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OmniPax Editora Rev Bras Terap e Saúde, 1(2):75-81, 2011

Intervenção Fisioterapêutica Psicomotora


em Crianças com Atraso no Desenvolvimento

Psychomotor Physical Therapist Intervention in Children with Late Development

Luciana Vieira Castilho-Weinert∗, Elgison da Luz dos Santos, Marcelo Rodrigues Bueno
Curso de Fisioterapia, Universidade Federal do Paraná - Setor Litoral, Matinhos (PR)

Resumo: Contextualização: A psicomotricidade visa facilitar a interação entre a motricidade, a afetividade e a mente, pois o desen-
volvimento motor típico está relacionado com estes três fatores. Os participantes da terapia psicomotora são estimulados a interferir
em cada exercício proposto para obter experiências significativas. A interação entre a fisioterapia e a psicomotricidade pode tornar o
tratamento fisioterapêutico mais eficaz e significativo tanto para o paciente como para o fisioterapeuta. Objetivos: O presente estudo
teve como objetivo caracterizar o perfil psicomotor de cinco crianças com diagnóstico clínico de atraso no desenvolvimento psicomotor,
na faixa etária de três a cinco anos de idade cronológica. Métodos: Após aprovação do projeto de pesquisa por um Comitê de Ética,
sob o número do CAAE 2807.0.000.301-08, as crianças foram recrutadas na Associação Mantenedora do Centro Integrado de Preven-
ção (AMCIP), no município de Curitiba. O instrumento de avaliação utilizado foi a Avaliação Psicomotora de Fonseca, cujo resultado
direcionou a elaboração de um plano de tratamento individualizado. Os sujeitos foram submetidos a uma avaliação inicial, posteri-
ormente foram submetidos a 15 atendimentos de fisioterapia psicomotora e, então, a uma reavaliação para comparar os resultados.
Resultados: Analisando-se of dados das avaliações, constatou-se que houve melhora em todos os sujeitos, principalmente nos fatores
equilíbrio e coordenação dos movimentos. Assim, a idade psicomotora e a idade cronológica igualaram-se na maior parte dos sujeitos.
Conclusões: Entende-se que a intervenção fisioterapêutica por meio da psicomotricidade foi eficiente para promover a aprendizagem
motora de crianças que possuem atraso e defasagem entre as idades motora e cronológica. Em trabalhos futuros pretende-se analisar
outras variáveis, como gênero e ambiente.

Palavras-chave: fisioterapia, psicomotricidade, aprendizagem motora

Abstract: Contextualization: Psychomotricity aims at facilitating the interaction between motricity, affectivity and the mind, since the
typical motor development is related to these three factors. Participants of psychomotor therapy are encouraged to act in each proposed
exercise so as to have meaningful experiences. The interaction between physical therapy and psychomotricity can make the treatment
more effective and meaningful for both the patient and the physical therapist. Objectives: This study aimed characterizing the psychomotor
profile of five children with clinical diagnosis of delay in the psychomotor development at the age ranging from three and five years old.
Methods: After the research project be approved by an Ethics Committee (under number CAAE 2807.0.000.301-08), the children were
recruited from the Associação Mantenedora do Centro Integrado de Prevenção (AMCIP) in the city of Curitiba. The evaluation instrument
used was the Psychomotor Assessment of Fonseca, which results leaded to the planning of individualized treatments. After the initial
evaluation, the individuals were submitted to 15 interventions with a psychomotor physical therapist and, next, to a new assessment
to compare results. Results: Analyzing the data from the assessments, improvements in all subjects were found, mainly in balance and
coordination of movements. Thus, for most of the subjects, the psychomotor age become equivalent to the motor age. Conclusions: The
physical therapy intervention with psychomotricity was efficient to promote the motor learning in children with late development and lag
between motor and chronological age. In future works other features will be considered, such as gender and environment.

Keywords: physical therapy, psychomotricity, motor learning.

