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Ensino de Cálculo: uma abordagem usando Modelagem Matemática

Lourdes Maria Werle de Almeida Dra. 1


Luci Harue Fatori Dra. 2
Luciana Gastaldi Sardinha Souza Ms. 3

Resumo
Neste trabalho estamos interessados em apresentar algumas reflexões sobre o ensino e a
aprendizagem de Cálculo Diferencial e Integral. O trabalho visa encaminhar uma reflexão sobre a
idéia de que há alguns aspectos, cuja incorporação às aulas, pode trazer contribuições importantes para
a aprendizagem dos alunos. Argumentamos que, de modo geral, um fator importante é trabalhar com
problematizações e, desenvolver no âmbito da sala de aula, atividades que incitem os alunos a
mobilizarem o seu conhecimento. Neste encaminhamento abordamos a modelagem matemática como
alternativa de ensino e aprendizagem para as aulas de Cálculo. Analisamos algumas situações nas
quais atividades de modelagem foram desenvolvidas. O que se pode concluir é que, por um lado,
pensar nas atividades das aulas de Cálculo como algo que envolve “idéias” e “tem sentido” para os
alunos parece ser fator importante para a aprendizagem e deste modo, pode contribuir para amenizar
os problemas que se percebem em relação ao ensino e à aprendizagem nesta disciplina. Por outro lado,
a atribuição de sentido e o desenvolvimento de idéias podem se dar a partir de problematizações
introduzidas nas aulas.
Palavras-chave: Ensino de Cálculo, Modelagem Matemática, Educação Matemática

Abstract
In this work we presented some reflections on the teaching and the learning of Calculus. The
work directs a reflection on the idea that there are some aspects, whose incorporation to the
classes, can bring contributions for the students' learning. We argued that, in general, an
important factor is to work with problem-solving strategies, developing in the extent of the
classroom, activities that incite the students to mobilize his/her knowledge. In this direction
we approached the mathematical modelling as alternative and we analyzed some situations
involving modelling activities. We ended that, on one side, to think in the activities of the
classes of Calculation as something that involves "ideas" and "has sense" for the students
seems to be important factor for the learning and this way, it can contribute to soften the
problems that are noticed in relation to the teaching and to the learning in this discipline. On
the other hand, the sense attribution and the development of ideas can feel starting from
problem-solving strategies that are introduced in the classes.

Key-words: Calculus Teaching, Mathematical Modelling, Mathematical Education

1- Introdução
Vivemos num período em que as pesquisas com relação ao ensino e à aprendizagem da
Matemática nos diferentes níveis de ensino têm demonstrado avanços significativos. Por outro
lado, as transformações observadas na sociedade requerem adequações com relação às
práticas de professores e às mudanças curriculares. No que diz respeito ao ensino superior, as
diretrizes curriculares para os cursos de graduação sugerem modificações que nem sempre são

1
Professora Associada do Departamento de Matemática da Universidade Estadual de Londrina.
E-mail: lourdes@uel.br
2
Professora Associada do Departamento de Matemática da Universidade Estadual de Londrina.
E-mail: lucifatori@uel.br
3
Professora Adjunta do Departamento de Matemática da Universidade Estadual de Londrina.
E-mail: lucianagastaldi@sercomtel.com.br
fáceis de implementar e que representam desafios ou causam inquietações para professores e
alunos.
Neste trabalho estamos interessados em apresentar algumas reflexões sobre o ensino de
Cálculo em cursos superiores. Embora a problemática no âmbito do ensino de Cálculo seja
amplamente discutida, as soluções ou recomendações estão longe de serem consensuais.
Por um lado, as pesquisas se debruçam sobre questões relativas ao Ensino Fundamental e
Médio, levando em conta a idéia de que “os alunos estão ingressando na universidade cada
vez mais despreparados” (Malta, 2004). Por outro lado, outras investigações partem do
princípio de que as dificuldades em relação ao ensino e a aprendizagem devem ser
enfrentadas e corrigidas no ensino superior.
Neste contexto, são inúmeras as propostas de melhoria para o ensino de Cálculo.
Nosso trabalho se encaminha no sentido de considerar que há alguns aspectos, cuja
incorporação às aulas, pode trazer contribuições importantes para a aprendizagem dos alunos.
Deste modo, a partir de alguns pressupostos teóricos, argumentamos que, de modo geral, um
fator importante é trabalhar com problematizações e, desenvolver no âmbito da sala de aula,
atividades que incitem os alunos a mobilizarem o seu conhecimento. Aliados a estas
problematizações, que devem constituir espaços para a descoberta, experimentação e
argumentação, ponderamos que as aulas de Cálculo devem favorecer também a compreensão
dos conceitos, a relação com a realidade, o uso de computadores e os trabalhos em equipe.
Levando em consideração estes aspectos, entendemos que uma alternativa de ensino e
aprendizagem para o Cálculo que pode vir a contemplá-los durante as aulas é a Modelagem
Matemática. Descrevemos então atividades de modelagem matemática desenvolvidas com
alunos de dois cursos diferentes e analisamos como estes aspectos se evidenciaram durante o
desenvolvimento das atividades.

