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Introdução
1Discente do Curso de Mestrado profissional Ensino na Saúde da Universidade Estadual do Ceará. E-mail:
nandafortal@hotmail.com
2 Docente do Curso de Mestrado Profissional Ensino em Saúde na Saúde da Universidade Estadual do Ceará
3 Enfermeira. Drª pela Universidade Federal do Ceará - UFC
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medidos ou são ignorados, sobretudo, quando se trata de Órtese, Prótese e Materiais
especiais - OPME.
As ações gerenciais que deveriam ser determinadas pelo conhecimento
administrativo da assistência objetivando a melhoria da qualidade e eficiência na utilização
dos recursos em saúde, nem sempre seguem essa orientação, podendo transformar-se em
conflitos entre os profissionais da instituição (2). Sabe-se atuação do enfermeiro no
gerenciamento de órtese, prótese e materiais ainda é bem restrito.
Assim, a pretensão desse trabalho é analisar a partir do exposto na seguinte
problemática: quais os mecanismos que regem a atuação do enfermeiro no processo da
gestão de OPME, no âmbito das unidades hospitalares? Desta maneira, o trabalho tem o
intuito de, através de um levantamento bibliográfico sobre a temática, apresentar o estado
da arte dessa discussão numa perspectiva crítica.
Método
Este estudo foi realizado a partir de um levantamento bibliográfico, a partir de sites de
buscas de artigos científicos, dos meses de maio e junho de 2017 nas seguintes bases de
dados: Biblioteca Regional de Medicina (BIREME); Literatura latino-americana e do caribe
em ciências da saúde (LILACS); Scientific Eletronic Library Online (SCIELO); Medical
Literature Analysis and Retrieval Sistem on-line (MEDLINE) e Biblioteca Virtual em Saúde
– BVS. O filtro para a busca foram os seguintes descritores: órtese e prótese; materiais
especiais - OPME; Recursos financeiros em saúde.
O trabalho foi dividido em três aspectos relevantes a partir do contexto dos requisitos
do processo para o gerenciamento de OPME: exigências; planejamento - solicitação de
padronização e processo de compra.
Resultados e discussão
A complexidade do hospital exige a provisão e o gerenciamento de materiais e
equipamentos, indispensáveis à realização de procedimentos por parte do enfermeiro.
O entendimento sobre: “a deficiência de materiais tem interferência direta na
assistência ao cliente, constituindo-se numa preocupação para o enfermeiro gerente da
Unidade” (3). Tal precariedade é uma constante, desde os materiais mais simples até os
mais complexos, como órteses, que se refere unicamente aos aparelhos ou dispositivos
ortopédicos de uso provisório, destinados a alinhar, prevenir ou corrigir deformidades ou
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melhorar a função das partes móveis do corpo e prótese, que é o componente artificial que
tem por finalidade suprir necessidades e funções de indivíduos sequelados por
amputações, traumáticas ou não.
O mesmo autor citado anteriormente, fala:
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incluindo-se órtese prótese, sendo que esses atos devem ser analisados de maneira
adequada (7).
O mesmo autor ainda traz ainda reflexões importantes, principalmente, no que tange
aos recursos humanos, pois poderá envolver os seguintes profissionais para atingir sua
eficiência:
a. Diretorias, chefias imediatas e equipes técnicas das áreas usuárias de
OPME, responsáveis pela realização do procedimento.
b. Coordenador do centro cirúrgico.
c. Coordenador do serviço de confecção e dispensação de órteses,
próteses e meios auxiliares de locomoção.
d. Coordenador do centro de material e esterilização (CME).
e. Responsável pelo gerenciamento do almoxarifado central.
f. Colaboradores do almoxarifado central e almoxarifado satélite.
g. Responsável administrativo pelo processo de aquisição de insumos.
h. Responsável pelo setor de faturamento (7. p. 136).
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Falta de qualidade de alguns materiais e 5) Ausência de envolvimento profissional na
gestão de material médico-hospitalar (10). Destaca-se, no entanto, que estas categorias
formadas envolvem aspectos positivos e negativos do processo de trabalho, durante a
tarefa. Nesse sentido, a ausência de autonomia na escolha do material médico-hospitalar
nem sempre, há centralização na tomada de decisão do profissional que compra os
materiais, caracterizando o sentimento de submissão quanto ao poder de decidir qual seria
a melhor escolha.
No que diz respeito à compra de insumos de saúde, um hospital, dentre seus
objetivos, tem por missão conseguir uma maior confiabilidade em todos os serviços em
que oferece à população. Para alcançar suas metas, deve evitar todo tipo de desperdício:
de material hospitalar; de esforços desnecessários, com o uso indevido do tempo; com o
próprio trabalho empregado em uma atividade (quando há o retrabalho), com processos
ineficientes dentre outros.
Sobre este assunto, destaca-se na pesquisa abaixo, a importância que os
enfermeiros,
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profissional, satisfação no trabalho e possibilidade de realizar atendimentos, conforme as
demandas, sem improvisações muitas vezes desnecessárias.
Conclusão
Constatou-se que as órteses, próteses e materiais especiais – OPME são avanços
que representam melhoria na qualidade de vida das pessoas. Em contrapartida,
proporcionam impacto nos gastos em saúde, independente da complexidade, visto serem
considerados produtos de alto custo. O processo envolvendo esses itens, apesar de
bastante complexo, mostrou ter uma boa relação custo-benefício. Embora apresente
alguns gargalos, como o custo e o tempo despendido durante o fluxo de OPME, o hospital
consegue ter um controle do fluxo e do estoque desse processo, que promovem a
viabilidade e os benefícios da utilização de processos gerenciais específicos na
administração de OPME, a partir de recurso humanos preparados para este contexto.
Compreendeu-se que o enfermeiro participa ativamente da utilização de recursos
assistenciais em grande escala e atua nas definições ou como cumpridor de decisões de
outras instâncias. O estudo mostra que o mesmo gerencia recursos institucionais, mas é
pouco explorado no sentido de elucidar o tipo de participação do mesmo nos níveis
estratégicos e operacionais. Compreende-se, portanto, que, o tipo de participação da
enfermagem na gestão de recursos do hospital, pode contribuir para aumentar a
autonomia profissional, satisfação no trabalho e possibilidade de realizar atendimentos,
conforme as demandas de forma a garantir a segurança do paciente.
Considera-se ainda a relevância da pesquisa, pela possibilidade da aplicação
prática dos resultados, visando à organização e melhoria da gestão hospitalar pautada no
gerenciamento eficiente de custos e na distribuição equitativa dos recursos disponíveis,
considerando que ainda existem oportunidades de melhorias nos processos assistenciais
já estabelecidos.
Referências
1. World Health Organization. 2006. Disponível em: <http://www.afro.who.int/pt/oms-em-
africa/missao-e-funcoes-essenciais.html >. [Acesso em: 25 maio 2017].
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3. STUMM, Eniva Miladi Fernandes et al. Dificuldades enfrentadas por enfermeiros em
um centro cirúrgico. Rev. Texto Contexto Enfermagem, Florianópolis, 2010 Jul-Set;
15(3): 464-74
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Análise da Judicialização da Saúde no Mandado de Segurança nº 5213458-TJ-
GO
Introdução
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A Saúde Pública brasileira tornou-se um tema de grandes debates transcendendo o
enfoque simplesmente médico e diagnóstico para atingir estudos das Ciências
Econômicas, Jurídicas e Administração. Chegou-se num determinado patamar em que é
indiscutível a necessidade de um planejamento prévio da gestão da saúde pública a fim de
atender à demanda.
Além dos pedidos administrativos de distribuição de medicamentos e assistência à
saúde (consultas, exames, cirurgia e próteses), há a intervenção do Poder Judiciário
nestas políticas públicas em escala crescente em detrimento à escassez de verba pública.
O objetivo geral do presente trabalho é compreender o fenômeno da Judicialização
do acesso à Saúde Pública a partir da análise de um caso concreto (Mandado de
Segurança) que ainda não teve decisão definitiva, mas com decisões liminares de
somenos importância, inclusive com manifestação do Supremo Tribunal Federal. E,
especificamente, busca-se analisar o entendimento dos juízes, desembargadores e
ministros que manifestaram nos autos assim como os argumentos utilizados para dar
sustentáculo às suas decisões. Este artigo está organizado da seguinte maneira: além da
Introdução, o tópico “2” trata do Direito Humano à Saúde; o tópico “3” se refere à Saúde no
Ordenamento Jurídico Brasileiro; o tópico “4” explicita a metodologia empregada no
presente estudo; o tópico “5” trata da análise ao Mandado de Segurança 5213458-TJ-GO;
o tópico “6” contém os resultados encontrados, e por fim, o tópico “7” se refere à discussão
dos resultados e conclusão.
Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e
à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação,
ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos
serviços sociais necessários, o direito à segurança, em caso de
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desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda
dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. (2)
Existem outros dispositivos que, indiretamente, podem ser considerados direitos
vinculados à saúde, como a proibição à tortura (art. 5º) e outros.
Uma definição ampla e visionária da saúde é estabelecida no preâmbulo da
Constituição da Organização Mundial de Saúde (OMS): “[…] um estado de completo bem
estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de
enfermidade.” (3)
Esta visão holística da saúde enfatiza o fato de que muitas das políticas que
determinam a saúde são feitas fora do setor convencional da saúde e afetam as
determinantes sociais da saúde.
Metodologia
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A metodologia utilizada para o presente estudo foi o método indutivo, partindo do
estudo de caso concreto para as conclusões gerais contemplando quatro etapas: a
observação e o registro de todos os fatos; a análise e a classificação dos fatos; a derivação
indutiva de uma generalização a partir dos fatos; e a verificação.
Análise ao Mandado de Segurança 5213458 -TJ-GO
O presente estudo trata da análise ao Mandado de Segurança 5213458-TJ-GO e
seus recursos decorrentes no qual a impetrante, uma criança do sexo feminino de dez
meses de idade (representada por sua mãe) considera ter o direito líquido e certo de
receber do Estado de Goiás o medicamento Spinraza, princípio ativo nusinersn.
Impetrado diretamente no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, por ter
competência originária determinada pelo art. 14, inciso I, alínea “b” do Regimento Interno
do Tribunal de Justiça de Goiás, a petição inicial foi subscrita por advogada particular que
contém a informação de que a requerente encontrava-se à época internada na Unidade de
Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) por portar Atrofia Muscular Espinhal (AME). Colacionou
relatório médico contendo a confirmação da doença prescrevendo o uso do medicamento
SPINRAZA, medicamento não regulamentado pela Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (ANVISA), razão pela qual foi negada seu fornecimento via Sistema Único de
Saúde (SUS). Na via administrativa tal pedido foi negado devido à falta de registro do
referido medicamento na ANVISA. Fundamentou a petição alegando este ser o único
medicamento capaz de salvar a vida da criança, juntamente com jurisprudências pátrias
que desconsideram a lista da ANVISA priorizando a vida/saúde dos requerentes. Por fim
pediu deferimento da liminar para fornecimento imediato do medicamento; concessão da
gratuidade da justiça; fixação de astreintes em caso de indeferimento; e, concessão do
medicamento na decisão definitiva.
O pedido liminar foi julgado monocraticamente pelo Desembargador Kisleu Dias
Maciel Filho. Na ocasião considerou presentes os requisitos da fumaça do bom direito e do
perigo da demora e deferiu a liminar concedendo 48 horas para a entrega do
medicamento.
O Estado de Goiás, via sua procuradoria, interpôs Agravo Regimental no qual pede
ao Desembargador Relator reconsidere a decisão ou que seja remetido ao colegiado,
alternativamente. Argumentou o Agravante a ausência de exame comprobatório da
doença, recurso limitado do Estado e que os artigos 6º e 196 da Constituição Federal de
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1988 se referem a Direitos Sociais e não Individuais, uma vez que a obrigação de entrega
do medicamento orçado em 3 milhões de reais resultaria em desabastecimento de
medicamento para grande parcela da população goiana.
Diante das negativas por parte do Poder Judiciário, o Estado de Goiás solicitou a
Suspensão de Segurança (SS 5192 MC) ao Supremo Tribunal Federal (STF) por se tratar
de medicação importada, sem registro na ANVISA e despida de comprovação consistente
de eficácia e segurança. Outro argumento foi o de que o alto custo do medicamento
implicaria risco de lesão à ordem, à segurança, à economia e à saúde do Estado de Goiás.
Ao apreciar o pedido, a Ministra Presidente Cármen Lúcia mencionou decisão em
caso similar na qual o Ministro Cezar Peluso foi relator e ressaltou que o alto custo do
medicamento não seria, por si só, motivo suficiente para caracterizar a ocorrência de grave
lesão à economia e à saúde públicas, pois a política pública de fornecimento de
medicamentos excepcionais “tem por objetivo contemplar o acesso da população
acometida por enfermidades raras aos tratamentos disponíveis”. Por fim, decidiu
justificando que a concessão da medida “configuraria dano inverso” e poderia levar à morte
da menor, que nasceu em setembro do ano passado. (8)
O processo objeto de estudo encontra-se em tramitação no Supremo Tribunal Federal
com vista à Procuradoria Geral da República (PGR) em 08/09/2017 para posterior decisão
da Presidência.
Resultados Encontrados
Dos resultados encontrados verificou-se que, embora não se tenha decisão definitiva
no caso em tela, diante das jurisprudências e fundamentos apresentados, a tendência do
julgamento é seguir o entendimento esposado. As decisões analisadas se referem
priorizam a saúde da requerente em detrimento da limitação do orçamento público, da
ausência de estudos sobre a eficácia do medicamento e do tratamento isonômico aos
dependentes das políticas públicas de distribuição de medicamentos.
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Executivo e Legislativo, principalmente quando assume a função de distribuição de
Políticas Públicas sem considerar os limites de recursos.
Do que se viu das decisões analisadas no caso em estudo, nenhuma recorreu à
solicitação de áreas específicas da saúde. Consabido que o julgador tem conhecimento
limitado à legislação, ou seja, conhecimento jurídico não é capaz de sobrepor ao
conhecimento técnico de outras áreas de conhecimento, tais como, farmacêuticos. Ciente
desta situação, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já se manifestou sobre o tema com
recomendações de que os juízes ouçam, quando possível, os gestores públicos antes de
decidir questões relacionadas à saúde. (9)
Especificamente no Estado de Goiás foi instituída a Câmara da Saúde, composta por
diversos técnicos da área da saúde para auxiliar os juízes em casos similares ao ora em
estudo e não foi verificada nenhuma consulta ao referido colegiado, desprovendo as
decisões judiciais de fundamentos técnicos necessários para a solução do problema. (10)
Diante do exposto, constatamos que o problema da saúde no país está longe de ser
resolvido, pois o caminho tomado pelas autoridades judiciais, ministério público e
defensorias públicas, que buscam a judicialização particular de distribuição de
medicamentos não contribui para a justiça distributiva e igualitária de medicamentos,
desconsiderando a limitação orçamentária e deixando as políticas públicas direcionadas ao
cumprimento exclusivo das decisões judiciais.
Referências
1. PIOVESAN. Flávia. Os Direitos Humanos e o direito constitucional Internacional. 7ª Ed.
São Paulo: Saraiva, 2006, p. 130.
627
5. Brasil. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a
promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos
serviços correspondentes e dá outras providências. (Lei Orgânica da Saúde). Diário
Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 20 set. 1990. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm . [Acesso em: 12 agosto. 2017.]
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A importância da triagem nutricional no adulto hospitalizado
RESUMO: A desnutrição hospitalar ainda é bastante frequente nos dias de hoje. Neste
contexto, todo esforço deve ser realizado para reconhecer e identificar precocemente, os
pacientes com risco nutricional, por meio de triagem nutricional, que identifica indivíduos
desnutridos ou em risco de desnutrição. A manutenção do estado nutricional é
imprescindível para a preservação e recuperação da saúde.
Palavras chave: Desnutrição Hospitalar, Triagem Nutricional, Risco Nutricional
ABSTRACT: Hospital malnutrition is still common today. In this context, every effort should
be made to recognize and early identify patients at nutritional risk through nutritional
screening that identifies individuals malnourished or at risk of malnutrition. The
maintenance of nutritional status is essential for the preservation and restoration of health.
Keywords: Hospital Malnutrition, Nutrition Screening, Nutritional Risk
Introdução
No Brasil e no mundo, vários estudos têm apontado a alta prevalência de desnutrição
em pacientes internados. (1)
Este distúrbio relaciona-se em grande parte com aumento de complicações clínicas e
mortalidade, além de contribuir para prolongar o tempo de hospitalização, e aumentando
assim os custos hospitalares. (2)
A manutenção do estado nutricional é imprescindível para a preservação e
recuperação da saúde. A identificação precoce do risco nutricional possibilita uma
intervenção e cuidado nutricionais mais adequados. (3)
Neste contexto, todo esforço deve ser realizado para reconhecer e identificar
precocemente, os pacientes com risco nutricional, por meio de um método efetivo de
triagem nutricional, visando a prevenção da deterioração do estado nutricional. (4)
A Associação Dietética Americana (ADA), o Comitê das Organizações de Saúde
(JCHO) e a Iniciativa de Triagem Nutricional (NSI) definiram triagem nutricional como o
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processo de identificação das características que se sabe estarem associadas a problemas
dietéticos ou nutricionais. (5)
A Aspen (AmericamSociety Parenteral and Enteral Nutrition) considera que a perda
de peso, presença de doenças crônicas, aumento das necessidades nutricionais e
alterações dietéticas são fatores de risco que podem comprometer o estado nutricional do
paciente. (6)
A triagem nutricional é um procedimento que tem como objetivo identificar pacientes
desnutridos ou em risco de desnutrição, com o intuito de analisar a necessidade de uma
avaliação complementar mais detalhada.
A detecção precoce auxilia no cuidado nutricional e na prevenção de complicações,
deve ser realizada até 72 horas da admissão do paciente, podendo ser realizada por
qualquer profissional de saúde. Segundo a Aspen, em unidades de terapia intensiva essa
detecção precoce deve ocorrer em até 24 horas. (6)
O ministério da Saúde tem reconhecido a importância do rastreamento do processo
de desnutrição, por isso em 7 de março de 2005, entrou em vigor a portaria 343 que tornou
obrigatória a implantação de protocolos de triagem e avaliação nutricional para o
acompanhamento desses pacientes nos hospitais do SUS. (7)
Mesmo sabendo que com a detecção precoce do risco nutricional, é possível
minimizar ou prevenir a deterioração do estado nutricional, percebe-se na prática clínica,
muitos poucos hospitais utilizando o processo de triagem nutricional
Diante disso, o presente estudo tem como objetivo mostrar a importância da Triagem
Nutricional.
Objetivo
Analisar a importância da Triagem Nutricional.
Metodologia
A fundamentação teórica foi realizada por meio de revisão bibliográfica de artigos
científicos publicados nos últimos cinco anos, na base de dados ScientifcElectronic Library
Online (SciELO), United States National Library of Medicine (PubMed) e Medical Literature
Analysis and Retrieval System Online (MedLine), livros e portarias do Ministério da Saúde.
A estratégia de busca utilizou as seguintes palavras-chave: Desnutrição Hospitalar,
Triagem Nutricional e Risco Nutricional.
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Discussão
A prevalência de desnutrição hospitalar tem crescido muito no Brasil. Atualmente
diversos estudos têm correlacionado a evolução clínica com o estado nutricional, pois a
capacidade de reagirmos a patologia depende em grande parte de um adequado estado
nutricional.(1,2)
O sistema imunológico e as funções cognitivas tornam-se comprometidos, tornando-
se fator de risco para complicações infecciosas, delírios, reações adversas a medicações e
cicatrização prejudicada (8)
Outros estudos correlacionam a desnutrição, com o aumento de complicações
clínicas e mortalidade, aumento dos custos hospitalares e maior tempo de internação.
Além disso, quanto maior o período de permanência no hospital, maior é o risco de se
agravar a desnutrição. (9)
Os pacientes hospitalizados estão sujeitos a apresentarem alterações nutricionais,
que, se não diagnosticados e tratados precocemente, acarretam um quadro de
desnutrição. São assim, por diversos fatores, entre eles o aumento das necessidades
energéticas, diminuição da capacidade de digestão e absorção dos nutrientes, períodos
prolongados de jejum, o próprio ambiente hospitalar, no qual o paciente não esta
familiarizado, o próprio preconceito do paciente em relação a alimentação servida que é
tida como de baixa qualidade (10)
A avaliação nutricional e a determinação do diagnóstico nutricional no início da
internação permitem identificar indivíduos desnutridos ou em risco de desnutrir-se e instituir
terapia nutricional adequada que vise à recuperação do estado nutricional e à prevenção
de complicações relacionadas à desnutrição.
Por tudo isso, é fundamental a identificação precoce do risco nutricional, por meio de
um método efetivo de triagem, visando a prevenção da desnutrição ou promovendo sua
recuperação. (3)
A inserção de um método de triagem nutricional para identificação de risco nutricional
tem sido recomendada, nacional e internacionalmente, por organizações de especialistas,
com o objetivo de avaliar efeitos físicos e fisiológicos adversos de pacientes com doenças
crônicas degenerativas e/ou lesões agudas. (6)
O risco nutricional se refere ao risco do paciente desenvolver complicações em
decorrência do estado nutricional prejudicado. Portanto, a avaliação do risco nutricional é o
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primeiro passo no processo de cuidados nutricionais, pois possibilita ao profissional de
saúde intervir antes do agravamento do estado nutricional. (4)
A triagem nutricional é um procedimento simples e rápido, que consiste na realização
de um inquérito ao paciente ou seus familiares com a finalidade de identificar o risco
nutricional. (2,11).
O principal objetivo da triagem nutricional é identificar rapidamente indivíduos que se
encontrem em risco nutricional, sinalizando aqueles pacientes que poderiam beneficiar-se
da terapia nutricional. Esta identificação deve ser realizada nas primeiras 24 horas a no
máximo 72 horas após a internação. (11)
Considerando a relevância da Triagem Nutricional, o Ministério da Saúde através da
portaria GM/MS Nº 343, de 07 de março de 2005 instituiu mecanismos para organização e
implantação de Unidades de Assistência e Centros de Referência de Alta Complexidade
em Terapia Nutricional, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, estabeleceu normas
técnicas e operacionais para regulamentar a aplicação desta prática. (7)
Para a identificação precoce de pacientes desnutridos e consequente intervenção,
além de prevenção da desnutrição, o ideal seria promover a conscientização dos
profissionais de saúde quanto aos aspectos nutricionais, implantando a triagem nutricional
como atividade de rotina nos hospitais, e tornando real a cobertura do Sistema Único de
Saúde (SUS) dos custos provenientes de avaliação do estado nutricional, assim como dos
materiais e equipamentos necessários à aplicação da terapia nutricional Cabe aos
profissionais de saúde instituir iniciativas educacionais para esclarecer as equipes de
saúde e a população sobre a importância do diagnóstico e do tratamento da desnutrição
hospitalar.
Conclusão
Conclui-se que a triagem nutricional deve ser, portanto, parte da atenção primária de
todos os pacientes, para maior sobrevida ao paciente a fim de prevenir a desnutrição
hospitalar e suas consequências.
A escolha do método de triagem nutricional ideal deve considerar o contexto no qual
o paciente está inserido, além de aspectos como recursos humanos e físicos disponíveis.
O melhor método será aquele que contemplar fácil acesso, baixo custo e bom prognóstico.
632
Referências
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hospitalized patients. Nutrition2010;26:721-6.
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633
Emenda Constitucional nº 95/2016: instrumento de afastamento da equidade
no Sistema Único de Saúde
Kammilla Araújo1
634
base àqueles realizados no exercício de 2016 com reajuste, para os próximos vinte anos,
de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apontado pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Destaca-se que tal regime fiscal
permanecerá inalterado até o décimo ano de vigência da EC. Após esse intervalo de
tempo, será possível proceder a alterações sobre o método de correção dos limites, por
meio de Projeto de Lei Complementar do Presidente da República.
Nesse contexto é possível inferir que ao longo dos próximos anos haverá a realidade
de limitação e, mais especificamente, de redução de recursos destinados à saúde e,
inevitavelmente, desrespeito ao princípio da equidade apregoado pelo SUS. O presente
trabalho pretende tecer breves comentários sobre o afastamento da equidade na Saúde
Pública como consequência da EC nº 95/2016.
Metodologia
Trata-se de um estudo exploratório e qualitativo com interpretação, atribuição de
significados e análise hipotético-indutiva (3).