1. Introdução no momento da execução da atividade, o aspecto


intelectual ao procurar resolver o desafio proposto
A psicomotricidade é uma ciência relativamente e o aspecto afetivo, já que, no decorrer da ativi-
nova que surgiu por volta do início do século XX, dade, o participante experimentará sentimentos di-
na França, durante a ocorrência de uma epidemia versos 25,17,1 .
de encefalite. Ela visa facilitar a interação entre A intervenção psicomotora tem como objeto de
a motricidade, a afetividade e a mente, pois acre- estudo o homem e seu corpo em movimento em re-
dita que o desenvolvimento motor típico das pessoas lação ao seu mundo interno e externo. Está relaci-
está relacionado com esses três fatores. Assim, faz onada ao processo de maturação, onde o corpo é a
a abordagem clínica voltada à globalidade do indi- origem das aquisições cognitivas, afetivas e orgâni-
víduo, uma vez que, na sua concepção, a dinâmica cas 20,7,18 .
aplicada será capaz de desenvolver o aspecto motor A psicomotricidade é indispensável a toda cri-
ança típica ou patológica, e tem dupla finalidade:
∗ Autor correspondente: E-mail: luciana.weinert@ufpr.br assegurar o desenvolvimento funcional e ajudar sua
ISSN 2177-9910
76 Castilho-Weinert et al.

afetividade a expandir-se e a equilibrar-se com o Considerando-se o desenvolvimento global da cri-


ambiente. Trata-se de uma forma de atenção per- ança, no qual a inteligência e as habilidades cogni-
ceptiva centrada no próprio corpo, que permite a tivas dependem diretamente de sua aprendizagem
criança tomar consciência de suas características motora 27 , este trabalho motiva-se na possibilidade
corporais e de dados exteriores. Para a área mo- de se realizar uma estimulação conjunta dos aspec-
tora, torna possível um melhor controle motor, com tos cognitivos, motores e afetivos da criança, redu-
movimentos mais elaborados e coordenados 24,12 . zindo seus atrasos motores, e, assim, prevenindo ou
Embora o desenvolvimento psicomotor seja algo minimizando atrasos em seu desenvolvimento cog-
em comum, Campos e Santos 2 defendem a idéia nitivo e dificuldades de aprendizagem.
que a idade para o surgimento de novas habilida- Este trabalho teve como objetivo principal verifi-
des varia entre os indivíduos, uma vez que a evo- car qual a melhora no desenvolvimento e aprendi-
lução é determinada por fatores genéticos, ambien- zagem psicomotora de indivíduos com atraso no de-
tais e também pela maneira com que os pais os ma- senvolvimento, utilizando a psicomotricidade. Du-
nuseiam e os estimulam, porém, essa variação não rante o estudo foi possível avaliar e realizar o aten-
deve ser superior a um ano, o que determinaria um dimento dos participantes com atraso psicomotor
atraso. e analisar a melhora na aquisição das habilidades
A psicomotricidade possui alguns elementos bá- psicomotoras ocasionada pelo tratamento proposto.
sicos, chamados de pilares, dentre eles pode-se des-
tacar o esquema corporal, a lateralidade, a estrutu- 2. Materiais e Métodos
ração espacial, a orientação temporal e a pré-escrita 3 .
Baseando-se nestes pilares, é possível traçar obje- O estudo foi realizado na Associação Mantene-