2- Sobre o Cálculo Diferencial e Integral


2.1-Aspectos históricos
A origem do Cálculo Diferencial e Integral está fortemente ligada ao século XVII e a
dois nomes: ao inglês Isaac Newton (1642-1727) e ao alemão Goltfried Wilhelm Leibniz
(1646-1716). Newton realizou seus estudos na Inglaterra, partindo de definições de espaço e
tempo e, levando em consideração idéias apresentadas por Descartes, desenvolveu o que ele
chamou de Método de Fluxões, concluído em 1671 mas publicado somente em 1736. Em seu
trabalho Newton considerava uma curva como resultado do movimento contínuo de um
ponto. Criou uma denominação para a mudança de posição – fluente – e a taxa de variação do
fluente em relação ao tempo denominou fluxão. A fluxão equivale ao que hoje chamamos de
derivada e o fluente é a função.
Leibniz, contemporâneo de Newton, desenvolveu seus estudos em Paris quase na
mesma época que Newton, mas foi o primeiro a publicar seus trabalhos em 1684. Sem
conhecer os trabalhos de Newton, Leibniz desenvolveu o Calculus Differentialis e Calculus
Summatorius ou Calculus Integralis, criando a notação para taxas de variação usada até hoje
que, além de representar bem os fenômenos é de fácil operacionalização.
Newton e Leibniz descreveram fenômenos reais usando a linguagem do Cálculo. A
partir daí desenvolveu-se uma teoria matemática sobre o Cálculo Diferencial e Integral, de
certa forma, independente da realidade, mas que permite compreendê-la em vários aspectos.
Segundo Zuin (2001), as idéias geradas neste século iriam repercutir e transformar o mundo.
É a partir de Newton e Leibniz que o Cálculo passa a constituir um campo autônomo do
conhecimento e atualmente as ferramentas do Cálculo estão impregnadas nas aplicações das
mais diversas áreas e, como ramo da Matemática, seu ensino é contemplado como disciplina
obrigatória em diferentes cursos.

2.2-Sobre o ensino e aprendizagem do Cálculo


Embora o Cálculo seja uma disciplina presente no currículo de muitos cursos
superiores, as dificuldades com seu ensino e sua aprendizagem têm representado um problema
para professores e estudantes tanto dos cursos de Matemática como para os de cursos de
serviço 4.
Segundo Cabral e Catapani (2003) os indicadores desta problemática estão
comprovados pelas taxas de reprovação, repetência e abandono das disciplinas de Cálculo. De
forma geral, embora a disciplina exija esforços e dedicação dos alunos, estes expressam
muitas dificuldades em compreender os conceitos explorados (Franchi, 1993; Vilarreal,
1999).
O que se pode perceber é que o insucesso dos alunos está fortemente relacionado com
a não adequação dos conteúdos que compõe os programas das disciplinas de Cálculo à
realidade dos estudantes e às necessidades do sistema social, cultural e econômico, com uma
metodologia que, em geral, prioriza operações, técnicas e repetição de algoritmos, entre
outros fatores.
A forma como são estruturados os livros didáticos de Cálculo adotados nas
universidades brasileiras também não favorece o desenvolvimento e a aprendizagem dos

4
Denominação considerada para disciplinas de conteúdo matemático ministradas por professores do
departamento de matemática em cursos para não matemáticos.
alunos. De modo geral, cada capítulo é iniciado com definições seguidas de teoremas ou
propriedades, depois são apresentados alguns exemplos de exercícios que utilizam estas
definições e só ao final do capítulo são apresentadas algumas aplicações relacionadas ao
assunto. Deste modo, o aluno, além de já receber os problemas prontos, ao resolvê-los já sabe,
de antemão, a que conceitos deve recorrer.
De forma geral, nas aulas de Cálculo os conteúdos são apresentados aos alunos como
um saber já construído, sem lugar para a intuição, experimentação ou descoberta e perante o
qual não é possível a argumentação. Os conceitos são apresentados aos alunos, na maioria das
vezes, já formalizados, não decorrentes das suas ações e da reflexão sobre eles, dando-se
quase nenhum tempo aos alunos para sentirem a formalização como algo natural e necessário
à comunicação de processos e resultados.
O encaminhamento do nosso trabalho se dá no sentido de, à luz de um quadro teórico,
levantar alguns aspectos que consideramos relevantes para amenizar os problemas relativos ao
insucesso dos alunos nas aulas de Cálculo, levando a uma reflexão sobre esta problemática.