A pesquisa exploratória mostrou-se proveitosa, resultando na análise e na revisão da
literatura de documentos, entre artigos científicos, manuais, legislação e documentos
institucionais. Além disso, utilizou-se da consulta de dados institucionais do IBGE, Banco
Mundial e Ministério da Saúde, Portal da Transparência.
Resultados
De acordo com as projeções do IBGE (4), a alteração da estrutura etária brasileira é
considerável, nos últimos anos, e mais expressiva, se comparados os dados do ano de
2000 para o de 2036. A população entre 15 e 24 anos de idade teve uma queda de 7,6
pontos percentuais. Já a população com idade compreendida entre 25 a 59 anos teve um
aumento de oito pontos percentuais. A população acima de sessenta anos quase triplicou,
apresentando um aumento de 13,3 pontos percentuais. Em termos absolutos, a população
acima de 60 anos passará de 14,2 milhões, em 2000, para 48,9 milhões habitantes em
2036.
Nesse contexto destaca-se que os gastos de saúde da população idosa,
sabidamente, são maiores em relação ao restante da população demandando,
consequentemente, mais investimento principalmente se considerado um aumento
populacional tão expressivo. Conforme dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013 (5),
635
mais de cinquenta por cento da população entrevistada, com idade acima de 65 anos,
referiu diagnóstico de hipertensão, quase 20%, de diabetes e 25% de colesterol alto.
Doenças crônicas que, se não controladas inevitavelmente, geram ainda mais custos à
saúde.
No caso da saúde, de acordo com os dados do Portal da Transparência (6), nos
últimos cinco anos, o maior percentual de aplicação ocorreu em 2015 e não ultrapassou a
casa dos 13,7% da Receita Corrente Líquida (RCL), ou seja, a União não aplicou o mínimo
constitucional. Não será no ano de 2017 que conseguirá aplicar os mínimos 15% para
elevar os gastos com a saúde a patamares considerados, minimamente, aceitáveis, para
um congelamento de gastos pelo período de vinte anos
636
Gráfico 01: Projeção do impacto da EC nº95/2016 sobre o gasto federal com saúde em
comparação com a manutenção da regra da EC nº 86/2015 – em % do PIB (Hipóteses:
piso da PEC 241 = 13,2% da RCL de 2016; e RCL 2016 = R$ 689 bilhões).
Não se pode afastar a realidade de que, de acordo com os dados do Banco Mundial
(8), em 2014, o gasto público no custeio da saúde representou 45,5 e atendeu,
exclusivamente, a 75% da população brasileira, com a oferta integral de bens e serviços de
saúde, ou seja, sem cobertura da saúde suplementar. Além disso, bens e serviços de
vigilância em saúde (sanitária e epidemiológica), vacinação, tratamentos de alto custo não
cobertos pelos planos de saúde, nomeadamente, o oncológico e o transplante de órgãos,
são atendidos, na sua totalidade, pela rede pública de serviços de saúde (9).
Discussão
637
O processo de busca de fontes de financiamento e as inúmeras crises também
fizeram parte do processo de construção do SUS. A vinculação de recursos para o SUS já
constava da proposta da Comissão Nacional da Reforma Sanitária e pretendia vincular à
saúde recursos equivalentes a 10% do PIB. No entanto, tal vinculação só ocorreu 12 anos
mais tarde, com a Emenda Constitucional n. 29 (EC n. 29/2000), de 13 de setembro de
2000, que estabeleceu a vinculação das receitas da União, dos estados, dos municípios e
do Distrito Federal (11).
A EC n. 29/2000 (12) estabeleceu a base de cálculo e os percentuais mínimos de
recursos orçamentários que a União, o Distrito Federal, os estados e os municípios
tornaram-se obrigados a aplicar em ações e serviços públicos de saúde. Mas a efetividade
dessa emenda exigia a regulamentação, por Lei Complementar (LC), nos termos do
parágrafo terceiro que previa a reavaliação dos percentuais mínimos, pelo menos a cada
cinco anos, desde a data de promulgação da Emenda. Após mais doze anos, em 2012, a
LC n. 141/2012 manteve a mesma regra da EC n. 29/2000 e não adicionou mais recursos.
A LC n. 141/2012 (13) regulamentou o Art. 198 da CR/88 e definiu: a) valor mínimo e
normas de cálculo da quantia mínima a ser aplicada, anualmente, pela União; b)
percentuais mínimos do produto da arrecadação de impostos a serem aplicados,
anualmente, pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios; c) critérios de rateio
dos recursos da União (destinados aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios) e
dos estados (destinados aos seus respectivos municípios para redução progressiva de
desigualdades regionais); d) normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas
nas esferas federal, estadual, distrital e municipal. Em 16.10.2012, foi publicado o Decreto
n. 7.827 (14) que regulamentou a LC n. 141/2012 e estabeleceu os procedimentos de
condicionamento e restabelecimento das transferências constitucionais, além dos
procedimentos de suspensão e restabelecimento das transferências voluntárias da União,
nos casos de descumprimento da aplicação dos recursos em ações e serviços públicos de
saúde dos quais trata a LC n. 141/2012.
Em 2015, a EC n. 86 (15) alterou o inciso I, do §2º, do Art. 198 da CR/88, referente ao
valor mínimo e às normas de cálculo da quantia mínima a ser aplicada, anualmente, pela
União e definiu o cumprimento progressivo, em cinco anos, a partir de 2016. Além disso,
revogou o inciso IV do §3º do mesmo artigo que previa a possibilidade de o percentual
mínimo da União ser reavaliado, por Lei Complementar, pelo menos a cada cinco anos, e
638
determinou a inclusão, para fins de cumprimento do montante mínimo aplicado pela União,
dos recursos destinados para a área de saúde, oriundos da exploração de petróleo e do
gás natural e das emendas individuais.
Por fim, a EC nº 95 estabelece limites para gastos aplicando, na prática, um montante
inferior aos 15% constitucionalmente determinados.
A EC nº 95/2016 na prática
639
últimos dez anos. A proposta dos sanitaristas, desde a Reforma, era de, no mínimo, dez
por cento em relação ao PIB, para que se garantisse o atendimento adequado de uma
política de saúde como se quer o SUS: universal, integral, equânime e gratuito a toda a
população brasileira.
Gráfico 02: Simulação do impacto da ECnº95/2016 sobre o Gasto Federal do SUS caso
vigorasse desde 2003, em % do PIB
640
A EC nº 95/2016 e a equidade
641
Conclusão
A construção histórica do SUS, especialmente a partir do Movimento Sanitário,
resultou na ruptura de um sistema contratualista, excludente e de financiamento seletivo
por um sistema que se quer universal, gratuito e equânime. Apesar de todas as
dificuldades para a sua implementação, o SUS tem, hoje, um impacto social de grande
importância, como sistema de proteção social, em razão dos resultados obtidos e da
abrangência da cobertura alcançada.
O sistema de saúde brasileiro se apresenta como política pública social e instrumento
de superação das desigualdades, por meio da equidade institucionalizada nas políticas
públicas que são um importante meio de ação estatal em prol do desenvolvimento social,
impulsionadas pelos conflitos e disputas.
O gasto público com a saúde que se impõe com a EC º 95/2016 mostra-se em
desacordo com a política do SUS que visa um atendimento universal e integral para
redução das desigualdades. Ter 54% do custeio da saúde com despesas privadas permite
inferir que, em razão de falhas estruturais, parte da população recorre aos planos e
seguros de saúde, acentuando ainda mais as iniquidades no país, à medida que cria um
atendimento desigual àqueles com maior poder aquisitivo, permitindo-os usufruir de
melhores serviços, tendo como contrapeso um serviço de diferenciada qualidade aos
usuários do SUS. Enfim, o gasto privado maior, por meio de desembolso direto, ou por
meio de aquisição de planos e seguros de saúde, e a menor participação de recursos
públicos no setor concretizam a forma mais iniqua e excludente de financiamento.
Referências
642
5. IBGE. Pesquisa Nacional de Saúde 2013 - Percepção do estado de saúde, estilos de
vida e doenças crônicas, 2013. IBGE: Rio de Janeiro, 2014. Disponível em:
https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/pns/2013/default.shtm Acesso em:
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Transparência”. Disponível em http://www.portaldatransparencia.gov.br. Acesso em:10
de junho de 2017.
7. VIEIRA, Fabiola S.; BENEVIDES, Rodrigo P. S. “Os impactos do novo regime fiscal
para o financiamento do sistema único de saúde e para a efetivação do direito à saúde
no brasil”. Nota técnica nº 28. Brasília: IPEA, 2016.
8. Banco Mundial. Disponível em: https://data.worldbank.org/. Acesso em: 10 de junho de
2017.
9. VIEIRA, Fabiola S.; BENEVIDES, Rodrigo P. S. “O Direito à Saúde no Brasil em
Tempos de Crise Econômica, Ajuste Fiscal e Reforma Implícita do Estado” Revista de
Estudos e Pesquisas sobre as Américas. (3). Disponível em:
http://dx.doi.org/10.21057/repam.v10i3.21860. Acesso em: 10 de junho de 2017. 10.
Ibidem
10. VIANNA, Solon M.“A Seguridade Social e o SUS: re-visitando o tema” In: Saúde e
Sociedade. 14(1), 7-22.
11. BRASIL. Constituição (1988). Emenda Constitucional nº 29 de 13 de setembro de
2000. Altera os arts. 34, 35, 156, 160, 167 e 198 da Constituição Federal e acrescenta
artigo ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para assegurar os recursos
mínimos para o financiamento das ações e serviços públicos de saúde.
12. BRASIL. Lei Complementar nº 141 de 13 de janeiro de 2012. Regulamenta o § 3o do
art. 198 da Constituição Federal para dispor sobre os valores mínimos a serem
aplicados anualmente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios em ações e
serviços públicos de saúde; estabelece os critérios de rateio dos recursos de
transferências para a saúde e as normas de fiscalização, avaliação e controle das
despesas com saúde nas 3 (três) esferas de governo; revoga dispositivos das Leis nos
8.080, de 19 de setembro de 1990, e 8.689, de 27 de julho de 1993; e dá outras
providências.
13. BRASIL. Decreto nº 7.827 de 16 de outubro de 2012. Regulamenta os procedimentos
de condicionamento e restabelecimento das transferências de recursos provenientes
das receitas de que tratam o inciso II do caput do art. 158, as alíneas “a” e “b” do inciso
I e o inciso II do caput do art. 159 da Constituição, dispõe sobre os procedimentos de
suspensão e restabelecimento das transferências voluntárias da União ,nos casos de
descumprimento da aplicação dos recursos em ações e serviços públicos de saúde de
que trata a Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012, e dá outras
providências.
14. BRASIL. Constituição (1988). Emenda Constitucional nº 86 de 18 de março de 2015.
Altera os arts. 165, 166 e 198 da Constituição Federal, para tornar obrigatória a
execução da programação orçamentária que especifica.
643
15. BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Glossário. Disponível em:
<http://www.orcamentofederal.gov.br/glossario1/glossario_view?letra=D>. Acesso em
10 de junho de 2017.
16. BRASIL. Lei Complementar 101 de 4 de maio de 2012. Estabelece normas de
finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras
providências.
17. Instituto de Estudos Socioeconômicos (2017) Orçamento 2017 prova: teto dos gastos
achata despesas sociais e beneficia sistema financeiro. Disponível em:
<ttp://www.inesc.org.br/noticias/noticias-do-inesc/2017/marco/orcamento-2017prova-
teto-dos-gastos-achata-despesas-sociais-e-beneficia-sistema-financeiro>. Acesso em
10 de junho de 2017.
18. Ibidem
19. Ministério da Fazenda (2016) “Relatório de Análise Econômica dos Gastos Públicos
Federais Evolução dos Gastos Públicos Federais no Brasil: Uma análise para o
período 2006-15” Secretaria de Politica Econômica. Brasília: Ministério da Fazenda
Disponivel em: http://www.spe.fazenda.gov.br/notas-
erelatorios/relatorio_gasto_publico_federal_site.pdf. Acesso em:10 de junho de 2017.
20. Ibidem
21. VIANA, Ana Luiza d'Ávila; FAUSTO, Márcia Cristina Rodrigues; LIMA, Luciana Dias de.
Política de saúde e eqüidade. São Paulo Perspec., São Paulo , v. 17, n. 1, p. 58-68,
Mar. 2003 . Available from
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010288392003000100007&ln
g=en&nrm=iso>. access on 14 Oct. 2017. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-
88392003000100007.
22. BRASIL. Lei nº 8080 de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a
promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos
serviços correspondentes e dá outras providências.
23. ROCHA, Luciano V. (2017) A EC 95/16 entre o teto e o assoalho do estado. Disponível
em:
http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI251944,11049A+EC+9516+entre+o+teto+e+
o+assoalho+do+estado Acesso em : 10 de junho de 2017.
24. PIOLA, Sérgio F. et. al. Estruturas de financiamento e gasto do sistema público de
saúde. A saúde no Brasil em 2030 - prospecção estratégica do sistema de saúde
brasileiro: estrutura do financiamento e do gasto setorial. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2013
644
Participação ou privatização nos serviços públicos de saúde: Uma análise das
Organizações Sociais e dos Contratos de gestão.
Introdução
A noção de serviços públicos para promoção de atividades estatais visando ao
interesse público são ideias que surgem com a criação do Estado Social, como resposta às
preocupações mais individualistas do Estado Liberal. Na Constituição Federal de 1988 é
possível encontrar a perspectiva de justiça social por meio do modelo de Estado de Bem-
Estar Social, mas tal fato não impediu as mudanças que ocorreriam após a sua
promulgação nesse quesito.
A ideia de um estado provedor logo sofreu mudanças em razão das perspectivas
neoliberais, que trouxeram as concepções de um Estado insuficiente na execução dos
serviços públicos. Com a concepção de Estado gerencial fomentou-se a criação do
chamado terceiro setor, partindo-se da premissa de que os serviços não essenciais
poderiam ser destinados a execução por parte da sociedade civil, fazendo-lhe participar da
execução desses serviços.
Assim, sob as premissas de uma concepção de Estado eficiente, as Organizações
Sociais, entidades civis sem fins lucrativos qualificadas pela Administração Pública,
surgem como medida de execução dos serviços ditos não exclusivos e são resultado de
um Plano de Reforma do Estado na década de 90.
1Universidade Federal do Ceará - Programa de Pós-Graduação em Direito - Mestrado em Ordem Jurídica Constitucional.
E-mail: fabriciahc@gmail.com
645
No que se refere ao direito à saúde, as premissas adotadas da interpretação da
CF/88, de que a saúde deve ser garantida pelo Estado mediante políticas sociais e
econômicas que contemplem o acesso universal e igualitário às ações e serviços, sendo a
participação da iniciativa privada apenas complementar, faz-nos perceber que medidas
que exasperem esses comandos traduzem, afinal, a transferência de uma obrigação
estatal, considerada fundante do projeto constituinte brasileiro de um Estado de Bem Estar
Social, que determinou ao Estado o dever de prestador de serviços públicos.
Metodologia
A partir de método dedutivo buscou-se analisar a execução dos serviços públicos de
saúde pelo terceiro setor.
A pesquisa realizada foi do tipo bibliográfica utilizando as plataformas do banco de
dados de artigos e livros dos periódicos da Capes, Scielo, acervo da biblioteca da
Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará e acervo próprio das autoras, bem
como o sítio oficial do Planalto e do Ministério da Saúde nas pesquisas referentes à
legislação. Considerando que a discussão sobre o tema abordado é recente, optamos pela
não delimitação temporal.
As bases de pesquisa utilizadas foram: SUS, terceiro setor, organização social,
contrato de gestão. Utilizaram-se os textos encontrados sobre o tema, excluindo os que
não fossem pertinentes a problemática pesquisada, publicados desde a edição da Lei
9.637/98.
Discussão e resultados
A formação do Estado Social está relacionada ao crescimento da necessidade de
implementar medidas que efetivam a igualdade, após o declínio das ideias liberais que se
apresentaram com base num Estado de Polícia mantedor da liberdade individual e
econômica de apenas uma parcela da sociedade (1), e que restringiu a atuação do Estado
à defesa mínima dessa liberdade, com destaque a proteção da propriedade e do indivíduo
(2).
Essa situação agrava-se pela industrialização e pela urbanização, que atenuaram
fortemente os vínculos comunitários e familiares de solidariedade, levando o Poder Público
a ter que criar um mínimo aparato de suporte para substituir os antigos vínculos de
646
solidariedade e manter a proteção à classe burguesa (3). Há, portanto, a substituição do
Estado Liberal pelo Estado Social, o de polícia pelo prestador de serviços (4).
Assim, como observado por Barcarollo, a natureza do estado como intervencionista é
a garantia da prestação dos serviços públicos, como instrumento da justiça social,
passando o Estado de mero protetor, para provedor da justiça e da solidariedade social,
ganhando força as ideias da Escola Francesa dos Serviços Públicos de Léon Duguit,
segundo a qual os serviços públicos detêm uma grande importância, pois configuram a
própria soberania estatal. A justificativa da atuação do Estado passa a ser ligada à
prestação de serviços essenciais à população, em prol dos direitos sociais e sua efetivação
(5). Essa perspectiva ganha nova roupagem no Século XX, com a noção de Estado de
Bem-Estar social. No entanto, com o crescimento de uma nova perspectiva liberal nos
anos 40, denominada neoliberalismo, encabeçada pela Escola de Chicago, impulsiona-se
a premissa de que o Estado deveria ser mínimo nas prestações sociais, embora figurasse
como protetor do mercado e da economia.
Segundo Renato de Andrade (6), quando o Brasil vivia o momento da Constituinte de
1988, dois projetos societários se configuravam no País: um de caráter mais democrático,
com mais justiça social, participação política das massas trabalhadoras e progressistas na
sociedade civil, e outro de caráter neoliberal, no aspecto do individualismo possessivo, em
que o mais forte sobreviveria e as diferenças não seriam respeitadas.
A CF/88 fez clara opção pelo primeiro projeto, ao garantir direitos civis, políticos e
sociais dentro da concepção de bem estar social. No entanto, na década de 90, com a
ideia de Administração Pública Gerencial, a face social restou prejudicada com a aplicação
do modelo neoliberal, já disseminado nos países europeus e nos EUA. Sob essa
perspectiva, o serviço público que se caracteriza como uma atividade de competência do
Estado na promoção de políticas públicas, essencial no Estado Democrático de Direito,
sofre mudanças para na sua realização. O então modelo de administração burocrática
passa a ser considerado como um entrave na realização das políticas públicas e dos
serviços públicos, servindo de fundamento para o argumento da Reforma do Estado e a
gestão dos serviços públicos pela iniciativa privada (7).
Isto porque, a Administração Pública Gerencial consubstancia-se na definição do que
se chamou de gestão social ou processos sociais, em que a ação gerencial é desenvolvida
sem o caráter burocrático dos procedimentos administrativo, levando-se em conta a
647
tecnologia dos setores privados como fator contributivo em relação à produtividade e as
contribuições ao setor público, na administração das políticas públicas (8). Os contratos de
gestão e as organizações sociais representam bem esse intuito de gestão gerencial.
A Organização Social (O.S.), regulada no âmbito federal pela Lei 9.637/98, se
constitui como uma instituição privada, sem fins lucrativos, qualificadas pelo Estado para
exercerem atividades públicas, por meio de Contrato de Gestão, envolvendo diretamente a
sociedade civil nos rumos do Estado, sendo possível para a consecução desse fim, a
cessão a essa instituição, de bens públicos móveis e imóveis, bem como servidores
públicos.
A qualificação da pessoa jurídica privada como O.S dá a mesma uma série de
garantias e cautelas necessárias para que possa executar os serviços públicos, sem
prejuízo das flexibilidades que possuem as pessoas jurídicas de direito privado. Seus
funcionários, por exemplo, são contratados sem concurso público ou o teste e as compras
podem ser realizados sem licitações públicas, tudo isso visando diminuir a temida
burocracia “inerente ao Estado”.
Seguindo a perspectiva gerencial, tais situações estão justificadas, pois o foco da
atividade estaria em seus resultados e não em processos ou procedimentos para a sua
realização. Sob a ótica do plano de reforma do Estado, executado pelo Ministro-Chefe da
Casa Civil, Bresser Pereira, a O.S. representa um enfoque à ação pública, em detrimento
da estatal (9), assim, o que é publico se diferencia do que é Estatal. Daí o porquê do
discurso da publicização, que não seria uma privatização.
Essa percepção de uma divisão do que seria público e do que seria ação do Estado,
somente destorce a realidade dos fatos nas chamadas atividades não exclusivas,
encobrindo a real situação de privatização desses serviços. A ideia de que serviços
públicos não exclusivos são realizados com mais eficiência pelo setor não estatal nas
atividades não privativas (10) por meio de uma gestão gerencial, tira o foco da real
situação da privatização da execução desses serviços.
Pode-se citar como consequência da disseminação das ideias de gestão gerencial e
de “Estadofobia” a utilização do terceiro setor como forma de legitimar a desestruturação
da Seguridade Social por parte do Estado e ainda a retirada do Estado à responsabilidade
da intervenção social e assim da fiscalização de sua execução (11). Nessa perspectiva, o
contrato de gestão figura-se como uma privatização da execução dos serviços públicos,
648
pois apesar da titularidade da atividade ser do Estado, sua execução está sendo realizada
pelo setor privado.
O Contrato de Gestão, sem dúvidas, surge da noção de uma parceria entre a
sociedade civil e o Estado, possibilitando que aquele participe no planejamento e execução
das políticas públicas. Todavia, os principais motivos que fomentam a execução dos
serviços públicos por O.S e a forma pelo qual essa execução se realiza é na perspectiva
de que o Estado (e o serviço público) precisaria de uma reforma, por não estar apto a
exercer suas atribuições, distorcendo os fatos em relação a privatização da execução
desses serviços.
Não se pode olvidar que ao Poder Público está reservado o papel de protagonista da
prestação de serviços públicos, restando à iniciativa privada, especialmente nos casos de
prestação de serviços públicos de saúde, apenas a participação complementar, mediante
contrato de direito público ou convênio (art. 199, § 1º combinado com art. 175, CF/88.).
Assim, os serviços públicos de saúde, especialmente, face ao seu tratamento
constitucional especial dado em razão da relevância pública do direito à saúde (art. 197
CF), não podem ser totalmente delegados à iniciativa privada.
Nesse aspecto, alerta Di Pietro que a Lei 8.080/90 previu, nos artigos 24 a 26, que
essa participação complementar se daria quando as possibilidades do Sistema Único de
Saúde fossem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma
determinada área, formalizada por contrato ou convênio sob as regras da Lei 8.666/93,
assim, o Poder Público não abriria mão da prestação do serviço de sua competência em
favor de terceiro ou que terceiros administrem entidade pública prestadora do serviço de
saúde. A instituição privada poderia complementar as ações e serviços de saúde em suas
próprias instalações e com seus próprios recursos materiais e humanos. Ademais, apenas
se admitiria no ordenamento brasileiro a parceria entre público e privado, ou a
terceirização, de determinadas atividades materiais ligadas ao serviço de saúde, não
podendo haver uma transferência do próprio serviço de saúde como um todo ou de sua
gestão (12).
Contudo, a autora sugere que para as organizações sociais se enquadrarem nos
princípios constitucionais que regem a gestão do patrimônio público, fundamentais para
sua proteção, seria imprescindível que se fizessem alterações na forma de escolha das OS
e nos contratos de gestão a fim de que existisse pelo menos: a exigência de licitação para
649
escolha da entidade e comprovação de que ela já existe com sede, patrimônio e capital
próprios; demonstração de qualificação técnica e idoneidade financeira para administrar o
patrimônio público; submissão aos princípios licitatórios; limitações salariais quando
dependam de recursos orçamentários do Estado para pagar seus empregados; e exigência
de garantia a ser dada pela OS, assim como feito nos contratos administrativos. (13)
Ademais, outro fator que denota indevida a total transferência de serviços de saúde
às organizações sociais, conforme Gabardo, é o engano que pode levar o discurso
gerencial, que relaciona a O.S. com a necessária participação dos cidadãos na execução
de serviços públicos (14), pois, por esse modelo, eles passariam a ser agentes ativos na
gestão pública não por meio dos mecanismos de participação popular e de participação
democrática, inclusive direta, previstos na CF/88, mas pela redução do aparelho do
Estado. Tarso Violin pontua que a execução das políticas na área de saúde (da seguridade
social como um todo) é um dever principalmente do Estado e não da sociedade, esta pode
participar de serviços de saúde, por meio da fiscalização e das políticas, como por exemplo
em conselhos gestores da política da saúde com participação popular. (15)
É nesse aspecto das instâncias de controle social por meio de participação popular e
democrática como, por exemplo, na participação em conselhos e comissões de saúde, que
deveria se dar a participação do cidadão na execução dos serviços públicos e não pela sua
privatização. Ocorre que os conselhos de saúde têm função consultiva e muitas vezes
pouco efetiva, seja por falta de divulgação, de estrutura, ou incentivo à participação, em
face do pouco impacto sobre a reestruturação dos serviços de saúde (16), ou ainda porque
os conselheiros não participam de forma ativa, muitos pela ausência de presença física ou
pela falta de entrosamento, opinião e manifestação sobre a política de saúde. (17)
Nas comissões intergestores bipartite (CIB) e tripartite (CIT), responsável pelas
principais definições na gestão das políticas de saúde dentro do SUS, a participação social
se dá apenas de modo indireto, pela pressão popular e pelo voto (18). Assim, de certo
modo, pode-se concluir pela inefetividade do controle social sobre a gestão da saúde
pública.