tivos terapêuticos e de forma lúdica, utilizando o dora do Centro Integrado de Prevenção (AMCIP), na
brincar como recurso, trabalhar todos os estímulos cidade de Curitiba/PR, onde se oferece acompanha-
necessários para obter os resultados esperados 21 . mento com professores preparados para atendimen-
Para Silva e Kleinhans 23 e Lombroso 14 a psico- tos de crianças especiais e tratamentos com diver-
motricidade é fundamental à infância, pois as con- sas áreas da saúde incluindo, medicina, fonoaudio-
dições ambientais estão relacionadas com o desen- logia, serviço social, psicologia, terapia ocupacional,
volvimento global do indivíduo e as interações viven- reeducação visual e fisioterapia.
ciadas podem promover a capacidade de interações Inicialmente o projeto de pesquisa foi submetido
do sistema nervoso em função das experiências e para apreciação por um Comitê de Ética em Pes-
das demandas ambientais. quisas. Após a aprovação, sob o número do CAAE
Sabe-se que, através de estímulos ambientais for- 2807.0.000.301-08, os responsáveis legais pelos su-
necidos por familiares, terapeutas e pelo próprio am- jeitos da pesquisa assinaram o Termo de Consen-
biente, ocorre a especialização morfo-químico-fun- timento Livre e Esclarecido, onde os autores reco-
cional das células do sistema nervoso. Esta espe- nhecem e referem o cumprimento das diretrizes ci-
cialização permite a formação de sinapses com co- tadas na resolução 196/96 do Conselho Nacional de
nexões entre estruturas funcionais do sistema ner- Saúde. A amostra foi selecionada de forma probabi-
voso. O cérebro infantil tem uma quantidade ex- lística aleatória simples onde os sujeitos se subme-
cessiva de sinapses, que continua até o início da tiam voluntariamente. Para participar da pesquisa
adolescência e são mais intensas quando estimula- os sujeitos deveriam seguir os seguintes critérios de
das 23,9,10 . inclusão:
Durigon, Sá e Sitta 4 e Filho e Arruda 11 rela-
• Possuir atraso no desenvolvimento psicomotor;
tam que crianças que possuem atraso no seu de-
senvolvimento psicomotor necessitam de estimula- • Possuir, no início da pesquisa, idade cronoló-
ção das suas habilidades psicomotoras o mais pre- gica de, pelo menos, três anos completos e, no
cocemente possível, pois pacientes com distúrbios máximo, cinco anos;
neurológicos ou atrasos motores beneficiam-se de
programas de tratamento fisioterapêutico principal- • Não ter outro acompanhamento fisioterapêu-
mente quando iniciado precocemente. tico além do tratamento proposto pela pesquisa.
Conforme Silva e Kleinhans 23 e Souza 26 na me-
Como critério de exclusão adotou-se: possuir ou-
dida em que o sujeito percebe que pode realizar no- tras patologias diagnosticadas ou sequelas de doen-
vas atividades com êxito, haverá satisfação e maior ças neurológicas e musculares.
motivação para enfrentar aquelas que ele ainda não A avaliação inicial e final foi realizada por meio
consegue, fazendo assim que seu desenvolvimento
da Avaliação Psicomotora de Fonseca 6 . Com a ava-
físico e mental avance passo a passo. Todos têm
liação inicial determinou-se a idade psicomotora de
dificuldades, precisa-se apenas saber lidar com as
mesmas.
Intervenção em crianças com atraso no desenvolvimento 77

