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EDITOR CHEFE
Arno Alcântara

REDAÇÃO E CONCEPÇÃO
Marcela Saint Martin

DIREÇÃO DE CRIAÇÃO
Matheus Bazzo

DESIGN E DIAGRAMAÇÃO
Jonatas Olimpio

Material exclusivo para assinantes do


Guerrilha Way.

Transcrição das lives realizadas no


Instagram do Dr. Italo Marsili dos dias
18/02/2019 a 22/02/2019

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COMO USAR
ESTA APOSTILA
Tem gente que adora um papel — para segurar, anotar,
levar consigo aonde for. Outros preferem o digital, seja
em áudio, em vídeo, ou mesmo em texto.

O Guerrilha Way atende a todos os gostos.

Nesta apostila semanal, que você pode imprimir ou


simplesmente salvar em PDF, você vai encontrar:

1. Uma visão geral dos assuntos abordados nas


lives da semana anterior;
2. Um resumo de cada uma delas;
3. Sua transcrição na íntegra, com uma bela
diagramação.

Por isso, o booklet que você tem em mãos é uma pequena


jóia que você pode arquivar em um lugar especial da sua
biblioteca e consultar sempre que necessário.

Você não precisa lê-lo de capa a capa. Consulte-o


conforme a sua necessidade.

Faça bom proveito!

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ÍNDICE
PACIÊNCIA, MEDIOCRIDADE,
RECAÍDAS E ALGO MAIS
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RELAXA, NINGUÉM SE 25
IMPORTA COM A SUA VIDA

VOCÊ NUNCA SERÁ


A BEYONCÉ
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A SEMANA
NUMA TACADA SÓ
Live #26 | 18/02/2019 - Instagram
PACIÊNCIA, MEDIOCRIDADE,
RECAÍDAS E ALGO MAIS
Live de perguntas e respostas.

Live #27 | 19/02/2019 - Instagram | Youtube


RELAXA, NINGUÉM SE
IMPORTA COM A SUA VIDA
Livrar-se da ilusão de que a sua vida “incomoda” os
outros é fundamental para que você possa amadure-
cer e servir de fato.

Live #28 | 21/02/2019 - Instagram | Youtube


VOCÊ NUNCA SERÁ A BEYONCÉ
Nem todas as possibilidades estão abertas para nós. A
vida humana acontece na articulação entre a nossa
vontade e as nossas determinações.

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RESUMO
DA SEMANA

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Live #26 | 18/02/2019 - Instagram
PACIÊNCIA, MEDIOCRIDADE,
RECAÍDAS E ALGO MAIS

Live de perguntas e respostas. Um apanhado:

Como ser mais paciente?


Colocando-se no lugar daquele que é o alvo da sua impaci-
ência. Conhecendo melhor aquele a quem amamos -- só po-
demos amar o que conhecemos. A paciência vem do amor.
Amor é compreensão da vida do outro e proposta de melho-
ra.

Descobri que sou uma porcaria. E agora?


Não exagere seus defeitos -- você não é nem tão ruim assim.
Você é só um medíocre, até na sua vileza.

Como agir diante das recaídas de 4a camada?


Não paralise porque você tropeçou na saída da 4a camada.
Se você não desistir, uma hora você sai dela.

Live #27 | 19/02/201 - Instagram | Youtube


RELAXA, NINGUÉM SE IMPORTA COM A SUA VIDA

A percepção de que “minha vida incomoda muita gente”


traduz um desejo de ser observado, um medo da solidão.
Mas a verdade é que estamos todos sozinhos, no sentido
de uma solidão ontológica, constitucional, comum a todo
e qualquer ser humano. Longe de ser um motivo de triste-
za, isso é a estrutura mesma da vida humana.

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Quando você entende que a sua mera existência não in-
comoda ninguém, você pode começar a entregar algo
de fato. Porque a sua mera aparição onde quer que seja
não tem impacto nenhum. O que pode ter um impacto é
o seu serviço. É chegar e sorrir para os outros, ver o que
está faltando, o que precisa ser feito, o que pode ser or-
ganizado, o que pode ser melhorado. Quando você fizer
isso, a preocupação com o que os outros estão pensando
de você simplesmente desaparecerá.

Live #28 | 21/02/2019 - Instagram | Youtube


VOCÊ NUNCA SERÁ A BEYONCÉ

É típica do nosso tempo a idéia de que você pode ser o


que você quiser. Livrar-se dessa crença idiotizante é um
passo fundamental para o nosso crescimento. Em algum
momento da vida, é preciso aceitar as determinações que
nos condicionam e entender que nem todas as possibili-
dades estão abertas para nós. A vida humana acontece
na articulação entre a nossa vontade e as nossas determi-
nações.

Quando entendemos que estamos determinados por


nossa circunstância (como na fórmula “eu sou eu e mi-
nha circunstância”, de Ortega y Gasset), a vida começa a
andar. O eu não existe sem a circunstância.

Isso não deve nos levar a um rancor, nem a um como-


dismo, mas à ação: aceita ser o melhor que se pode ser, e
não fugir da realidade da malha vital para uma realidade
mental, imaginativa, abstrata. Quem acredita que pode

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ser o que quiser está no caminho da frustração. Quem
acredita que não pode nada, também. Os dois extremos
são falsos. Podemos algumas coisas e não podemos ou-
tras. O segredo está em aceitar nossa circunstância e agir
dentro dela.

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Live #26 | 18/02/2019 (segunda) - Instagram

PACIÊNCIA, MEDIOCRIDADE,
RECAÍDAS E ALGO MAIS
“Tenho 19 anos, ele, 22. Faltam dois anos para eu aca-
bar a faculdade. Faço estágio, ele tem emprego fixo.
Sinto vontade de casar e cuidar da casa. O que acha?”
Ué, eu não acho nada. Acho que você tem que ver aí,
você é quem sabe. Se ele tem emprego fixo e vocês
querem se casar, casem, caramba. Qual é o problema?