2.3 - Aspectos levantados à luz de um quadro teórico


Conforme Papert (1994), a determinação do padrão de vida de uma pessoa reside na
capacidade de aprender novas habilidades, de assimilar novos conceitos, de avaliar novas
situações e de lidar com o inesperado. Neste sentido, segundo Vinner (1991), para assimilar
um novo conceito, o sujeito precisa formar um conceito imagem do mesmo. O conceito
imagem corresponde a toda estrutura cognitiva na mente de um sujeito à qual estão associadas
todas as imagens mentais, propriedades e processos. Por meio do conceito imagem o sujeito
vai construir o conceito definição que é a forma pessoal de palavras usado para explicar o seu
conceito imagem. Segundo Dias (2002), a aquisição de um conceito definição representa que
o sujeito possui uma idéia clara do significado deste conceito.
Neste sentido, consideramos que a valorização do conceito ao fazer as opções
procedimentais do ensino, representa uma condição essencial, pois a aprendizagem da
Matemática só acontece, efetivamente, quando o estudante consegue apreender o significado e
atribuir sentido aos conceitos ou idéias matemáticas e passa a usar e compartilhar esses
significados (Almeida e Brito, 2005).
Assim, uma estratégia para formar um conceito imagem mais coerente com o conceito
definição formal seria evitar o caminho tradicional em que as definições precedem exemplos e
problemas, ou seja, o caminho no qual o conceito imagem é formado depois do conceito
definição e é controlado por este.
Uma outra estratégia para o sucesso das aulas de Cálculo parece advir da
aplicabilidade dos conceitos. Neste contexto, Matos (2003), argumenta que a Matemática
enquanto ciência parece desenvolver-se, fundamentalmente, a partir de problemas postos
dentro da própria Matemática processando-se assim uma evolução interna. No entanto, a
relação que existe entre a Matemática e o mundo físico tem constituído também uma fonte
inesgotável de problemas para os próprios matemáticos que os tem inspirado e dado lugar ao
desenvolvimento de novas teorias matemáticas. Introduzir estes problemas nas aulas é a
perspectiva que estamos interessadas em abordar. Neste sentido, Gómez-Grannell (1998),
coloca que “o reconhecimento do uso das aplicações sociais da Matemática não significa
brincar de vender e comprar na sala de aula, mas buscar formas de vincular o conhecimento
matemático aos seus usos científicos e sociais é essencial para dotar de sentido a atividade
matemática na sala de aula”.
Não defendemos aqui a idéia “utilitarista” da Matemática, mas somos favoráveis à
idéia de que relações entre conhecimento científico e conhecimento escolar precisam se
estabelecer nas aulas de Cálculo. Estas relações, de forma geral, não são facilmente
percebidas pelos alunos. Assim, podemos, por exemplo, observar que o aluno compreende
com clareza que o efeito de um medicamento no organismo vai diminuindo no decorrer do
tempo e tende mesmo a desaparecer, no entanto, o aluno não associa este fato ao conceito de
limite e tem dificuldades para compreender o conceito de limite usando  e  ; o aluno usa
com naturalidade a idéia de velocidade média, no entanto, tem dificuldades em perceber que a
derivada também é uma taxa de variação.
Uma justificativa importante para a visualização da aplicação dos conceitos diz
respeito aos aspectos motivacionais. Neste sentido vários estudos, como por exemplo Carreira
(1993), D’Ambrosio (2002), Almeida e Borssoi (2005), têm observado que, situações de
ensino que proporcionam ao aluno contato com o contexto real, podem motivá-los para o
envolvimento nas atividades e para a construção de seu conhecimento. Para Lachini (2001), a
maneira mais eficaz de lidar com tradições arraigadas, como é, por exemplo, o insucesso de
muitos alunos em Cálculo, é levar em consideração as relações pessoais cotidianas em que os
sujeitos transitam. Isto nos leva a pensar que uma motivação contextualizada com o curso ou
com a vida real cria nos alunos, uma afetividade com a disciplina e o desejo de aprender. É
impossível ensinar o desejo, no entanto, segundo Charlot (2000), uma motivação, agente
externo, pode causar uma mobilização interna e esta desencadeia o desejo de aprender.
Outro aspecto que parece relevante para a aprendizagem do Cálculo diz respeito à
incorporação de atividades com o uso do computador. Segundo Lachini (2001) a
implementação do uso dos computadores no estudo do Cálculo cria condições propícias para
que cada professor possa reavaliar sua competência docente e possa se considerar não apenas
um repassador do conhecimento pronto, mas se descobrir, a partir do uso do computador,
como reelaborador de saberes. Além disso, os computadores com sua rapidez para realizar
cálculos rotineiros e gerar informações gráficas, propiciam um momento para o
desenvolvimento da capacidade de questionar, de analisar criticamente e de tomar decisões,
atributos necessários para a formação de um profissional capaz de viver e conviver numa
sociedade em constante transformação.
Finalmente, defendemos a idéia de que os trabalhos em grupo podem favorecer a
aprendizagem do Cálculo. Esta idéia traduz outras percebidas na literatura de que o aprender
se dá num contexto de integração social e que o aluno constrói o seu conhecimento
confrontando-o com o conhecimento dos colegas. Segundo Fernandes (2000), quando os
alunos trabalham juntos com o mesmo objetivo e produzem um produto ou solução final
comum, têm a possibilidade de discutir os méritos das diferentes estratégias para resolver um
mesmo problema, e isso pode contribuir significativamente para a aprendizagem dos
conceitos envolvidos. Segundo Cury (2000), depoimentos de alunos de Cálculo revelam que a
interação com colegas que “falam a mesma linguagem” é fundamental para a aprendizagem.
Neste sentido hoje, parece evidenciar-se uma concepção de que “aprender Matemática é
construir relações Matemáticas, negociar os significados matemáticos com os outros e refletir
sobre a sua própria atividade Matemática” (WHEATLEY, 1992 apud REYNOLDS;
WHEATLEY, 1996). Embora, não tenhamos neste trabalho interesse em apresentar uma
análise aprofundada sobre a influência dos aspectos sociais na aprendizagem, levando em
consideração esta visão da aprendizagem da Matemática, fortalecemos a nossa concepção de
que a interação social tem um lugar importante nas aulas de Cálculo.
A partir do levantamento destes aspectos, nosso trabalho se encaminha no sentido de
investigar se a Modelagem Matemática pode vir a contemplá-los durante as aulas de Cálculo.