cada sujeito e também se detectou qual o pilar psi- que a sua maior dificuldade durante a realização
comotor em que cada indivíduo possuía maior dé- das funções propostas foi em equilíbrio e nas habi-
ficit. Desta forma foi possível identificar qual pilar lidades motoras finas. Devido a isso, o plano de tra-
deveria ser mais priorizado durante o programa de tamento elaborado para o sujeito foi composto por
tratamento de cada indivíduo. um circuito psicomotor global, porém com maior ên-
As avaliações utilizadas eram separadas por fai- fase em equilíbrio e coordenação motora.
xas etárias, de 1 a 2 anos, de 2 a 3 anos, de 3 Durante sua evolução diária foram evidenciadas
a 4 anos e de 4 a 5 anos, conforme proposto por algumas melhoras. Em torno do quarto atendimento
Fonseca 6 . Cada uma destas faixas compreendia di- o sujeito já conseguia caminhar pela prancha de
versos itens com atividades psicomotoras. Iniciava- equilíbrio para frente, porém mantinha os membros
se sempre avaliando a faixa etária correspondente a superiores abduzidos, para aumentar a base de equi-
idade cronológica do participante, assinalando “SIM” líbrio. No sétimo atendimento percebeu-se que o
para as atividades realizadas com sucesso e “NÃO” mesmo já realizava toda a atividade sem abduzir os
para as não concluídas. Se porventura tivesse um membros superiores e a partir do oitavo executou a
item assinalado como “NÃO” regredia-se para a ava- marcha associando vários outros movimentos, tais
liação da faixa etária anterior (menor), até que o como: abaixar-se, ficar em um pé só, ficar parado
participante chegasse ao êxito de todos os exercí- sobre um pé com olhos fechados, correr e mudar de
cios. Desta forma, quando a criança completava to- direção, entre outras atividades que tinha por obje-
dos os itens de uma avaliação, esta era a faixa etária tivo desequilibrá-lo para que o mesmo se reorgani-
correspondente à sua idade psicomotora. zasse rapidamente e não perdesse seu equilíbrio.
Enquanto isto os terapeutas observavam e de- Para as habilidades motoras finas foi possível ob-
terminavam quais pilares cada sujeito apresentava servar na reavaliação uma melhora em relação à
maior dificuldade e quais movimentos não executa- pontaria, manuseio de pequenos objetos nas mãos
ram ou fizeram. como lápis, recorte, dobraduras e preensão em pinça
Os atendimentos ocorreram com frequência de com objetos que necessitem de motricidade fina. O
três vezes por semana, com duração de 30 minu- gráfico da Figura 1 mostra os resultados atingidos
tos cada, cada participante teve um total de 17 en- com a intervenção psicomotora deste paciente.
contros, sendo que no primeiro e no último foram
aplicadas a avaliação inicial e a avaliação final, to-
talizando 15 atendimentos com intervenção psico-
motora.
A intervenção consistia em um circuito com di-
versas brincadeiras com enfoque terapêutico. A cada
dia de intervenção estas brincadeiras eram modifi-
cadas ou substituídas para motivar a participação
das crianças. O circuito de tratamento psicomotor
proposto abrangeu tratamento para todos os pilares
psicomotores. Este circuito foi composto em etapas,
lembrando-se que para cada indivíduo foi traçado
um programa de tratamento com enfoque individu-
alizado. Embora o circuito psicomotor englobasse
todos os pilares, cada atendimento foi diferenciado
havendo maior ênfase no pilar que se observou o
maior atraso durante a avaliação.
Figura 1: Análise da evolução do paciente 1
Após o tratamento de cada paciente era reali-
zada uma evolução diária, onde se anotava os ga-
Os dados apresentados no gráfico mostram que o
nhos motores adquiridos a partir daquele dia. O
sujeito 1 evoluiu para uma idade psicomotora com-
procedimento de avaliação final foi o mesmo reali-
patível com sua idade cronológica, pois adquiriu os
zado durante a avaliação inicial.
2 itens (13,3%) que faltavam na avaliação de 3 a 4
anos e os 13 itens (46,4%) que faltavam na avalia-
3. Resultados
ção de 4 a 5 anos.
3.1. Análise do sujeito 1 3.2. Análise do sujeito 2
O paciente 1 possuía idade cronológica de 4 anos O paciente 2 possuía idade cronológica de 3 anos
e 10 meses. Pela avaliação determinou-se a idade e 9 meses. Pela Avaliação inicial pode-se verificar
psicomotora entre 2 a 3 anos, pois as atividades que sua idade psicomotora estava entre 2 e 3 anos
dessa idade foram todas realizadas. Observou-se
78 Castilho-Weinert et al.