Vocês sabem desta história: eu mesmo casei e tam-


bém não tinha nada. Eu e a Sâmia não tínhamos ri-
gorosamente nada, mas casamos e deu tudo certo.
Minha impressão é sempre no sentido de que o deter-
minante é a capacidade de trabalho. É a capacidade
que o sujeito tem de querer trabalhar, de querer tocar
a casa, de querer tocar a família. O cara e a mulher,
óbvio, estou falando dos dois. Às vezes vocês podem
começar sem nada, mas se os dois têm um desejo de
fazer a coisa acontecer, vai dar certo. Às vezes vocês
até começam já com uma boa estrutura, mas se os
dois são meio moles, não têm muito compromisso,
não têm muita palavra, a coisa em geral não dá mui-
to certo.

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“Como posso ajudar meu noivo a superar as crises de
ego? Ele sabe e tem consciência disso.”
“Crise de ego” é um negócio que não existe. Pare de
bobeira. Você está usando um termo que não tem pé
nem cabeça. O pessoal que faz meu Curso para Psico-
lógos sabe que este é um dos grandes problemas: nós
não temos muita idéia daquilo que falamos. O que
é “crise de ego”? Eu preciso saber saber o que está
acontecendo, como posso ajudar uma “crise de ego”
sem saber o que é? Ele está com inveja está? Está
com ciúme? Está se achando o bonzão, é um sober-
bo? Você tem de ver o que é, pegar o análogo e bater
nele. “Crise de ego”... Isso é uma coisa louca, não tem
pé nem cabeça esse negócio aí que você falou.

“Caraca, tu tem o olho claro?”


Meu olho não é claro. Ele muda de cor, depende da
luz que bate. Meu pai é quem tem olho azul.

“Uma dúvida: por que esse horário


de 12h52min?”
Olhem só, pessoal, não tem nada a ver com nume-
rologia, com essas coisas, não é isso! Não tem nada a
ver. Eu é que pergunto: por que esse fetiche com nú-
meros inteiros? Eu não tenho fetiche com isso. Um
número quebrado é melhor. Às 12h50min a gente
senta aqui, tranquilamente, e às 12h52min já come-
çou a nossa live. Essa é a idéia.

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“Meu Deus!!! Você é lindoooo”
Ah, essa pergunta é muito boa! De nada, muito obri-
gado, são seus olhos! Sabe por que você me acha lin-
do? Porque você gosta de mim, não tem nada de be-
leza aqui.

“O que é a paciência?”
A paciência é uma virtude. Se você for pegar um ma-
nual teórico, ele vai dizer que a paciência é uma vir-
tude oriunda da Fortaleza, que você tem de ser forte
para aguentar as coisas. Mas a paciência não é uma
virtude que vem da Fortaleza.

Se você pensar que a paciência vem da Fortaleza,


uma hora você necessariamente perderá a paciên-
cia, ou seja, perderá a virtude, porque ninguém é for-
te o tempo todo sempre. Não dá para ser. Mas se você
entender que a paciência é algo que se cultiva através
do amor, aí a história será outra.

A verdadeira paciência vem da seguinte forma: você


olha para aquele filho, para aquela esposa, para aque-
le marido, para aquele amigo que está com alguma
dificuldade, que está dando problemas, que está de-
morando para se resolver em uma questão na qual
você talvez já tivesse se resolvido. Você olha para
aquela pessoa e você estará cultivando a paciência
quando de fato entender que aquele sujeito é igual
a você, que você poderia ter a mesma dificuldade

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que ele. Você cultiva a paciência quando entende
o processo dele, a dificuldade dele, quando ama o
outro e espera que ele melhore também. É daí que
vem a paciência.

A verdadeira paciência deriva do amor,


da empatia, não da força bruta.

“Ah, mas eu tenho força, tenho capacidade de resis-


tir àquela burrice de um filho, ou àquela impontua-
lidade de um noivo”. Você não vai conseguir. Se você
tentar pegar a paciência a partir da força bruta, vai
falhar miseravelmente. Uma hora você vai perder a
paciência. É por isto que em geral perdemos a paci-
ência, na verdade: porque estamos querendo apostar
na força. Não vai funcionar. A verdadeira paciência
vem do amor.Quando você ama a pessoa, ama o pro-
cesso dela, ama o que ela pode se tornar no final das
contas, você adquire a verdadeira paciência. É daí
que vem a coisa.

Vamos concretizar o negócio: você está olhando para


um filho que tem uma certa dificuldade de apren-
dizado. O moleque não aprende, é meio disperso.
Como você vai aguentar uma criatura dessas? Ora,
vai aguentar se compadecendo dele no bom sentido.
Você vai olhar para ele e, por exemplo, tentar enten-
der o temperamento dele. Isso é o amor, nós só con-
seguimos amar aquilo que conhecemos. Para amar-

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mos melhor, precisamos conhecer melhor. Você vai
olhar para esse filho com uma dificuldade de apren-
dizado, e vai entender que talvez ele seja um sanguí-
neo ou um melancólico, vai entender como funciona
esse processo interior, e vai dar os recursos para po-
der ajudá-lo. É assim que se faz.

Ou então você tem ali, de repente, um noivo, uma


noiva, uma esposa, que nunca é pontual, sempre tem
dificuldades de se arrumar na hora certa. (Aqui cabe
uma série de piadas sobre mulheres não se arruma-
rem na hora certa, mas deixemos essa parte para lá.)
O que você vai fazer? Você vai tentar ajudar a pessoa
a criar um sistema, um processo mais rápido de es-
colha de roupas, por exemplo. Ou às vezes a pessoa
não se arruma na hora certa porque não tem roupa
mesmo, então você propõe que ela vá ao shopping.
Entende?

É daí que vem a verdadeira paciência. Ela não vem


de você suportar. Imagine que está seu esposo/espo-
sa, seu noivo/noiva, demorando para se arrumar, e
você fica no sofá da sala se controlando para não di-
zer nada, queimando de raiva por dentro. Uma hora
você vai estourar. É isso que em geral acontece com
quem tenta conquistar a paciência através do exercí-
cio da força. Não vai conseguir nunca.

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Você só consegue conquistar a paciência
através do amor, e o amor vem uma
compreensão de o que é a vida do outro,
de uma proposta de melhora para o outro.

É necessário propor ou de fato se interessar pela


pessoa, ajudá-la a melhorar, é daí que vem o amor
verdadeiro. Quando você se implica na vida do ou-
tro, propondo elementos de melhora para ele, você
está amando essa pessoa. É daí que vem a verdadeira
paciência, e não de outro lugar.

