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1.

1- Neoclassicismo, Grupo dos Seis e Erik Satie

No inicio do séc. XX ocorreu a Primeira Guerra Mundial, provocando grandes mudanças não
só no pensamento e nas atitudes como no contexto das artes em geral, fazendo com que a geração
após guerra começasse a pensar de maneira diferente. Em contraste com o espírito subjetivo e
emocional que existia, surgiu a limpidez da música neoclássica. Compositores começaram a
escrever a partir de novos caminhos e um destes tinha por base a música antiga, um movimento que
foi chamado de neoclassicismo. Este era “...uma espécie de novo Classicismo...” (Michels, 2007,
p.533), que surgiu como reação contra a luxúria do Romantismo, incluindo o Impressionismo e o
Expressionismo. A atitude anti-romântica faz com que essa corrente retorne aos conceitos musicais
anteriores ao Romantismo, principalmente os do séc. XVIII, tratados porém com um espírito de
paródia afetuosa. Volta-se a adotar os modos de execução, formas e géneros do Barroco e do Pré-
Classicismo, tal como a suite, o concerto, a sinfonia, a sonata, mas apenas como meras peças
musicais, onde vão buscar elementos do passado e descontextualizam-nos.

O neoclassicismo tem mais tendência a empregar a tonalidade e a modalidade, contudo este


assume também a atonalidade, como uma contrariedade ao sistema tonal aplicado por todos os
clássicos. Deste modo, por vezes o prefixo neo pode implicar paródia ou distorção das
características verdadeiramente clássicas. O neoclassicismo tem uma caráter brincalhão e pretendia
desfazer a pomposidade Romântica.

“Basta de nuvens, ondas, folhas, aquários, ondinas e fragrâncias nocturnas.


Precisamos de uma música com os pés na terra, uma música do dia-a-dia” - “uma
arte objetiva, desligada do indivíduo, que exija do ouvinte uma plena consciência” -
“acabada, pura, sem adornos supérfluos” (Michels, 2007, p.533)
Foi em Paris que este movimento teve maior destaque, tendo Erik Satie como um dos seus
principais compositores. Este tencionava que a música fosse reduzida estritamente ao essencial. Era
um compositor com senso de humor e paródia, que colocava títulos surrealistas nas suas peças e
desafiava constantemente os teóricos e críticos de arte. As suas indicações de dinâmica eram feitas
da mesma forma, com pp já sem fôlego com muita dificuldade 1. Assim, a sua música era seca,
caprichosa, paródica e espirituosa (Niomar, 2013).

Fig. 1- Les Six

“Les Six” referia-se a um


grupo de compositores franceses
composto por Auric, Durey,
Honegger, Milhaud, Poulenc e Tailleferrem . O nome dado por Henri Collet surge após um
concerto, em que este pública na revista Comoedia, dois artigos intitulados “Os cinco russos, os seis
franceses, e Erik Satie” e posteriormente “Os seis franceses”. Tratava-se de um grupo com uma
organização semelhante aos Cinco Russos. Satie, com o seu humor subversivo e a sua repulsão à
pomposidade, tornou-se o mentor do grupo (Stanley, 2006, p.229).

“Um agrupamento de amizades e não de tendências. Depois, pouco a


pouco, estabeleceram-se as ideias comuns que nos aproximaram
intimamente, a saber: a reação contra o fluido, o regresso à melodia, o
regresso ao contraponto, a precisão, a simplicidade, etc.” ( Candé, 2004,
p.286)

Os membros afirmam que a única coisa em comum é a amizade, contudo, compõem


um Álbum dos Seis e a partitura de Os Noivos da Torre Eiffel. Deste modo, devido à falta
de consenso artístico do grupo, este começa a fragmentar-se a partir de 1921. Contudo,
conseguiu desvendar a grande música através do contacto com o circo, o musica-hall, as
máquinas, o desporto, a natureza, entre outros.

1.2- Francis Poulenc

1
pp en pauvre souffle, avec beaucoup de mal
Francis Poulenc (1899-1963) foi um compositor e pianista francês que nasceu de uma família
que apreciava e tocava música. Através da sua mãe, Poulenc começou a tocar piano aos cinco
anos.

“Com quatorze anos de idade, Poulenc ouviu pela primeira vez A


Sagração da Primavera de Stravinsky, um compositor que iria ser
um modelo e inspiração durante toda a sua vida” ( Stanley, 2006, p.
229)

Estudou piano com Ricardo Viñes e, através deste, conheceu Erik Satie, que se viria a
tornar uma grande influência para o compositor. Durante a primeira parte da sua carreira, a
simplicidade e objetividade da sua escrita, fez com que muitos críticos não o
credibilizassem. Contudo, após a Segunda Guerra Mundial, a ausência de complexidade
linguística na sua música não justificava uma falta de musicalidade e/ou técnica (Nichols,
1980, p.163).