e que não conseguia realizar as atividades psicomo- O gráfico da Figura 3 mostra que, para a idade
toras correspondentes à sua idade cronológica por- psicomotora de 3 a 4 anos, o sujeito realizava ape-
que apresenta déficits de equilíbrio e na motricidade nas 3 itens da avaliação (20%). Após a interven-
elaborada fina. ção com a psicomotricidade ele adquiriu 10 itens
Logo no segundo dia de intervenção, algumas (66,6%) e faltaram apenas 2 itens (13,4%) para que
atividades propostas para o equilíbrio foram execu- sua idade psicomotora atingisse completamente a
tadas com êxito, tais como deambular com coorde- faixa de 3 a 4 anos.
nação pé ante pé. A partir do sétimo atendimento,
sua evolução em relação ao equilíbrio era perceptí-
vel, e realizava atividades como andar na ponta dos
pés, andar em linha reta e saltar sobre obstáculos
caindo na ponta dos pés, entre outras atividades.
No décimo atendimento o sujeito começou a deam-
bular na trave de equilíbrio com largura menor, ob-
tendo ótimos resultados.
O gráfico da Figura 2 apresenta os resultados ob-
tidos com este paciente ao final da coleta de dados.
Na reavaliação, observou-se que o sujeito conseguiu
realizar todas as atividades proposta para a idade
de 3 a 4 anos, o que possibilitou igualar a sua idade
cronológica com a idade motora. Na avaliação ini-
cial o mesmo realizava apenas 6 itens (40%) da ava- Figura 3: Análise da evolução do paciente 3
liação desta idade e adquiriu os 9 itens restantes
(60%).
3.4. Análise do sujeito 4
O sujeito 4 possuía idade cronológica de 4 anos
e 3 meses e pela avaliação inicial pode-se verificar
que a idade psicomotora era de 2 a 3 anos, o que
caracterizou atraso em seu desenvolvimento. Dos
vinte e oito itens que compõem a avaliação de 4 a
5 anos, o mesmo conseguiu realizar apenas seis.
Na avaliação de 3 a 4 anos, composta por quinze
itens conseguiu executar dez. E na avaliação de 2 a
3 anos, conseguiu realizar todas as atividades pro-
postas. Observou-se que neste sujeito os maiores
déficits encontrados também estavam relacionados
a equilíbrio e coordenação.
Ao comparar a avaliação final com a inicial pode-
Figura 2: Análise da evolução do paciente 2
se observar boa evolução nas atividades adquiri-
das. Logo nos primeiros atendimentos houve me-
lhora no equilíbrio, e o sujeito começou a caminhar
3.3. Análise do sujeito 3 na trave de equilíbrio entre o quarto e o sétimo aten-
O paciente 3, com idade cronológica de 3 anos dimento. Como a parte de equilíbrio foi aprimorada,
e 7 meses, obteve pela avaliação inicial uma idade outras atividades como deambular com coordena-
psicomotora entre 2 e 3 anos. Apresentava dificul- ção, pegar objetos correndo sem perder o equilíbrio,
dades em realizar exercícios que exigiam equilíbrio, manter-se estático sobre um pé só, mudar de dire-
coordenação motora e motricidade fina. ção sobre degraus escadas e alternar os pés foram
As atividades relacionadas ao equilíbrio começa- adquiridas até o nono dia de intervenção.
ram a melhorar no segundo encontro e permanece- As atividades de motricidade fina como prender e
ram em evolução rápida até o décimo atendimento. manusear lápis, giz de cera e outros objetos mais fi-
Na sua reavaliação, no que diz respeito à idade nos só foram observadas totalmente por volta do dé-
psicomotora de 3 a 4 anos, não realizou apenas as cimo encontro, onde executou desenhos corporais
atividade de recortes, embora o circuito englobasse nas atividades solicitadas.
outras atividades com coordenação motora fina. No No gráfico da Figura 4 pode-se perceber que o
gráfico 3 apresenta-se a melhora constatada na ava- sujeito 4 evoluiu para uma idade entre 3 e 4 anos,
liação final. pois realizava na avaliação inicial apenas 10 itens
Intervenção em crianças com atraso no desenvolvimento 79