Aqui pode estar a raiz do problema da falta de participação social na gestão da saúde
pública, não na prestação dos serviços de saúde por organismos em tese representativos
dessa participação, como a propaganda gerencial pretende vender, mas no uso indevido
dos mecanismos já existentes de participação e controle social no SUS.
650
Conclusão
A partir da distorção do projeto de Estado de Bem Estar Social no Brasil, que instituiu
uma Administração Pública em que o Estado figurava como prestador de serviços públicos,
o discurso pejorativo de Administração Pública vista como burocrática - formal e pouco
eficiente sobrepôs esse modelo, materializada pelo Plano Diretor da Reforma do Aparelho
Estatal, sob a perspectiva de reconstrução da administração pública em bases modernas e
racionais, focada no controle de resultados e descentralização, resultando na imposição de
diretrizes neoliberais no Estado Brasileiro, tornando-se a privatização dos serviços públicos
carro chefe dos primeiros governos democráticos brasileiros.
Nessa perspectiva, uma das medidas implementadas foi a transferência de serviços
públicos para serem executados e os recursos públicos geridos pela iniciativa privada, sob
a justificativa da democratização dos serviços públicos, ao trazer a sociedade civil para a
gestão dos serviços públicos nas chamas atividades não exclusivas do Estado. O Contrato
de Gestão surge assim como forma de operacionalizar essa democratização dos serviços
públicos, por meio das organizações sociais, para o exercício de uma atividade dita não
exclusiva do Estado, realizando-se uma diferenciação do que seria estatal daquilo que é
público, apresentando que haveria preservação do caráter público dos serviços, mesmo
sem a participação estatal, para fundamentar a privatização da execução desses serviços.
Buscou-se demonstrar o engodo desse discurso, primeiro por ser incoerente,
segundo porque antes não se buscou valorizar e incentivar as demais formas de
participação e controle social no Sistema Único de Saúde, que coexistem com a presença
do Estado na prestação dos serviços públicos de saúde. Com isso, a disseminação das
ideias neoliberais de desprestígio ao Estado enquanto prestador de serviços públicos e
ainda de participação popular democraticamente na gestão pública foi tudo que a iniciativa
privada, respaldada pelos anseios neoliberais, precisava para justificar que seria aceitável
uma afronta ao projeto constituinte de Estado em vigor no Brasil.
Referências
651
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efetividade de suas normas. Revista de Direito Sanitário. 2016; 17, p. 38-53.
652
Do financiamento e orçamento da saúde: breves comentários
RESUMO: O presente artigo tem como objetivo explicar brevemente como funciona o
financiamento e o orçamento da saúde no Brasil. O acesso universal à saúde pública exige
um padrão de financiamento que sacie a necessidade da população, exigindo assim um
constante aumento de recursos investidos no SUS. Ademais, o presente artigo discute o
orçamento da saúde, com seus dilemas e embates. Empregar-se-á neste trabalho a
pesquisa bibliográfica. A pesquisa bibliográfica é realizada a partir do levantamento de
referências teóricas já examinadas, e propagadas por meios eletrônicos ou escritos, como
livros, artigos científicos, páginas de web sites. Outrossim, quanto à natureza será utilizada
a pesquisa qualitativa. A pesquisa qualitativa não se importa com representatividade
numérica, mas, sim, com o exame minucioso da compreensão de um grupo social, de uma
organização. O resultado alcançado neste artigo foi uma discussão e explicação sobre o
orçamento da saúde no Brasil. A conclusão foi no sentido de que a saúde é um direito
importante e que os gestores públicos devem deve-se seguir as regras constitucionais e
legais na administração do dinheiro público destinado à saúde.
Palavras-chave: Financiamento do SUS; Orçamento da Saúde; PEC Teto de Gastos
Públicos.
Do direito à saúde
O artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da Organização das
Nações Unidas (ONU), dispõe que a saúde é um direito de toda pessoa:
Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e
à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação,
ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos
serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na
doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de
meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade.”
(ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1948)
Por sua vez, a Carta Magna de 1988 foi a primeira Constituição do país a declarar
que o direito à saúde é um direito fundamental:
1 E-mail: maressa.lopes.rezende@gmail.com
653
Assim, o Poder Público deve assegurar o direito à saúde. E a
maneira como o faz é por meio do Sistema Único de Saúde.
Do orçamento da saúde.
Neste sentido, a fim de financiar o SUS, o Poder Público deve, todos os anos, gastar
uma porcentagem de seu orçamento público.
Orçamento Público de acordo com o Portal do Ministério do Planejamento é[1] :
Ademais, há um piso de gastos para a saúde que deve constar nos orçamentos
públicos.
654
Até o ano de 2015, a despesa mínima com saúde deveria crescer de acordo com a
variação nominal do PIB (e se a variação fosse negativa, o piso seria o mesmo valor do
ano anterior).
Por sua vez, o orçamento de 2017 para a Saúde deveria ser equivalente a 13,7% das
receitas correntes líquidas (o total arrecadado pela União menos os repasses para estados
e municípios.)
Entretanto, a partir da promulgação da PEC dos gastos públicos houve uma
modificação substancial no orçamento destinado à saúde pública.
Com a emenda, em 2017, sobe para 15% o gasto mínimo que deverá ser realizado
pela União. A contar do orçamento de 2018, a emenda estipula o valor mínimo deverá ser
o total gasto nos 12 meses anteriores até junho reajustado pela variação do IPCA no
período.
A finalidade do teto é conter a dívida pública que, de acordo com o FMI, deve
corresponder a 78,3% do PIB ainda este ano e pode chegar a 93,6% do PIB até 2021.
655
A transferência a que se refere o art. 198, § 3º, da Constituição Federal, tem como
origem o montante que a União deve aplicar anualmente em ações e serviços de saúde,
por determinação do art. 198, § 2º, I, da CF/88 c/c art. 5º da Lei Complementar nº 141, de
2012.
Ao revogar tacitamente o art. 3º da Lei 8.142, de 1990, e expressamente o § 1º da Lei
nº 8.080, de 1990, o art. 17 da Lei Complementar nº 141, de 2012, estabeleceu a nova
forma de repasse dos recursos de saúde da União, em cumprimento ao disposto no art.
198, 3º, II, da CF/88, nos seguintes termos:
O art. 3º da Lei Complementar nº 141, de 2012, por sua vez, trazendo segurança
jurídica ao sistema, estabeleceu quais seriam essas despesas com ações e serviços
públicos de saúde e, por conseguinte, em uma interpretação sistemática, o que seria
recurso de transferência obrigatória:
656
II - atenção integral e universal à saúde em todos os níveis de
complexidade, incluindo assistência terapêutica e recuperação
de deficiências nutricionais;
III - capacitação do pessoal de saúde do Sistema Único de
Saúde (SUS);
IV - desenvolvimento científico e tecnológico e controle de
qualidade promovidos por instituições do SUS;
V - produção, aquisição e distribuição de insumos específicos
dos serviços de saúde do SUS, tais como: imunobiológicos,
sangue e hemoderivados, medicamentos e equipamentos
médico-odontológicos;
VI - saneamento básico de domicílios ou de pequenas
comunidades, desde que seja aprovado pelo Conselho de
Saúde do ente da Federação financiador da ação e esteja de
acordo com as diretrizes das demais determinações previstas
nesta Lei Complementar;
VII - saneamento básico dos distritos sanitários especiais
indígenas e de comunidades remanescentes de quilombos;
VIII - manejo ambiental vinculado diretamente ao controle de
vetores de doenças;
IX - investimento na rede física do SUS, incluindo a execução de
obras de recuperação, reforma, ampliação e construção de
estabelecimentos públicos de saúde;
X - remuneração do pessoal ativo da área de saúde em
atividade nas ações de que trata este artigo, incluindo os
encargos sociais;
XI - ações de apoio administrativo realizadas pelas instituições
públicas do SUS e imprescindíveis à execução das ações e
serviços públicos de saúde; e
XII - gestão do sistema público de saúde e operação de
unidades prestadoras de serviços públicos de saúde.
Assim, as verbas repassadas pela União aos Estados, Distrito Federal e Municípios
para as finalidades descritas no art. 3º da referida lei são, por força do art. 198, § 3º, da
CF/88 c/c o art. 17 da Lei Complementar nº 141, de 2012, transferências constitucionais
obrigatórias, que devem ser realizadas pelo Fundo Nacional de Saúde na modalidade
fundo a fundo, conforme determina o seu art. 18.
657
recursos correntes ou de capital a outro ente da Federação, a título de cooperação, auxílio
ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os
destinados ao Sistema Único de Saúde."
Atualmente, os instrumentos utilizados para formalização de transferências
voluntárias são o termo de convênio, o contrato de repasse acordo, ajuste ou outros
instrumentos congêneres, todos regulados pelo Decreto nº 6.170, de 25 de julho de 2007.
Verifica-se que o art. 25 da mencionada lei exclui expressamente do conceito de
transferência voluntária aquela decorrente de determinação constitucional, legal ou
destinada ao SUS.
Isso permite concluir e confirmar o que foi dito no tópico anterior no sentido de que
todos os recursos referentes às ações e serviços de saúde previstos no art. 3º, da Lei
Complementar nº 141, de 2012, que a União tem que transferir por força da previsão
constitucional expressa no art. 198, § 3º, II, c/c art. 17 da citada lei são de transferência
obrigatória, já que decorrem de determinação constitucional e, concomitantemente, são
destinados ao SUS.
Por consequência, o repasse desses recursos não deve ser feito por termo de
convênio, contrato de repasse, ajuste ou outro instrumento congênere, mas por repasse na
modalidade fundo a fundo, conforme acertadamente preceitua o art. 18 da Lei
Complementar nº 141, de 2012.
No que concerne ao critério relacionado à alocação como ações e serviços de saúde,
destaca-se, para efeito de classificação, o rol previsto no artigo 6º da Lei Orgânica da
Saúde.
Por conseguinte, são assim considerados: ações de vigilância sanitária, vigilância
epidemiológica, saúde do trabalhador, e de assistência terapêutica integral, inclusive
farmacêutica. Ainda, pode haver dispêndio concernente à participação na formulação da
política e na execução de ações de saneamento básico; à ordenação da formação de
recursos humanos na área de saúde; vigilância nutricional e orientação alimentar;
colaboração na proteção do meio ambiente; controle e fiscalização de serviços, produtos e
substâncias de interesse para saúde; fiscalização de alimentos, água e bebidas para o
consumo humano; participação no controle e fiscalização de produtos psicoativos, tóxicos
e radioativos; desenvolvimento científico e tecnológico; formulação e execução da política
de sangue e seus derivados.
658
Dessa forma, os recursos federais são constituídos, organizados e transferidos em
blocos de financiamento, de modo que o uso de tais recursos fica adstrito a cada bloco,
atendendo as especificidades nele previstas.
De acordo com o artigo 4º da Portaria de Consolidação nº 6, de 28 de setembro de
2017, os blocos de financiamento são os seguintes: Atenção Básica, Atenção de Média e
Alta Complexidade, Vigilância em Saúde, Assistência Farmacêutica, Gestão do SUS e
Investimentos na Rede de Serviços de Saúde, cabendo enfatizar que "os recursos
referentes a cada bloco de financiamento devem ser aplicados nas ações e serviços de
saúde relacionados ao próprio bloco".
O §2º do artigo 6º da referida Portaria dispõe sobre a vedação da utilização dos
recursos referentes aos blocos de financiamento para determinadas circunstâncias, nos
seguintes termos:
“Art. 6º [...]
§ 2º Os recursos referentes aos blocos da Atenção Básica,
Atenção de Média e Alta Complexidade Ambulatorial e
Hospitalar, Vigilância em Saúde e de Gestão do SUS, devem
ser utilizados considerando que fica vedada a utilização desse
para pagamento de:
I - servidores inativos;
II - servidores ativos, exceto aqueles contratados
exclusivamente para desempenhar funções relacionadas aos
serviços relativos ao respectivo bloco, previstos no respectivo
Plano de Saúde;
III - gratificação de função de cargos comissionados, exceto
aqueles diretamente ligados às funções relacionadas aos
serviços relativos ao respectivo bloco, previstos no respectivo
Plano de Saúde;
IV - pagamento de assessorias/consultorias prestadas por
servidores públicos pertencentes ao quadro do próprio município
ou do estado; e
V - obras de construções novas, exceto as que se referem a
reformas e adequações de imóveis já existentes, utilizados para
a realização de ações e/ou serviços de saúde.”
659
recursos referentes aos blocos de financiamento devem ser aplicados nas ações e
serviços de saúde relacionados ao próprio bloco.
Considerações Finais
Para finalizar, conclui-se que o direito à saúde é um direito de todos e que os
gestores devem assegurá-lo por meio de políticas públicas que atendam às necessidades
da população.
Ademais, deve-se seguir as regras constitucionais e legais na gestão do dinheiro
público destinado à saúde. Quanto às decisões acerca dos investimentos dos recursos
públicos, é necessário que haja transparência para viabilizar o controle por parte da
sociedade.
Isso, porque a efetivação dos direitos reconhecidos pela Constituição, encontram-se
cingidos às escolhas políticas, e tratando-se de um Estado Democrático, as decisões
devem ser informadas à população, que é o destinatário por excelência das razões e
justificações.[2]
Referências
660
A problemática do desabastecimento de medicamentos, no âmbito do Poder
Público, em razão da falta de planejamento estruturado das licitações.
RESUMO: A concretização do direito à saúde pelo Poder Público ainda é um dos assuntos
mais controversos e questionados da atualidade, uma vez que não é só a falta de
planejamento e desídia do Administrador Público em efetivar as políticas públicas que
geram o caos nesta seara, principalmente quando trata-se de fornecimento de
medicamentos à população. O problema vai muito mais além, acarretando em um estado
de violação massiva e sistêmica do direito fundamental à saúde em decorrência dos
bloqueios políticos institucionais. Assim, o presente articulado tem por objetivo apresentar
as dificuldades e soluções quanto ao planejamento e gestão da Administração Pública,
através de análise crítica com pesquisa doutrinária e jurisprudencial, concluindo-se que
somente com mais eficiência na formulação de políticas públicas, com proposição de
critérios e parâmetros, será efetivada a aquisição tempestiva dos medicamentos e outros
materiais hospitalares, evitando-se, assim, o seu desabastecimento e que o acesso a
serviços de saúde se transforme em mais um fator de iniquidade.
Palavras- chave: saúde; gestão; planejamento; licitação.
661
A despeito disso, não se pode olvidar que a compra de medicamentos, no Brasil,
esbarra em uma série de dificuldades, dentre as quais se insere o conluio entre sociedades
empresárias farmacêuticas, as quais, em certas ocasiões, nem mesmo participam dos
certames, a fim de forçar uma contratação emergencial com preços mais elevados que
aqueles tradicionalmente praticados no mercado. Tal fato, porém, não exime os gestores
que, quando não mancomunados com os fornecedores de medicamentos, agem com
negligência na busca por soluções concretas para o problema do desabastecimento.
Nessa linha de intelecção, cumpre lembrar que o Tribunal de Contas da União (3) tem
entendimento consolidado sobre a possibilidade de contratação emergencial, ainda que o
fato ensejador da necessidade pública tenha sido decorrente da falta de planejamento, da
desídia administrativa ou da má gestão dos recursos públicos pelo gestor.
No entanto, tal posicionamento não convalida a conduta omissiva do administrador,
uma vez que esta não pode vir em prejuízo do interesse maior tutelado pela Administração,
qual seja a coletividade. Sendo assim, o mesmo Tribunal de Contas reporta-se pela
apuração da responsabilidade do servidor, em caso de inércia dolosa ou culposa, através
de regular processo administrativo.
É verdade que, na concepção acertada do TCU, os cidadãos não podem ser
prejudicados por um ato espúrio do administrador público, a exemplo do caso de omissão
no adequado gerenciamento do estoque de medicamentos. Todavia, a dispensa de
licitação jamais poderá emergir como regra para as compras de materiais hospitalares, tal
como vem ocorrendo, diuturnamente, no Brasil, visto que o art. 24, da Lei 8.666/93 - Lei
Geral de Licitações - limita o quantitativo a ser adquirido ao que for estritamente necessário
para sanar a situação excepcional, devendo ser instaurado, de logo, o regular processo
licitatório.
Constata-se, desta feita, que não há como abastecer os principais centros de saúde
apenas com quantitativos fracionados de maneira irregular, por ducto de contratação
emergencial, sob pena de persistir o desfalque de materiais hospitalares tão caros à
concretização do direito à saúde.
Ademais, é inadmissível, nesse contexto, o fracionamento de licitação, para fins de
contratação direta em razão do valor. Recentemente, a título de informação, tal situação foi
objeto de investigação no Estado de Alagoas tanto pela Controladoria Geral da União
662
quanto pela Polícia Federal, o que se constatou um prejuízo da ordem de mais de 230
milhões de reais (4) ao Erário, e, consequentemente, à população alagoana.
O que se vislumbra, inevitavelmente, é a configuração de um estado de coisas
inconstitucional na saúde, haja vista a crise abranger a dificuldade estratégica dos três
Poderes, em adotar soluções efetivas que apaziguem o atual estado caótico do
gerenciamento da saúde.
Rodríguez Garavito e Rodríguez Franco (5) defendem que estes casos estruturais
são caracterizados por: i) afetar um número amplo de pessoas que alegam a violação de
seus direitos, diretamente ou através de organizações que litigam em sua causa; ii)
envolver várias entidades estatais como demandadas por serem responsáveis pelas falhas
sistemáticas de políticas públicas, e iii) implicar ordens de execução complexas, as quais o
juiz da causa decide a várias autoridades públicas a empreender ações coordenadas para
proteger toda população afetada, e não somente as partes do caso concreto.
Em sua evolução jurisprudencial, o ECI teve sua consolidação de requisitos para
declaração formal pela CCC na decisão T-025 de 2004 (6), quais sejam: i) violação
massiva e generalizada de vários direitos constitucionais que afeta a um número
significativo de pessoas; ii) a prolongada omissão das autoridades no cumprimento de
suas obrigações para garantir os direitos; iii) a adoção de práticas inconstitucionais; iv) a
não expedição de medidas legislativas, administrativas e orçamentarias necessárias para
evitar a violação dos direitos; v) a existência de um problema social cuja solução depende
da intervenção de várias entidades, requer a adoção de um conjunto complexo e
coordenado de ações e exige um nível de recursos que demanda um esforço orçamentário
adicional importante e vi) um iminente congestionamento judicial pelo número alto de
ações propostas.
Seguindo em convergência ao entendimento pelo estado de coisas inconstitucional,
no caso retratado da saúde no Estado de Alagoas, a Procuradoria Geral do Estado de
Alagoas (7), em parecer proferido pontuou a configuração fática desse estado de coisas
inconstitucional na saúde pública. No teor de seu posicionamento, trouxe à baila a
necessidade dos três Poderes na atuação em conjunto com o fim de cessar a falta de
medicamentos, sucateamento de hospitais, ausência de profissionais de saúde, além de
outras medidas necessárias para tal.
663
É de conhecimento que o Executivo, muitas vezes, sofre com as dificuldades para a
implementação de todas as políticas públicas necessárias ao regular aparato da saúde.
Dentre elas, destaca-se o agravamento desta crise pelo Judiciário, quando este Poder
profere, crescentemente, liminares desprovidas do necessário impacto financeiro ao Erário.
O resultado dessa microvisão do Judiciário, ao conceder tutelas específicas
indiscriminadamente, acarreta em uma interferência negativa no plano governamental de
ações e serviços que devem ser oferecidos à população como um todo (macrovisão), uma
vez que contingencia verbas de destinações mais amplas para cumprir às determinações
judiciais. Ainda, segundo Sampaio (8), a gestão dos recursos públicos e a visão transversal
das políticas públicas, não são de conhecimento do Estado-juiz, de modo que o
cumprimento das decisões em caráter individual, pode não só comprometer a integridade
das políticas públicas de saúde como também de outras áreas.
Por outro lado, nota-se a omissão do Legislativo na realização de seu papel
fiscalizatório e na edição de enunciados normativos mais consentâneos com o total
cumprimento do desígnio constitucional, sobressaindo-se a ausência até o presente
momento da Lei Complementar regulamentando a competência comum da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios no âmbito da saúde, conforme art. 23,
parágrafo único da Constituição Federal.
Desse modo, vislumbram-se reiteradas violações ao direito fundamental grafado no
art. 196, da Constituição Federal, gerando, assim, o estado de coisas inconstitucional.
É salutar, portanto, que os gestores atuem de maneira eficiente, de modo a
possibilitar a aquisição tempestiva dos medicamentos e outros materiais hospitalares, com
o escopo de evitar o desabastecimento.
O primeiro passo é fazer uma pesquisa detalhada dos tipos de demandas que são
dirigidas à Administração Pública, a fim de estimar quais os quantitativos necessários para
atender, no mínimo, um ano de fornecimento contínuo. A despeito de alguns gestores
alegarem a impossibilidade de realização de um planejamento que espelhe,
verdadeiramente, a realidade, em face das constantes determinações judiciais, o que se
pretende é, pelo menos, diminuir as interrupções das distribuições e minorar o volume de
contratações emergenciais.
Existem ferramentas à disposição do gestor para, levando-se em conta uma demanda
em potencial, viabilizar a contratação daquilo que for necessário ao atendimento da
664
necessidade pública. O registro de preços, expressamente consignado na Lei 8.666/93, em
seu artigo 15, é um instrumento efetivo que se adequa ao planejamento estratégico
imprescindível ao abastecimento dos órgãos de saúde, até porque a existência de preços
registrados não obriga a Administração a firmar contratações que deles poderão advir.
Lado outro, é fundamental que se investiguem as sociedades empresárias que não
participam dos certames licitatórios de medicamentos, mas, com frequência, são
contratadas em procedimentos emergenciais. Não é crível que as licitações sejam desertas
e, posteriormente, surja uma série de interessados em vender tais produtos para a
Administração Pública, através de procedimento de dispensa de licitação.
Nesse ponto, é fundamental que se crie uma rede estruturada entre vários órgãos
(Controladoria, Advocacia Pública, Tribunal de Contas, Ministério Público, Polícia Civil e
Federal, dentre outros), com o intuito de coibir rotineiros desvios e impropriedades na
gestão da saúde, bem como de facilitar o intercâmbio de informações, para que se tenha
uma atuação preventiva.
Ademais, é de substancial importância que os servidores responsáveis pela aquisição
de medicamentos sejam adequadamente treinados, em um modelo de compliance no
serviço público, de modo a garantir que exista um programa de integridade, com padrões
éticos suficientes a alterar modelos de conduta acostumados à ineficiência. Afinal de
contas, de nada adianta impor rotinas de trabalho profícuas, se os servidores estão
atuando em contrariedade aos interesses da Administração. Sobre o compilando, no
âmbito da Administração Pública, posiciona-se Ricardo Breier (9):
665
uma mudança no conjunto de procedimentos hábeis a gerar mais eficiência para a
atividade administrativa, evitando, assim, o esfacelamento do orçamento estatal. E, o mais
importante, tudo em prol da concreção do direito fundamental de todo e qualquer cidadão,
o direito à saúde.