“Nossa, como sou uma porcaria, já era para


eu ser adulto. E agora?”
Ah, meu filho, graças a Deus você se deu conta dis-
so! Nós só melhoramos, só progredimos, quando no-
tamos isso aí. Em geral, enquanto estamos achando
que somos a última bolacha do pacote, que somos a
azeitona da empada, acabamos por não ajudar nin-
guém, porque estamos olhando só para aquilo que
os outros tem de olhar da gente. Perceber que somos
uma porcaria é o primeiro movimento. Daí pode de-
rivar um segundo movimento, que é fatal: o pessi-
mismo.

O pessimismo aparece quando nós nos olhamos e


vemos que somos verdadeira porcaria, como você
falou aí. Podemos ficar pessimistas se formos muito
soberbos, porque ficaremos feridos, falando “Nossa,

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eu deveria ser tão lindo e gostoso, mas notei que não
sou nem lindo nem gostoso” Meu filho, por que você
achou que deveria ser lindo e gostoso? Não precisa-
va. Portanto, quando você notar que é uma verda-
deira porcaria, o movimento seguinte deve ser um
movimento de correção. Você deve se corrigir, se
emendar, recolher aquelas virtudes que te faltam.

E outra, dizer para si “Sou uma verdadeira porcaria


em tudo” também já é soberba, já é exagero. Prestem
atenção em uma coisa que é fundamental de se ter
na cabeça: ninguém é lindo e gostoso o tempo todo e
ninguém é mau pra caramba o tempo todo. Poucas
pessoas o são.

Nenhum de todos nós, que estamos aqui, é mau o


tempo todo. Nenhum de nós é profundamente mau,
profundamente canalha. Até para ser ruim a gente é
vulgar. Aprenda isso, meu caro. Você que fez essa per-
gunta aí, não fique se achando tão mau também. É
disso que eu quero te advertir, te prevenir: você tam-
bém não é uma grande porcaria, nem nisso você é tão
diferente.

Você é uma porcariazinha igual a todos nós, então


pare com esse negócio. Eu estou com um paciente
assim agora. Amo-o, ele é meu amigo e também meu
paciente. Ele olha para si e fala “Ah, eu sou o pior dos
homens”. Pare de ser soberbo, caramba! É claro que

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você não é o pior dos homens! Você é Hitler? É Stalin?
É Mao Tse Tung? É um líder comunista que matou
20 milhões de pessoas? Claro que não, você é vulgar,
você é uma pessoa vulgar, até na sua ruindade você
é medíocre! Você, eu, nós somos assim! Nem nisso a
gente consegue se diferenciar tanto.

Pois tente ser ruim mesmo. Nem isso você con-


seguirá fazer. Então abaixe a bola, corte essa sua
crista aí, que você não é nem a última bolacha do
pacote quando faz um ato bom, nem é o homem
mais profundamente mau quando faz uma ruin-
dade. Você é só um homem medíocre, é só isso.
Não precisa ficar chorando no sofá, dizendo “Não
tem cura para mim, para a minha ruindade”. É cla-
ro que tem.

A cura é o olhar com calma, com


tranquilidade, para a sua vida.
É isso, está entendendo?

“Nossa, como sou uma porcaria”. Quer saber? Nem


isso você é. Nem uma porcaria verdadeira você é.
Olhe só que coisa. Isso é para te aliviar. Você é só uma
porcaria medíocre, como outra pessoa qualquer.

“Ai, já era para eu ser adulto, e agora?” Pare, meu fi-


lho! Esse é o drama de todo mundo, não é só seu, não.
Fique bem tranquilinho, abaixe essa crista. Olhe que

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movimento sutil do nosso espírito: se você se acha
essa porcaria enorme e verdadeira, se fica pensando
“Sou uma porcaria profunda, não há uma porcaria
maior do que esta que vos fala, este é o homem mais
porcaria do mundo”, o que acontecerá imediatamen-
te com seu movimento interior? Você pensará “En-
tão não tem cura, não tem jeito, vou ficar aqui senta-
do no sofá e vou continuar sendo uma porcaria para
o resto da vida”.

Vê só que coisa medíocre, terrível que você está fa-


zendo consigo? Isso é desculpa para não melhorar,
meu filho. Se você declara “É, eu sou só uma porca-
riazinha”, você é obrigado a melhorar, porque uma
porcariazinha tem cura. Mas se você realmente de-
clara “Eu sou Hitler, Stalin, Mao Tse Tung”, aí, meu
filho, foge da minha possibilidade de melhora, não
tem o que fazer, vai continuar sendo ruim. Mas não.
O que estou te falando é o seguinte: nem nisso você
é diferente, você é uma porcariazinha igual a todos
nós.

Você vai então tratar de declarar “É, sou uma porca-


ria em alguma coisas”, e você vai ter que melhorar.
Essa é a idéia. “Já era para eu ser adulto, e agora?”
E agora, meu filho, sabe o que você vai fazer? Você
vai arrumar sua cama, fazer as compras da sua casa,
vai falar “Mãe, não precisa fazer compra no mercado,
deixe que eu vou, não precisa a senhora ir lá não”,

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“Deixe que eu faço, deixe que eu pago as contas de
casa”. É isso o que você vai fazer.

Você diz “E agora”? Ué, agora comece a assumir as


responsabilidades da vida adulta, caramba. Quais
são? Pagar boleto, ser útil para os outros, parar de
reclamar, parar de ficar de fricote, caramba. É isso o
que você vai fazer.

“Mimimi, já era para eu ser adulto, e agora?” Seja


adulto, ora. Ficar reclamando não funciona tam-
bém. Não é que adultos não reclamem, mas isso
não é próprio do adulto. O adulto limpa a própria
cueca, caramba, faz a própria comida, arruma a
própria cama, é isso o que um adulto faz. Isto aqui
é solução para você: em vez de ficar chorando no
travesseiro, na cama, vá trabalhar. Faça trabalhos
braçais.

Se você não quiser fazer nada disso, então você não


está reclamando de nada, você é só um soberbinho,
você gosta de ser coitadinho, de ser uma porcaria-
zinha, e sabe para quê? Para ninguém te cobrar de
porcaria nenhuma, porque você é um café com lei-
te, um zero à esquerda, ninguém conta contigo.