(66,6%) e adquiriu 5 itens (33,3%). E quase atin- apenas 1 item (6,6%) para atingir esta idade psico-
giu a idade psicomotora entre 4 e 5 anos, pois re- motora. Já na faixa entre 4 e 5 anos, realizava 7
alizava apenas 8 itens da avaliação (28,6%), adqui- itens (25%), adquiriu 14 itens (50%) e não adquiriu
riu 16 itens (57,2%) e faltou adquirir apenas 4 itens 7 itens (25%).
(14,2%). Comparado-se o número de atividades ad- Os resultados revelam uma melhora importante,
quiridas o tratamento foi satisfatório. entretanto, por não executar apenas 1 item da ava-
liação de 3 a 4 anos, o sujeito permaneceu com sua
idade psicomotora entre 2 e 3 anos.

4. Discussão

A psicomotricidade precisa ser vista com bons


olhos pelo profissional da fisioterapia, pois ela au-
xilia o desenvolvimento motor e intelectual da cri-
ança, por isso, faz-se necessário sempre estudar e
conhecer os conceitos e pesquisas na área de psico-
motricidade, mais especificamente a infantil, que é
um dos objetivos de muitos profissionais da área da
saúde e áreas afins. É importante também identi-
ficar os pontos positivos e negativos do desenvolvi-
Figura 4: Análise da evolução do paciente 4 mento e desempenho psicomotor de crianças sau-
dáveis e patológicas, que auxilia o terapeuta du-
rante a elaboração do programa de tratamento es-
3.5. Análise do sujeito 5 pecífico e pode trazer resultados surpreendentes 16 .
O paciente 5 possuía idade cronológica de 4 anos Os sujeitos avaliados nessa pesquisa apresen-
e 9 meses. Observando a avaliação inicial do sujeito taram grandes dificuldades psicomotoras. Isso foi
5 verifica-se que o mesmo apresentou déficit motor observado por meio das avaliações aplicadas antes
nas tividades propostas para a sua idade, o que de- do tratamento. Segundo Mastroianni e colaborado-
terminou sua idade psicomotora entre 2 e 3 anos. res 15 crianças com atrasos motores estão em risco
Ao analisar a avaliação final percebe-se uma am- de problemas de atenção, aprendizagem e ajusta-
pla melhora nas atividades de equilíbrio e motrici- mento psicossocial. Isto corrobora a importância
dade fina. Houve ganhos na altura dos saltos, na da realização deste estudo. Os sujeitos que partici-
deambulação em condições diferenciadas, na habi- param deste estudo apresentaram atraso principal-
lidade de chutar e nas atividades mais elaboradas, mente no equilíbrio e na coordenação motora fina,
como colorir e recortar dentro dos limites, entre ou- além de déficits em outros pilares psicomotores.
tras atividades. O gráfico da Figura 5 apresenta os Após a intervenção, nos resultados foi possível
resultados adquiridos após a intervenção. observar que os sujeitos 1 e 2 conseguiram grande
melhora em equilíbrio e coordenação motora, pois
na avaliação final haviam adquirido todos os itens
que faltavam para igualar sua idade psicomotora à
idade cronológica. Atingiram um ganho percentual
de 46,4% e 60%, respectivamente. Este resultado
pode ser considerado bastante satisfatório.
Os sujeitos 3 e 4 tiveram grande melhora em
equilíbrio, porém faltou a obtenção de alguns itens
da avaliação que dependiam de melhor coordena-
ção motora. Para o sujeito 3 igualar as idades psi-
comotora e cronológica faltaram 2 itens de 15 na
avaliação, e ao sujeito 4 faltaram 4 itens de 28.
Porém, mesmo não atingindo integralmente a equi-
valência de idades, foram bons os resultados atin-
Figura 5: Análise da evolução do paciente 5 gidos, considerando-se o percentual de ganhos de
66,6% na evolução da idade do sujeito 3 e de 57,2%
Os dados apresentados mostram que, na idade do sujeito 4.
psicomotora entre 3 e 4 anos o sujeito realizou ini- O sujeito 5 obteve melhora em equilíbrio, po-
cialmente 10 itens (66,6%) da avaliação e na avali- rém para igualar sua idade motora à cronológica
ação final havia adquirido 4 itens (26,8%) faltando faltou realizar itens da avaliação que contemplavam
80 Castilho-Weinert et al.

tanto equilíbrio, quanto coordenação motora. Em o desenvolvimento psicomotor é de grande impor-