A sua primeira composição publicada, Rapsodie nègre2, tinha características anti-


românticas e anti-impressionistas, podo-o em comum com músicos da sua geração.

Poulenc foi talvez o mais aficionado para os objetivos do grupo, estabelecidos pelo
mentor Jean Coteau: a simplicidade, a elegância e a modernidade sofisticada, que apenas
esporadicamente os outros membros do grupo praticavam. Poulenc escreveu para o teatro
muito mais tarde que os seus colegas do Grupo dos Seis. Nesta área, todas as sua obras
dramáticas são compostas após a Segunda Grande Guerra, sem apresentar características
revolucionárias nem novas técnicas. Segundo Grout (1988), o compositor testemunha um
sentido perfeito do teatro (p. 715).

Num ponto de vista geral, a partir de sensivelmente 1930, Poulenc atinge uma nova
maturidade que foi antecipada devido ao reencontro com o cantor Pierre Bernac e a morte
de Pierre-Octave Ferroud. Consequentemente, Poulenc redescobriu a sua fé católica
romana, substituindo a natureza irónica do neoclassicismo pela profundidade espiritual,
compondo uma série de obras sacras. Deste modo, teve uma “...tendência para abandonar o
aspeto por assim dizer brincado e gratuito da sua arte, a fim de lhe conferir maior seriedade
2
Obra dedicada a Erik Satie
de intentos, uma expressão mais humana e um estilo mais castigado” (Borba & Lopes
Graça,1999, p 405). Os mesmos autores afirmam ainda que é no campo da música vocal que
este revela mais o seu talento, onde identifica perfeitamente os mais belos textos de poetas
antigos e contemporâneos, traduzindo nas suas canções com piano a sua finura, a
plasticidade da linha melódica, ligando a isto “...um perfeito sentido de prosódia e uma aguda
penetração do sentido dos poemas”(Borba, 1999, p.405).

Durante a Segunda Guerra Mundial permaneceu em França e demonstrou a sua resistência


através da sua escrita, que exprimia a sua dor e desolação na canção intitulada C. Após este período
conturbado da História Mundial, Poulenc estava preocupado em se inserir no ambiente musical de
Paris, “defendendo o “clássico” Stravinsky contra os Messiaenistas e atingindo o sucesso brilhante
na sua primeira ópera Les mamelles de Tirésias 3(Nichols,1980, p.164).

“Apaixonado pela vida, melancólico e


serenamente místico, ao mesmo tempo monge e
diabrete” (Tranchefort, 2004, p.703). O caráter
espirituoso, chique e gaulês de muita da música de
Poulenc conjugam a graça e o espírito da canção
popular parisiense, um dom especial para a imitação
satírica, a fluência melódica e um estilo cativante.
“Na sua música, nada evoca a secura do
neoclassicismo de convenção” (Candé, 2004,
p.292). Era considerado um grande “pequeno
mestre”, que conseguiu por vezes atingir os
pícaros na segunda parte da sua carreira. Em
vida, por vezes foi considerado um músico
menor, contudo após a sua morte alguns
Fig. 2- Desenho de Jean Coteau (1922)
historiadores designavam-no como o herdeiro de Monteverdi, Mozart, Mussorgsky. As
principais características das sua música são a perfeição do estilo e a espontaneidade da
inspiração que lhe permitiu inventar um classicismo muito pessoal.

3
Defending the ‘classical’ Stravinsky against the ‘Messienistes’ and achieving a brilliant success with his first opera Les
marmelles de Tirésias
1.1- Neoclassicismo, Grupo dos Seis e Erik Satie

No inicio do séc. XX ocorreu a Primeira Guerra Mundial, provocando grandes mudanças não
só no pensamento e nas atitudes como no contexto das artes em geral, fazendo com que a geração
após guerra começasse a pensar de maneira diferente. Em contraste com o espírito subjetivo e
emocional que existia, surgiu a limpidez da música neoclássica. Compositores começaram a
escrever a partir de novos caminhos e um destes tinha por base a música antiga, um movimento que
foi chamado de neoclassicismo. Este era “...uma espécie de novo Classicismo...” (Michels, 2007,
p.533), que surgiu como reação contra a luxúria do Romantismo, incluindo o Impressionismo e o
Expressionismo. A atitude anti-romântica faz com que essa corrente retorne aos conceitos musicais
anteriores ao Romantismo, principalmente os do séc. XVIII, tratados porém com um espírito de
paródia afetuosa. Volta-se a adotar os modos de execução, formas e géneros do Barroco e do Pré-
Classicismo, tal como a suite, o concerto, a sinfonia, a sonata, mas apenas como meras peças
musicais, onde vão buscar elementos do passado e descontextualizam-nos.