Referências
1. http://g1.globo.com/fantastico/noticia/2017/08/mesmo-com-milhoes-gastos-falta-o-
basico-no-hospital-geral-de-alagoas.html. Acesso em 13/10/2017
2. http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/vida-
urbana/2015/04/27/interna_vidaurbana,573117/desabastecimento-de-medicamentos-
na-farmacia-de-pernambuco-penaliza-pacientes.shtml. Acesso em 13/10/2017
3. Acórdão 2240/2015-Primeira Câmara, TC 019.511/2011-6, relator Ministro Benjamin
Zymler, 28.4.2015.
4. https://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/policia-federal-cumpre-mandados-de-busca-e-
apreensao-na-secretaria-da-saude-de-alagoas.ghtml. Acesso em 13/10/2017
5. RODRÍGUEZ GARAVITO, Cesar.; RODRÍGUEZ FRANCO, Diana. . Cortes y cambio
social. Cómo la Corte Constitucional transformo el desplazamiento forzado em
Colombia. Bogotá: Colección de Justicia, 2010. Disponível em: <
https://www.dejusticia.org/wp-content/uploads/2017/04/fi_name_recurso_185.pdf
6. ______. Sentencia de Tutela –T- 025.Bogotá. Relator: Ministro Manuel José Cepeda
Espinosa. Disponível em : < http://www.corteconstitucional.gov.co/relatoria/2003/t-
1030-03.htm>. Acesso em: 25 jul.2017.
7. PARECER PGE/ASS N° 139/2015 (Diário Oficial de Alagoas de 15/12/2015).
8. SAMPAIO, José Adércio Leite. Teoria da Constituição e dos Direitos Fundamentais.
Belo Horizonte: Del Rey, 2013.
9. https://www.conjur.com.br/2015-ago-20/ricardo-breier-compliance-setor-publico-
desafio-pais. Acesso em 13/10/2017
666
Controvérsia acerca do mínimo constitucional em ações e serviços públicos
de saúde no exercício de 2016: Considerações jurídicas
RESUMO: O artigo tem como escopo analisar o valor mínimo constitucional de recursos
públicos a serem empregados em ações e serviços públicos de saúde no exercício 2016, o
qual sofreu alteração pela Emenda Constitucional nº 95, de 15 de dezembro de 2016 e
gerou enorme controvérsia na determinação de quais exercícios sofrerão a alteração
orçamentária. A saúde, como direito social de status constitucional, é tema que está em
constante debate e, dado seu caráter de prestação estatal universal, a aplicação do seu
regramento jurídico tem capacidade de influenciar diretamente milhões de cidadãos. O
aumento do percentual a ser aplicado no orçamento da saúde foi objeto de diferentes
interpretações, tanto por órgãos públicos, como pela sociedade civil. Uma interpretação
aduz que a emenda se destinou a alterar o percentual mínimo a ser aplicado a partir do
exercício de 2017, enquanto outra defende que a emenda alterou o percentual já para o
exercício de 2016, apesar de ter sido promulgada nos últimos 15 dias desse ano. A
diferença entre essas teses significa financeiramente em, aproximadamente, R$ 2 (dois)
bilhões de reais no orçamento da saúde. A questão é analisada pela hermenêutica
constitucional, sob o prisma da teoria da sociedade aberta de intérpretes da Constituição
(Peter Häberle) e pelos princípios orçamentários, da segurança jurídica e da separação
dos poderes. Muito além da pura e simples interpretação de texto normativo, essa
discussão toma contornos próprios, uma vez que tem como pano de fundo a oferta de
serviços públicos de saúde, área que ainda demanda grande evolução de gestão pública,
e, consequentemente, é alvo de constante controle social.
Palavras-chave: Direito Constitucional. Orçamento. Ações e Serviços Públicos de
Saúde. Hermenêutica.
Introdução
667
integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços
assistenciais”.
As disposições supracitadas demonstram que optou-se politicamente, na ocasião do
estabelecimento da ordem constitucional brasileira, em conferir importância central à
atuação do Estado para assegurar o direito à saúde. Como consequência lógica, o desafio
que exsurge-se imediatamente após essa opção é o de garantir os recursos públicos
necessários para a concretização dessa tarefa.
Nesse contexto, com o advento da EC nº 29, de 2000, os entes federados tiveram
sua participação no financiamento da saúde vinculada a um percentual mínimo específico.
Conforme estabelecido pelo art. 198, § 2º, inciso I, da Constituição (com a redação dada
pela referida emenda), no caso da União, a forma de cálculo seria definida nos termos de
Lei Complementar. À época, a regulamentação ficou a cargo do art. 5º da LC nº 141/2012,
que atrelou a participação da União ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).
Já em 2015, foi publicada a EC nº 86, que alterou o art. 198 da Constituição e
estabeleceu, no caso da União, a aplicação de recursos em saúde em percentual não a
inferior a 15% da receita corrente líquida (RLC) do respectivo exercício financeiro. Não
obstante, a referida Emenda trouxe, em seu art. 2º, regra de transição estipulando que
percentual de 15% da RLC seria alcançado progressivamente, ao longo de cinco anos,
iniciando em 2016 com o valor de 13,2%.
668
O Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo (MPCSP) entendeu que o
percentual mínimo a ser aplicado em ASPS no ano de 2016 seria de 15%. Assim,
considerando que em 2016 a aplicação em ASPS da União apurada como proporção da
receita corrente líquida foi o equivalente a 14,70%2, o MPCSP elaborou representação ao
Ministério Público Federal em São Paulo, solicitando, entre outros pedidos, a apuração das
“irregularidades perpetradas pela União quanto ao dever de financiamento mínimo das
ações e serviços públicos de saúde”.
Por sua vez, o Ministério Público de Contas junto ao Tribunal de Contas da União
(MPCTCU) encampou a denúncia3 apresentada pelo MPCSP, no sentido de que o
percentual mínimo a ser aplicado em ASPS no ano de 2016 seria de 15%. Assim,
formalizou-se representação em razão de “indícios de déficit na aplicação do percentual
mínimo em ações e serviços públicos de saúde pela União no exercício financeiro de
2016”.
O Conselho Nacional de Saúde (CNS), com base no Parecer Conclusivo elaborado
por sua Comissão de Financiamento, reprovou4 o Relatório Anual de Gestão de 2016 do
Ministério da Saúde, fundamentando essa decisão, entre outros argumentos, no
desrespeito à aplicação do percentual mínimo em ações e serviços públicos de saúde.
Por outro lado, a Secretaria de Planejamento e Orçamento do Ministério da Saúde
entendeu que para o ano de 2016 a regra estabelecida pela EC nº 86, de 17 de março de
2015, é 13,2% da RCL .
Nesse mesmo diapasão, a Advocacia-Geral da União, por meio de seu órgão setorial
– Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Saúde – emitiu parecer jurídico5 opinando que
o mínimo constitucional a ser aplicado em ações e serviços públicos de saúde, para o
exercício financeiro de 2016, equivale a 13,2% da RLC6.
Por fim, o Tribunal de Contas da União, em despacho emitido no bojo da
representação formulada pelo MPCTCU3, entendeu que mínimo a ser aplicado em ações e
serviços públicos de saúde para o exercício financeiro de 2016 corresponde ao percentual
de 13,2% da RLC.
2 Dado constante na representação do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo ao Ministério Público
Federal em São Paulo, de 28 de abril de 2017.
3 Processo no TCU: TC 011.936/2017-7
4 ATA DA 295ª REUNIÃO ORDINÁRIA DO CNS: “(...) Deliberação: aprovada, com 28 votos favoráveis, um voto contrário
e cinco abstenções, a resolução do CNS que reprova o RAG 2016 do Ministério da Saúde.”
5 Nota Técnica nº 04/2017/SPO/SE/MS
6 PARECER n. 00440/2017/CONJUR-MS/CGU/AGU, subscrito pelo autor
669
Execução Orçamentária e o Princípio da Anualidade
670
Cumpre destacar que, na ocasião da promulgação da EC nº 86/2015, a Advocacia-
Geral da União já havia proferido entendimento semelhante no PARECER n.
00465/2015/PFF/CGJOE/CONJUR-MP/CGU/AGU.
7 Mendes, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 9. ed. São Paulo : Saraiva, 2014.
671
Conforme relatado acima, a interpretação que pretende aplicar a regra de ASPS da
EC nº 95/2016 no próprio exercício de 2016 não é viável juridicamente. Contudo, este
entendimento não conduz, necessariamente, à ideia de que a EC nº 95/2016 padece de
vício de inconstitucionalidade. Doutro modo, cabe aplicação da interpretação conforme à
Constituição, como técnica de hermenêutica, a fim de se preservar a validade da referida
No âmbito sobretudo da interpretação das leis – posto que também seja pertinente
para a compreensão de normas editadas pelo poder constituinte de revisão em face de
limitações estabelecidas pelo poder constituinte originário –, há ainda a considerar o
princípio da interpretação conforme a Constituição.
Não se deve pressupor que o legislador haja querido dispor em sentido contrário à
Constituição; ao contrário, as normas infraconstitucionais surgem com a presunção de
constitucionalidade. Daí que, se uma norma infraconstitucional, pelas peculiaridades da
sua textura semântica, admite mais de um significado, sendo um deles coerente com a
Constituição e os demais com ela incompatíveis, deve-se entender que aquele é o sentido
próprio da regra em exame – leitura também ordenada pelo princípio da economia
legislativa (ou da conservação das normas).
Segundo Mendes no trecho citado acima, esta técnica é cabível inclusive para
interpretações das Emendas Constitucionais face às normas originárias da Constituição.
Cabe ressaltar, ainda, que não é somente o Poder Judiciário que pode recorrer à
interpretação conforme à Constituição na aplicação das normas, de modo que a
Administração também pode se valer deste princípio hermenêutico. Conforme explica
Sarmento 9
Finalmente, cabe observar que a interpretação conforme à Constituição, como
princípio hermenêutico, não se direciona apenas ao Poder Judiciário. Todos os que
interpretam e aplicam as normas jurídicas, como a Administração Pública e mesmo os
672
particulares, devem fazê-lo de acordo com a Constituição, preferindo sempre as exegeses
legais que mais prestigiem os comandos constitucionais.
É forçoso reconhecer que a interpretação conforme à Constituição é plenamente
aplicável ao caso em análise. Logo, deve-se conferir o entendimento de que a EC nº
95/2016 se destinou a alterar o percentual mínimo a ser aplicado em ASPS a partir do
exercício de 2017, aplicando a exegese compatível com os comandos constitucionais.
Cumpre mencionar que este último entendimento também se coaduna com o sentido
da norma (mens legis). Percebe-se que a EC nº 95/2016 teve a preocupação de dispor
sobre às aplicações mínimas em ASPS nos exercícios financeiros futuros. Com efeito,
incluiu-se o art. 110 no ADCT com a previsão de que, no Novo Regime Fiscal, as
aplicações mínimas em ações e serviços públicos de saúde tem novo regramento a partir
do exercício de 2017.
Convém transcrever ainda trechos do parecer final do Relator, Deputado Darcísio
Perondi, na Comissão Especial relativa à PEC nº 241-A, de 201610:
Nesse sentido, adotar o ano de 2016 como base de cálculo para as aplicações
mínimas em ações e serviços públicos de saúde causaria imensa perda para o setor. Ao
alterar o ano base para 2017, como propomos, e ao se revogar o art. 2º da EC 86/2015,
teremos a incidência do percentual de 15% da receita corrente líquida do ano de 2017,
conforme dita o art. 198 da Constituição, e, a partir de então, a correção pelo IPCA.
Pela leitura dos trechos do parecer supratranscrito, fica evidenciada que a mens legis
nunca foi a aplicação do percentual de 15% como mínimo da saúde para o exercício de
2016, tendo em vista que a EC nº 95/2016 objetivava a instituição do novo regime fiscal
apenas a partir de 2017.
673
usuários do SUS e representantes de entidades de profissionais de saúde. Logo, é um
órgão deliberativo com cunho iminentemente político11 e não jurídico.
Compete ao CNS, entre outras atribuições, atuar na formulação de estratégias e no
controle da execução da Política Nacional de Saúde, na esfera do Governo Federal,
inclusive nos aspectos econômicos e financeiros. No desempenho dessa função, o
Conselho se deparou com os possíveis significados da EC nº 95/2016 e, de forma corajosa
e respeitável, interpretou a Constituição atribuindo-lhe o significado sob prisma não
exclusivamente jurídico, com a visão do setor da saúde.
Observa-se, assim, que a atuação do CNS no debate aqui tratado aproxima-se da
lição de Peter Häberle, que propugna uma sociedade de intérpretes da Constituição que
englobe o maior número forças produtivas de interpretação12. Para o autor, essa
proposição é denominada de sociedade aberta de intérpretes, em oposição à sociedade
fechada, que abarca somente os intérpretes clássicos, como os juízes e tribunais
constitucionais. Esse novo olhar pluralista sobre a hermenêutica constitucional contribui
para moldar seu caráter democrático.
Considerações finais
O Estado Democrático de Direito foi desenhado para trilhar vias seguras, de forma
que seu trajeto é incompatível com atalhos e surpresas. Entende-se, portanto, que não
merece guarida a argumentação de que a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº
95, em 15 de dezembro de 2016, alterou automaticamente o piso das ASPS para o mesmo
exercício. Essa interpretação não prestigia a lógica constitucional exposta anteriormente,
desconsiderando valores como a segurança jurídica, separação dos poderes, respeito às
normas orçamentárias, princípio da anualidade orçamentária, dentre outros.
Embora não nos alinhemos à posição adotada pelo Conselho Nacional de Saúde,
deve-se reconhecer que o debate sobre a interpretação do texto constitucional é salutar ao
processo democrático e dialético do direito. Nesse aspecto, evidencia-se a atuação do
CNS na análise das normas aplicáveis à área da saúde, sobretudo em relação às
disposições constitucionais. Materializa-se, desse modo, a ideia de sociedade aberta de
intérpretes, contribuindo para a democratização da Constituição.
11 Não nos referimos à conotação “político-partidária”, mas sim à análise e formulação de mérito das políticas públicas.
12 HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional: a sociedade aberta de intérpretes da constituição: contribuição para a
interpretação pluralista e ‘procedimental’ da Constituição”. Sergio Antonio Fabris Editor: Porto Alegre, 2002.
674
REFERÊNCIAS
1. Mendes, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva,
2014.
2. Sarmento, Daniel; Souza Neto, Cláudio Pereira de. Direito constitucional: teoria,
história e métodos de trabalho. 1. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012.
3. Häberle, Peter. Hermenêutica Constitucional: a sociedade aberta de intérpretes da
constituição: contribuição para a interpretação pluralista e ‘procedimental’ da
Constituição”. Sergio Antonio Fabris Editor: Porto Alegre, 2002.
675
Quando o Estado burla a si mesmo: o caso da Lei de Responsabilidade Fiscal
brasileira
César Augusto Paro1
RESUMO: Este ensaio busca realizar uma reflexão crítica sobre o caso da Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF) brasileira e sua relação com o Sistema Único de Saúde
(SUS). Inicialmente, contextualiza-se a conjuntura econômico-política do cenário nacional e
internacional em que esta regulamentação surge. Por meio de pesquisa bibliográfica,
realiza-se análise da aplicação desta lei no Brasil, dando ênfase às suas influências no
sistema de saúde. Identifica-se que o Estado Brasileiro se encontra numa situação
paradoxal: garante constitucionalmente um sistema de saúde universal e integral, e, ao
mesmo tempo, possui uma legislação fiscal que não permite efetivar o direito à saúde tal
como garantido. Devido a isso, os gestores públicos que buscam efetivá-lo, são punidos
pelos órgãos fiscalizatórios. Diferentes setores da sociedade têm se mobilizado para a
superação deste entrave, mas, este é um processo complexo e lento, que ainda vai exigir
muitos esforços para que realmente se modifique.
Palavras-chave: Lei de Responsabilidade Fiscal; Gestão; Sistema Único de Saúde.
1 Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro – IESC/UFRJ. E-mail:
cesaraugustoparo@iesc.ufrj.br
676
Uma das características mais marcantes da economia do século XX é o
crescente aumento das despesas públicas. Tal situação é encontrada não
apenas nos países de economia coletivizada, onde o Estado, por definição,
é o grande agente econômico, mas também nas nações capitalistas
avançadas, defensoras da livre iniciativa e da economia de mercado (3).
677
manutenção do equilíbrio das contas públicas, o cumprimento de metas entre receitas e
despesas, a obediência a limites e procedimentos adequados e a observância das
condições definidas para a geração de despesas com pessoal e seguridade social (8).
Tendo como pilares o planejamento, a transparência, o controle e a responsabilização
no uso dos recursos públicos, busca conter o déficit público e o endividamento crescente
por meio da manutenção do equilíbrio fiscal permanente, mediante o cumprimento
intertemporal de metas de resultado fiscal nas três esferas governamentais. Para tanto,
são estabelecidas rígidas restrições legais em relação à renúncia de receitas, geração de
despesas com pessoal, seguridade social, dívidas consolidadas e mobiliárias, operações
de crédito, concessão de garantias e inscrição em restos a pagar (9).
Em relação ao estabelecimento de limites de despesas líquidas com pessoal e
redução de custo do endividamento público, a LRF instituiu, respectivamente, a avaliação
de desempenho dos gestores públicos pela razão entre despesas públicas com pessoal e
receita corrente líquida e entre dívidas consolidadas líquidas e receita corrente líquida (7).
Os gastos com despesas de pessoal são definidos, em seu Art. 8º, como o:
O §1º deste mesmo artigo esclarece que os valores dos contratos de terceirização de
mão-de-obra que se referirem à substituição de servidores e de empregados públicos
serão contabilizados como “outras despesas de pessoal” invés de “gastos com pessoal”.
A racionalidade econômico-gerencial que a reforma induzida pela LRF trouxe é
reconhecida por alguns autores (10) como grande responsável pelos importantes avanços
das finanças públicas no Brasil. No entanto, os setores sociais tecem fortes críticas às
consequências que normatizações como estas trouxeram para a garantia dos direitos
sociais, situando a LRF lado a lado de outros dispositivos que são reconhecidos como
“ataques” ao financiamento dos direitos sociais nos anos 90 e 2000:
Desde os vetos de Collor aos pontos sobre financiamento ao SUS, nas leis
nº 8.080 e nº 8.132; passando pela criação do que hoje se chama
Desvinculação das Receitas da União (DRU), pela criação do regime de
678
metas de inflação, pela perenização da LRF, pelas propostas de reforma
tributária que são, simplesmente, desoneração do capital, entre outros
pontos, o financiamento dos direitos sociais - incluindo a saúde - sofre a
violência da política de ajuste fiscal, isto é, do sacrifício dos direitos
democráticos em detrimento da remuneração da burguesia rentista,
nacional ou internacional, que vive da dívida pública brasileira (11).
A LRF e o SUS
679
Com a proposta do SUS de universalizar o acesso de ações de saúde para todos,
ampliou-se a rede própria de serviços de saúde, o que repercutiu na necessidade de
inserção de grande contingente de trabalhadores de saúde. No entanto, a limitação legal
imposta pela LRF trouxe impasses entre o máximo de gasto possível com despesa de
pessoal e a necessidade de incorporação de profissionais (13). Isto induziu principalmente
os entes federados municipais a realizarem contratações por meio de vínculos indiretos a
despeito da realização de concursos públicos para admissão de pessoal, havendo a
difusão de Organizações Sociais, Organizações Não-Governamentais, Organizações da
Sociedade Civil de Interesse Público e Cooperativas Gestoras, pois, deste modo, a
contabilização dos gastos se dá como “serviços de terceiro” e não “gastos de pessoal”
(18).
Essas parcerias com entidades do terceiro setor têm levado à precarização dos
vínculos de trabalho, dado que não geram garantias dos direitos dos trabalhadores. O
trabalho precário em saúde é identificado como um obstáculo para o desenvolvimento do
sistema público de saúde, pois compromete a relação dos trabalhadores com o sistema e
prejudica a qualidade e a continuidade dos serviços prestados pelo SUS (19).
A LRF, portanto, repercute em uma situação paradoxal para a gestão pública do SUS,
uma vez que, ao mesmo tempo em que o Estado responsabiliza os gestores do SUS pela
prestação de serviços de saúde integrais e universais, os impedem de contratarem pessoal
para a execução dessas políticas públicas (20). Neste sentido, o Estado burla a si mesmo
(21), complexificando a consolidação da proposta de um sistema de saúde público
universalizante.
Na pesquisa bibliográfica realizada nas bases de dados nacionais, identificamos uma
escassez de estudos que tratassem da temática dos impactos da LRF na implementação
de ações e serviços de saúde do SUS. A maioria dos estudos sobre LRF abordava a
temática sob uma perspectiva predominantemente macroeconômica, enfatizando o
endividamento ou o comportamento do emprego sem detalhamento para o setor saúde.
Alguns estudos que problematizavam a referida questão na saúde tinham caráter teórico-
conceitual, não apresentando dados empíricos. Nas fontes oficiais de informação, não há
uma padronização na divulgação dos dados das despesas com pessoal e do valor da
receita corrente líquida, o que dificulta a produção de informações pela sociedade civil e
680
academia. Os Tribunais de Conta, órgãos responsáveis pela fiscalização da LRF, seguem
lógicas distintas de divulgação de informações.
Diversos estudos econômicos demonstram a importância que a LRF teve para a
estabilidade fiscal dos entes federados. Giuberti (22) analisou o efeito sobre o gasto com
pessoal dos municípios brasileiros de 1993 a 2003, verificando que a LRF não afeta o
comportamento dos gestores públicos no que diz respeito ao gasto com pessoal na maioria
dos municípios (encontrou somente 1,4% de municípios acima do limite de 60% em 2003)
e que a LRF é relevante para controlar o gasto com pessoal com benefícios para os
municípios que apresentaram um gasto elevado com esse item do orçamento.
Rodrigues (23) analisou o comportamento do emprego formal em setores específicos
da economia brasileira, como a saúde, entre 1998 e 2009. Revelou que a LRF não teve
qualquer influência para a união na proporção de despesa com pessoal pela receita
corrente líquida, cujo valor máximo para o período analisado alcançou somente 31,9%
(valor bem inferior ao limite prudencial de 47,5%). Já estados e municípios esforçaram-se
para se enquadrar nos limites estabelecidos pela norma, sendo que em 2009 ainda havia
entes em situação emergencial.
Estudos regionais também revelam o comportamento da LRF nos municípios de
determinado estado. Em análise realizada com os municípios de Piauí, visualizou-se que o
índice de endividamento médio dos municípios recuou em aproximadamente 7,0%,
sugerindo o êxito desta legislação (24). Estudo sobre os municípios gaúchos demonstrou
que, no geral, a LRF foi determinante para promover melhores desempenhos na gestão
financeira destes municípios, dado pelo aumento da capacidade de pagamento das
dívidas, do equilíbrio do superávit primário e do aumento das receitas tributárias (25). Já
nos municípios de Alagoas, houve o cumprimento dos limites com despesa e pessoal logo
de imediato à promulgação da legislação fiscal, mas, a longo prazo, estes limites
estabelecidos são difíceis de serem atingidos, causando quase sempre situações de
desequilíbrios nas finanças públicas (26).
Em 2014, 333 (79,9%) dos 417 municípios baianos descumpriam a LRF em relação
aos limites de gasto com pessoal por conta de despesas com profissionais de saúde para
a execução de programas federais ou estaduais. Caso tais despesas obrigatórias fossem
desconsideradas para fins de apuração das despesas com pessoal, somente 27 (5,7%)
municípios continuariam violando os limites da lei (15).
681
As críticas à LRF também estão presentes nas instâncias de participação social no
SUS. Nas proposições presentes nos relatórios finais das Conferências Nacionais de
Saúde (CNS), esta é apresentada como um entrave para o desenvolvimento do SUS,
sendo registrada a insatisfação popular com esta lei. Desde a 11° CNS em 2000 (mesmo
ano de promulgação da LRF), já existia um receio sobre os impactos que ela acarretaria na
implementação do SUS, derivando-se, portanto, propostas de contraposição à instituição
desta. Em todas as conferências posteriores, críticas à LRF continuaram emergindo das
discussões, o que demonstra que a percepção inicial de que esta lei poderia ter impactos
negativos para a consolidação do sistema de saúde foi se ratificando (27).
Como toda Lei Complementar, o terreno para negociar a sua mudança é o Congresso
Nacional. Quase 300 Projetos de Lei Complementar (PLP) relacionados a esta lei já
tramitaram ou estão tramitando na Câmara dos Deputados. Em 2015, criou-se nesta
instância uma Comissão Especial para análise da PLP nº 251/2005 de despesa com
pessoal na área da saúde. Junto a este PLP, foram apensados outros 16 projetos criados a
partir de 2015 que também sugeriram alterações na LRF com relação às despesas com a
área da saúde (15).