sua avaliação final faltou executar 7 itens de 28, po- tância para o aprendizado da leitura e da escrita, e
rém sua melhora também foi bastante significativa, que as crianças com nível superior de desenvolvi-
atingindo um percentual de 50%. mento psicomotor são as que apresentam os melho-
Segundo Gallahue e Ozmun 8 o equilíbrio é a ca- res resultados escolares 19 .
pacidade do indivíduo manter a postura de seu corpo, Porém, apesar de se demonstrar a importância
mesmo quando é colocado em diferentes posições. da psicomotricidade no desenvolvimento cognitivo,
Portanto, o sujeito que não apresenta um bom con- na aprendizagem da leitura e da escrita e na forma-
trole do equilíbrio tem dificuldade de locomoção e de ção da inteligência, tradicionalmente, a escola tem
realizar determinadas atividades além de não con- dado pouca importância à atividade motora das cri-
seguir manter suas posturas tendo interferências anças. O espaço da atividade infantil fica reduzido à
nas atividades cotidianas. Ferreira 5 afirma que a visão de que o movimento é algo essencialmente mo-
falta de equilíbrio também pode encontrar sua ori- tor, destacado de qualquer outra esfera do desenvol-
gem na ausência de confiança que a criança tem em vimento, seja afetiva, cognitiva ou social 13 . Assim,
si mesma, sendo acompanhada de perturbações da também cabe aos profissionais que trabalham com
coordenação. Crianças instáveis do ponto de vista a intervenção psicomotora, o papel de auxiliar a di-
psicomotor, que a todo instante mudam de posi- fundir sua importância no desenvolvimento global
ção a fim de tentar estabilizar seu equilíbrio, aca- da criança.
bam por prejudicar sua capacidade de atenção. Se-
gundo Fonseca 6 o equilíbrio é um passo essencial 5. Conclusão
do desenvolvimento psico-neurológico do indivíduo,
ou seja, um passo chave para todas as ações coor- A psicomotricidade é uma modalidade de trata-
denadas intencionais, que na verdade são os alicer- mento fisioterapêutico fortemente embasada na lite-
ces dos processos humanos de aprendizagem. Isto ratura em que o desenvolvimento dos aspectos mo-
reitera a importância dos resultados atingidos com tor, social, emocional e lúdico da personalidade e
este estudo. a destreza dos movimentos corporais são vivencia-
Em relação aos fatores da praxia global e fina, dos por meio de atividades motoras organizadas e
todos os sujeitos apresentaram melhora na coorde- sequenciais, desenvolvidas individualmente ou em
nação. É certo que alguns dos indivíduos não com- grupo.
pletaram sua avaliação pelo fato de não ter adqui- Pelo presente trabalho e com base nos achados
rido total coordenação fina, mas segundo Sarmento, da literatura pode-se afirmar que a psicomotrici-
Braga e Martins 22 o desenvolvimento da praxia fina dade, através de atividades afetivas, constitui-se num
é um processo de maturação mais lento ao ser com- fator de equilíbrio na vida das pessoas.
parado à praxia global, e para uma perfeita aqui- A hipótese inicial da pesquisa foi confirmada, re-
sição motora fina, faz-se necessário a praxia glo- velando o potencial da psicomotricidade na reversão
bal. Com os sujeitos da pesquisa não aconteceu e tratamento dos atrasos psicomotores da popula-
diferente, houve maiores aquisições amplas e algu- ção em questão.
mas aquisições motoras finas, isso permite conside- A psicomotricidade pode tornar o tratamento mais
rar como bons os resultados alcançados. efetivo tanto para o paciente como para o fisiotera-
Como esta pesquisa utilizava como tratamento peuta, uma vez que apenas a utilização das técni-
a psicomotricidade, que é um alicerce tanto para cas fisioterapêuticas não permite ao profissional a
aquisições motoras, quando cognitivas, além dos observação de alguns pontos durante a avaliação e
benefícios momentâneos trazidos aos sujeitos parti- o tratamento, tais como, o aspecto afetivo e emoci-
cipantes, também se tem a expectativa da influência onal do indivíduo durante a terapia. A negligência
dos resultados obtidos no futuro escolar das crian- a esses pontos pode tornar o atendimento algo de-
ças participantes, reduzindo assim as suas dificul- sinteressante para o paciente, dificultando sua ade-
dades de aprendizagem. são ao tratamento. Assim, observa-se a necessidade
Em uma análise mais aprofundada, os resulta- de novos trabalhos associando a psicomotricidade
dos obtidos com este estudo fornecem perspecti- e a fisioterapia com a utilização deste recurso em
vas importantes de melhoria na aprendizagem cog- grupos maiores, inclusive com a comparação entre
nitiva dos indivíduos participantes. Segundo Oli- meninos e meninas, e também com a análise das
veira 19 o movimento consciente pode ser realizado, influências ambientais.
através da prática de atividades psicomotoras, como
forma de auxiliar a criança na comunicação com o Referências
mundo. Através da ação, por meio do movimento e
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