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DISCIPLINA: Língua Portuguesa

PROFESSOR: Jeymeson de Paula Veloso


CONTEÚDO: Parnasianismo

Conceito de BELO – Dicionário de termos literários – Carlos Ceia


“Não pode haver nenhuma regra de gosto objectiva, que determine por meio de conceitos o que seja belo.
Pois todo juízo proveniente desta fonte é estético; isto é, o sentimento do sujeito e não o conceito de um objecto é o
seu fundamento determinante. Procurar um princípio de gosto, que fornecesse o critério universal do belo através de
conceitos determinados, é um esforço infrutífero, porque o que é procurado é impossível e em si mesmo
contraditório.” (Crítica da Faculdade do Juízo, I, 17). Kant refere-se assim à tentativa de definição do belo (Das
Schöne), categoria estética ou expressão maior da estética, tradicionalmente tomada por “ciência do belo”. Por ser um
conceito com enorme carga subjectiva e de aplicação universal, a sua definição é problemática desde a origem da
reflexão estética. O primeiro texto especulativo sobre o belo (kalos), o Hípias Maior, atribuído a Platão, termina com a
confirmação do provérbio “o que é belo é difícil”, pois os dois interlocutores, Sócrates e Hípias, não conseguiram
chegar a uma definição satisfatória. Da mesma forma que termos como o amor, a justiça, o jogo, o bem e o mal, por
exemplo, são indefiníveis no sentido em que não é possível determinar um critério de aplicação imediata, assim
acontece com o conceito de belo. Kant, o primeiro filósofo a tratar da questão do belo de forma sistemática, contudo
sem propor um método de reconhecimento, chama estética à parte da Crítica da Razão Pura que trata
da sensibilidade, mas estuda o belo na Crítica da Faculdade o Juízo. Depois de Alexander Baumgarten (1714-
1762), autor de Aesthetica, o que prevalece é uma elementar definição da estética como ciência do belo (da mesma
forma simplista que se aceita a lógica como ciência da verdade e a moral como ciência do bem).
Na Antiguidade, o belo é tratado por Platão, Aristóteles e Plotino. O Hípias Maior é o diálogo que mais
demoradamente se ocupa da definição do belo em si (auto to kalon), um traço que seja comum a todos os objectos
supostamente belos. No Simpósio e no Fedro, o problema do belo concorre com o do amor. O Simpósio é em grande
parte a procura de uma solução para a questão: “Eros é o amor do belo?”(204d). O amor é sempre um delírio (mania)
que nos conduz à visão do belo sensível (“Somente a Beleza tem a ventura de ser mais perceptível e
cativante!”, Fedro, 250d). Neste diálogo, Sócrates pergunta a Agatão: “Não achas que o belo é simultaneamente
bom?” (201c). O diálogo não chega a ser conclusivo. Aristóteles, na Metafísica, chama já a atenção para a diferença
entre o belo e o bem: o bem implica sempre acção e o belo pode ser encontrado nas coisas imóveis (1078a1).
Aristóteles considera depois três formas superiores do belo: a ordem, a simetria e o limite, formas que a matemática
demonstra especialmente. Como a simetria diga respeito fundamentalmente às artes plásticas, Aristóteles não a
menciona na Retórica, onde volta ao assunto. A ordem encontra-se na estrutura formal da tragédia; a limitação diz
respeito à extensão da tragédia. Estes princípios filosóficos são aplicados à literatura na Poética: “o belo consiste na
grandeza e na ordem, e portanto, um organismo vivente pequeníssimo não poderia ser belo (…); e também não seria
belo, grandíssimo.” (1450b). Não se encontra em Aristóteles, contudo, uma especulação sistemática sobre o belo. Em
as Enéadas, Plotino também discorre brevemente sobre o assunto, pondo em causa a ideia de que o belo possa ser
medido pela grandeza e pela ordem. Plotino segue ainda Platão e conclui que tais critérios apenas servem a beleza
física, ignorando a beleza moral.
O conceito de belo entra na crítica da obra de arte de parceria com as noções de gosto, de equilíbrio, de