Na análise dos PLP já submetidos sobre a LRF, observa-se que, apesar de todos
abordarem políticas de saúde, alguns ampliam a alteração da LRF no que tange também
políticas de educação e assistência social, e, até mesmo, todos os programas promovidos
pela união. Houve também propostas mais restritas, que se focalizavam em algum serviço
específico da saúde, como o caso do Programa de Saúde da Família.
As proposições em sua maioria reforçam a importância do setor saúde ter um
tratamento diferenciado na regulação fiscal, apontando como mais adequada a criação de
um sistema próprio para o controle dos gastos com pessoal da área de saúde, que seria
contabilizado em separado com os servidores das demais áreas. A maioria dos projetos
que propuseram alteração na porcentagem de despesas com pessoal em relação a receita
corrente líquida para a área da saúde indicou o percentual máximo de 75%.
Para a análise destes referidos PLP, a Comissão Especial realizou duas audiências
públicas e dois seminários neste ano de 2015, envolvendo além de deputados,
representantes da Confederação Nacional dos Municípios, do Ministério Público de
Contas, do Conselho Nacional de Secretários de Saúde, do Conselho Nacional de Saúde,
do Ministério da Saúde, do Ministério da Educação, entre outros (7).
682
A referida comissão reconhece que a LRF tem grande importância no cenário
nacional, pois permitiu um maior controle dos gastos públicos e a geração de uma cultura
de responsabilidade na gestão fiscal da administração público. No entanto, entende que o
dispositivo da LRF tem sido inadequado perante a realidade enfrentada por muitos
municípios brasileiros, que tem repercutido na rejeição de suas contas pelas instâncias
fiscalizadoras. Portanto, esta aprova o PLP nº 251/2005 na forma de substitutivo com nova
fórmula de cálculo dos limites de despesa com pessoal nos municípios:
§ 3º Para efeito exclusivo da verificação do limite (...), poderá
ser deduzido do cálculo o montante da despesa com pessoal
que exceder a aplicação do percentual fixado no referido
dispositivo sobre as receitas vinculadas e transferidas pela
União no âmbito das funções Saúde, Educação e Assistência
Social, desde que observadas as seguintes condições: I – as
despesas sejam destinadas ao pagamento de pessoal ativo e
vinculadas aos respectivos programas; II – for comprovado, na
última apuração anual, que o Município cumpre os requisitos
constitucionais e legais relativos à aplicação mínima de
recursos no âmbito da saúde, da educação e da assistência
social; III – o Município adota todas as medidas necessárias à
arrecadação das receitas e à cobrança da dívida ativa (7).
Observa-se que esta proposta não busca estabelecer um valor máximo de despesas
com pessoal, mas sim permitir que o teto que até então vinha sendo adotado de forma
rígida na fiscalização da LRF seja flexibilizado quando os gastos com pessoal em saúde,
educação e/ou assistência social relacionados às transferências da união ultrapassarem os
valores máximos. A ausência de um valor em específico parece ter sido uma solução
prudente, dado que, além de não haverem consensos nem mesmo dentro dos PLP
analisados sobre qual seria este valor, isto flexibiliza a possibilidade de gasto com este tipo
de despesa para a o que for necessário, sem ter que ficar preso a um limite
predeterminado.
É importante ressaltar que esta nova proposta continua valorizando uma cultura
política de responsabilidade fiscal, dado que mantém a maioria do restante do texto da lei
original e condiciona a possibilidade desta flexibilização à adesão aos programas federais,
à aplicação mínima dos recursos para cada uma das três áreas e à adoção das medidas
necessárias para a arrecadação das receitas e cobrança da dívida ativa.
Ademais, também é pautada neste substitutivo a obrigatoriedade de que todos os
entes federados incluam seus dados contábeis e fiscais nos sistemas de informação da
683
união. Isto certamente será um ganho, pois permitirá um maior acesso a situação fiscal de
todos os entes federados, promovendo possibilidades de melhorias para a condução
político-econômica estadual e nacional, assim como o controle social e a realização de
estudos acadêmicos.
Atualmente, o trabalho da comissão especial encontra-se encerrado e o referido
substitutivo deverá ser aprovado em plenária da Câmara dos Deputados, para
posteriormente ser encaminhado para aprovação pelo Senado Federal e, por fim, à sanção
do Presidente da República. Apesar de estar em regime de urência, a matéria ainda não foi
apreciada em face do encerramento da sessão por mais de 70 vezes, delongando esta
importante decisão para a gestão do sistema público de saúde.
Considerações finais
Este ensaio propiciou a reflexão sobre o caso da LRF brasileira e sua relação com o
SUS. Trata-se de uma temática polêmica, sobre a qual emerge uma diversidade de
discursos que são sustentados por racionalidades distintas. Por um lado, há uma ênfase
em aspectos econômicos, que remontam a necessidade de um controle de gastos e do
desenvolvimento de uma cultura de responsabilidade na gestão fiscal da administração
pública, enquanto que, por outra vertente, se dá ênfase na necessidade de avanço nas
políticas sociais, como na consolidação do SUS.
Identifica-se que o Estado brasileiro se encontra numa situação paradoxal: garante
constitucionalmente um sistema de saúde universal e integral, e, ao mesmo tempo, possui
uma legislação fiscal que não permite efetivar o direito à saúde tal como garantido. Devido
a isso, os gestores públicos que buscam efetivá-lo, são punidos pelos órgãos
fiscalizatórios. Diferentes setores da sociedade têm se mobilizado para a superação deste
entrave, mas, conforme foi demonstrado neste trabalho, este é um processo complexo e
lento, que ainda vai exigir muitos esforços para que realmente se modifique.
Referências
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Saúde: relatório final. Brasília: Ministério da Saúde; 2001.
686
O papel do ministério público no dever do estado de fornecimento de
biotecnologias para pessoas com deficiência
Introdução
687
continuativas e impeditivas do desenvolvimento pleno das pessoas, e da sociedade como
um todo, consubstanciado em hipótese de inconstitucionalidade a ser debelada à luz de
uma hermenêutica constitucional atenta aos direitos humanos de pessoas que possuam
algum tipo de deficiência física ou surdez.
Para realização da presente investigação foi necessário aplicar o método dogmático,
como a hermenêutica dos textos normativos recomenda, mas também o aporte à doutrina
e à transversalidade foram necessários, desde que se trata de tema interdisciplinar de
elevado teor político e sociológico, tudo alinhavado por uma tradição de pensamento
racionalista igualitária.
Por fim, a investigação em mãos representa um convite ao leitor interessado em
saber mais sobre as reais possibilidades que o Estado brasileiro oferece as pessoas com
deficiência física e surdez em matéria de acesso a emprego, dignidade humana e justiça
social.
Metodologia
Resultados
688
A teoria da reserva do possível não pode ser aplicada quando a vida e a saúde
estiverem em risco, porque a dignidade da pessoa humana deve prevalecer. Assim, já
decidiu o Superior Tribunal de Justiça usando entendimento do Supremo Tribunal Federal.
(STJ. Recurso Especial n. 784.241/T2. RS. Relatora: Min. Eliana Calmon. Julgamento: 8-4-
2008).
Em outro caso o estado usa a teoria da reserva do possível para não fornecer
cadeiras de rodas motorizadas para criança tetraplégica. (TJES. Processo: AI
24100915131 ES 24100915131. Relator: Ronaldo Gonçalves de Sousa. Julgamento: 22-3-
2011. Órgão Julgador: Terceira Câmara Cível. Publicação: 31-3-2011).
Em Ação Civil Pública promovida pelo Ministério Público contras as fazendas públicas
do estado e município de São Paulo, o judiciário assegurou o direito a saúde para pessoa
hipossuficiente e deficiente física e mental. (TJSP. Processo: APL 51264320088260360 SP
0005126-43.2008.8.26.0360 Relator: Peiretti de Godoy. Julgamento: 19-10-2011. Órgão
Julgador: 13ª Câmara de Direito Público. Publicação: 20-10-2011).
O Supremo Tribunal Federal tem decidido que os planos e a legislação do direito a
saúde das pessoas com deficiências estão em vigor, mas carece de efetividade. Assim,
não pode o poder público deixar de cumprir dizendo que as normas são meramente
programáticas, que não tem planos ou programas de atuação do governo. (Precedentes:
RMS 17449/MG DJ 13.2.2006; RMS 17425/MG, DJ 22.11.2004; RMS 13452/ MG. DJ 7-10-
2002).
A Defensoria Pública da União (DPU) ajuizou Ação Civil Pública de nº 0007197-
51.2011.4.02.5101 (2011.51.01.007197-7), em face da União Federal, do Estado do e do
Município do Rio de Janeiro, alegando que Sistema Único de Saúde fornece apenas
implante coclear unilateral e não fornece a manutenção dos mesmos. O pedido é para que
sejam fornecidos implante bilateral e manutenção. Com requerimento de tutela antecipada,
para que os entes federados forneçam para adultos e crianças: a) implantes bilaterais; b)
sistema FM; c) manutenção (compra de acessórios, concertos, trocas, atualizações); d)
reposição em caso de perda; e) terapia fonoaudiológica.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro deferiu em parte a tutela antecipada, para
que os entes federados forneçam no prazo de 10 meses, e que o Sistema Único de Saúde
passe a se responsabilizar pela realização de implantes bilaterais, com uma porcentagem
de 30 para cada 100 implantes realizados.
689
O Tribunal de Justiça de Pernambuco, em Agravo de Instrumento o relator Antonio
Fernando de Araújo Martins obrigou plano de saúde a fornecer implante coclear a uma
criança segurada. (APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. SEGURO SAÚDE. IMPLANTE
COCLEAR EM MENOR IMPÚBERE. COBERTURA DEVIDA. Agravo de Instrumento nº
245818220108170001 PE 0009818-79.2010.8.17.0000, Órgão Julgador: 6ª Câmara Civil,
julgamento: 09/11/2010).
Discussão
690
O direito à saúde é umas das dimensões do mínimo existencial à dignidade da
pessoa humana (1).
Os direitos fundamentais são bidimensionais, por conta de duas grandezas, uma
jurídico-positiva e outra jurídico-subjetiva, as dimensões positivas tem por partida a
continuação saudável e cumprimento dos direitos fundamentais, já as dimensões negativas
tem como objetivo proteger e rodear a ordem jurídica do indivíduo. È justamente baseado
nesse estudo, que os autores neste artigo procurarão demonstrar a legitimidade do
Ministério Público para a defesa do direito fundamental das pessoas com deficiências, em
adquirir através do estado as biotecnologias (2).
O modelo da ICIDH concluiu que as pessoas com deficiência portam uma certa
desvantagem na vida social, e esse desvantagem advém das barreiras impostas pela vida
em sociedade. Partindo desse raciocínio, as pessoas com deficiência tem que superar
essas desvantagens, através ora da cura ou ora da reabilitação dependendo do caso (3).
O Brasil inseriu no ano de 2011, um Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com
Deficiência para assegurar o direito à saúde das pessoas com deficiência garantido pela
convenção, o “Plano Viver sem Limite”, esse plano tem como objetivo, a promoção,
utilizando políticas, programas e ações. Coordenado pela Secretaria de Direito Humanos
(Decreto n.º 7.612/2011)
Pela dimensão jurídico-positiva, o direito a saúde a integridade física é um princípio
constitucional especial, estimulador de vários outros princípios, como a dignidade da
pessoa humana, cidadania e eficiência (4).
O judiciário tem que garantir que essas metas e ações do plano não sejam
descumpridas pelo estado, alegando o principio da reserva do possível, teoria essa surgida
quando o Tribunal Constitucional Alemão que já decidiu que algumas contraprestações
estatais ficam condicionadas ao principio da razoabilidade (5).
Obstruir o direito a saúde significar contrariar a própria Constituição, autorizando o
Ministério Público a promover uma ação, na qualidade de guardião do patrimônio público
em sentido amplo O Ministério público pode e deve defender o patrimônio moral do Estado,
tendo, uma imagem a guardar para o povo (6).
O art. 129, II, da Constituição Federal de 1988, diz que uma das principais funções do
Ministério Público, juntamente com outros atos infraconstitucionais, a exemplo da LC
75/93, art. 6º, VII, b; Lei n. 8.625/93, art. 25, IV, b, Lei n. 8.247/92, art, 17, é a proteção ao
691
patrimônio público e social. Neste contexto, garantir o acesso a saúde tem legitimidade,
juntamente com defesa da ordem jurídica e o regime democrático.
Dentro da dimensão jurídico subjetiva dos direitos fundamentais a saúde e
integridade física, pode-se entrever os interesses defendidos coletivamente pelo Ministério
Público (7).
O direito difuso é quando existe uma ligação em que se unem pessoas
indetermináveis. No caso do acesso a saúde das pessoas com deficiência, a ligação fática
é determinada pela circunstância de interligar um grupo de pessoas juridicamente aptas a
fazerem uso das biotecnologias. Todos têm interesse na correta aplicação do Direito (8).
Como afirma Leonel:
Outro instrumento que o Ministério Público pode usar, em favor das biotecnologias
para pessoas com deficiência, é o enforcement, o qual pode ser conceituado como os
mecanismos que estimulem e imponham o respeito às leis. São muitos os meios usados
na aplicação da lei:
692
isenção de IPI para os equipamentos e aparelhos, inclusive eletrônicos, destinados a
pessoas portadoras de deficiências física, auditiva, visual e mental) (12).
Portanto, o Ministério Público é legitimado para a defesa do direito das pessoas com
deficiência em brigarem pelo fornecimento de biotecnologias, tanto na dimensão jurídico-
objetiva, como protetor do ordenamento jurídico, bem como na dimensão jurídico-subjetiva,
como defensor dos direitos coletivos em sentido amplo.
Conclusão
693
Fato é que o Estado invés de promover a participação das pessoas com surdez tem
obstruído o acesso ao trabalho dessas pessoas portadoras de necessidades especiais.
Essas deficiências sensoriais (audição) são muito significativas para a percepção de
mundo e desenvolvimento intelectual dos seres humanos, uma vez que acarreta segundo
a medicina legal a perda da metade dos sentidos mais importante da espécie humana,
essa alteração gerou uma desigualdade com discriminação distorcida da qual prejudicou
ainda mais os portadores dessas patologias, pois essas pessoas continuam sendo
discriminadas no mercado de trabalho da ampla concorrência, seja em concursos públicos
que exijam aptidão plena do candidato, ou seja em empresas privadas.
Se a CF tem como fundamentos os valores sociais do trabalho e tem como um dos
objetivos a serem alcançados, a diminuição de todas as formas de desigualdade, não tem
sentido dentro do universo dos deficientes auditivos fazer discriminação ou dar
preferências aos deficientes entre si. Como nos ensina o pensamento imortal de
Aristóteles: ‘tratar os iguais igualmente e os desiguais, desigualmente, na medida de sua
desigualdade’.
A aplicação do princípio da igualdade ou isonomia, tendo em vista que por este
princípio a atuação do Estado deve estar em harmonia com o direito compreendendo este
as suas regras e princípios, terá grande função na democratização da legalidade estrita,
pois quando se estudar o objetivo teleológico dos princípios da dignidade da pessoa
humana, proporcionalidade, razoabilidade, eficiência, finalidade, se verificará que a
legalidade estrita acaba prejudicando as garantias do cidadão, e que se aplicar a igualdade
e isonomia para melhor utilização desses institutos, princípios e teorias, no sentido de
salvaguardar direitos dos cidadãos quando aplicado a seara proteção do estado ao
deficiente no mercado de trabalho público-privado, permitindo assim assegurar as
garantias do cidadão perante o poder afirmativo estatal, embasado em um Poder público-
privado Eficiente, um poder público-privado participativo e integrador.
No que concerne à aplicação dos princípios mencionados na formulação do problema
desse projeto à luz do princípio da igualdade ou isonomia como elemento democrático da
legalidade administrativa sintetizando a finalidade de cada um desses princípios verificar-
se-á a importância da utilização do princípio da dignidade da pessoa humana para
democratizar a legalidade administrativa quando aplicada ao caso concreto, pois somente
694
democratizando a legalidade administrativa se terá à efetiva utilização dos princípios gerais
do direito administrativo pelos aplicadores do direito.
Enfim, a Administração Pública, estaria sendo mais proporcional, razoável, sem
desrespeitar a dignidade da pessoa humana, procurando diminuir todas as formas de
desigualdade, as desigualdades existentes entre os deficientes e os não deficientes e entre
os deficientes entre si, seriam melhor trabalhadas proporcionalmente na medida das suas
desigualdades.
Referências
695
Reflexos administrativos do processo de judicialização da saúde no município
de Palmas-TO
Introdução
696
garantir a prestação da tutela jurisdicional conquistada, o que na maioria das vezes
fragiliza a assistência integral à população em geral.
Nesse sentido, é importante analisar as repercussões da judicialização da saúde na
organização administrativa da Secretaria Municipal de Saúde de Palmas-TO identificando
os mecanismos que a gestão pública municipal tem elaborado para enfrentamento mais
racional dos entraves que surgem no decorrer do processo.
Metodologia
Resultados e discussão
697
Nesse sentido, refletir sobre o processo de judicialização da saúde levando-se em
consideração os aspectos peculiares da esfera municipal é imprescindível para
identificação de pontos que merecem melhor atenção do gestor para a proposição de
soluções viáveis e efetivas frente ao crescente número das demandas judiciais.
Ocorre que a maior parte das liminares concedidas estabelece um prazo diminuto
para que o medicamento seja dispensado ao usuário, nota-se que nesse breve intervalo se
faz necessário a instrução do processo, aquisição, entrega do medicamento ou produto
pela empresa e a dispensação ao paciente. Quando se tratam de medicamentos que não
são padronizados e consequentemente não integram nenhum Programa é bem provável
que também não estejam disponíveis no estoque e é diante desses fatos que para
atendimento à demanda judicial solicita-se a aquisição por dispensa de licitação por
emergência ou declaração de inexigibilidade por exclusividade, encontrando
fundamentação legal, respectivamente, o inciso IV do artigo 24 e o inciso I do artigo 25,
ambos da Lei n. 8.666/93 (2).
Nesse contexto, sendo a perspectiva do aumento da judicialização algo concreto, se
faz necessário refletir a respeito de alternativas que possam diminuir a sua incidência ao
passo que se busca despertar os vários setores da gestão pública para propositura de
soluções mais rápidas e viáveis para as demandas judiciais sem, contudo, desconsiderar a
dimensão política da judicialização em saúde, que exige, na maioria das vezes, soluções
coletivas a curto, médio e longo prazo.
Reflexos administrativos
698
podem ser feitas com Cartão Corporativo são aquelas passíveis de enquadramento como
Suprimento de Fundos.
Entende-se por Suprimento de Fundos o adiantamento concedido a servidor, a
critério e sob a responsabilidade do Ordenador de Despesas apresentando prazo
determinado para aplicação e comprovação de gastos. As despesas com recursos de
Suprimento de Fundos somente serão consideradas elegíveis quando restarem
demonstrados: pequeno vulto, o caráter excepcional da aquisição, a impossibilidade e a
vantagem de não serem submetidas ao processo normal de aplicação e o interesse público
(3).
A respeito das demandas judiciais envolvendo medicamentos foi publicado o Decreto
nº 1.279, de 29 de julho de 2016, o qual disciplina procedimentos a serem adotados pelos
servidores públicos municipais na prescrição de medicamentos e na solicitação de exames
e procedimentos de saúde:
699
Assim, a criação de espaços que possibilitem diálogos e articulações entre esses dois
campos têm a capacidade de aperfeiçoar tanto o cotidiano dos processos decisórios,
judiciais e sanitários quanto estimular a formação e aperfeiçoamento de recursos humanos
capazes de atuar na interface saúde e direito de forma mais consciente e, portanto, mais
efetiva.
Sendo assim, o Núcleo de Estudos Jurídicos (NEJS) criado pela Fundação Escola
Saúde Pública de Palmas em Portaria Conjunta com a Secretaria Municipal da Saúde
(portaria institucional Nº 17/SEMUS/FESP, de 29 de junho de 2016) tem funcionado como
uma das estratégias para acompanhamento e apoio às demandas relativas à saúde
pública, no âmbito do Poder Executivo municipal a fim de estimular a prática de estudos
jurídicos tendo como eixo a melhoria na perspectiva da diversidade em todos os níveis
facilitando assim a interlocução fundamentada entre os diversos setores que são
impactados pela Judicialização na busca de soluções viáveis e mais justas tanto para
Gestão Pública como para os usuários do Sistema Único de Saúde local.
O Núcleo é composto atualmente por 13 (treze) integrantes os quais recebem para
execução de suas atividades bolsa de desenvolvimento científico com fulcro no art. 26 da
Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, contando com representantes em sua maioria
da Assessoria Jurídica, Comissão Especial de Credenciamento (COMEC), Núcleo de
Apoio Técnico em Saúde (NAT), Vigilância Sanitária, Auditoria, Fundação Escola Saúde
Pública de Palmas.
A coordenação do NEJS fica sob a responsabilidade de representante indicado pela
gestão com lotação na Assessoria Jurídica
Busca-se com a iniciativa otimizar a problemática da Política Pública, por meio de
iniciativas que têm como base a identificação de evidências que apontam as necessidades
de cooperação/apoio a ser desenvolvido junto ao gestor, tanto para dirimir conflitos de
judicialização da saúde, quanto para exercer o alinhamento dos projetos com as diretrizes
do Sistema Único de Saúde, tornando ferramenta fundamental no âmbito da gestão.
Para isso o Núcleo tem como objetivos fortalecer e consolidar a prática da pesquisa
jurídica no âmbito do SUS; desenvolver parcerias através de experiências que focalizem a
qualidade através do exercício do direito pelos sujeitos demandatários; exercitar atividades
que dialoguem com as diversas áreas de conhecimento na produção de práticas jurídicas;
700
promover ações que demandem celeridade aos processos; fomentar o uso das novas
tecnologias e ferramentas de comunicação em ambientes virtuais de aprendizagem.
Prioriza-se o desenvolvimento de mecanismos técnicos, estratégias organizacionais
de qualificação das ações em saúde, o fortalecimento das equipes técnicas, a realização
de estudos e pesquisas com a divulgação de informações estratégicas, trabalhos estes
pautados pela concepção de atender as especificidades da gestão no âmbito do SUS,
tendo como base um amplo processo de cooperação, envolvendo além dos servidores,
gestores e as instituições de ensino e pesquisa.
Com a execução dos planos de intervenção individuais com foco nos setores
envolvidos objetiva-se conferir à Administração Pública da Secretaria Municipal de Saúde
meios viáveis para se assegurar o alcance dos Princípios da Administração Pública quais
sejam, Eficiência, Eficácia e Economicidade dentro de um contexto onde são priorizados
os Princípios e Diretrizes do Sistema Único de Saúde.
701
pedido de uma das partes do processo com a finalidade de avaliar certa situação e dados
pré-existentes no processo, servindo para o livre convencimento do magistrado, permitido
pela lei e não como documento postulatório ou probatório no sentido estrito do processo.
Logo, esse parecer se aproxima de uma consulta que o magistrado pode realizar a
documento técnico ou profissional que seja de sua confiança, com a diferença que o NAT
está institucionalizado existindo recomendação da gestão judiciária quanto ao uso desse
tipo de assessoria pelos magistrados (4).
O Núcleo possui uma equipe mínima composta por 01 presidente, 01 assistente
administrativo, 01 bacharel em Direito, 01 enfermeiro, 01 farmacêutico, 01 nutricionista,
sendo que a secretaria da saúde disponibiliza, quando necessário, um médico especialista
que auxilia na elaboração de pareceres (5).
Os pareceres do NAT influenciam na decisão do magistrado no ano de 2014 dos
processos em que o NAT estadual emitiu parecer, 52,98% foram acatados totalmente,
17,88% foram acatados parcialmente, atingindo um montante de 70,86% de decisões em
harmonia com o parecer emitido pelo Núcleo (5).
Em especial, no município de Palmas, o Núcleo de Apoio Técnico (NAT) foi instituído
por meio da Portaria Nº 468/SEMUS/GAB, de 27 de maio de 2016, publicado no Diário
Oficial do Município de Palmas N° 1.511.
Cabe ainda ao Núcleo de Apoio Técnico o fornecimento de informações sobre a
previsão de existência ou não de políticas públicas nos casos concretos. Desta forma, as
notas técnicas emitidas pelo NAT devem indicar se os documentos que porventura sejam
juntados aos autos estão em observância aos aspectos exigidos pela Política Pública do
SUS, sendo responsável ainda pela emissão de informações nas fases pré-processual e
processual.