É uma decisão que você terá de tomar na vida. Você


vai ter que assumir as responsabilidades da vida
adulta, que são simples, no final das contas. Nin-

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guém aqui está exigindo que você seja um herói, um
mártir, basta ser um adulto normal, caramba. Ganhar
seu dinheiro, não encher o saco dos outros, não ficar
pedindo tudo para todo o mundo o tempo todo, não
querer que todo o mundo tenha peninha de você e
tenha que resolver seus problemas… Vá você resolver,
caramba. É assim que você sai desse seu estado aí.

“Ah, nossa, como sou uma porcaria” Não, cara, vá por


mim: você não é uma porcaria pequenina, mas não
é uma porcaria gigantesca também. Você é uma por-
cariazinha normal, como outra qualquer.

“Recaídas ridículas de quarta camada fazem


parte do processo? Me sinto patétieca...”
É isso aí, é claro que faz parte do processo. Você está
saindo de lá. A quarta camada é como piche, ela cola
na gente. Não se preocupe com essas suas “recaídas”
de quarta camada. Até porque veja bem, não é exata-
mente uma recaída, pois você ainda está dentro da
quarta camada, mas está lutando para sair dela. E é
isso aí, você não vai desistir porque continua caindo.

Imagine que coisa terrível: “Meu Deus, tropecei um


dia e vou parar de andar, vou sentar em uma cadei-
ra de rodas a esperar que me empurrem”. Isso é uma
coisa que ninguém pensa em fazer. Todo mundo tro-
peça, ué. Quando éramos crianças, a gente tropeça
e ralava o joelho, mas continuamos andando, até a

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hora em que aprendemos a andar e passamos a cair
menos vezes. E na nossa vida afetiva faremos a mes-
ma coisa.

Você não vai paralisar no seu desejo, no


seu processo de amadurecimento porque
tropeçou, caiu, porque teve um buraquinho
no seu peito em algum momento.

Você não fará isso absolutamente. Você continua-


rá se esforçando, tentando servir, ser útil, lutando
por não encher o saco. Quem é assinante do Guerri-
lha Way verá que o caderno de ativação desta sema-
na é sobre a inveja. Matarmos a inveja é fundamental
também. Não deixem de olhar o caderno, baixem o
PDF, dêem uma lida, uma olhada.

“Ah, Italo, eu não consigo ler, não gosto de ler, tenho


cegueira, tenho hipermetropia, quebrei meus ócu-
los”. Então escute. Eu gravo um vídeo introdutório
do Guerrilha Way toda semana explicando o cader-
no de ativação. Ali já tem alguma coisa. Então vá lá,
entre no portal e dê uma olhada no vídeo, você verá
que é sobre a inveja, essa inveja que temos que matar
dentro da gente. Com inveja a gente não progride.

Saber declarar que há alguém melhor que nós é uma


das receitas para sair da quarta camada. Você vê que
há alguém melhor que você, você declara isso, você

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elogia essa pessoa e alguma coisa no seu peito já co-
meça a acontecer. Você começa a ter um modelo es-
tável para copiar, veja que coisa maravilhosa. Esse é
um dos segredos.

“Não vai ter hoje?”


Olha, minha filha, há muitas coisas que “não vai ter
hoje” mesmo, ou porque o pessoal não vai te entre-
gar, ou porque você não estará mais aqui hoje. A mor-
te chega para todos nós. Hoje nós podemos não estar
mais aqui, então iremos tratar de ser responsáveis,
de fazer especialmente bem as coisas que temos fei-
to.

“Não vai ter hoje?” Como assim “não vai ter hoje”?
Pode ser que não tenha hoje mesmo, sabia? Não está
garantido que a noite vá chegar para você, nem para
mim. E aí vem na nossa cabeça aquela estúpida idéia
de novela da Globo: “Se só te faltasse um dia, o que
você faria?” E aí as pessoas respondem: “Vou comer
torta de limão, pão de mel, vou fazer o raio que o par-
ta…” Pare com essa bobeira.

Sabe o que você deveria fazer se soubesse que não vai


chegar ao fim de hoje? Você deveria fazer especial-
mente bem aquilo que está fazendo agora, com toda
a intensidade, todo o amor, toda a presença. É isso o
que você tinha que fazer. Se você soubesse que não
terá mais hoje para você, que vai acabar para você,

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que você não vai chegar até a noite, eu recomendaria
que você faça especialmente bem aquilo que você
está fazendo agora, aquilo que é seu dever, sua obri-
gação fazer.

Se você está em um trabalho, trabalhe bem, só
hoje, meu amor. Se você está na sua casa, na sua fa-
mília, hoje, dedique-se a eles especialmente bem.
Se você está dando um beijo na sua esposa, dê um
beijo especialmente bom nela. Se você está com
seus filhos, olhe nos olhos deles especialmente
bem, sem distração. Se você está fazendo uma pre-
ce, uma oração, faça-a com seu coração derrama-
do ali no seu objeto de louvor e de culto. Se você
está tomando banho agora, se está me ouvindo e
tomando banho, tome banho especialmente bem.

Faça as coisas com presença.


Esse é o segredo.

Se você soubesse que não vai chegar até a noite hoje,


não entre em uma de maluquice, “Ah, vou fazer isso
e aquele outro…” Não, faça especialmente bem aqui-
lo que está na sua mão. Lembrar-se todos os dias que
pode ser que a gente não chegue à noite é um dos
grandes truques para a nossa vida ser produtiva, para
a gente não procrastinar, para a gente de fato ser al-
guém útil. A responsabilidade começa a entrar.

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Eu sei que há um monte de gente que me ouve en-
quanto lava a louça. Lave especialmente bem essa
louça. O motorista do Uber que está aí me ouvindo,
dirija especialmente bem. É isso o que você tem de
fazer, caramba. A vida melhora. Imagine se em um
dia todo o mundo cumprisse o seu dever. No dia de
hoje. Hoje, 18 de fevereiro, se todo mundo acordasse
e falasse: “Hoje eu vou fazer o que preciso fazer com
toda a intensidade. Hoje eu vou fazer com amor, com
intensidade, aquilo que é o meu dever.” Bicho, ima-
gine a qualidade desse dia. O mundo iria melhorar
monstruosamente. Só isso. Não precisa de, sei lá, in-
vestimento em saúde. Se nós aqui, se todo cidadão,
todo o mundo, fizesse especialmente bem aquilo
que tem de fazer, a qualidade do mundo melhoraria
monstruosamente. É ou não é?