3-Modelagem Matemática no âmbito do ensino e da aprendizagem do Cálculo


Da mesma forma que Newton e Leibniz, ao desenvolverem o Cálculo, estabeleceram
representações para problemas cuja origem estava fora da Matemática, ainda hoje, percebida
como atividade humana, a Matemática tem seu desenvolvimento fortemente ligado a
problemas não essencialmente matemáticos. Neste sentido, Caraça (1998) coloca que: “Sem
dúvida a Matemática possui problemas próprios, que não têm ligação imediata com outros
problemas da vida social. Mas não há dúvida também de que os seus fundamentos mergulham
tanto como os de outro ramo qualquer da Ciência, na vida real...”
Neste contexto, segundo D’Ambrósio (2003), de forma geral a origem das idéias
matemáticas é resultado de um processo que procura explicar e entender fatos e fenômenos
observados na realidade. O desenvolvimento destas idéias e sua organização intelectual dão-
se a partir de elaborações sobre representações da realidade. Estas representações da realidade
constituem o que chamamos de “modelos matemáticos”. A modelagem matemática consiste
na obtenção, aplicação e avaliação destes modelos.
Diversas experiências de modelagem matemática têm sido conduzidas em sala de aula,
como por exemplo ALMEIDA e BRITO (2005), BASSANEZZI (2002), BARBOSA (2001),
BRITO (2004), FERRUZZI (2003), ALMEIDA e DIAS (2004) entre muitos outros. Nessas
experiências, o encaminhamento das atividades varia, muitas vezes, em função da necessidade
de se atender às exigências impostas pelo contexto escolar e também de acordo com as
concepções sobre o papel da modelagem no currículo. Consideramos, neste trabalho, a
modelagem matemática segundo a alternativa da combinação. Nesta opção, segundo Blum e
Niss (1991), algumas vezes a modelagem pode ser usada para introduzir conceitos
matemáticos, outras vezes com a finalidade de aplicar conceitos já conhecidos.
O desenvolvimento de uma atividade de modelagem matemática em sala de aula
envolve um conjunto de ações que vão desde a definição de uma situação problema e passam
pela identificação e seleção das variáveis mais importantes, a elaboração das hipóteses
simplificadoras, a obtenção de um modelo matemático e sua resolução por meio de
procedimentos adequados levando à análise do modelo obtido, confrontando as soluções com
os dados reais observados. Este confronto pode sugerir a complementação ou o
aperfeiçoamento do modelo, conferindo um caráter essencialmente dinâmico à atividade. O
que assume fundamental importância no contexto de ensino e aprendizagem da Matemática é
o processo de obtenção e análise crítica do modelo bem como as sistematizações de conteúdos
matemáticos que se consegue fazer a partir dele.
Neste sentido, diversos autores têm apresentado razões ou argumentos para justificar a
inclusão de atividades de modelagem nas aulas de matemática (Ver, por exemplo: Bassanezzi,
2002; Blum e Niss, 1991). Em termos gerais, os argumentos levam em consideração que, ao
desenvolver uma atividade de modelagem matemática o aluno pode desenvolver sua
criatividade, conjecturar, construir o seu conhecimento, desenvolver sua competência crítica
além de, ao perceber verdadeiras aplicações da Matemática escolar, sentir-se mais motivado
para o envolvimento com as atividades.
Na literatura podemos encontrar diversos trabalhos que estabelecem relações entre as
aulas de Cálculo e a modelagem matemática (Franchi, 1993; Vilarreal, 1999; Araújo, 2002;
Biembengut, 1997; Barbosa, 2004). De forma geral, o que as pesquisas revelam é que criar e
explorar o modelo de um fenômeno é uma experiência importante no processo de
aprendizagem. Segundo Ogborn (1997), citado em Matos (2003), “Quando se constroem
modelos, começa-se a pensar matematicamente. A análise de um modelo matemático, pode
levar a compreensão de conceitos profundos, como por exemplo, a noção fundamental de taxa
de variação... A criação de modelos é o início do pensamento puramente teórico sobre o
funcionamento das coisas”.
Nosso trabalho se encaminha no sentido de perceber a modelagem matemática como
uma alternativa pedagógica que oportuniza ao aluno a atribuição de sentido e a compreensão
de conceitos matemáticos, viabiliza a interação entre a matemática escolar e a realidade,
proporciona a utilização de ferramentas computacionais nas aulas de Cálculo e estimula os
trabalhos em grupo, aspectos que, na seção anterior apontamos como relevantes para as aulas
de Cálculo.