No ano de 2014 (janeiro a dezembro), foram encaminhadas 775 consultas ao NAT
estadual, 286 judiciais e 489 extrajudiciais. Em 2015, essas consultas totalizaram 1.361
sendo 511 judiciais e 850 extrajudiciais. Observando-se um aumento significativo de mais
de 75% no número de consultas (6).
Levantamentos sobre a atuação do NAT municipal revelam que entre os meses de
agosto a dezembro de 2016, o NAT de Palmas emitiu 52 Notas Técnicas tendo como o
principal demandante a Defensoria Pública do Estado do Tocantins
702
Dessas Notas Técnicas 44 (quarenta e quatro) são extra-judiciais e 8 (oito) judiciais,
não sendo possível determinar no momento quantas das demandas extra-judiciais
sofreram processo de judicialização, assim como, ainda não é possível definir quantos dos
pareceres emitidos foram acatados pelos magistrados por ainda não terem sido emitidas
sentenças.
Contudo, é interessante destacar que dados provenientes do sistema adotado pela
Prefeitura Municipal de Palmas-TO, sistema PRODATA, com base em dados fornecidos
pelo setor de finanças da Secretaria Municipal de Saúde de Palmas e Secretaria de
Finanças, revelam um valor crescente de gastos com demandas judiciais até o ano de
2015 com um declínio de 20,6% em 2016 coincidindo com a implantação do Núcleo de
Apoio Técnico (NAT) de Palmas.
Conclusão
703
diferentes esferas da saúde , com o Estado e a União, com Judiciário e com os próprios
usuários do Sistema Único de Saúde a fim de que vias administrativas sejam utilizadas
antes de se utilizar de forma desnecessária ou abusiva o litigioso judicial, tratando-se
nesse sentido, de uma possibilidade na verdade de se fortalecer a juridicização das
relações sociais no âmbito do SUS.
Referências
704
A Responsabilidade Civil do Estado pelos danos causados por Organizações
Sociais na prestação de serviços públicos de saúde
Introdução
A responsabilidade civil do Estado significa o dever de reparação dos danos
causados pela conduta estatal, comissiva ou omissiva (1).
O art. 37, § 6º da Constituição Federal e o artigo 43 do Código Civil, preveem que o
Estado responde objetivamente pelos danos que seus agentes causarem a terceiros,
admitindo-se algumas excludentes de responsabilidade, tais como a culpa exclusiva da
vítima e o caso fortuito (2).
Como vivemos num estado democrático de direito, a forma encontrada de dividir os
ônus e encargos sociais é distribuir por toda a coletividade, as consequências danosas do
funcionamento do serviço público.
Impera a teoria do chamado risco administrativo, em que se estabelece a
responsabilidade do Estado pelos danos que os seus agentes causem a terceiros. Não se
perquire se o agente público causador do dano agiu com dolo ou culpa, a pessoa jurídica
de direito público sempre responderá, desde que se estabeleça um nexo de causalidade
entre o ato da Administração e o prejuízo sofrido. É a denominada responsabilidade
objetiva.
Tema de intensos debates doutrinários e jurisprudenciais estabeleceu-se sobre a
responsabilização do Estado pelos atos omissivos. Há autores que entendem que a
responsabilidade também seria objetiva, outros entendem que seria subjetiva e, portanto,
imprescindível a demonstração de culpa.
705
Apreciando recentemente a questão, o Supremo Tribunal Federal decidiu que:
[…]
“as pessoas jurídicas de direito público respondem objetivamente pelos
danos que causarem a terceiros, com fundamento no art. 37, § 6º, da
Constituição Federal, tanto por atos comissivos quanto por atos omissivos,
desde que demonstrado o nexo causal entre o dano e a omissão do Poder
Público” (STF, 2ª T., ARE 868.610 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em
26.05.2015).
Fator de destaque na nova ordem constitucional, diz respeito à responsabilidade
objetiva das pessoas jurídicas de direito privado, prestadoras de serviços públicos.
Tal como as pessoas jurídicas de Direito Público, a empresa pública, a economia
mista e os concessionários, permissionários e autorizatários de serviços públicos estão
sujeitos ao mesmo regime da Administração Pública no que respeita à responsabilidade
civil (3).
Esses prestadores de serviços públicos (art. 175 da C.F.), que responderão
objetivamente, não podem ser confundidos com as empresas que executam atividades
econômicas (que estão sujeitas ao regime jurídico das empresas privadas – art. 173 e § 1º
da C.F.). Estas até poderão responder subjetivamente, mas não com base na Constituição
Federal (como aquelas), mas sim no art. 12 ou 14 do Código de Defesa do Consumidor ou
do art. 927 do Código Civil.
Eventual indenização a ser paga por esses particulares prestadores de serviços
públicos, deverá ser suportada com o seu próprio patrimônio. E não o Estado por elas e
nem com elas. No máximo, poder-se-ia falar em responsabilidade subsidiária do Estado,
uma vez exauridos os recursos da entidade prestadora de serviços públicos. Se o Estado
escolheu mal aquele a quem atribuiu a execução de serviços públicos, deve responder
subsidiariamente caso o mesmo se torne insolvente (3).
Quando o Estado presta serviços públicos na área da saúde, seja diretamente ou
através de terceiros, podem ocorrer acidentes de natureza pessoal, que ocasionam danos
irreparáveis, às vezes fatais, em virtude de culpa, por imprudência, negligência ou
imperícia.
A saúde é direito de todos e dever do Estado, consoante dispõe o art. 196, da
Constituição Federal. O texto constitucional, dispõe, ainda, no art. 197, que as ações e
serviços públicos de saúde são de relevância pública, e que a execução desses serviços
deve ser feita diretamente pelo Poder Público ou através de terceiros e, também, por
pessoa física ou jurídica de direito privado.
706
Atualmente, a prestação de serviços públicos de saúde por meio de organizações
sociais, tem se tornado medida crescente no Brasil. E, com esse novo modelo de gestão,
que surgiu com o advento da Lei n. 9.637/98, o Poder Público celebra contrato de gestão
com essas entidades, de onde surgem inúmeros debates acerca da responsabilização
pelos danos causados a terceiros, se do Poder Público ou a Organização Social, e ainda
se há solidariedade entre as referidas pessoas jurídicas.
Este artigo visa a abordagem dessas indagações, e sem pretensão de esgotar a
discussão, pretende-se contribuir para que questões desse cunho sejam debatidas de
forma mais profunda.
Metodologia
O presente estudo descritivo foi realizado com base em pesquisa bibliográfica com o
objetivo de verificar a literatura que versa sobre a responsabilidade civil do Estado na área
da saúde e as organizações sociais.
Realizou-se, ainda, pesquisa jurisprudencial na base de dados do Tribunal de Justiça
de São Paulo no endereço eletrônico <www.tjsp.jus.br> (acesso em março e abril de
2017), selecionando-se algumas decisões existentes sobre a questão, visando a constatar
qual entendimento tende a prevalecer. Foram utilizados como descritores
“responsabilidade civil do estado por erro médico”, “indenização por erro médico” e
“responsabilidade civil das organizações sociais”, excluindo os recursos que não diziam
respeito a pedido de indenização em razão de falha no serviço de saúde prestado por
organizações sociais.
Resultados e discussão
A responsabilidade civil do estado na área da saúde
A responsabilidade estatal pelos danos sofridos pelos usuários do serviço de saúde
em hospitais públicos, bem como naqueles que têm convênio com o INSS, deverá ser
informada pela teoria objetiva, pois se trata de responsabilidade de agente do Poder
Público. Esse tipo de responsabilidade só é elidível com prova de caso fortuito ou de força
maior ou, ainda, por falta de nexo causal entre o fato e o dano, como no caso de culpa
exclusiva da vítima (4).
É objetiva, pois fundada na culpa anônima da Administração ou na falha do serviço
médico prestado. Mas não chega a ser considerada como de risco integral. Para o
707
reconhecimento dessa responsabilidade, deve-se partir do pressuposto da precariedade ou
deficiência do serviço prestado, não se admitindo a inversão do ônus probatório do Código
de Defesa do Consumidor (4).
Essa responsabilização estatal somente ocorrerá se configurada a falha estatal e
identificado como causa do evento danoso reclamado pela vítima ou seus dependentes; a
simples lesão incapacitante ou a morte do paciente inserem-se no risco natural do
tratamento médico, ainda que prestado por agente do estado, pois também aqui a
recuperação do doente ou lesado não deixa e representar uma obrigação de meio e não
de resultado; o que se pode admitir, em sede de responsabilidade civil da entidade estatal,
é apenas uma presunção de que o agravamento da moléstia ou o perecimento do paciente
tenham tido a sua causa na deficiência, precariedade ou emissão do serviço médico-
assistencial prestado pelo hospital, a se permitir a contraprova de uma alegada excludente
da causa pretendida, no sentido da demonstração de que o dever jurídico do Estado foi
razoavelmente cumprido através da prestação de um serviço adequado e compatível; em
outros termos, no sentido de que o evento danoso não encontra a sua causa numa
pretensa falta do serviço público; a esta causa excludente de responsabilidade
acrescentam-se as excludentes do caso fortuito ou da força maior, do fato imputável ao
próprio paciente ou a terceiros (4).
Não elide a responsabilidade estatal, em nenhum caso, e principalmente em função
do art. 37, § 6º, da Constituição, ter ocorrido o evento danoso em hospital ou
estabelecimento conveniado, havendo assim “verdadeira sub-rogação da preposição”: o
serviço prestado pelo nosocômio, enquanto conveniado promotor da saúde coletiva, é
público (4).
708
tendentes à modernização e aperfeiçoamento de gestão pública, com o objetivo principal
de melhorias na prestação dos serviços públicos e no atendimento ao cidadão.
E essas medidas de modernização do Estado previam a possibilidade de alguns
serviços públicos serem executados por meio de parceria entre o Poder Público e pessoas
jurídicas de direito privado que atuassem em determinadas áreas de interesse público e
pudessem ser habilitadas como gerenciadoras de instituições prestadoras de serviços nas
áreas de educação, saúde, cultura, esporte e lazer.
Os defensores desse Programa de Publicização advogavam que certas atividades
que não eram exclusivas do Poder Público, mas eram executadas por ele, melhor seriam
executadas pelo setor privado.
Nesta esteira, em 15 de maio de 1998 foi aprovada a Lei Federal n. 9.637 criando
essa nova figura jurídica (Organização Social – OS), e definindo que pessoas jurídicas de
direito privado sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa
científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à
cultura e à saúde, seriam qualificadas como organização social.
Essa norma geral, que orienta o processo de criação e habilitação das organizações
sociais nas três esferas de governo, após sofrer severas críticas da doutrina e ser
impugnada por meio de ADI (ADI 1.923), teve sua constitucionalidade declarada pelo STF
em abril de 2015, e atualmente é um modelo de gestão, principalmente na área da saúde
de diversos entes federados.
A responsabilidade direta pela administração da unidade de saúde é das
Organizações Sociais, mas o serviço de saúde continua sendo público, com os seus bens,
mobiliários e equipamentos pertencendo ao Estado.
A relação das OS com o Estado seguirá os termos estabelecidos no contrato de
gestão, que é o seu instrumento legal. O vínculo jurídico existente entre elas e o Estado
não objetiva a delegação de atividade estatal, mas apenas o fomento de atividades
privadas que satisfazem interesses sociais, elas não integram a administração indireta e se
distinguem das empresas públicas, autarquias, fundações públicas ou sociedades de
economia mista, principalmente no tocante à responsabilidade civil (1).
O primeiro estado brasileiro a admitir essa modalidade de gestão foi São Paulo, por
meio da Lei Complementar nº 846, de 4 de junho de 1998 (São Paulo, 1998), editada um
mês após a Lei Federal n. 9.637/98.
709
Passadas quase duas décadas após a promulgação da lei retromencionada, esse
modelo de gestão vem se consolidando na prestação dos serviços de saúde no Brasil, e
diversos estados e municípios têm adotado as OS como proposta governamental no setor
de saúde.
A título de exemplo, vale citar o Município de Santos, que passou a adotar referido
modelo de gestão com a promulgação da Lei n. 2.947, de 17 de dezembro de 2013. E, a
partir de então, já foram firmados 2 (dois) contratos de gestão: com a Organização Social
Fundação ABC, para a execução dos serviços de saúde da UPA Central; e com o Instituto
Social Hospital Alemão Oswaldo Cruz – para a execução dos serviços de saúde no
Hospital dos Estivadores.
710
regulada pelo Código Civil. É que esses entes não têm fins lucrativos e sua
função é de auxílio ao Poder Público para melhorar o resultado de certas
atividades de interesse público e do próprio Estado. Assim, não se nos
afigura que esse tipo de parceria desinteressada e de cunho
eminentemente social carregue o ônus da responsabilidade objetiva,
quando, sem a parceria, estariam as referidas pessoas reconhecidamente
sob a égide do Código Civil”.
Para o citado autor, o correto seria responsabilizar o ente federativo que firmou a
parceria, porque é o Estado que se sujeita ao risco administrativo.
Há também entendimento de que a responsabilidade é subjetiva, porque a OS é
entidade privada de relevância social e presta serviço em nome próprio, sendo que o
vínculo com o Poder Público não é de delegação do serviço, mas sim de parceria para a
consecução de finalidades sociais, não podendo se sujeitar à aplicação do art. 37, § 6°da
CF (1).
Alguns autores entendem que a responsabilidade é objetiva, pois são pessoas
jurídicas prestadoras de serviço público (7).
Há os que entendem que a responsabilidade estatal é sempre objetiva nos termos do
art. 37, § 6° da CF, e que há a ação de regresso contra a OS (8).
Outros (1) entendem que a responsabilidade é subsidiária, porque a atividade é
desempenhada em parceria, que inexiste solidariedade porque esta não pode ser
presumida, ou decorre da lei ou do contrato, e inexiste norma legal atribuindo solidariedade
ao Estado com os prestadores de serviços públicos; o vínculo jurídico entre o ente estatal e
a OS é de convênio, atraindo a incidência do art. 70 da Lei de Licitação – 8.666/93, que
fixa a responsabilidade primária do conveniado por danos causados a terceiros, na forma
do art. 116 da mesma lei.
Entretanto, o art. 9° da Lei n. 9.637/98, traz regra de responsabilidade solidária do
ente estatal se, ao tomar conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, não
comunicar ao Tribunal de Contas da União.
Nessa linha, ao Estado caberia a responsabilização na modalidade subsidiária, ou
seja, apenas se os bens da entidade não forem suficientes para adimplir a reparação ou
indenização, pelo dano causado a terceiro, se se omitir do dever de fiscalização.
Celso Antônio Bandeira de Mello (9) sustenta ser subjetiva a responsabilidade da
Administração sempre que o dano decorrer de uma omissão do Estado. Porém, referido
autor pontua que há que se fazer a distinção entre omissão genérica e omissão específica.
711
Entende-se não ser correto dizer, sempre, que toda hipótese de dano proveniente de
omissão estatal será encarada, inevitavelmente, pelo ângulo subjetivo. Assim o será
quando se tratar de omissão genérica (10).
Há omissão específica quando o Estado se omitir e criar a situação propícia para a
ocorrência do evento em situação em que tinha o dever de agir para impedi-lo (3).
Conforme já narrado no decorrer do presente trabalho, a responsabilização solidária
do agente fiscalizador deve ser considerada na modalidade objetiva (hipótese de omissão
específica), ou seja, ao Estado foi atribuído o dever individualizado de agir, pois constatada
ilegalidade ou irregularidade, na utilização de recursos ou bens de origem pública, deverá
o agente fiscalizador levar ao conhecimento da autoridade competente.
Neste ponto, se o órgão fiscalizador apurou ilegalidade ou irregularidade na
prestação desse serviço público, comunicou aos órgãos competentes, processou ou puniu
a organização social, não há que se falar em responsabilidade subsidiária do Estado.
Esse mesmo raciocínio é empregado com relação à inexistência de responsabilidade
estatal no pagamento de verbas trabalhistas, objeto de prestação de serviços terceirizados
pelo Estado.
No caso, o parágrafo 1º, do artigo 71 da Lei de Licitações (que não permite a
transferência do pagamento de encargos trabalhistas, fiscais e comerciais ao Estado, por
inadimplemento do contratado), foi declarado constitucional pelo Supremo Tribunal
Federal, nos autos da ADC 16, de 24/11/10.
Deste modo, idêntico raciocínio pode ser empregado ao artigo 9º da Lei nº 9.637/98;
ou seja, somente quando houver falha na fiscalização do contrato de gestão ou do termo
de parceria é que o Estado poderá ser responsabilizado por danos eventualmente
causados por uma organização social e, mesmo assim, somente se o seu patrimônio não
suportar a indenização devida ao prejudicado.
Na jurisprudência o tema ainda é muito incipiente, e dos dados coletados constatou-
se que embora o debate ainda seja intenso, tende a prevalecer o entendimento de que a
responsabilidade do Estado pelos danos causados pelas organizações sociais de saúde é
subsidiária (11).
Conclusão
A proposta governamental de que os serviços de saúde sejam prestados por meio
das chamadas Organizações Sociais (OS), é tendência que vem sendo adotada no Brasil.
712
No entanto, a delegação da prestação dos serviços públicos de saúde não afasta a
responsabilidade civil do Estado, que deve responder de forma objetiva imprópria, solidária
e subsidiária, no caso de atos comissivos ou omissivos praticados pelas Organizações
Sociais enquanto prestadoras dos serviços públicos.
A responsabilidade é objetiva imprópria em razão de o dever de indenizar depender
da comprovação da culpa na conduta médica, sendo o Poder Público solidariamente
responsável pelo dano causado perante o lesado, mas com responsabilidade patrimonial
subsidiária, ou seja, somente será possível atingir o erário caso se esgotem os bens
exequíveis da Organização Social prestadora do serviço público, e ainda, assim, se se
comprovar que o ente estatal se omitiu do dever de fiscalizar adequadamente os serviços.
Referências
2. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 11ª Ed. – Rio de Janeiro:
Editora Forense. 2016, p. 171/195.
3. FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 12ª Ed. – São Paulo:
Editora Atlas. 2015, p. 340/345.
6. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 30. ed. rev.
atual. e ampl. - São Paulo: Atlas, 2016 – p. 587/588
9. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de direito administrativo. 27. ed. São
Paulo: Malheiros, 2010. p. 1012/1013
10. CASTRO, Guilherme Couto de. A responsabilidade civil objetiva no direito brasileiro.
Rio de Janeiro: Forense, 1997. p.37; apud OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende.
713
Curso de Direito Administrativo. 2.ed.rev, atual.e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São
Paulo: Método: 2014, p. 702
11. SÃO PAULO, Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – Consulta de Processos
do Segundo Grau – www.tjsp.jus.br – acesso em março e abril 2017
714
A importância da triagem nutricional no adulto hospitalizado.
RESUMO: A desnutrição hospitalar ainda é bastante frequente nos dias de hoje. Neste
contexto, todo esforço deve ser realizado para reconhecer e identificar precocemente, os
pacientes com risco nutricional, por meio de triagem nutricional, que identifica indivíduos
desnutridos ou em risco de desnutrição. A manutenção do estado nutricional é
imprescindível para a preservação e recuperação da saúde.
Palavras Chave: Desnutrição Hospitalar, Triagem Nutricional, Risco Nutricional
ABSTRACT: Hospital malnutrition is still common today. In this context, every effort should
be made to recognize and early identify patients at nutritional risk through nutritional
screening that identifies individuals malnourished or at risk of malnutrition. The
maintenance of nutritional status is essential for the preservation and restoration of health.
Key Words: Hospital Malnutrition, Nutrition Screening, Nutritional Risk
Introdução
715
processo de identificação das características que se sabe estarem associadas a problemas
dietéticos ou nutricionais. (5)
A Aspen (AmericamSociety Parenteral and Enteral Nutrition) considera que a perda
de peso, presença de doenças crônicas, aumento das necessidades nutricionais e
alterações dietéticas são fatores de risco que podem comprometer o estado nutricional do
paciente. (6)
A triagem nutricional é um procedimento que tem como objetivo identificar pacientes
desnutridos ou em risco de desnutrição, com o intuito de analisar a necessidade de uma
avaliação complementar mais detalhada.
A detecção precoce auxilia no cuidado nutricional e na prevenção de complicações,
deve ser realizada até 72 horas da admissão do paciente, podendo ser realizada por
qualquer profissional de saúde. Segundo a Aspen, em unidades de terapia intensiva essa
detecção precoce deve ocorrer em até 24 horas. (6)
O ministério da Saúde tem reconhecido a importância do rastreamento do processo
de desnutrição, por isso em 7 de março de 2005, entrou em vigor a portaria 343 que tornou
obrigatória a implantação de protocolos de triagem e avaliação nutricional para o
acompanhamento desses pacientes nos hospitais do SUS. (7)
Mesmo sabendo que com a detecção precoce do risco nutricional, é possível
minimizar ou prevenir a deterioração do estado nutricional, percebe-se na prática clínica,
muitos poucos hospitais utilizando o processo de triagem nutricional
Diante disso, o presente estudo tem como objetivo mostrar a importância da Triagem
Nutricional.
Objetivo
Analisar a importância da Triagem Nutricional.
Metodologia
A fundamentação teórica foi realizada por meio de revisão bibliográfica de artigos
científicos publicados nos últimos cinco anos, na base de dados ScientifcElectronic Library
Online (SciELO), United States National Library of Medicine (PubMed) e Medical Literature
Analysis and Retrieval System Online (MedLine), livros e portarias do Ministério da Saúde.
A estratégia de busca utilizou as seguintes palavras-chave: Desnutrição Hospitalar,
Triagem Nutricional e Risco Nutricional.
716
Discussão
717
O risco nutricional se refere ao risco do paciente desenvolver complicações em
decorrência do estado nutricional prejudicado. Portanto, a avaliação do risco nutricional é o
primeiro passo no processo de cuidados nutricionais, pois possibilita ao profissional de
saúde intervir antes do agravamento do estado nutricional. (4)
A triagem nutricional é um procedimento simples e rápido, que consiste na realização
de um inquérito ao paciente ou seus familiares com a finalidade de identificar o risco
nutricional. (2,11)
O principal objetivo da triagem nutricional é identificar rapidamente indivíduos que se
encontrem em risco nutricional, sinalizando aqueles pacientes que poderiam beneficiar-se
da terapia nutricional. Esta identificação deve ser realizada nas primeiras 24 horas a no
máximo 72 horas após a internação. (11)
Considerando a relevância da Triagem Nutricional, o Ministério da Saúde através da
portaria GM/MS Nº 343, de 07 de março de 2005 instituiu mecanismos para organização e
implantação de Unidades de Assistência e Centros de Referência de Alta Complexidade
em Terapia Nutricional, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, estabeleceu normas
técnicas e operacionais para regulamentar a aplicação desta prática. (7)
Para a identificação precoce de pacientes desnutridos e consequente intervenção,
além de prevenção da desnutrição, o ideal seria promover a conscientização dos
profissionais de saúde quanto aos aspectos nutricionais, implantando a triagem nutricional
como atividade de rotina nos hospitais, e tornando real a cobertura do Sistema Único de
Saúde (SUS) dos custos provenientes de avaliação do estado nutricional, assim como dos
materiais e equipamentos necessários à aplicação da terapia nutricional Cabe aos
profissionais de saúde instituir iniciativas educacionais para esclarecer as equipes de
saúde e a população sobre a importância do diagnóstico e do tratamento da desnutrição
hospitalar.
Conclusão
Conclui-se que a triagem nutricional deve ser, portanto, parte da atenção primária de
todos os pacientes, para maior sobrevida ao paciente a fim de prevenir a desnutrição
hospitalar e suas consequências.
A escolha do método de triagem nutricional ideal deve considerar o contexto no qual
o paciente está inserido, além de aspectos como recursos humanos e físicos disponíveis.
O melhor método será aquele que contemplar fácil acesso, baixo custo e bom prognóstico
718
Referências
1. Kondrup J, Johansen N, Plum LM, Bak L, Hojlund Larsen I, Martinsen A, Andersen JR,
Baernthsen H, Bunch E, Lauensen N. Incidence of nutritional risk and causes of
inadequate nutritional care in hospitals. ClinNutr 2002;21(6):461-8.