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Live #27 | 19/02/2019 (terça) - Instagram | Youtube

RELAXA, NINGUÉM SE
IMPORTA COM A SUA VIDA
Ontem uma pessoa me perguntou uma coisa muito
interessante nos stories. É uma pergunta muito co-
mum, que manifesta algo sobre a nossa personalida-
de, sobre nosso temperamento. Enfim, a menina per-
guntou o seguinte: “Doutor Ítalo, por que as pessoas
se incomodam tanto com a minha vida?” E dei uma
resposta para colocar a pessoa no lugar, para que ela
parasse e refletisse. Então, queria desenvolver aqui
essa ideia.

Em primeiro lugar, quando falamos uma coisa des-


se tipo – “Por que as pessoas se incomodam tanto
com a minha vida?” –, isso reflete um desejo que
temos de estar sendo olhados. É um desejo que, sob
certo aspecto, é muito justificado. Temos muita di-
ficuldade de entender que possamos estar sozinhos,
que temos que fazer a nossa vida conosco mesmos.
Por mais que tenha gente que nos ame, nos apoie, a
decisão humana é sempre uma ruptura, um absolu-
to, no sentido de que ela está separada de todo o res-
to; ela não se dissolve em outras condutas.

Preste atenção, que isso é superimportante: no limi-


te, quem toma as decisões da sua vida e da minha
vida somos nós mesmos. Por mais que estejamos am-

25
parados por um grupo ou por uma comunidade, a
decisão humana é sempre sua, a responsabilidade é
sempre sua, mesmo que você ache que não é respon-
sável.

Vamos pegar o exemplo desses políticos presos. Eles


podem alegar o que quiserem: “Ah, mas eu fui con-
vencido por Fulano; fui influenciado por um meio
social corrupto; o esquema era esse...” Eu sei, Sérgio
Cabral, mas, no limite, quem assinou, quem aceitou
propina foi você. A decisão foi sua. Ninguém vai vir
do seu lado e dizer: “A culpa é minha também”. A res-
ponsabilidade é sua, não é de ninguém mais.

Nós temos, pois, uma solidão ontológica, uma so-


lidão constitucional, com a qual temos que apren-
der a conviver. Isso não é pessimismo, mas o ser
humano é de algum modo solitário. Estamos sozi-
nhos no mundo, morremos sozinhos.

“Ah, não, minha avó morreu com um monte de gente


ao lado dela rezando o Pai Nosso...” Eu sei, mas quem
passou para o lado de lá foi só ela, sozinha. Então,
morremos sozinhos, agimos sozinhos. A solidão é
algo com que temos de aprender a nos confrontar. E
não é para dar medo em ninguém. Isso aqui é a estru-
tura da vida humana mesmo. Temos algo de solitário.
É claro que temos muitas condutas que são comuni-
tárias, inspiradas pelo amor. Mas temos que aprender

26
que existe um elemento de solidão. Então, quando
uma pessoa me faz uma pergunta dessas – “Por que
as pessoas se incomodam tanto com a minha vida?”
–, é só uma pessoa que não se acostumou ainda com
a ideia de que não tem ninguém olhando para ela
durante a maior parte do tempo. Isso demonstra cla-
ramente uma insegurança, uma fraqueza.

Veja bem: ninguém está nem aí para a sua vida,


ninguém está nem aí para a vida de ninguém, essa
que é a verdade. O problema é que vivemos só com
pessoas egoístas. 90% das pessoas com que você
convive são egoístas, no bom e no mau sentido.
Ou porque são moralmente egoístas – primeiro os
interesses delas –, ou são egoístas inocentes – que
não têm um egoísmo que vai prejudicá-lo, mas
simplesmente não estão pensando em você, estão
pensando nas coisas delas.

Ninguém olha para você. Vou falar uma coisa: ra-


ramente alguém vai se incomodar com a sua vida.
Isso é coisa da nossa cabeça. Somos nós que estamos
achando que estamos incomodando os outros. O pes-
soal não está nem aí para nós.

“Ah, Ítalo, as pessoas se interessam, sim. Só me criti-


cam...”. Criticam por um minuto, depois já esquecem
que você existe. Se passar o carro de som na frente
dela, se ela passar pela barraquinha de cachorro-

27
-quente, se passar por uma vitrine de loja, já esque-
ceu de você, pois você não é tão interessante assim
para virar assunto em roda. Foi essa a resposta que
dei: “Você é rica, linda, cheirosa, tem barriga negati-
va, tem uma inteligência insuperável, tem um poder
de sedução incrível?” Não! Então, você não é assunto.

Quando nos acostumamos a não ser assunto nas ro-


das, quando não buscamos ser isso, começamos a ter
uma primeira força, que é a força para lidar com essa
solidão constitucional. Existe uma solidão que é sua,
que é minha, e não temos como resolver esse proble-
ma. Temos que nos resolver sozinhos. As pessoas não
nos estão pendurando nos fios, e falando todo tem-
po sobre nós. Não estamos sendo assunto de roda ne-
nhuma. É uma ou outra personalidade humana que
é assunto nas rodas de amigo. São pessoas que de fato
se distinguem, pelo bem ou pelo mal, o que não é o
seu caso.

Você é uma pessoa normal, como eu, como todo mun-


do. Não temos distinção nenhuma. O próprio Bolso-
naro, que era assunto em todas as rodas de amigo,
ninguém mais fala dele, nem dele que é o presidente
do Brasil. O pessoal nem lembra que ele está eleito. O
Lula – “vai ser preso, não vai; foi preso, não foi; Lula
livre...” – nem ele é mais assunto. Até esses dois sujei-
tos, que são os dois grandes ícones do assunto públi-
co, ninguém fala mais deles.

28
O Boechat – “Pobre do Boechat, que morreu; coitada
da família...”; eu mesmo fiz uma live aqui sobre o po-
bre do Boechat – e ninguém fala mais dele. Ninguém
fala mais de Brumadinho, ninguém fala de nada.

As pessoas falam delas mesmas. “Ah, não, Ítalo, eu


lembro de você todos os dias. Você é assunto qui em
casa…” Sabe por quê? Porque estou falando de você, e
não de mim! Como sou uma pessoa que fala de você,
de suas misérias, de suas possibilidades, do seu cora-
ção, você tende a lembrar de mim. Mas você só lem-
bra de mim porque estou falando de você, porra! É só
por isso.

