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Introdução à biofortificação

Módulo I - Fome Oculta: O que é e como combatê-la?

MATERIAL DE APOIO DIDÁTICO

31 de maio de 2018
Criação: Camila Stephan Marques da Silva
Normalização: Celma Rivanda Machado de Araújo
Introdução à biofortificação
Módulo I - Fome Oculta: O que é e como combatê-la?

Neste primeiro módulo, você será capaz de entender o que é fome oculta, suas causas
e efeitos, assim como as possíveis soluções para combater este mal.

1. O PROBLEMA

A fome oculta é um fenômeno que atinge pessoas no mundo inteiro, desde as mais
necessitadas nos países subdesenvolvidos até aquelas com maior poder aquisitivo nos países
desenvolvidos. Trata-se de um estado de carência nutricional, seja pela falta de acesso a uma
alimentação completa e de qualidade, seja pelo consumo de alimentos de alto teor calórico e
de incompleto valor nutricional. Para estes últimos, destaque deve ser dado aos praticantes
de atividades físicas que fazem dietas alimentares rigorosas e aos obesos. No entanto, o
problema torna-se mais preocupante em regiões menos desenvolvidos e, consequentemente,
mais pobres. Nestes casos, os grupos prioritários são as crianças na pré-escola, as gestantes,
as lactantes e os idosos.

De acordo com Vilas Boas1 (2016), a fome oculta ocorre quando os indivíduos possuem
carências nutricionais em seus regimes alimentares, comprometendo sua saúde e qualidade
de vida, incidindo em diversas enfermidades associadas à alimentação precária.
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Mais especificamente, as carências nutricionais decorrem da ingestão inadequada de


micronutrientes, exemplificado pelas vitaminas e minerais, tais como: pró-vitamina A, ferro e
zinco. Frequentemente, esta anomalia alimentar ocorre de maneira combinada a duas ou mais
deficiências nutricionais. Um fator preponderante reside no fato deste distúrbio alimentar se
instalar de forma imperceptível no organismo, trazendo sérias complicações, que de início se
apresentam de forma branda, podendo em estágios mais avançados levar à morte. Por
exemplo, a deficiência de vitamina A pode causar cegueira irreversível, cegueira noturna,
diminuição da função imunológica e, como consequência, aumento do risco de infecções. O

1 Doutorando em Geografia pela Universidade Federal de Minas Gerais, com ênfase em pesquisas
1 relacionadas aos temas: Fome, Alimentação, Segurança Alimentar, Renda da Terra, Agricultura, entre
outros.
efeito primordial da deficiência de ferro está a anemia, tendo como grupo de maior risco2 as
gestantes e as crianças. Entre os sintomas de carência de zinco estão a deficiência no sistema
imunológico e as alergias crônicas constantes.

Confira, abaixo, a lista dos alimentos de origem vegetal que são ricos em ferro, zinco
e pró-vitamina A:

Ferro

As melhores fontes de ferro de origem vegetal são encontradas nos vegetais folhosos
verde-escuros, nas leguminosas (feijões, fava, grão-de-bico, ervilha e lentilha), nos grãos
integrais ou enriquecidos, nas nozes, nas castanhas e nas farinhas de trigo e de milho
fortificadas com ferro.

Zinco

O zinco proveniente de fontes vegetais pode ser encontrado nas leguminosas, nas
sementes de abóbora, nas sementes de melancia, no grão-de-bico, no cogumelo, nas
castanhas do caju, nas amêndoas e nos amendoins. Ele é encontrado principalmente no
gérmen e nas camadas externas dos grãos.

Pró-vitamina A

A pró-vitamina A (betacaroteno) é a forma como se encontra a vitamina A nos vegetais.


Ela está presente nos seguintes alimentos: cenoura, batata-doce, abóbora, beterraba,
mamão, damasco e manga. Em quantidades menores, pode ser encontrada nos vegetais
folhosos como couve, repolho, espinafre, agrião e brócolis.
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2 Avanços da ciência mostram que os primeiros mil dias de vida, que engloba os 270 dias de gestação
mais os 365 dias do primeiro ano de vida e os 365 do segundo, tem grande impacto na saúde do bebê,
com desfechos que serão sentidos na vida adulta.

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2. SOLUÇÕES PARA O PROBLEMA DA FOME OCULTA

De acordo com Silva (2000), a deficiência de micronutrientes é considerada um dos


problemas de saúde pública de maior relevância no mundo. Diante deste problema, listamos
a seguir alguns meios de intervenção para solucioná-lo:

 Educação nutricional e diversificação alimentar: Promoção de práticas alimentares


saudáveis e estímulo ao consumo de alimentos ricos em micronutrientes que podem
estar disponíveis, mas subutilizados pela população deficiente.
 Fortificação de alimentos: A fortificação de alimentos é uma prática iniciada nos anos
1940, quando restrições inerentes à segunda guerra mundial limitaram a oferta de
alimentos. Trata-se de um processo no qual é acrescido um ou mais nutrientes ao
alimento processado, com o objetivo de prevenir ou corrigir deficiências nutricionais
apresentadas pela população. Falaremos mais sobre esta técnica no módulo 3.
 Suplementação: É uma outra opção amplamente utilizada para complementar a
alimentação quando não conseguimos as vitaminas e minerais através da alimentação
regular. Nesta técnica os micronutrientes são substâncias químicas vendidos em
cápsulas, pó, pastilhas, entre outros formatos. Seu consumo deve ser feito sob
indicação e acompanhamento de um médico ou nutricionista. Falaremos mais sobre
as suas vantagens e desvantagens no módulo 3.
 Biofortificação de alimentos: A biofortificação (conceito este que você irá aprender
no próximo módulo) é uma técnica inovadora nos cultivos agrícolas, que tem por
objetivo aumentar os teores de vitaminas e minerais em alimentos tradicionalmente
consumidos por populações carentes e assim contribuir para a segurança alimentar.
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Pode ser feito por melhoramento convencional, transgenia ou fortificação agronômica