4- Algumas situações de Modelagem relacionadas com a aprendizagem do Cálculo


Apresentamos duas atividades de modelagem matemática desenvolvidas em turmas
diferentes - Licenciatura em Matemática e Ciências Contábeis. Levando em consideração a
perspectiva apresentada para a modelagem matemática, uma das atividades foi desenvolvida
durante aulas de Cálculo 1 e viabilizou introduzir novos conceitos. A outra atividade que
descrevemos foi desenvolvida na disciplina de Introdução à Modelagem Matemática e fez
com que os alunos recorressem a conceitos já estudados nas aulas de Cálculo em séries
anteriores para resolver o problema.

4.1-Introduzindo novos conceitos


Descrevemos aqui uma das situações de modelagem, cujo objetivo era introduzir
novos conceitos, desenvolvidas por estudantes de uma turma do 1º ano do curso de Ciências
Contábeis no ano de 2004, na disciplina de Cálculo Diferencial.
Ao fazer uso da modelagem, além de levar em consideração aspectos motivacionais,
planejava-se que os alunos trabalhassem com os computadores na perspectiva de
compreenderem aspectos gráficos das funções, estabelecerem relações entre as diferentes
representações destas funções e conhecerem ferramentas computacionais para o cálculo.
Os alunos desenvolveram atividades em grupos e abordaram temas como preços de
estacionamento, taxas cobradas pelos correios, administração de soro em hospitais, confecção
de camisetas, entre outros. Por meio destas atividades foram introduzidos e abordados
diversos conceitos do Cálculo 1. Abordamos aqui a equipe que se envolveu com o problema
de “Corridas de Táxi”.
Inicialmente os alunos realizaram pesquisa, junto à CMTU (Companhia Municipal de
Trânsito e Urbanismo), órgão responsável pela definição das normas que regulamentam o
serviço de táxi e verificaram que o preço das corridas depende do horário, distância percorrida
e tipos de corrida. A planilha definida pela CMTU é posteriormente transformada em Decreto
Lei que, sancionado pelo Poder Executivo do Município, enviado a um órgão estadual –
IPEM (Instituto de Pesos e Medidas do Estado do Paraná), que, baseado nestas informações e
em conformidade com a Legislação pertinente do INMETRO, faz o aferimento dos
taxímetros.
De acordo com a legislação em vigor, para quaisquer tipos de corrida, era atribuído um
valor inicial de R$3,60, comumente conhecido como bandeirada. Para os quilômetros rodados
completos, os táxis poderiam utilizar-se de dois valores diferentes, conforme o horário:
Bandeira 1 – de segunda a sexta, das 06 às 18 horas: neste caso o passageiro paga a
bandeirada, mais R$ l,60 por quilômetro rodado;
Bandeira 2 – de segunda a sexta, das 18 às 06 horas, aos sábados, domingos e feriados: neste
caso o passageiro paga a bandeirada, mais R$ 1,90 por quilômetro rodado. Assim, para o caso
da bandeira 1 podemos escrever: Preço = R$ 3,60 + R$ 1,60 por km (completo) rodado.
A primeira questão investigada pelos alunos diz respeito à contagem do ‘quilômetro
rodado’. Para buscar respostas, as alunas (o grupo era formado só por garotas) tomaram um
táxi no perímetro urbano da cidade. Ao perceber que o taxímetro mudava a cada R$ 0,20
fizeram cálculos simples e concluíram que o taxímetro atribuía R$ 0,20 a cada 0,125km
rodados. A partir destas informações o grupo organizou os dados conforme aparece na tabela
1 a seguir. Como dispostos nesta tabela, os dados não se mostram adequados para obter a
equação geral da função, uma vez que envolve faixas de distâncias. Assim, as alunas
organizaram os dados de modo a considerar somente distâncias fixas e não intervalos, como
acontece na tabela 1. Estes dados são apresentados na tabela 2.
Tabela 1: Bandeira 1 Tabela 2. Bandeira 1
d (km) P (reais) d (Km) P (reais)
00,125 3,60 0 3,60
0,1250,25 3,60 + (1 x 0,20) = 3,80 0,125 3,60 + (1 x 0,20) = 3,80
0,2500,375 3,60 + (2 x 0,20) = 4,00 0,150 3,60 + (1 x 0,20) = 3,80
0,3750,5 3,60 + (3 x 0,20) = 4,20 0,200 3,60 + (1 x 0,20) = 3,80
0,5000,625 3,60 + (4 x 0,20) = 4,40 0,250 3,60 + (2 x 0,20) = 4,00
0,6250,75 3,60 + (5 x 0,20) = 4,60 0,300 3,60 + (2 x 0,20) = 4,00
0,750,875 3,60 + (6 x 0,20) = 4,80 0,350 3,60 + (2 x 0,20) = 4,00
0,875 1,0 3,60 + (7 x 0,20) = 5,00 0,375 3,60 + (3 x 0,20) = 4,20