Saiba que as pessoas não estão


absolutamente incomodadas
com a sua vida.

É você que está olhando para os outros, e está fa-


lando dos outros. No final das contas, é você quem
está falando mal dos outros. Não tem ninguém
prestando atenção em você. Você queria que esti-
vessem, mas não estão.

Desculpa informá-lo; esta é a realidade da vida hu-


mana: não tem ninguém nem aí para você. As pes-
soas estão querendo saber se vão pagar o boleto que
está atrasado, se o crush da academia vai responder
o WhatsApp que ela mandou, se vão passar naque-

29
le emprego… Ninguém está nem aí para você, porra.
Aprenda isso.

Se você passar uma semana enfiando na sua cai-


xolinha que não tem ninguém falando de você, ga-
nhará uma super força. Sabe por quê? Porque não
fica mais achando na sua cabeça que as pessoas o
estão perseguindo, porque elas não estão.

“Ítalo, estão sim. Você não sabe como é no meu am-


biente de trabalho...” Não tem ninguém nem aí para
você, meu amor. Sabe por que o estão perseguindo
no ambiente de trabalho? Porque você está fazendo
uma coisa chamada ‘trabalhar mal’. Então não é per-
seguição, porra! Se você trabalha mal, está com cara
de bunda, não entrega o que lhe pedem, está sempre
fazendo fofoca, sempre chega atrasado, ora, as pes-
soas não estão falando mal de você, estão descreven-
do a realidade. Isso não é perseguição; é diagnóstico.
Então pare de se sentir perseguido, e mude! Não tem
perseguição alguma: ninguém está falando de você,
ninguém lembra que você existe.

Quando aprende que as pessoas não lembram que


você existe, quando não se sente mais perseguido,
você passa a produzir. Olha que coisa maravilhosa,
que coisa boa da nossa vida.

É claro que respondi uma brincadeira: “Você é tudo

30
isso mesmo: barriga negativa, linda, rica, cheirosa,
maravilhosa, inteligente, dentes perfeitos, pele bri-
lhante e resplandecente? Você é essa pessoa?” Não;
então, ninguém nem lembra que você existe. Acostu-
me-se com isso, que a vida fica tão boa. Você tira um
peso do seu ombro, e começa a produzir também.

Portanto, vamos parar com essa história, pois isso


aqui é medo da solidão. Só que não adianta ter medo
da solidão, pois ela é constitucional, é constitutiva, é
algo com que você tem de lidar todo santo dia.

Os seus atos são isolados; é você quem os toma. Não


adianta achar que alguém vai decidir por você. As
pessoas até podem fazer isso, mas, no limite, foi você
quem concordou, ainda que por omissão, com a de-
cisão do outro. A responsabilidade é sua, sempre sua.

Esse papo de achar que os outros


pensam em mim, é conversa de
quem está querendo se eximir
da responsabilidade da vida.

Se você não entendeu que a vida tem um peso para


você, tem um peso para mim, que sou eu quem toma
as decisões, que sou eu que tenho que fazer as coisas
– sou eu que tenho de estudar, sou eu que tenho de
levar meu filho na escola, sou eu que tenho de dizer
sim ou não para as situações concretas –, se não en-

31
tendeu isso, vai achar que todo mundo está falando
de você..

Portanto, livre-se desse pensamento de perseguição.


Quando você se livra disso, vai se sentir necessaria-
mente meio isolado, meio sozinho – “Como não tem
ninguém falando de mim? Então não importo mui-
to; não sou tudo o que achava que era” –, finalmente
entendeu como a vida funciona. É exatamente isto:
não tem ninguém pensando em você em momento
nenhum.

E aí o que precisa fazer? Comece a agir.

A sua ação passa a ser o que você realmente


pode entregar para a vida dos outros.

Mas aí a coisa é concreta, de verdade. Até agora, você


estava entregando só uma coisa da sua cabeça. Você
acha que as pessoas estão falando de você. “A minha
vida incomoda...” Sua vida não incomoda, nem não
incomoda. Ninguém está nem aí para a porra da sua
vida. Essa que é a verdade. Infelizmente, é isso.

Mas quando você entende esse negócio, vai come-


çar a estar presente nas rodas, a ajudar os outros,
a servir os outros. Se você entra numa festa, e acha
que ‘a sua vida está incomodando’, você não precisa
agir. O fato de você aparecer já mobilizou os outros.

32
“Apareci e a minha vida já incomodou… late mais
alto, que daí de baixo eu não escuto”. Isso aí é música
da Popozuda e da Anitta. Na vida real, não é assim.
Não estão nem aí para você.

Então, você acha que quando aparece numa festa,


num casamento, todo mundo se incomoda – “A diva
chegou; todos os olhares são para mim; o meu vesti-
do é do estilista famoso; meu cabelo é o mais chique;
porra, eu sou do caralho!” –, mas não tem ninguém
pensando em você, não tem ninguém olhando para
isso, porque você não é isso tudo.

Assim, se você entende que não é isso tudo, como é


que vai se relacionar numa festa? Vai ter que sorrir,
cumprimentar, contar uma história interessante,
pegar salgadinho para a tia gorda, pegar o gengibre
para a tia fitness. Vai começar a olhar para os outros,
e ver o que cada um precisa, e vai começar a servir,
a conversar, a falar coisa interessante. Aí as pessoas
vão olhar, e interagir com a verdade que tem em você,
não com essa bosta que você criou na sua cabeça.

33
Live #28 | 21/02/2019 (quarta) - Instagram | Youtube

VOCÊ NUNCA SERÁ A BEYONCÉ


Alguns momentos da vida são decisivos.

Tem gente que acha que vai ser um gênio, que vai des-
cobrir a cura do câncer, da AIDS, que vai revolucionar
a história do mundo etc. Isso é coisa de adolescente,
mas tem gente que diz que é isso que move o mundo;
que, sem essas idéias, “o que seria da humanidade?”,
“sem essas idéias, a gente não teria as vacinas, os au-
tomóveis, o avião...”.