9. Sousa VMC, Guariento ME. Avaliação do idoso Desnutrido. Rev Bras Clin Med
2009;7:46-49
11. Gout, BS; Barker L.A; Crowe TC Malnutrition Identification, diagnosis and dietetic
referrals: Are we doing a good enough job? Nutrition & Dietetics. V. 66, p 206-211,
2009.
719
A problemática do desabastecimento de medicamentos, no âmbito do Poder
Público, em razão da falta de planejamento estruturado das licitações
RESUMO: A concretização do direito à saúde pelo Poder Público ainda é um dos assuntos
mais controversos e questionados da atualidade, uma vez que não é só a falta de
planejamento e desídia do Administrador Público em efetivar as políticas públicas que
geram o caos nesta seara, principalmente quando trata-se de fornecimento de
medicamentos à população. O problema vai muito mais além, acarretando em um estado
de violação massiva e sistêmica do direito fundamental à saúde em decorrência dos
bloqueios políticos institucionais. Assim, o presente articulado tem por objetivo apresentar
as dificuldades e soluções quanto ao planejamento e gestão da Administração Pública,
através de análise crítica com pesquisa doutrinária e jurisprudencial, concluindo-se que
somente com mais eficiência na formulação de políticas públicas, com proposição de
critérios e parâmetros, será efetivada a aquisição tempestiva dos medicamentos e outros
materiais hospitalares, evitando-se, assim, o seu desabastecimento e que o acesso a
serviços de saúde se transforme em mais um fator de iniquidade.
Palavras-chave: saúde; gestão; planejamento; licitação.
720
a falta de atas de registro de preços de medicamentos e insumos de sua responsabilidade,
segundo a Lei 8.080/90 e a lista REMUME4.
A despeito disso, não se pode olvidar que a compra de medicamentos, no Brasil,
esbarra em uma série de dificuldades, dentre as quais se insere o conluio entre sociedades
empresárias farmacêuticas, as quais, em certas ocasiões, nem mesmo participam dos
certames, a fim de forçar uma contratação emergencial com preços mais elevados que
aqueles tradicionalmente praticados no mercado. Tal fato, porém, não exime os gestores
que, quando não mancomunados com os fornecedores de medicamentos, agem com
negligência na busca por soluções concretas para o problema do desabastecimento.
Nessa linha de intelecção, cumpre lembrar que o Tribunal de Contas da União (3) tem
entendimento consolidado sobre a possibilidade de contratação emergencial, ainda que o
fato ensejador da necessidade pública tenha sido decorrente da falta de planejamento, da
desídia administrativa ou da má gestão dos recursos públicos pelo gestor.
No entanto, tal posicionamento não convalida a conduta omissiva do administrador,
uma vez que esta não pode vir em prejuízo do interesse maior tutelado pela Administração,
qual seja a coletividade. Sendo assim, o mesmo Tribunal de Contas reporta-se pela
apuração da responsabilidade do servidor, em caso de inércia dolosa ou culposa, através
de regular processo administrativo.
É verdade que, na concepção acertada do TCU, os cidadãos não podem ser
prejudicados por um ato espúrio do administrador público, a exemplo do caso de omissão
no adequado gerenciamento do estoque de medicamentos. Todavia, a dispensa de
licitação jamais poderá emergir como regra para as compras de materiais hospitalares, tal
como vem ocorrendo, diuturnamente, no Brasil, visto que o art. 24, da Lei 8.666/93 - Lei
Geral de Licitações - limita o quantitativo a ser adquirido ao que for estritamente necessário
para sanar a situação excepcional, devendo ser instaurado, de logo, o regular processo
licitatório.
Constata-se, desta feita, que não há como abastecer os principais centros de saúde
apenas com quantitativos fracionados de maneira irregular, por ducto de contratação
emergencial, sob pena de persistir o desfalque de materiais hospitalares tão caros à
concretização do direito à saúde.
721
Ademais, é inadmissível, nesse contexto, o fracionamento de licitação, para fins de
contratação direta em razão do valor. Recentemente, a título de informação, tal situação foi
objeto de investigação no Estado de Alagoas tanto pela Controladoria Geral da União
quanto pela Polícia Federal, o que se constatou um prejuízo da ordem de mais de 230
milhões de reais (4) ao Erário, e, consequentemente, à população alagoana.
O que se vislumbra, inevitavelmente, é a configuração de um estado de coisas
inconstitucional na saúde, haja vista a crise abranger a dificuldade estratégica dos três
Poderes, em adotar soluções efetivas que apaziguem o atual estado caótico do
gerenciamento da saúde.
Rodríguez Garavito e Rodríguez Franco (5) defendem que estes casos estruturais
são caracterizados por: i) afetar um número amplo de pessoas que alegam a violação de
seus direitos, diretamente ou através de organizações que litigam em sua causa; ii)
envolver várias entidades estatais como demandadas por serem responsáveis pelas falhas
sistemáticas de políticas públicas, e iii) implicar ordens de execução complexas, as quais o
juiz da causa decide a várias autoridades públicas a empreender ações coordenadas para
proteger toda população afetada, e não somente as partes do caso concreto.
Em sua evolução jurisprudencial, o ECI teve sua consolidação de requisitos para
declaração formal pela CCC na decisão T-025 de 2004 (6), quais sejam: i) violação
massiva e generalizada de vários direitos constitucionais que afeta a um número
significativo de pessoas; ii) a prolongada omissão das autoridades no cumprimento de
suas obrigações para garantir os direitos; iii) a adoção de práticas inconstitucionais; iv) a
não expedição de medidas legislativas, administrativas e orçamentarias necessárias para
evitar a violação dos direitos; v) a existência de um problema social cuja solução depende
da intervenção de várias entidades, requer a adoção de um conjunto complexo e
coordenado de ações e exige um nível de recursos que demanda um esforço orçamentário
adicional importante e vi) um iminente congestionamento judicial pelo número alto de
ações propostas.
Seguindo em convergência ao entendimento pelo estado de coisas inconstitucional,
no caso retratado da saúde no Estado de Alagoas, a Procuradoria Geral do Estado de
Alagoas (7), em parecer proferido pontuou a configuração fática desse estado de coisas
inconstitucional na saúde pública. No teor de seu posicionamento, trouxe à baila a
necessidade dos três Poderes na atuação em conjunto com o fim de cessar a falta de
722
medicamentos, sucateamento de hospitais, ausência de profissionais de saúde, além de
outras medidas necessárias para tal.
É de conhecimento que o Executivo, muitas vezes, sofre com as dificuldades para a
implementação de todas as políticas públicas necessárias ao regular aparato da saúde.
Dentre elas, destaca-se o agravamento desta crise pelo Judiciário, quando este Poder
profere, crescentemente, liminares desprovidas do necessário impacto financeiro ao Erário.
O resultado dessa microvisão do Judiciário, ao conceder tutelas específicas
indiscriminadamente, acarreta em uma interferência negativa no plano governamental de
ações e serviços que devem ser oferecidos à população como um todo (macrovisão), uma
vez que contingencia verbas de destinações mais amplas para cumprir às determinações
judiciais. Ainda, segundo Sampaio (8), a gestão dos recursos públicos e a visão transversal
das políticas públicas, não são de conhecimento do Estado-juiz, de modo que o
cumprimento das decisões em caráter individual, pode não só comprometer a integridade
das políticas públicas de saúde como também de outras áreas.
Por outro lado, nota-se a omissão do Legislativo na realização de seu papel
fiscalizatório e na edição de enunciados normativos mais consentâneos com o total
cumprimento do desígnio constitucional, sobressaindo-se a ausência até o presente
momento da Lei Complementar regulamentando a competência comum da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios no âmbito da saúde, conforme art. 23,
parágrafo único da Constituição Federal.
Desse modo, vislumbram-se reiteradas violações ao direito fundamental grafado no
art. 196, da Constituição Federal, gerando, assim, o estado de coisas inconstitucional.
É salutar, portanto, que os gestores atuem de maneira eficiente, de modo a
possibilitar a aquisição tempestiva dos medicamentos e outros materiais hospitalares, com
o escopo de evitar o desabastecimento.
O primeiro passo é fazer uma pesquisa detalhada dos tipos de demandas que são
dirigidas à Administração Pública, a fim de estimar quais os quantitativos necessários para
atender, no mínimo, um ano de fornecimento contínuo. A despeito de alguns gestores
alegarem a impossibilidade de realização de um planejamento que espelhe,
verdadeiramente, a realidade, em face das constantes determinações judiciais, o que se
pretende é, pelo menos, diminuir as interrupções das distribuições e minorar o volume de
contratações emergenciais.
723
Existem ferramentas à disposição do gestor para, levando-se em conta uma demanda
em potencial, viabilizar a contratação daquilo que for necessário ao atendimento da
necessidade pública. O registro de preços, expressamente consignado na Lei 8.666/93, em
seu artigo 15, é um instrumento efetivo que se adequa ao planejamento estratégico
imprescindível ao abastecimento dos órgãos de saúde, até porque a existência de preços
registrados não obriga a Administração a firmar contratações que deles poderão advir.
Lado outro, é fundamental que se investiguem as sociedades empresárias que não
participam dos certames licitatórios de medicamentos, mas, com frequência, são
contratadas em procedimentos emergenciais. Não é crível que as licitações sejam desertas
e, posteriormente, surja uma série de interessados em vender tais produtos para a
Administração Pública, através de procedimento de dispensa de licitação.
Nesse ponto, é fundamental que se crie uma rede estruturada entre vários órgãos
(Controladoria, Advocacia Pública, Tribunal de Contas, Ministério Público, Polícia Civil e
Federal, dentre outros), com o intuito de coibir rotineiros desvios e impropriedades na
gestão da saúde, bem como de facilitar o intercâmbio de informações, para que se tenha
uma atuação preventiva.
Ademais, é de substancial importância que os servidores responsáveis pela aquisição
de medicamentos sejam adequadamente treinados, em um modelo de compliance no
serviço público, de modo a garantir que exista um programa de integridade, com padrões
éticos suficientes a alterar modelos de conduta acostumados à ineficiência. Afinal de
contas, de nada adianta impor rotinas de trabalho profícuas, se os servidores estão
atuando em contrariedade aos interesses da Administração. Sobre o compilando, no
âmbito da Administração Pública, posiciona-se Ricardo Breier (9):
724
Postas tais considerações, percebe-se o quão amplo é o problema do
desabastecimento dos órgãos de saúde das diversas esferas federativas, de tal sorte que
não se trata apenas de mero planejamento estrutural das licitações e compras, mas sim de
uma mudança no conjunto de procedimentos hábeis a gerar mais eficiência para a
atividade administrativa, evitando, assim, o esfacelamento do orçamento estatal. E, o mais
importante, tudo em prol da concreção do direito fundamental de todo e qualquer cidadão,
o direito à saúde.
Referências
1. http://g1.globo.com/fantastico/noticia/2017/08/mesmo-com-milhoes-gastos-falta-o-
basico-no-hospital-geral-de-alagoas.html. Acesso em 13/10/2017
2. http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/vida-
urbana/2015/04/27/interna_vidaurbana,573117/desabastecimento-de-
medicamentos-na-farmacia-de-pernambuco-penaliza-pacientes.shtml. Acesso em
13/10/2017
3. Acórdão 2240/2015-Primeira Câmara, TC 019.511/2011-6, relator Ministro Benjamin
Zymler, 28.4.2015.
4. https://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/policia-federal-cumpre-mandados-de-busca-
e-apreensao-na-secretaria-da-saude-de-alagoas.ghtml. Acesso em 13/10/2017
5. RODRÍGUEZ GARAVITO, Cesar.; RODRÍGUEZ FRANCO, Diana. . Cortes y cambio
social. Cómo la Corte Constitucional transformo el desplazamiento forzado em
Colombia. Bogotá: Colección de Justicia, 2010. Disponível em: <
https://www.dejusticia.org/wp-content/uploads/2017/04/fi_name_recurso_185.pdf
6. ______. Sentencia de Tutela –T- 025.Bogotá. Relator: Ministro Manuel José Cepeda
Espinosa. Disponível em : < http://www.corteconstitucional.gov.co/relatoria/2003/t-
1030-03.htm>. Acesso em: 25 jul.2017.
7. PARECER PGE/ASS N° 139/2015 (Diário Oficial de Alagoas de 15/12/2015).
8. SAMPAIO, José Adércio Leite. Teoria da Constituição e dos Direitos Fundamentais.
Belo Horizonte: Del Rey, 2013.
9. https://www.conjur.com.br/2015-ago-20/ricardo-breier-compliance-setor-publico-
desafio-pais. Acesso em 13/10/2017
725
Eixo 6 – Comunicação e informação em Saúde
Leonardo Carnut1
Waleska de Oliveira Carvalho
Marianne de Vasconcelos Carvalho
RESUMO: Sob o marco dos Direitos Humanos, um conteúdo normativo do direito à saúde
é o direito à informação em saúde, o que, em âmbito local, significa ampliar os
mecanismos de comunicação e informação entre o sistema e o usuário. Assim este estudo
visou revisar informações consideradas essenciais para que o usuário saiba como o
sistema de saúde está organizado para lidar com a questão do câncer bucal, como forma
de concretizar o direito à informação para garantia da integralidade do cuidado nesta rede
de atenção. Para isso, realizou-se uma revisão narrativa conforme descrito por Rothers
com a perspectiva de identificar o que há na literatura sobre a articulação ‘direito à
informação’ e ‘fluxo assistencial para o câncer bucal’. As informações encontradas
puderam ser agrupadas em três grandes temas: a) informações sobre o “fluxo assistencial
e a atenção secundária à saúde como elementos do sistema de referência e contra
referência”; b) informações sobre o “câncer bucal e as respostas do sistema de serviços de
saúde frente ao problema”, e c) como/quando deve ocorrer a “referência de usuários com
lesões suspeitas de câncer bucal”. Pode-se concluir que o direito à informação para
integralidade do cuidado ao câncer bucal ainda é incipiente especialmente no que se refere
a organização normativa dos serviços e o quede fato existe na rede.
Palavras-chave: Direito à Saúde. Neoplasias. SUS. Fiscalização e Regulação em
Saúde. Informação e Comunicação em Saúde.
Introdução
O trabalho em saúde é pautado pelo princípio da incerteza da demanda (1). Por mais
que os arranjos organizacionais (como na Estratégia de Saúde da Família, por exemplo)
conformem o processo de trabalho em saúde sob a égide da programabilidade (2), o fato é
que a demanda espontânea ocorre, muitas vezes baseada na ausência de informação do
cidadão sobre o escopo de atividades que determinado serviço oferta.
Dotado de uma perspectiva leiga, os usuários constroem um imaginário sobre os
serviços de saúde que, por vezes, não correspondem a sua capacidade instalada.
Segundo Oliveira et al (3), a comunidade percebe consideráveis barreiras de acesso aos
726
serviços básicos e demonstra ter uma imagem de grande limitação de recursos humanos e
materiais em relação às unidades básicas de saúde. Por outro lado, prontos-socorros e
hospitais se apresentam aos usuários, por várias razões, como espaços de maior
resolubilidade.
Diante deste cenário, é possível identificar um hiato cada vez maior entre sistema de
saúde e usuários dos serviços. Em virtude disso, neste milênio, vem crescendo a
consciência dos movimentos de Saúde Pública e dos organismos internacionais sobre a
importância da aplicação dos direitos humanos na área da saúde. O “Comitê dos Direitos
Socioeconômicos e Culturais” estabeleceu, em seu 14º Comentário Geral de 2000, a
dimensão e o conteúdo normativo do direito à saúde, no qual, dentre eles, encontra-se o
direito à informação em saúde (4), o que, em âmbito local significa: a) ampliar os
mecanismos de comunicação e informação e, b) incentivar a formas de acolhimento que
levem à otimização dos serviços e ao acesso dos usuários a todos os níveis de atenção do
sistema de saúde, com mecanismos de referência e contra referência (5).
Partindo-se desses pressupostos é que o direito à informação sobre o sistema é um
passo para a consolidação do direito à saúde, que se constitui, por sua vez na expressão
concreta do direito à vida e a da dignidade da pessoa humana. Logo, entender o rol de
atividades destinadas a cada organização pública de saúde se trata de um direito
fundamental do usuário do Sistema Único de Saúde conforme preconizado no art. 7º.
Inciso VI da lei 8.080: “VI - divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de
saúde e a sua utilização pelo usuário” (6).
A concretização do direito à informação (7) sobre o sistema de saúde e suas
possibilidades de intervenção não vem sendo uma tarefa trivial, particularmente no que
tange a participação da mídia e de outros veículos de comunicação de largo alcance que
incitam construções distorcidas e generalizadas do que a saúde e o sistema público,
porventura, venham a ser (8). Esse fenômeno consolida, assim, o que Lefèvre (9) já
chamava de uma construção de “mitologias sanitárias”.
O fato é que, a depender da demanda do usuário, é legítimo que ele não consiga
resolutividade para seu agravo no âmbito da atenção básica. Isso ocorre porque, uma das
características dos serviços de saúde é a fragmentação de suas organizações (10), o que
remete, no conceito de redes, à interdependência constante de outros pontos de atenção
(11). Assim, em casos mais complexos e que requeiram maior incorporação tecnológica no
727
processo do cuidado, o usuário deve ser captado pela equipe de atenção básica e essa
deve ficar responsável pela referência adequada de cada caso a nível especializado.
Esse processo de garantia do acesso ao usuário a níveis mais complexos do sistema
(se assim os precisar) é o que se entende por integralidade do cuidado (ou da assistência)
conforme exposto em documentos oficiais (12, 6). Trata-se, portanto, de uma diretriz do
Sistema Único de Saúde e que, resumidamente, significa um conjunto articulado e
contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos
para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema (13).
A garantia da integralidade do cuidado não depende apenas de profissionais com
forte capacidade de captação-diagnóstico-condução, mas também de todos os atores
sociais que compõem os serviços de saúde, em especial o usuário. É pertinente lembrar
que, conforme a lei orgânica da saúde (6), a responsabilidade do Estado com a saúde não
exime a responsabilidade das pessoas, das famílias, das empresas e da sociedade.
Então, visando compreender como o direito à informação para garantia da
integralidade do cuidado poderia ocorrer nos casos relacionados à usuários com lesões
suspeitas de câncer bucal é que este artigo objetivou revisar as informações necessárias
relacionadas ao atendimento para o usuário comum que precise saber como procurar o
sistema, caso desenvolva uma lesão suspeita de câncer bucal.
Para isso, realizou-se uma revisão narrativa conforme descrito por Rothers (14)
conforme três informações consideradas essências para que o usuário saiba sobre como o
sistema de saúde está organizado para lidar com a questão do câncer bucal: 1)
informações sobre o “fluxo assistencial e a atenção secundária à saúde como elementos
do sistema de referência e contra referência”; 2) informações sobre o “câncer bucal e as
respostas do sistema de serviços de saúde frente ao problema”, e 3) como/quando deve
ocorrer a “referência de usuários com lesões suspeitas de câncer bucal”.
728
da assistência intermunicipal; definindo mecanismos para a reorganização dos fluxos de
referência e contra referência e introduzindo o conceito de regulação assistencial (16).
Daí, 7 anos depois do processo de intensificação da regionalização, em 2008, a
Política Nacional de Regulação foi promulgada, desta vez, oficializando termos e funções
por ora já executadas pelas secretarias ou adicionando novas atribuições. Nesse sentido,
oficializou-se atribuições em regulação como aqueles dispostos no art 8º., incisos V e VI
(diagnosticar, adequar e orientar os fluxos da assistência; construir e viabilizar as grades
de referência e contra referência) (17).
Dentre as ações relativas à construção desses fluxos, o art 5º. da mesma portaria no.
1559/2008 elenca as seguintes ações a serem desenvolvidas pelos complexos reguladores
em âmbito geral. São eles: a regulação médica da atenção pré-hospitalar e hospitalar às
urgências; o controle dos leitos disponíveis e das agendas de consultas e procedimentos
especializados; a padronização das solicitações de procedimentos por meio dos protocolos
assistenciais; e o estabelecimento de referências entre unidades de diferentes níveis de
complexidade, de abrangência local, intermunicipal e interestadual, segundo fluxos e
protocolos pactuados (17).
Conforme exposto, percebe-se que os níveis de atenção à saúde caracterizam-se por
um elemento fundamental da regulação assistencial, o que justifica, em grande parte, sua
existência. Com efeito, pode-se afirmar que os níveis de atenção à saúde e seus pontos de
atenção são elementos de um sistema de referência e contra referência e sua
normatização é prerrogativa do poder público, e na área da saúde, o seu conceito está
relacionado aos aspectos de organização dos fluxos dos usuários nos diversos níveis do
sistema (18).
Focando-se no fluxo atenção básica-atenção secundária, o acesso aos
procedimentos especializados, a padronização de solicitação de procedimentos via
protocolização e o estabelecimento de unidades de referência inter/intra níveis são ações
clássicas deste fluxo. Assim, a configuração de uma rede de atenção secundária que
garanta suporte (ou em termos Merhyanos, uma “retaguarda”) para solucionar aquilo que
foge o escopo da atenção básica é crucial. Assim sendo, a atenção secundária (ou
também dita, especializada) compõe, com os demais níveis de atenção, o rol de elementos
de um sistema de referência e contra referência básica.
729
A atenção especializada pode ser conceituada e ao mesmo tempo delimitada pelo
território em que é desenvolvida como um conjunto de ações, práticas, conhecimentos e
técnicas assistenciais caracteristicamente demarcadas pela incorporação de processos de
trabalho que englobam maior densidade tecnológica, as chamadas tecnologias
especializadas (19).
Segundo Merhy (20) os serviços da atenção especializada são espaços de saber-
fazeres profissionais, onde se concretiza o encontro das tecnologias leves e leves-duras,
ofertadas sobre a infraestrutura tecnológica dura. A atenção especializada deve ser
preferencialmente ofertada de forma hierarquizada e regionalizada, garantindo a escala
adequada (economia de escala) para assegurar tanto uma boa relação custo-benefício
quanto a qualidade da atenção a ser prestada (19).
Em saúde bucal, a referência para a atenção secundária são os Centros de
Especialidades Odontológicas (CEO). Estas unidades foram criadas pela portaria nº
599/GM, de 23 de março de 2006. São caracterizadas como Serviço de Apoio Diagnóstico
e de Terapia (SADT) e é o principal espaço de atendimento de casos mais complexos que
transcendem a capacidade físico-pessoal de resolução da atenção primária no SUS (21).
730
espinocelular, uma variante dos tumores epiteliais que acomete a camada estratificada
escamosa (24).
Conceitualmente falando, “câncer de boca”, “câncer bucal” e “câncer oral” são termos
muito abrangentes, podendo a falta de especificação gerar confusões. Ao se referir ao
câncer de cavidade bucal, a Organização Mundial de Saúde, por exemplo exclui os casos
de câncer de lábio. Quanto às demais localizações anatômicas da boca (gengiva, assoalho
da boca, mucosa da bochecha, vestíbulo da boca, língua, palato e área retromolar)
diferentes seleções podem ser efetuadas e estudos específicos. Além disso, uma
perspectiva analítica mais abrangente permitiria aplicar o termo genérico “câncer bucal”
aos tumores de amígdala e da orofaringe; de fato, alguns estudos efetuam esse recorte
temático para análise em conjunto (22).
Já, epidemiologicamente, o câncer bucal apresenta um conjunto de fatores
associados à sua incidência na população. Dentre aqueles cuja evidência é bem
estabelecida o fumo se apresenta como o principal. Este, quando associado ao consumo
de álcool potencializa a expressão da doença atuando de forma sinérgica. Exposições
ocupacionais como à radiação solar (específico para os cânceres de lábio inferior) dentre
outras substâncias reconhecidamente carcinógenas (como o asbesto, por exemplo)
também são consenso na literatura. Outros fatores descritos como hábitos alimentares
(hipovitaminoses), infecção oral pelo papiloma vírus humano (HPV) transmitido
sexualmente ou pelo parto requerem maiores estudos (22).
O câncer bucal é considerado um problema de saúde (25, 26), uma vez que estudos
epidemiológicos mostram uma taxa de sobrevida em 5 anos e, esta, não tem aumentado
por décadas. Um dos principais fatores que contribuem para esse quadro é o diagnóstico
tardio dessas lesões, onde pacientes se apresentam com estadiamento clínico avançado.
A maioria das lesões malignas é o carcinoma espinocelular (CEC), ocorrendo
predominantemente em homens a partir da quarta década de vida, tagabistas e etilistas
(27, 28).