harmonia, de perfeição – efeitos que se produzem no sujeito apreciador. Parece ser condição necessária ao despontar
do sentimento do belo a sensação de prazer e/ou de simpatia. As duas principais conceituações clássicas do belo
apresentam-no como “o que é agradável à vista e ao ouvido” (Platão, Hípias Maior, e S. Tomás de Aquino). Kant
demonstra que o belo não pode ser só o agradável, porque o prazer estético pode neutralizar o prazer sensível e vice
versa. O agradável provoca o desejo e está sujeito à predisposição do sujeito. O belo é sempre sensação subjectiva e
desinteressada, não sendo determinado por nenhuma predisposição particular do sujeito. Kant dirá a propósito que o
juízo sobre o agradável pressupõe o prazer provocado pelo objecto, enquanto o juízo sobre o belo é anterior ao prazer
e condiciona-o.
Hípias propôs a Sócrates que o belo fosse o útil. Mas sabemos que são coisas distintas, porque as coisas úteis
não são necessriamente belas e vice versa. O útil está circunscrito a uma situação particular e relativa; o belo é
independente de qualquer condição. O belo julga-se por si mesmo, ao passo que o útil deseja-se em função de um
propósito. Como observou Kant, o belo “agrada sem conceito”, porém só podemos dizer de algo que é útil quando o
sujeitamos à experiência ou à ponderação.
O sublime não é apenas o belo elevado ao seu mais alto grau. Da mesam forma, por analogia, o bonito não é
simplesmente o belo reduzido à sua expressão mais comum. O sublime exige a condição de ilimitado: é sublime o que
se nos escapa no juízo imediato do belo. O sublime é aquilo que a imaginação não consegue deter; o belo é detível
pela imaginação e encontra-se num objecto finito. O bonito (e todas as variantes de menoridade do belo como
o gracioso, o lindo, o encantador, etc.) é o belo sem grandeza de espécie limitada. A avaliação de um objecto em
termos de sublime, belo ou bonito é a mais subjectiva das actividades judicativas do homem. Trazida tal avaliação
para a literatura, não se aceita hoje que tais atributos possam ser determinados objectivamente para a leitura crítica do
texto literário. A crítica impressionista que dominou o século XIX pode reclamar o contrário, mas todas as correntes
críticas do século XX tendem a não considerar os juízos meramente subjectivos como aceitáveis na apreciação das
obras de arte literária.
Não é possível dissociar o belo do seu antónimo: o feio. O adágio “Quem o feio ama bonito lhe parece.”
mostra que os juízos sobre o belo e o feio são potencialmente arbitrários. Se um objecto é considerado feio é porque
não possui aquilo que se julga ser belo, mas como tal consideração é sempre subjectiva, o que é feio para uns pode ser
até sublime para outros e vice versa. Nem o cómico pode servir de meio de apuramento do belo e do feio, porque tanto
podemos rir de uma coisa bela como de uma feia, embora seja esta última, quando associada sobretudo ao ridículo,
que provoca mais vezes o riso.
O belo só faz sentido para o homem, por isso tem que ser uma categoria que está presente no Ser do homem.
Mas o belo não é determinante do Ser de todas as coisas para que se dirige. Daquilo que dizemos ser belo, extrai-se
um juízo de valor que afecta a existência em si do objecto analisado. Como defende Kant, na Crítica da Faculdade de
Julgar (I, 2), uma coisa é bela em função de uma simples observação subjectiva, não se colocando em causa a
existência que a coisa tem em si mesma. Kant distingue o belo do bom (o que agrada por meio da razão) e do
agradável (o que exige a aceitação dos sentidos). O belo resulta de uma reflexão subjectiva sobre um objecto, sem
haver necessidade de saber que coisa deva ser esse objecto (a não ser que queiramos determinar se ele é bom), ou seja,
uma coisa bela não pede um conceito sobre a coisa em si. Uma flor pode ser considerada bela sem produzirmos um
conceito sobre a sua realidade como flor. (Em termos estéticos, pensamos que a avaliação da beleza de uma obra de