Acontece que ninguém que criou automóvel, vacina


ou avião tinha esse sonho na cabeça; tinha era traba-
lho duro, anos de experiência, uma puta de uma ba-
gagem de observação, de esforço. A maior parte das
histórias é assim, não é que o cara tinha um sonho de
infância, que achava que ia ser um gênio. O cara não
achava nada, ele estava era trabalhando; e uma hora,
óbvio, ele conseguiu articular dois ou três campos de
conhecimento mais ou menos distintos e inventou
alguma coisa, ou deu uma contribuição. Em geral é
assim que se faz.

Esse papo de que “vou ser um gênio”, “vou ser um


milionário”, “o pensamento positivo vai mudar mi-
nha vida” é uma bobeira sem fim. Você tem de traba-
lhar duro. Essa é uma coisa que sempre repito aqui.

34
Mas não é exatamente dessa determinação que que-
ro falar.

Uma das coisas que mudam a vida de


um sujeito é quando ele descobre que
não vai ser um gênio. Isso nos dá
uma tranquilidade enorme.

Alguns adolescentes são estúpidos e soberbos o bas-


tante para achar que vão ser gênios. Mas você não vai
ser nada, meu filho.

Quando você descobre que não vai ser um gênio,


a sua vida começa a andar. Porque você olha para
seu trabalho diário e descobre que tem de começar
a fazer as coisas. “É, eu não vou ser um gênio, não
vou ter aquela sacada que vai mudar a minha histó-
ria, a minha conta bancária. Vou ter aquela idéia, vou
fazer um aplicativo que vai conectar A com B, depois
vou fazer um evento de liquidez e, puta merda!, vou
botar 100 milhões no meu bolso!” Meu filho, não vai
acontecer isso com você, caia na real.

Essa é a primeira coisa importante de você saber: Vá


trabalhar, vagabundo! Que gênio, que nada! Isso é
papo de quem não quer trabalhar e assumir o peso
da vida.

A vida funciona exatamente assim: você acorda,

35
trabalha, estuda e, de repente, você pode até ter
uma idéia boa, razoável, melhor que a dos outros,
e aí você vai se destacar um pouquinho; se você for
persistente nesse negócio, quem sabe até consiga
alguma coisa. Mas, esse papo de ser milionário, pare
com essa história. Existe um monte de milionário, eu
sei, mas eles não são assim. A maior parte dos mi-
lionários trabalhou duro por muito tempo. “Mas tem
milionário que não trabalhou duro.” É, mas essa não
é a sua história. A sua história é: se você quer ser um
milionário, vai ter de trabalhar ganhando pouco por
muito tempo, e, de repente, você consegue ser um
milionário.

Se você tem dificuldade de acordar cedo, tem de


ficar colocando o despertador para tocar uma vez
atrás da outra, não consegue ser pontual, não con-
segue sentar para estudar, não consegue entregar
um relatório direito, você nunca vai ser um milio-
nário! Muito menos um gênio.

Milionário é até fácil você conseguir ser, mas gênio?


Pare com essa idéia de jerico.

Mas sei que você não tem mais essa idéia, não tem
mais 14 ou 15 anos, já está na vida adulta, já entendeu
que tem uma certa limitação intelectual, como eu, já
entendeu que tem certa limitação física, como eu, já
entendeu que tem certa limitação de convívio, como

36
eu. Espero que você já tenha entendido isso.

Mas tem outra coisa que você tem de entender, que


são as determinações do dia a dia, do meio ambien-
te. Você não é 100% livre! Não sei se você sabe disso.
O pessoal acha que é livre para fazer o que quiser.
Mas você não é 100% livre. Você tem uma série de
determinações que te condicionam. Isso é uma coi-
sa muito importante. Quando você entender isso,
de repente a sua vida começa a andar.

Um exemplo de uma determinação que te condicio-


na é que você não nasceu falando alemão. Você nas-
ceu no Brasil e começou a falar português. Essa já é
uma determinação. Você já tem uma grande diferen-
ça para com as pessoas que falam alemão.

Outra determinação: você não tem 1 metro e 90. E


quem tem 1 metro e 90 não tem 1 metro e 70. Temos
uma série de determinações físicas, sociológicas etc.
Eu estava falando desse assunto com uma pacien-
te hoje de manhã, e ela falou: “Mas esse negócio de
temperamento de repente não determina alguém?”
É óbvio que determina. Pronto, simples assim. Você
acha que não está determinada pelo resto das coisas
do mundo? Está! O temperamento é um dos elemen-
tos que vai te determinar.

37
Determinar não significa que você
não possa fazer certas coisas; mas
você vai ter de se esforçar, porque
elas não saem naturalmente.

O fato de você não ser 100% livre não significa tam-


bém que você está 100% determinado.

Não somos nem 100% livres nem 100% determina-


dos. A vida humana acontece exatamente na articu-
lação entre essas duas coisas.

Há um elemento de liberdade que está na vontade.


Mas existe uma liberdade que a gente não tem. Esta-
mos determinados pelos aspectos sociológicos, físi-
cos, às vezes até intelectivos. Tem gente que tem le-
são na inteligência.

Quando você entende que está determinado pela cir-


cunstância, a sua vida começa a andar. Esse é o pon-
to central da história.

Aquela frase do Ortega y Gasset é maravilhosa, eu a


repito um milhão de vezes: “Eu sou eu e minhas cir-
cunstâncias”. “Eu” é igual a eu + minhas circunstân-
cias. Isso é o “eu”. O “eu” não é isolado, abstrato, teó-
rico, do modelo antropológico aristotélico, tomista,
oriental, indiano… Isso é coisa da sua cabeça. O “eu”
mesmo é determinado pela circunstância.

38
“Eu” sou eu + minha circunstância. Não adianta você
se revoltar contra isso, essa é a estrutura do mundo.
Essa é a estrutura da sua pessoa. Você olha para sua
circunstância e entende que você está determinado.
Isso não vai te levar ao comodismo, à revolta, ao ran-
cor. Pode te levar, claro, mas tudo pode levar a gente
ao comodismo, à revolta e ao rancor. Pelo contrário,
isso vai te levar a uma ação na vida. Você assume:
“Estou determinado. Não nasci nos Estados Unidos,
não tenho acesso a toda a tecnologia. Não vou ser o
próximo Elon Musk, nem o próximo Steve Jobs”.