O neoclassicismo tem mais tendência a empregar a tonalidade e a modalidade, contudo este


assume também a atonalidade, como uma contrariedade ao sistema tonal aplicado por todos os
clássicos. Deste modo, por vezes o prefixo neo pode implicar paródia ou distorção das
características verdadeiramente clássicas. O neoclassicismo tem uma caráter brincalhão e pretendia
desfazer a pomposidade Romântica.

“Basta de nuvens, ondas, folhas, aquários, ondinas e fragrâncias nocturnas.


Precisamos de uma música com os pés na terra, uma música do dia-a-dia” - “uma
arte objetiva, desligada do indivíduo, que exija do ouvinte uma plena consciência” -
“acabada, pura, sem adornos supérfluos” (Michels, 2007, p.533)
Foi em Paris que este movimento teve maior destaque, tendo Erik Satie como um dos seus
principais compositores. Este tencionava que a música fosse reduzida estritamente ao essencial. Era
um compositor com senso de humor e paródia, que colocava títulos surrealistas nas suas peças e
desafiava constantemente os teóricos e críticos de arte. As suas indicações de dinâmica eram feitas
da mesma forma, com pp já sem fôlego com muita dificuldade 4. Assim, a sua música era seca,
caprichosa, paródica e espirituosa (Niomar, 2013).

Fig. 3- Les Six

“Les Six” referia-se a um


grupo de compositores franceses
composto por Auric, Durey,
Honegger, Milhaud, Poulenc e Tailleferrem . O nome dado por Henri Collet surge após um
concerto, em que este pública na revista Comoedia, dois artigos intitulados “Os cinco russos, os seis
franceses, e Erik Satie” e posteriormente “Os seis franceses”. Tratava-se de um grupo com uma
organização semelhante aos Cinco Russos. Satie, com o seu humor subversivo e a sua repulsão à
pomposidade, tornou-se o mentor do grupo (Stanley, 2006, p.229).

“Um agrupamento de amizades e não de tendências. Depois, pouco a


pouco, estabeleceram-se as ideias comuns que nos aproximaram
intimamente, a saber: a reação contra o fluido, o regresso à melodia, o
regresso ao contraponto, a precisão, a simplicidade, etc.” ( Candé, 2004,
p.286)

Os membros afirmam que a única coisa em comum é a amizade, contudo, compõem


um Álbum dos Seis e a partitura de Os Noivos da Torre Eiffel. Deste modo, devido à falta
de consenso artístico do grupo, este começa a fragmentar-se a partir de 1921. Contudo,
conseguiu desvendar a grande música através do contacto com o circo, o musica-hall, as
máquinas, o desporto, a natureza, entre outros.

1.2- Francis Poulenc

4
pp en pauvre souffle, avec beaucoup de mal
Francis Poulenc (1899-1963) foi um compositor e pianista francês que nasceu de uma família
que apreciava e tocava música. Através da sua mãe, Poulenc começou a tocar piano aos cinco
anos.

“Com quatorze anos de idade, Poulenc ouviu pela primeira vez A


Sagração da Primavera de Stravinsky, um compositor que iria ser
um modelo e inspiração durante toda a sua vida” ( Stanley, 2006, p.
229)

Estudou piano com Ricardo Viñes e, através deste, conheceu Erik Satie, que se viria a
tornar uma grande influência para o compositor. Durante a primeira parte da sua carreira, a
simplicidade e objetividade da sua escrita, fez com que muitos críticos não o
credibilizassem. Contudo, após a Segunda Guerra Mundial, a ausência de complexidade
linguística na sua música não justificava uma falta de musicalidade e/ou técnica (Nichols,
1980, p.163).

A sua primeira composição publicada, Rapsodie nègre5, tinha características anti-


românticas e anti-impressionistas, podo-o em comum com músicos da sua geração.

Poulenc foi talvez o mais aficionado para os objetivos do grupo, estabelecidos pelo
mentor Jean Coteau: a simplicidade, a elegância e a modernidade sofisticada, que apenas
esporadicamente os outros membros do grupo praticavam. Poulenc escreveu para o teatro
muito mais tarde que os seus colegas do Grupo dos Seis. Nesta área, todas as sua obras
dramáticas são compostas após a Segunda Grande Guerra, sem apresentar características
revolucionárias nem novas técnicas. Segundo Grout (1988), o compositor testemunha um
sentido perfeito do teatro (p. 715).