(uso de fertilizantes). O principal programa de pesquisa no mundo que trabalha com
biofortificação é o Programa HarvestPlus, um consórcio de pesquisa que atua na
América Latina, África e Ásia com recursos financeiros da Fundação Bill e Melinda
Gates, Banco Mundial e agências internacionais de desenvolvimento. O Brasil também
possui seu próprio programa de biofortificação — Rede BioFORT — mantida graças à
união entre a Embrapa, o HarvestPlus, as universidades, os centros de pesquisa
nacionais e internacionais, as associações de produtores, os governos estaduais, as

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prefeituras, as organizações não-governamentais, o CNPq e diversas fundações
estaduais de suporte à pesquisa.
 Políticas públicas: Foi na década de 1940, com os trabalhos de Josué de Castro3, que
o problema da fome entrou na agenda política brasileira. Outro grande expoente da
luta contra a fome no Brasil foi Herbert José de Souza, o saudoso Betinho, que se
dedicou ao projeto “Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida” na década
de 1990. Podemos listar diversos planos de erradicação da fome implementados pelo
Governo Federal como o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN), o
Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), o Programa de Alimentação do
Trabalhador (PAT), o Programa Bolsa Família (PBF), o Programa de Suplementação de
Ferro e Vitamina A e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).

Agora que você já sabe o que é fome oculta e como combatê-la, convidamos você a
refletir.

Para refletir

Apesar de o Brasil possuir o maior programa de alimentação escolar do mundo (Programa


Nacional de Alimentação Escolar-PNAE*), foi divulgada numa reportagem veiculada no Jornal
G1, de 20 de maio de 2018, que um terço das crianças de 0 a 3 anos mais pobres do Brasil está
fora da creche por falta de vaga. A partir desta notícia, e levando-se em consideração que os
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primeiros 1000 dias de vida são cruciais para o desenvolvimento da criança, reflita sobre a
importância da creche na segurança alimentar das crianças.

Nota: *Originalmente criado em 1955 com o nome de Campanha de Merenda Escolar, o


Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é a mais antiga política pública de
segurança alimentar e nutricional do Brasil. Este visa contribuir com o desenvolvimento, a
aprendizagem, o rendimento escolar e a formação de práticas alimentares saudáveis dos
alunos, por meio da oferta de alimentação escolar e de ações de educação alimentar e

3 Josué de Castro foi um dos maiores intelectuais brasileiros no tema da alimentação e nutrição.

4
nutricional. Cabe destacar que um marco importante da história do PNAE foi a aprovação da
Lei nº 11.947, em 2009, que prevê que 30% dos alimentos utilizados na merenda devem ser
procedentes da agricultura familiar.

Referências

VILAS BOAS, L. G. Fome oculta e seus liames como a economia, a política e a


sociedade. GeoGraphos. Alicante, Grupo Interdisciplinario de Estudios Críticos y de América
Latina de la Universidad de Alicante, v. 7, n. 90, p. 207-232, sept. 2016. Disponível em:
< https://rua.ua.es/dspace/bitstream/10045/57425/1/Lucas_Guedes.pdf >. Acesso em: 14
maio 2018.

SILVA, K. L. e. Revisão da Literatura. In: NUTTI, M. R. (Coord.). Enriquecimento e restauração


de alimentos com micronutrientes: uma proposta para o Brasil. São Paulo: ILSI Brasil, 2000.
p. 15-41. Cap. 1.

DUARTE, G. B. S.; REIS, B. Z.; COZZOLINO, S. M. F. Recomendações de minerais e vitaminas. In:


PHILIPPI, S. T.; AQUINO. R. C. (Org.). Recomendações nutricionais nos estágios de vida e nas
doenças crônicas não transmissíveis. São Paulo: Ed. Manole, 2017. Cap. 4.

BRASIL poderá alcançar o fim da fome até 2030. In: FAO. 2017. Disponível em:
<http://www.fao.org/brasil/noticias/detail-events/en/c/1042982/>. Acesso em: 14 maio
2018.

MORENO, A. C. Um terço das crianças de 0 a 3 anos mais pobres d. Jornal G1, Globo. Disponível
em: <https://g1.globo.com/educacao/noticia/um-terco-das-criancas-de-0-a-3-anos-mais-
pobres-do-brasil-estao-fora-da-creche-por-falta-de-vaga-diz-ibge.ghtml>. Acesso em: 21 de
maio de 2018.

MARTÍN Caparrós viaja pelo mundo para entender a fome. Disponível em:
<http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/tv/materias/PONTO-DE-VISTA/521951-
MARTIN-CAPARROS-VIAJA-PELO-MUNDO-PARA-ENTENDER-A-FOME.html>. Acesso em: 20
de abril de 2018.
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ANDERSON, L. et al. Nutrição. 17 ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1998. 737 p. Tradução de:
Nutrition in Health and Disease.

Literatura recomendada

SISTEMAS alimentares e nutrição: a experiência brasileira para enfrentar todas as formas de


má nutrição. Brasília, DF: OPAS, 2017. 128 p.

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