Levando em consideração os dados, as alunas, após alguns estudos, escreveram a função


 d 
preço: P1 (d )  3.6    0.20 (1)
 0.125 

 d 
onde,  representa a função maior inteiro definida por: x   {maior inteiro n tal que n  x}
 0.125 
Para os dados da Bandeira 2, usando os mesmos procedimentos encontraram:
 d 
P2 ( d )  3.6    0.20 (2)
 0.10526 
Uma vez realizados os estudos para os dois tipos de cobrança, as alunas fizeram uma
análise comparativa das situações, usando representação gráfica conforme aparece na figura 1.
Observando o gráfico, conjecturaram dois fatos: a) Como o gráfico de P2 está sempre
acima ou é igual ao gráfico de P1, o preço a ser pago na bandeira 2 é sempre maior ou igual ao
preço a ser pago na bandeira 1, para mesmas distâncias, o que confere com a situação
observada na prática; b) Quanto maior a corrida, maior a diferença de preços entre as duas
Bandeiras.

— P1: Preço na bandeira 1


— P2: Preço na bandeira 2

Figura 1– Bandeira 1 e Bandeira 2


Procurando justificar as conjecturas, foram feitos os seguintes cálculos:
d d
Como 0,125 > 0,10526, e d > 0, temos  . Percebendo que estas
0,125 0,10526
divisões poderiam resultar na mesma parte inteira, é possível concluir que
 d   d 
 0,125    0,10526  , o que, pelas equações (2) e (3), conduz a P1(d)  P2(d).
   
Neste momento, foi introduzido o conceito de “função monótona” e a partir deste os
resultados da segunda conjectura foram traduzidos da seguinte forma: se D é a função
diferença de preços, ou seja, D(d) = P2(d) – P1(d), então D é uma função não-decrescente,
isto é, se d1 < d2, então D(d1)  D(d2).
Por meio desta situação, foi possível abordar com os alunos conceitos importantes
relativos às funções. Estes conceitos passaram a ter algum sentido para as alunas uma vez que
perceberam a sua utilização em problemas reais. Para o conceito de função, por exemplo, as
alunas perceberam que para cada distância percorrida, existe um único preço a ser pago. É
impossível uma mesma distância ter dois preços. Por outro lado, analisando as tabelas, as
alunas verificaram que para valores de distâncias distintas, pagava-se o mesmo preço. Esta
idéia permitiu introduzir e dar sentido ao conceito de função injetora. De modo semelhante,
foi possível abordar o conceito de função sobrejetora.

Um outro aspecto a considerar é a utilização da função “maior inteiro”. De forma geral,


nas aulas de Cálculo, esta função, quando abordada, é usada somente para exemplificar
função não injetora ou não sobrejetora, no entanto, sua utilização é de grande valia para o
estudo de situações reais.

4.2-Aplicando conceitos já estudados


A atividade que mencionamos foi desenvolvida por um grupo de alunos do 4º ano de
do curso de Licenciatura em Matemática no âmbito da disciplina de Introdução à Modelagem
Matemática. Esta atividade, embora não fosse desenvolvida no âmbito de uma disciplina de
Cálculo, trouxe contribuições importantes para os alunos no que diz respeito à aprendizagem
do Cálculo, pois fez com que os alunos tivessem que selecionar, entre o seu repertório de
conceitos apreendidos, aqueles adequados para resolver o problema. Por outro lado,
possibilitou-lhes aplicar de uma forma bastante efetiva alguns conteúdos.
As idéias que se pretende explorar dizem respeito: à capacidade dos alunos em ativar
conhecimentos matemáticos em situações extra-matemáticas – a identificação imediata do
conteúdo matemático adequado para o problema nem sempre ocorre, neste sentido pensamos
que o ensino de matemática em geral deve proporcionar aos alunos experiências de contextos
em que a matemática se aplica; à possibilidade de observar nos alunos a compreensão dos
conceitos matemáticos envolvidos na resolução do problema; à utilização de recursos
computacionais para auxiliar no estudo; à importância do trabalho em grupo.
È adequado observar que esta atividade diz respeito ao ensino de Cálculo de forma
indireta: não havia, como na situação anterior, o objetivo de introduzir conceitos do Cálculo;
todavia, para resolver o problema, os alunos tiveram necessidade de recorrer a conceitos e
conteúdos de Cálculo, de modo que pudessem ver suas aplicações e atribuir-lhes sentido.
O problema, apresentado e definido pelos alunos, foi parcialmente resolvido durante
as aulas e parte dele foi desenvolvido pelos alunos em atividades extra-classe. O grupo
interessou-se em investigar o cultivo do peixe da espécie tilápia. A partir de informações,
perceberam que era possível aproveitar o couro do peixe, embora os pesqueiros do tipo
“pesque-pague”, comuns na região, ainda não estavam habituados a este tipo de
comercialização. De posse de informações sobre o aproveitamento do couro, os preços
praticados no sul do Brasil e a possibilidade de comercialização, propuseram-se a estudar a
possibilidade de ganhos que a utilização do couro poderia proporcionar ao dono do pesqueiro.
Inicialmente era preciso definir como medir a quantidade de couro obtido de cada
peixe. Com esta finalidade, pescaram peixes com pesos variando entre 280g e 720g. No
tempo reservado para a coleta de dados, pescaram 8 peixes, sendo todos de pesos diferentes,
conforme apresentado na tabela 3. Como em um genuíno trabalho de modelagem, precisariam
neste momento, formular hipóteses para decidir como seria obtida a superfície de cada peixe.
Decidiram então fazer uma aproximação por meio de triângulos, conforme ilustra a figura 2.
As medidas dos lados dos triângulos bem como a área de cada triângulo constam na tabela 3.
Para calcular estas áreas usaram a planilha Excel. Cada peixe dá origem a dois triângulos de
modo que a área útil correspondia a, aproximadamente, 55% da superfície total do peixe uma
vez que cabeça, cauda e barbatanas não fazem parte destes triângulos.
Em seguida, obtiveram do dono do pesqueiro os dados: são abatidas, no pesqueiro, em
média, 2,5 toneladas de tilápias por mês; a espécie, tilápia híbrida nilótica/tailandesa, não
atinge peso superior á 1 kg. Dos curtumes da região obtiveram que o preço é de R$ 6,00 por
m2 de couro. A partir destas informações, passaram ao desenvolvimento do modelo
matemático. Este é o momento em que, durante uma atividade de modelagem, os alunos se
deparam com o que este grupo denominou “o problema maior”: que matemática podemos
usar? O grupo, após alguma busca e discussão entre os elementos do grupo, percebeu que uma
forma de resolver o problema seria usar o Princípio da Alometria ( ver Basanezzi,.2002).
Definiram então as variáveis: x(t)= peso do peixe e y(t)= área útil de couro, de modo que as
taxas de crescimento destas duas partes do peixe em relação ao tempo seriam,
dx dy
respectivamente: e . Usando o Princípio da Alometria, poderiam escrever:
dt dt
1 dy 1 dx
k (3)
y dt x dt
onde x>0 e y>0 e k é a constante de proporcionalidade. Após as transformações adequadas é
possível este princípio como:

y  c xk (4)
onde c>0 é uma constante de integração e k>0 e representa a função-potência que descreve a
relação entre o peso x e a área útil de couro y, cujos parâmetros c e k precisam ser
determinados.
Tabela 3- Medidas das tilápias Figura 2: Aproximação por triângulos

Considerando x o peso dos peixes, definido na 1ª coluna da tabela 1, e y a área útil de


couro definida na 4ª coluna da tabela 3 e usando método de ajuste de curvas e a Planilha

Excel, obtiveram: y( x)  2.165 x 0.751 (5)


onde c=2.165 corresponde ao peso inicial do peixe e k=0.751 é o coeficiente de alometria e
indica a velocidade relativa de crescimento da área útil. O gráfico desta função é apresentado
na figura 3.
A validação, que representa no processo de modelagem um momento de grande
importância para os alunos, implica em verificar se o modelo obtido é “adequado” para a
situação em estudo e gera no aluno a auto-confiança, no sentido de sentir-se capaz para
resolver um problema. Esta é, segundo Charlot (2000), a importância maior: sentir-se capaz,
diante de si mesmo, diante dos colegas e diante do professor. A comparação entre dados
observados e dados estimados pelo modelo é apresentada na tabela 4.
Para analisar a questão dos ganhos que o pesqueiro poderia obter com a comercialização do
couro, os alunos usaram a hipótese, definida a partir de contatos com o responsável pelo
pesqueiro, de que o peso médio dos peixes abatidos é de 500 gramas. Usando a equação (5)

obtiveram: y(500)  2.165(500) 0.751  230 cm 2  0.023m 2

Tabela 4: Validação dos alunos Figura 3: Gráfico da Função

Peso Área útil Área útil


(gr) Observada(cm Estimada pelo
2
) modelo (6)
280 148.70 148.64
340 173.78 171.95
410 188.39 197.9
470 227.82 219.26
590 263.03 260.06
630 273.54 273.18
660 284.79 282.89
720 296.15 301.98

Levando em consideração que o pesqueiro vende 2.5 toneladas de peixe por mês, que
o peso médio de cada peixe é de 500 gramas, que o preço é R$6,00 por m2 de couro, que cada
peixe fornece, aproximadamente, 0.023m2 de couro, os alunos concluíram que o pesqueiro
poderia ganhar R$8280,00 ao ano não desperdiçando o couro da tilápia.
Ao manusearem o livro Bassanezi (2002), os alunos se depararam com as relações
entre superfície (área) e peso já estabelecidas na literatura: Resolveram então o problema
usando relações e conceitos já estabelecidos na literatura e obtiveram resultados muito
próximos daqueles que o desenvolvimento original lhes havia oportunizado.