Num ponto de vista geral, a partir de sensivelmente 1930, Poulenc atinge uma nova
maturidade que foi antecipada devido ao reencontro com o cantor Pierre Bernac e a morte
de Pierre-Octave Ferroud. Consequentemente, Poulenc redescobriu a sua fé católica
romana, substituindo a natureza irónica do neoclassicismo pela profundidade espiritual,
compondo uma série de obras sacras. Deste modo, teve uma “...tendência para abandonar o
aspeto por assim dizer brincado e gratuito da sua arte, a fim de lhe conferir maior seriedade
5
Obra dedicada a Erik Satie
de intentos, uma expressão mais humana e um estilo mais castigado” (Borba & Lopes
Graça,1999, p 405). Os mesmos autores afirmam ainda que é no campo da música vocal que
este revela mais o seu talento, onde identifica perfeitamente os mais belos textos de poetas
antigos e contemporâneos, traduzindo nas suas canções com piano a sua finura, a
plasticidade da linha melódica, ligando a isto “...um perfeito sentido de prosódia e uma aguda
penetração do sentido dos poemas”(Borba, 1999, p.405).

Durante a Segunda Guerra Mundial permaneceu em França e demonstrou a sua resistência


através da sua escrita, que exprimia a sua dor e desolação na canção intitulada C. Após este período
conturbado da História Mundial, Poulenc estava preocupado em se inserir no ambiente musical de
Paris, “defendendo o “clássico” Stravinsky contra os Messiaenistas e atingindo o sucesso brilhante
na sua primeira ópera Les mamelles de Tirésias 6(Nichols,1980, p.164).

“Apaixonado pela vida, melancólico e


serenamente místico, ao mesmo tempo monge e
diabrete” (Tranchefort, 2004, p.703). O caráter
espirituoso, chique e gaulês de muita da música de
Poulenc conjugam a graça e o espírito da canção
popular parisiense, um dom especial para a imitação
satírica, a fluência melódica e um estilo cativante.
“Na sua música, nada evoca a secura do
neoclassicismo de convenção” (Candé, 2004,
p.292). Era considerado um grande “pequeno
mestre”, que conseguiu por vezes atingir os
pícaros na segunda parte da sua carreira. Em
vida, por vezes foi considerado um músico
menor, contudo após a sua morte alguns
Fig. 4- Desenho de Jean Coteau (1922)
historiadores designavam-no como o herdeiro de
Monteverdi, Mozart, Mussorgsky. As principais características das sua música são a
perfeição do estilo e a espontaneidade da inspiração que lhe permitiu inventar um
classicismo muito pessoal.

6
Defending the ‘classical’ Stravinsky against the ‘Messienistes’ and achieving a brilliant success with his first opera Les
marmelles de Tirésias
“Não se lhe ficou a dever nenhum enriquecimento da técnica
musical, mas ele atinge sempre o seu objetivo de maneira admirável,
quer se trate de comover ou seduzir”(Candé, 2004, p.293).

Bibliografia

 BORBA, T. e LOPES GRAÇA, F. (1999). Dicionário de Música. Vol. 2. Porto: Mário


Figueirinhas Editor. Pp. 404-405, 571.

 CANDÉ, R. (2004). História universal da Música. Vol. 2. Porto: Edições Afrontamento.


Tradução: Fonseca, Manuel Dias e Siza, Tereza. Pp.286-367.

 GROUT, D. e PALISCAL, C. (1988). História da Música Ocidental. Lisboa: Gradiva-


Publicações. P.715.

 Hagaselamusica.com. Consultado em Outubro 26, 2019 em:


http://www.hagaselamusica.com/ficha-compositores/siglo-xx/poulenc-francois/.

 MICHELS,U. (2007). Atlas da Música II Do Barroco à Atualidade. Gradiva. Pp. 149,533.

 NICHOLS, R. (1992). «Francis Poulenc» in Music Sales Classical. Consultado em Outubro


23, 2019 em: http://www.musicsalesclassical.com/composer/long-bio/Francis-
Poulenc

 NICHOLS, R. (1980). «Francis Poulenc» in The New Grove, Dictionary of Music and
Musicians. vol.15. London: Macmillan Editor. pp.163-169.

 WHITTALL, A. (1980). «Neo-classical» in The New Grove, Dictionary of Music and


Musicians. Vol. 13. P. London: Macmillan Editor 104-105

 NIOMAR (2013, Agosto 12). Pianomusici. Consultado em Outubro 23, 2019 em:
http://pianomusici.blogspot.pt/2013/08/eric-satie-e-o-neoclassicismo.html

 STANLEY. J. (2006). Música Clássica Os grandes compositores e as suas obras-primas.


Editorial Estampa, Lda. P.229.

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