arte se faz de forma algo diferente da dos objectos comuns: dizer que uma obra é bela é criticamente redutor se não
acrescentarmos algo sobre a natureza e o perfil dessa obra.) Como o juízo do belo é meramente contemplativo (por
isso tem um alcance crítico limitado na apreciação de uma obra de arte) e sem qualquer interesse, não pode ser um
juízo do conhecimento. Quer dizer, o belo não está alicerçado em conceitos nem tem por fim chegar até eles. A
definição kantiana é então enunciada nestes termos: “O belo é o que é representado sem conceitos como objecto de um
comprazimento universal.” (I, 6).
Desta definição parte Kant para uma importante distinção: “Há duas espécies de beleza: a beleza livre
(pulchritudo vaga) e a beleza simplesmente aderente (pulchritudo adhaerens). A primeira não pressupõe nenhum
conceito do que o objecto deva ser; a segunda pressupõe um tal conceito e a perfeição do objecto segundo o mesmo.
(…) Flores são belezas naturais livres. (…) No entanto, a beleza de um ser humano (…) pressupõe um conceito do fim
que determina o que a coisa deve ser, por conseguinte um conceito da sua perfeição, e é portanto beleza simplesmente
aderente.” (I, 16). Os comentadores posteriores do belo parecem concordar com a existência de duas espécies de belo.
Hegel começa a sua Estética distinguindo desde logo o belo artístico do belo natural. Este segundo tipo de belo (que
equivale ao “belo livre” de Kant) fica de fora da estética que se deve ocupar apenas do belo criado pela arte. É a única
forma de trazermos o conceito do belo para a teoria literária: o belo do texto literário é, invariavelmente, um belo
artístico, conquanto a literatura seja uma obra de arte. Nenhum texto literário pode ter uma beleza como a do Sol, que
é absoluta e não é um produto do génio.
Depois de concordar com a tese de Kant sobre a insustentabilidade da definição clássica do belo como
unicamente o que agrada, convencido de que qualquer reflexão sobre o belo não pode limitar-se ao domínio do
sentimento, Hegel defende o belo artístico como o único com interesse estético. O belo artístico é um produto do
espírito, por isso só o podemos encontrar nos seres humanos e nas obras que eles produzem. Segundo Hegel, a Ideia
do bem, da verdade e do belo completam-se, porque, em suma, só há uma Ideia. Tudo o que existe contém a Ideia. A
estética ocupa-se em primeiro lugar da Ideia do belo artístico como ideal. O romantismo de Schiller, Goethe e
Schelling definira o belo como o infinito no finito. Hegel completará este aforismo com uma reflexão especulativa
mais ambiciosa: o belo, que do objecto aparece no sujeito, é “em si mesmo infinito e livre”.
A estética hegeliana foi desprezada no século XIX, vencida pelo psicologismo dominante. Em Itália,
Francesco de Sanctis preservou a lição de Hegel e o seu sucessor, Benedetto Croce, com a Estética come scienza
dell’espressione e linguistica generale (1902), redescobre a visão idealista do belo. Propondo a a abolição das
fronteiras entre todas as artes e entre todos os géneros literários, Croce defende todo o acto artístico como expressão,
origem do “lirismo”. Conquanto as obras de arte sejam formas de lirismo, serão sempre arte com valor estético.
No marxismo, a estética de Hegel também encontrou defensores. Se os fundadores do marxismo apenas dedicaram ao
problema do belo breves comentários, autores contemporâneos como Lukács e Brecht empenharam-se na definição do
belo artístico como expressão do homem social, trabalhador e criador. Visando a unidade do verdadeiro, do bom e do
belo, a estética marxista-leninista vai mais além da obra de arte na procura do significado do belo. Toda a obra de arte
é um reflexo da consciência social. O belo não é uma realidade absoluta e intocável pelo humano: o belo é o resultado
do trabalho humano realizado em comunidade.

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