Para que você quer ser isso? Seja um bom pai de fa-
mília, um bom profissional, um sujeito pontual; ven-
ça sua preguiça e comece a ser melhor para os ou-
tros, a ser honesto, a ganhar dinheiro, que a sua vida
começa a ir para frente. Simples assim. “Eu não sou a
Beyoncé.” Sabe quando você vai ser a Beyoncé? Nun-
ca! Imagina se eu, Italo Marsili, quisesse ser a Beyon-
cé. Eu não sou mulher, não sei fazer aquelas coisas
que ela faz, nem cantar eu canto. É óbvio que estou
determinado. A gente consegue entender a obvieda-
de da questão quando damos esses exemplos escra-
chados.

E por que não conseguimos entender essa obvie-


dade no dia a dia da nossa vida? É porque estamos
querendo fugir da trama da nossa vida. Temos uma
realidade mental, psicológica, imaginativa, abstra-

39
ta, que nos dá um certo conforto absolutamente
idiota, e esquecemos de ver a vida como ela é.

A vida como ela é não é opressiva, ruim. É uma ma-


ravilha. A melhor coisa do mundo é você olhar para
a vida real. A vida real é feita de todos esses ingre-
dientes.

A vida real é feita da circunstância,


do universo imaginativo, da capacidade
de oração, das pessoas que se apresentam,
das dificuldades e facilidades.

Essa é a trama da vida real. Florida, luminosa, com


vigor sensitivo!

A fuga para a vida imaginária é próprio de quando


estamos fracos e covardes. Para que você vai fugir
para aquele reduto mental que te aprisiona? Lá te-
mos uma impressão psicológica de liberdade. Mas
não há liberdade alguma nesse reduto mental,
porque todo dia você é convocado a se apresentar
na assembléia da vida material. Então, vamos olhar
para essa vida. E essa vida é determinada pela sua
circunstância concreta.

Tem coisas que a gente acha que são um problema. E


a gente acha que são um problema porque estamos
impregnados de uma certa cultura. Essa cultura de

40
“fazer” e “ser” o que você quiser é uma bobeira. Você
não vai ser o que quiser. Essas coisas são tão loucas
que desembocam em ideologia de gênero, etc. Você é
um menino e quer ser uma menina? Beleza, mas vai
virar uma menina em função do menino. Não adian-
ta, não há neutralidade, todo mundo nasce determi-
nado.

O peso da realidade é uma delícia.


Só se pode ser verdadeiramente feliz aí.

O lugar da fuga mental é muito entristecido. Eu


sei disso, atendo pessoas todos os dias. Lá não tem
vida, vigor.

A gente se contamina por um caldo de cultura que


está presente em tudo: em música MPB, pop, rock
etc. Tem também os livrões de autoajuda confundin-
do tudo. Alguns são bem intencionados, mas fazem
uma confusão dos diabos. Eles têm medo de falar a
verdade da vida.

A verdade da vida é que você não vai ser o quiser. Fi-


que nessa de querer ser o que você quiser para ver o
que acontece. Você vai entrar num workshop de au-
toajuda falando que você pode ser o que quiser, mas
daqui a 3 ou 4 anos estará frustrado, fazendo prova
de concurso público de ensino médio. Não tem pro-
blema em fazer esse tipo de concurso, mas você vai

41
estar frustrado porque achou que podia ser qualquer
coisa.

Você não vai ser um milionário. Não é que estou ro-


gando praga. Mas, para ser um milionário, você tem
de trabalhar todo dia, tem de ser um abnegado, pre-
cisa de uma atenção enorme etc. Se você tiver tudo
isso, talvez até consiga ser um milionário.

O pessoal fala do livro Trabalhe 4 horas por semana.


É interessantíssimo, mas a pessoa que compra aque-
le livro pensando em trabalhar 4 horas por semana
nunca vai conseguir. Só consegue trabalhar algum
dia 4 horas por semana e viver dos proventos desse
trabalho aquele sujeito que trabalhou igual doido, 12
horas por dia por 10 anos. Mas esse tipo de sujeito,
que tem esse drive, nunca vai trabalhar 4 horas por
semana, porque não é da natureza dele. Quem tem
isso como meta, vai chegar aos 70 anos precisando
trabalhar, porque apostou na preguiça, no caminho
fácil.

Eu conheço um monte de milionário. Nenhum deles


tem a vida que o pessoal que não é milionário acha
que eles têm.

Vocês conhecem o Gary Vee? Ele é um cara fantás-


tico; é engraçado, doidão, eu gosto dele. Ele deve ser
bilionário, mas faz questão de bater foto com olhei-

42
ra, cansado pra caramba. Por quê? Você acha que ele
ficou bilionário como?

É óbvio que estamos determinados por isso tudo.

Quando você entende que está determinado, sua


vida pode começar a melhorar. Mas se você acha que
pode tudo, então você não pode nada. Essa é uma re-
gra da vida. Aquele sujeito que acha que pode tudo,
não pode nada. E aquele que acha que não pode nada,
porque está deprimido e desesperançoso, esse não
pode nada mesmo.

“Nem tanto ao mar, nem tanto à terra”. A nossa


vida está num centro articulado entre a liberdade
e a determinação. Os dois extremos são falsos. Po-
demos algumas coisas e não podemos outras.

O sujeito que olha para si e diz que não pode nada,


que é um coitadinho, ou está doente, precisando
de ajuda (atendo vários aqui), ou apostou no viti-
mismo. O que ele quer é que ou mamãe ou papai
corram para ajudá-lo. O sujeito que se põe numa
postura dessa está querendo que alguém vá lá e re-
solva o pepino para ele. Não vai funcionar.

Esse é o sujeito vitimista. Ele vai ter sempre uma fra-


ção daquilo que poderia de fato ter.

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Tem um meme que acho fantástico: é uma família de
patos em que o patinho filho olha para mamãe e fala
que quer ser um astronauta; a mamãe só olha para
ele e diz que não.

Não existe pato astronauta! Você não vai ser um pato


astronauta. Pato serve para estar no lago, para nadar,
para voar, para carne boa de risoto etc. É para isso que
pato serve. Temos, então, de olhar para nós mesmos
e encontrar as nossas próprias determinações:

O que posso fazer?


O que sei fazer?
Qual foi a família em que nasci?
Quais são as potências que tenho?
Estou determinado por quais circunstâncias?

Aí a sua vida começa a ir para frente. Vai que vai.

Temos de matar os patos astronautas que estão na


nossa cabeça.

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@italomarsili
italomarsili.com.br

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