5- Considerações sobre as atividades


A elaboração e a resolução de problemas permitem ao aluno externalizar o processo
construtivo de aprender, de converter em ações alguns conceitos, proposições e exemplos
adquiridos ou construídos com o professor e com o material didático.
Ao usar a modelagem matemática como alternativa pedagógica, são realizadas nas aulas
sessões onde os alunos, reunidos em pequenos grupos assistidos pelo professor, se envolvem
na elaboração e resolução de problemas que, em geral, têm origem fora da Matemática.
O que se pôde perceber no decorrer do desenvolvimento das atividades de modelagem é
uma perspectiva para o ensino e a aprendizagem do Cálculo que pressupõe a necessidade de
atividades, por parte dos alunos, que propiciem a interação, o envolvimento e a cooperação.
Esta interação diz respeito tanto às relações sociais com colegas e professor, quanto à
interação que o aluno estabelece com o objeto matemático a ser conhecido.
No caso dos alunos do curso de Ciências Contábeis, obter os dados, vivenciando a
situação a ser investigada, fez com que se sentissem como participantes do processo de
construção da Matemática, da obtenção do modelo que descreve a situação em estudo. Esta
“vivência” da resolução do problema estabelece a ligação entre “motivação” e “cognição” e
confere sentido ao objeto matemático.
Neste contexto podemos dizer que o conhecimento construído pelas alunas é, em grande
parte, um produto da atividade, do contexto e da realidade em que se desenvolve e se utiliza.
Conferir sentido ao objeto matemático, neste caso, parece associar-se à compreensão do
conceito: o que é função?; o que é função injetora, sobrejetora?; por que a função maior
inteiro se mostra adequada para representar o problema em estudo?
Com relação ao trabalho do grupo que investigou a utilização do couro da tilápia, a
interação entre grupo e professora transparece igualmente importante. Perceber que o
problema em estudo pode ser associado a conceitos e idéias matemáticas que já surgiram em
outros momentos do curso, neste caso, parece ter sido o “motor” que desencadeia a atribuição
de sentido e a compreensão dos conceitos matemáticos.
Ao perceber que outras ferramentas matemáticas poderiam igualmente conduzir aos
resultados pretendidos, os alunos se apropriaram de uma certa “cultura matemática” que neste
caso funciona como uma posição de poder diante dos problemas que a Matemática pode
ajudar a resolver. Esta “satisfação” é, segundo Charlot (2000), um fator de extrema
importância para a aprendizagem da Matemática.
Com relação à importância dos aspectos computacionais para o ensino de Cálculo, as
atividades desenvolvidas nos levam a ponderar que a potencialidade dos computadores ligada
aos cálculos e às representações foi decisiva.
Para as alunas que estudavam o problema do táxi, a representação das funções obtidas
favoreceu a compreensão da situação problema, especialmente no que se refere à comparação
entre os preços para a bandeira 1 e bandeira 2. Por outro lado, estas alunas, por estarem no 1º
ano do curso, não tinham ainda nenhum conhecimento de software e sua utilização, que além
de permitir uma visualização do significado da função, funcionou como motivação para
conhecer e usar os recursos computacionais nas aulas de Cálculo.
Para o grupo envolvido com o problema dos peixes, o computador desempenhou um papel
fundamental. Calcular as áreas do couro da tilápia, encontrar os parâmetros dos modelos
obtidos e representar graficamente as soluções, eram procedimentos que lhes parecia natural
serem fetos com o auxílio do computador. Como são alunos do 4º ano, já tinham
familiaridade com os softwares usados e a importância da utilização diz respeito à: a) a idéia
de que com os recursos computacionais é possível salientar diferentes aspectos do problema
em estudo; b) é possível avaliar, a todo momento, a “qualidade” do modelo encontrado e, num
processo dinâmico de modelagem, aperfeiçoa-lo.
Por fim, pensar na importância de interagir, nas aulas de Cálculo, com aspectos ou
problemas da realidade parece ser de fundamental importância. Tanto para as alunas do 1º ano
que estudaram o problema do táxi, como para o grupo do 4º ano que investigou o uso do
couro da tilápia, o fato de que o que tinham para resolver era um problema real, que eles
mesmos tinham definido e que tinha um significado para eles, fez com que se envolvessem no
estudo e nas aulas e procurassem construir o conhecimento matemático necessário para
resolver o problema. Neste sentido, estudar funções para as alunas do 1º ano e, resolver
equações diferenciais para os alunos do 4º ano, era algo necessário e importante. Assim, a
afirmação de Stewart (1996) de que “a Matemática não é sobre números e sobre fórmulas
mas, é sobre idéias” se verifica também para as aulas de Cálculo.
Neste encaminhamento, por um lado, pensar nas atividades das aulas de Cálculo como
algo que envolve “idéias” e “tem sentido” para os alunos parece ser fator importante para a
aprendizagem dos alunos e deste modo, pode contribuir para amenizar os problemas que se
percebem em relação ao ensino e à aprendizagem nesta disciplina. Por outro lado, a atribuição
de sentido e o desenvolvimento de idéias podem se dar a partir da relação com a realidade,
dos trabalhos em grupo e do uso de ferramentas computacionais. Segundo Charlot, “Trata-se
propriamente de uma dialética e não de uma simples complementaridade: o sentido atribuído
a um saber leva a envolver-se em certas atividades, a atividade posta em prática para
apropriar-se de um saber contribui para produzir o sentido desse saber” (CHARLOT, 2000).

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