que, ao saber de sua partida para o Brasil, pedia-lhe que
cultivasse o haikai entre os imigrantes mitigando-lhes a saudade
do Japão. Nenpuku aceitou com honra o pedido, disse adeus e
se tornou mestre.
A história do haikai no Brasil ou do haikai brasileiro começa,
de fato, no seio da literatura moderna do Japão, especificamente
com Shiki, ancestral direto, o avô, o fundador da linhagem
estética da qual Nenpuku descende. Para termos uma noção da
importância de Shiki para a literatura nipônica, basta saber que
ele é considerado o quarto grande nome do "panteão do haikai",
juntamente com Bashô, Buson e Issa.
Se Bashô é o criador do haikai como um Do ou "caminho
para a iluminação Zen-budista (satori)"; se Buson é o pintor,
mestre do haikai artístico; se Issa é o "mais japonês dos hai-
kaístas japoneses"; Shiki é o crítico arguto, o poeta competente,
restaurador e modernizador do haikai. Foi ele quem pela pri-
meira vez levou o haikai à grande imprensa e criou a legendária
Hototogisu, revista especializada em haikai.
Shiki é a síntese de um período de transformações radicais
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no Japão, a chamada Restauração Megz. Como um artista mo-
demo japonês, conviviam nele a formação de samurai, a influ-
ência da literatura chinesa, o racionalismo neo-confucionista,
a estética ocidental, e um feroz e contundente desejo de revisar
os gostos e modelos tradicionais do haikai.
O poeta exporá suas idéias sistematicamente através de sua
coluna sobre haikai no jornal Nippon. Essa série de artigos
aparecerão a partir de 1892, ficando consagradas publicações
tais como Basho Zatsudan (1893), na qual demostra acidamente
sua aversão ao culto prestado pelos poetas do final do século
XIX ao poeta-zen Matsuo Bashô (1644-1694). Mais do que
um poeta de carne e osso, Bashô era considerado um religioso
iluminado, tornado, por decreto governamental, santo xintoísta.
Shiki buscava assim desmitificar a poética do maior nome do
haikai visando arrancar esta arte de um anacrônico estado de
estagnação. Era o momento propício para atacar valores do
Japão antigo e revitalizar um liaikai em franco processo de
I
decadência. Como afirma R.H. Blyth:
I
No meio do mato
a flor branca
seu nome desconhecido
O barulho do trovão
ecoa na imensidão de selva
feito filhotes de trovão
a lua crescente
na sobrancelha do papagaio
você não percebe?
Comprei melão
pensei em katakanu
no inesino momento
MAUR~CIO
ARRUDA
MENDONÇA
Londrina, inverno de 1999
I
H. Masuda GOGA in "O Haicai no Brasil", pdg. 33, Editora
Oriento, São Paulo, 1988.