Embora a epidemiologia, os fatores de risco, as estratégias de diagnóstico precoce, o
tratamento e mesmo os marcadores biológicos do câncer de boca sejam alvo de intensos
esforços de pesquisa, pouco ainda se sabe sobre o impacto real das intervenções de
saúde pública na prevenção da doença ou na minimização da mortalidade (29). Ainda
segundo o mesmo autor, as estratégias de saúde pública têm sido correntemente adotadas
731
para garantir alguma resposta coletiva ao problema tem sido a implantação de
“campanhas” preventivas focadas em uma ou no conjunto de três ações: o autoexame da
boca, o rastreamento e o diagnóstico precoce.
A técnica do autoexame da boca é geralmente descrita como não-invasiva, de baixo
custo, confiável e um método de controle de massa sobre a incidência da doença.
Entretanto seus benefícios seriam alvo da prevenção secundária. O paciente seria capaz
de identificar lesões suspeitas de malignidade e depois ser responsável por procurar
serviços de atenção primária ou secundária (29). É o que relata os dados de Martins (30)
em um estudo de acompanhamento de 9 anos de uma campanha de prevenção do câncer
de boca com autoexame no município de São Paulo. Para o autor as campanhas de
autoexame parecem mais mobilizar a população (pela associação à morte) (31) e ajudar
no treinamento diagnóstico dos recursos humanos do que atuar na redução da incidência
da doença.
Já o rastreamento baseia-se na ideia da detecção de casos na população até então
não detectados com o objetivo de reduzir os danos causados pela doença. O rastreamento
para cânceres só é efetivo se ele conseguir identificar e prover tratamento curativo para
uma proporção grande de lesões que iriam progredir para a morte na ausência de
intervenções. Apesar de grave e apresentar uma fase pré-clínica detectável e
suficientemente longa, o fato de o câncer bucal ser uma doença rara e a presente
ignorância sobre a efetividade do tratamento precoce enfraquece o argumento a favor do
rastreamento para esse tipo de doença (32). Não obstante, alguns autores em um ensaio
comunitário rigorosamente controlado comprovaram que os rastreamentos (screenings)
para câncer bucal não são efetivos para evitar mortalidade pela doença (33).
O diagnóstico precoce ainda parece ser o melhor método de evitar a mortalidade pela
doença. A análise do tempo decorrido desde o primeiro sintoma à aplicação do tratamento
mostra que o atraso diagnóstico poder ser responsável pelas altas taxas de
morbimortalidade. Em uma revisão da literatura (34), autores enfatizaram a necessidade
de reconhecer os agentes responsáveis pela demora de diagnóstico, e que este atraso
pode ser atribuído ao paciente, ao profissional de saúde e ao sistema de saúde (29). Assim
sendo, o estudo de fatores relacionados à rede de serviços, especialmente se tratando do
tempo decorrido entre os primeiros sintomas, diagnóstico e tratamento desses pacientes
são de suma importância.
732
A referência de usuários com lesões suspeitas de câncer bucal para
atenção secundária
733
que a prática da clínica ampliada, mesmo quando adquirida do ponto de vista filosófico,
apresenta obstáculos no seu exercício, seja pela rotina de trabalho ou pela incapacidade
de relacionar a integralidade como uma capacidade diagnóstico-terapêutica.
No cotidiano das práticas da atenção básica este fenômeno foi registrado por
Cimardes e Fernades (41). Os resultados de suas pesquisas permitiram avaliar que a
prática do profissional de realizar o exame em busca de lesões suspeitas de câncer de
boca foi relatada pela maioria da amostra (72%), mas 47,5% dos participantes relataram
nunca terem realizado um diagnóstico de câncer de boca. Conclui-se que a política do
governo federal para encaminhamento dos pacientes com lesões suspeitas não vem sendo
posta em prática, pois somente 11,7% dos entrevistados relataram estar encaminhando
seus pacientes para os Centros de Especialidades Odontológicas (CEO)
Quando a barreira da capacidade diagnóstica do cirurgião-dentista é superada, os
problemas passam a residir no deslocamento à unidade de referência. Júnior e Serra (42)
ao estudarem o sistema de referência e contra referência do Município de Resende
perceberam que o constante deslocamento dos usuários para os centros de referências e
a impossibilidade da realização de uma série de exames complementares para fins de
diagnóstico em unidades próximas a sua residência, além de transtornos e gastos
adicionais com transporte, submete o usuário a uma lógica de cuidado em saúde onde
somente o especialista localizado no hospital ou no centro de referência pode dar
resolubilidade ao seu agravo, comprometendo inclusive o diagnóstico precoce.
Outros achados de Chaves et al (43) caracterizam o problema do acesso
propriamente dito à atenção secundária. Em suas pesquisas sobre o acesso aos CEO na
Bahia percebeu-se que usuários com facilidade de acesso geográfico foram os mais jovens
que tiveram mais chance de receber assistência integral. Isto vem gerando uma baixa taxa
de utilização dos serviços públicos odontológicos especializados nos CEO analisados,
conforme os padrões propostos pela Portaria GM nº. 1.101/2002 e pela consulta aos
especialistas, ou seja, a oferta disponível está, de fato, sendo subutilizada para um tipo de
serviço essencial na garantia da integralidade da atenção à saúde bucal.
Portanto, de posse dessas evidências, percebe-se que os atuais mecanismos de
regulação assistencial ainda têm permitido um fluxo não-regulado dos usuários na rede
assistencial (44). Adicionalmente, o sistema de saúde e seu funcionamento são fortes
corresponsáveis pelo atraso diagnóstico e tratamento dos casos de câncer bucal (34).
734
Portanto, de acordo com a normatização vigente e todas a características relativas a um
processo de regulação assistencial, a produção desse fluxo é complexo e que
possivelmente falhas na compreensão e estabelecimento deste fluxo responde importantes
questões relativas a morbimortalidade do câncer de boca.
Considerações Finais
Ao revisar as informações necessárias relacionadas ao atendimento para o usuário
sobre o fluxo assistencial para casos de lesões suspeitas de câncer bucal, foi possível
perceber que grande parte das informações essenciais ainda destoa das práticas nos
serviços, podendo gerar menos possibilidade de acolhida dos casos que chegam
precisando de diagnóstico e, porventura, condução no interior do sistema.
Isso demonstra o quanto se tem a trabalhar no que tange ao direito à informação para
integralidade do cuidado no SUS especialmente se tratando de lesões que poderiam gerar
maior sobrevida caso os usuários pudessem identificar mais facilmente quais serviços
buscar e que fluxo devem enfrentar.
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738
Evolução dos Temas e atores envolvidos nos processos fundamentais do
direito humano a saúde
Jhonatas Barbosa1
Bruna Souza
Fábio Sousa
Introdução
Quando se tratam de saúde humana muitas questões filosóficas, antropológicas,
sociais, politicas e econômicas são evidenciadas. Todas estas questões complexas abrem
portas para dilemas mais simples de serem entendidos e que elucidam a mais formal e
evidente realidade, a de que a saúde humana é um direito que deve ser assegurado a
qualquer custo.
Este direito fundamental norteia a mais complexa rede de regras e deveres que
devem ser assegurados aos seres humanos, é essencial para o exercício de todos os
outros direitos constitucionais.
O tema, direto a saúde vem de um amplo debate internacional, outros diálogos tem
sido construídos, passando a barreira da problemática saúde, mais estes temas em debate
e as suas relações de influencia com a saúde tem sido considerada e estudados.
739
No mundo atual, diante dos avanços tecnológicos e científicos, era de se esperar que
os problemas relacionados à saúde e seus direitos já estivessem sendo resolvidos ou no
mínimo em estados mais avançados, no entanto, observa-se que dentro do contesto da
globalização, muitas são as manifestações de improbidades administrativas, corporativas,
politicas e sociais, que em suma prejudicam o avanço em politicas publicas, politicas estas
que se fossem bem administradas poderiam beneficiar o avanço de leis mais completas e
fundamentais que atendessem as manifestações e anseios da população.
Os estados nacionais são os detentores e os que podem garantir e legitimar o direito
a saúde, no entanto outros atores, principalmente as corporações internacionais são
capazes de influenciar positivamente e negativamente nas politicas publicas de normas e
regulamentações, que tem impactos diretos a saúde.
Estes diversos atores que influenciam nas partições do estado democrático, fazem
surgir na literatura novos conceitos como saúde global e direito sanitário global, o que
evidencia a necessidade de compreender estes novos fenômenos conceituais e as suas
consequências à realidade cívica.
O presente trabalho foi construído partir da analise sistemática de literatura, cobrindo
os aspectos jurídicos e democráticos, tem por objetivo fazer uma reflexão conceitual sobre
o direito sanitário no contexto global, caracterizando partir dos elementos que o enfatizam,
como os seus atores e os temas em destaques sociais.
740
baseadas em direitos humanos, o que possibilita o debate politico e social, tais
mecanismos promovem a construção de cidadania e amplia participação democrática (1).
O enfoque nos aspectos da globalização para entender como o direito a saúde esta
se ampliando pelo mundo, pode ajudar a compreender as relações de dilemas (temas) e
os atores envolvidos.
A globalização é marcada por características muito únicas, como a crescente
interdependência econômica, social, politica, além da integração global do capital, dos
bens de consumo, ideias jurídicas, filosofias, cultura, ciência e tecnologia (1).
Todas essas características podem parecer sem sentido em uma discussão sobre a
evolução do direito humano a saúde, mais, no entanto, tais características levam a
mudanças importantes na organização, no financiamento e nas ações dos sistemas
nacionais e internacionais de saúde, sejam de caráter politico, social ou jurídico.
Todas as caraterísticas humanas e naturais influenciam de alguma forma no tratado
de direito a saúde, as transações comerciais, viagens, as questões ambientais, os conflitos
armados ou ideológicos, e o próprio terrorismo, além de guerras civis, todas de alguma
maneira transcendem os limites territoriais e impactam profundamente a politica, os valores
sociais e as leis que definem os parâmetros do direito a saúde (2).
O fenômeno da globalização alterou profundamente as distinções entre a saúde
internacional e a saúde global, isso de certa forma impactou significativamente na
mudança de pensamento sobre saúde internacional, que se ocupava apenas com os
problemas nacionais de epidemias, atuando sobre as suas fronteiras (3).
Agora com a diversidade humana cada vês mais globalizada, estes dilemas
transcenderam as fronteiras para além de problemas nacionais, indo para discussões
globais (saúde global), agora se preocupando com a saúde da população mundial, não
estando recluso a fronteiras, mais sim, se reajustando com as forças da globalização.
A caracterização da saúde global vem como parte de uma compreensão internacional
de que a sociedade contemporânea reconhece não somente o encurtamento das
distancias, mais também dos impactos da globalização, como a interdependência global
sobre os parâmetros determinantes da saúde.
O termo saúde global, envolve amplos aspectos da nova ordem mundial, a
globalização envolve a participação de vários atores com importância, novos enfoques,
estratégias e objetivos (2).
741
As novas faces da globalização sobre a saúde global faz com que as fundações
privadas, organizações não governamentais e grandes corporações de vários países, além
das discussões sobre saúde, epidemias, nos estados, municípios e países globais,
também realça a relevância desses atores sobre a legitimidade e governança global sobre
saúde.
O direito sanitário global é em principio um campo muito abrangente, pois envolve
normas e processos de vinculo jurídico e politico, necessários para criar às condições de
amplo acesso a saúde física e mental em todo o mundo.
Diante desse quadro de realidades, o direito sanitário global tem evoluído sobre as
normas e politicas publicas de acesso a saúde, com uma infinidade de atores envolvidos
na forma de instituições que influenciam nos tratados legislativos, bem como na expansão
da legislação sanitária para todo o globo (4). Mesmo com os recentes avanços é fácil
observar que a realidade vivida por milhares de pessoas em todo o mundo é bem
diferente, a expansão progressiva dos direitos a saúde por meio de legislações cada vez
mais bem elaboradas se mostra fragmentado, descoordenado e em muitos casos ineficaz.
742
metabolismo humano. Novas pesquisas sobre epidemias e mortes por doenças adquiridas
como câncer, AIDS e outras, tem demostrado a necessidade de regras de controle e de
ações governamentais para melhorar a saúde (2).
Nos últimos anos o mundo tem assistido com perplexidade os acontecimentos
mundiais, vem aumento a preocupação com os vazamentos de radioatividade,
contaminação do ar por material particulado como foligem, além do aumento da
concentração de gases poluentes e cancerígenos (4).
O uso desrespeitoso de minérios de urânio por países como Irã, Coreia do Norte e
Turquia, para produção e teste de armas nucleares, com fins militares, tem alarmado o
mundo, o que faz as pessoas questionarem sobre que direitos elas tem frente a esses
abusos internacionais? Como viver com saúde e segurança se o mundo parece se
envolver em relações conflitantes e desarmoniosas?
Quando se questiona o que fazer sobre tais paradigmas complexos e atuais, fica
difícil consistir com respostas corretas e perfeitas, no entanto as discussões são validas
para o efetivo e amplo debate jurídico e social.
Hoje, o florescimento das discussões em direto sanitário global, cada vês mais tem
discutido as mais complexas preocupações, incluindo os avanços em pesquisas genéticas,
ciências biomédicas e reprodução assistida, entre outras.
Este novo campo de estudo tem contribuído para uma ampla discussão entre
diversas áreas do conhecimento. Sobre as pesquisas farmacêuticas, clonagem, doenças
infecciosas, alimentos, segurança e controle de doenças, entre mais, todas estão no
contexto da pesquisa do direito sanitário global (6).
Todos esses campos de estudo, hoje convergem para uma discussão ampla e
profunda das necessidades relacionadas aos direitos fundamentais de todos os seres
humanos a saúde.
O tema segurança esta relacionado a saúde por diversos motivos, desde os tempos
remotos, como discutido anteriormente, a humanidade sofre de doenças, sejam por causas
naturais ou adquiridas, de forma geral o controle de doenças, ou seja, uma questão de
segurança tem sido discutida por diversos lideres mundiais.
Saúde e segurança estão cada vês mais ligados, interligados por diversas discussões
internacionais, países ricos e desenvolvido como o Estados Unidos da América, nas
conferencias da ONU, tem levantado a bandeira das questões humanitárias, no entanto
743
cabe destacar e frisar que não apenas o Estados Unidos, mais diversos países da Ásia,
África, Europa e América, todos tem contribuído para um debate das questões de
segurança (1).
São diversos os problemas envolvidos com o tema segurança e saúde, preocupações
com armas químicas, biológicas e nucleares, têm sido muito discutidas nos últimos anos,
frente a essa batalha, estão ativistas, professores, cientistas, pessoas civis, governos e
lideres religiosos.
Eventos recentes como as ameaças do ditador da Coreia do Norte, com testes de
armas e misseis de longo alcance, com potencial capacidade de carregar ogivas atômicas,
vem fazendo o mundo interior estar em alerta máximo, o que tem levado os lideres
mundiais a reuniões quase constantes para avaliar e discutir os perigos, e propor medidas
de controle como embargos comerciais e políticos para forçar o retrocesso de tais
programas ameaçadores.
Episódios de contaminações de alimentos, como no caso do Brasil, operação
desencadeada pela força tarefa da policia federal intitulada carne fraca, evidencia um
problema complexo e desafiador de produção industrial de carne nacional, problemas com
as demandas de fiscalização e controle, são outro desafio, medidas de apoio legal ainda
necessitam evoluir para coibir tais atividades criminosas (3).
Na tentativa de evoluir e lidar com todos esses dilemas e desafios e num contesto
onde ha dificuldade dos lideres mundiais de reconhecerem, serem compromissados e
responsáveis, ainda falta a ampliação das agendas de organizações internacionais que
reforcem a necessidade de expandir o dialogo e o compromisso jurídico com ações
pontuais nos problemas entre os países e os seus atores (5).
Questões atuais como a migração, crise econômica e guerras representam impactos
nos sistemas de saúde dos países. Na Europa com a migração de diversos povos que
fogem de guerras, fome e perseguição politica, religiosa e étnica, levanta e modificam a
cadeia social e politica dos países, recentes ataques terroristas e casos de doenças têm
levantado questões complexas sobre o desafio e as consequências da migração sobre o
sistema de saúde (2).
No Brasil com a chegada de milhares de pessoas que fogem da Venezuela por causa
da crise econômica e politica, abrem precedentes ainda pouco controláveis sobre quais
744
impactos este fenômeno não planejado possa trazer ao sistema de saúde e vigilância
sanitária, aos estados afetados e a população ali presente.
O problema da crise humanitária tem sido o enfoque atual, lideres mundial tem
discutido os efeitos que estas migrações têm causado aos países e a soberania da
população ao direito de saúde e vigilância a estes direitos constitucionais.
No entanto diversas mudanças podem ser vistas por todo o mundo no cenário
politico, com os recentes casos de migração, ataques terroristas, fome, guerras, crise
politica, crise econômica, crise constitucional, aparentemente, muitos paradigmas tem sido
quebrados, podem ser vistos por todo o mundo um dilema difícil de ser compreendido por
completo, o desejo de muitas pessoas de manter a soberania popular de uma nação acima
dos problemas complexos de outras nações.
Casos recentes como o popular aumento da chamada extrema direita na Europa e
nos Estados Unidos tem demostrado a insatisfação popular e o quanto estas questões
complexas estão mudando o mundo, e, portanto sua consequência pode ser sentida nos
direitos fundamentais de acesso a saúde (4). Todos estes temas, por mais complexos que
sejam, apresentam os nexos de interdependência e dependência entre si, seus
paradigmas e suas consequências podem ser percebidas nas formas politicas e jurídicas
de um país, e influenciam nas manifestações populares, sócias, jurídicas, politicas e
religiosas, na verdade podem ser as indicativas de mudanças nas redes de saúde e no
estado de direito sanitário, ocasionando mudanças complexas e mundiais.
Com relação aos atores que participam da construção e das modificações dos direitos
sanitários em escala mundial, podem ser diversos e atuam de maneiras diferentes, no
entanto é possível classifica-los, como os que são considerados tradicionais, como as
organizações internacionais de saúde e os chamados novos atores, que atualmente
podem ser observados no âmbito distrital, nacional, regional e também em blocos
econômicos (6).
Os atores tradicionais como as instituições internacionais especializadas em
discussões sobre saúde como a OMS e a organização Pan-americana da Saúde (OPAS),
interferem na elaboração de normas jurídicas, que impactam na organização mundial
sobre a saúde (6).
745
Muitos são os interesses envolvidos por esses órgãos e instituições, não é incomum
haver discordâncias e tensões entre dilemas como soberania versos migração, direita
versos esquerda, ocidente versos oriente.
Todas essas complexas relações já são estudadas pelas teorias das relações
internacionais, evidentemente que nas múltiplas esferas dos atores, podem ser
encontradas simetrias politicas e filosóficas que influenciam de forma ampla a tomada de
decisões jurídicas e sócias sobre os direitos fundamentais sobre a saúde. Com relação aos
novos atores, estes atuam na esfera nacional e internacional, são organizações da
sociedade civil e do setor privado, que influenciam diretamente na tomada de decisões por
parte das instituições tradicionais. As organizações privadas e civis como as ONGs, tem
atuado constantemente sobre diversos temas relacionados a saúde e ao meio ambiente,
mesmo não possuindo personalidade politica ou jurídica, estas organizações influenciam
de forma ampla as tomadas de decisões, e influenciam a sociedade a mobilizações sobre
estes temas (3).
Devido a seu prestigio cientifico e acadêmico, estas instituições agregam força de
convencimento aos temas de seus interesses, de forma geral, no âmbito internacional
ganham surpreendente relevância nos assuntos sobre as politicas publicas e sociais, sobre
a saúde e os direitos sanitários nacionais e internacionais. A saúde global é um tema
complexo e envolve diversos fenômenos e atores envolvidos, mais este certo que estas
discussões internacionais podem ajudar a realizar mudanças importantes, pois envolve um
conjunto multidisciplinar de pessoas e profissionais envolvidos, desde médicos, filantropos,
farmacêuticos, químicos, biólogos, biotecnólogos, juristas, economistas, políticos,
sociedade civil, militar, OMGs entre outros. Todos discutindo os parâmetros, as politicas,
as pesquisas, os dilemas, os problemas, sejam nacionais ou globais, todos envolvem as
questões de saúde, humanidade, politicas publicas e sociais que garantam os pilares
fundamentais de direito sanitário global.
Conclusões
O progresso das discussões politicas e sociais sobre o direito sanitário global e suas
influencias sobre a saúde, são mais um passo importante na evolução da consciência
humana, pois privilegia seus próprios dilemas humanitários.
746
São diversos os temas que hoje podem ser observado no mundo que influenciam de
forma direta ou indireta a saúde no contexto global. Os indicativos mostram que tem
aumentado à disposição dos lideres mundiais e da sociedade civil em discutir os
problemas como o aumento de epidemias, os problemas de fabricação e teste de misseis
atômicos, migração entre outros.
Os atores são diversos, podem ser os tradicionais ou os novos, todos tem contribuído
de forma ampla para uma discussão efetiva sobre os direitos a saúde. Destaca-se o
aumento no numero de pessoas envolvidas com as discussões sócias, politicas e jurídicas
sobre a saúde. São mais diversificados e multidisciplinares os novos atores, sejam em
instituições privadas ou OMGs, podem-se observar cada vez mais cientistas, políticos e a
própria sociedade civil atuando nas discussões sobre a saúde. O grande dilema hoje é
com harmonizar tantos interesses sobre o direito sanitário global em comum acordo, fica
evidente que o direito a saúde, esta coberto por um cenário complexo e cheio de dilemas
de negociações politicas. No entanto ressalta-se que no atual cenário, diante da
globalização e dos novos dilemas mundiais é precisos consenso e união em prol do bem
comum, a saúde como direito fundamental.
Referências
747
introducción critica al derecho a la salud. Brasília: Fundação Universidade de Brasília,
CEAD, 2012. p. 97-106.
748
Direito a Qualidade Sanitária da Água: cuidados com a Água Residencial
Introdução
A água é um recurso ambiental essencial a sobrevivência dos seres vivos, e foi
reconhecida desta forma inicialmente em 1977 durante a Conferência das Nações Unidas
sobre Água em Mar Del Plata - Argentina. Nesta conferência foi estabelecido que
independente da condição social e econômica todos tinham direito ao acesso a água
potável de qualidade (1).
Outro referencial internacional quanto ao direito à água surgiu em 2002, durante o
Comitê das Nações Unidas sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em que foi
estabelecido o direito humano à água no Comentário Geral de nº15 (2). Neste documento,
além da disponibilidade de água, esta também deve ser de qualidade; quantidade
suficiente; ter acessibilidade física e financeira, que não apresente riscos, e nem
comprometa a alimentação e cuidados com a saúde (1).
1 1Programa de Doutorado em Saúde Pública e Meio Ambiente – ENSP/FIOCRUZ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail:
natashabhandam@gmail.com
2 DSSA/ENSP/FIOCRUZ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
3 DSSA/ENSP/FIOCRUZ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
749
Então em 2010 foi instituída uma legislação da Assembleia Geral da Organização das
Nações Unidas, Resolução A/RES/64/292 (3), que reconhece e determina formalmente
que a água, e o esgotamento sanitário são um direito a todas as populações humanas.
Após este marco, todas as cidades devem proporcionar e garantir o abastecimento de
água e o esgotamento sanitário às residências (1).
Apesar dos investimentos internacionais no acesso à água potável e ao
saneamento, atualmente, 2,5 bilhões de homens, mulheres e crianças no mundo não têm
acesso a serviços de saneamento básico. Além do mais, quase um bilhão de pessoas
continuam praticando defecação a céu aberto, e 748 milhões de pessoas não possuem
acesso imediato à água potável, principalmente, em regiões carentes como na África
subsaariana, Ásia Meridional e Sul oriental da Ásia (4). Estimou-se em 2010 que pela falta
de saneamento, aproximadamente 1,5 milhões de crianças menores de 5 anos cheguem a
óbito, e 443 milhões de dias escolares são perdidos a cada ano relacionado a doenças (3).
Estas condições precárias favorecem a disseminação de doenças, como as diarreicas que
são umas das principais causas de óbitos entre crianças menores de cinco anos. A falta de
saneamento e higiene também pode levar às doenças, como parasitoses intestinais,
cólera, febre entérica, hepatite e febre hemorrágica do vírus ebola (4).
Visto isto, é de fundamental importância que a água utilizada para consumo humano
atenda aos padrões de potabilidade para que não ocorram doenças devido a sua
contaminação (5). Para ser considerada potável no Brasil, os parâmetros devem estar
dentro dos limites preconizados pelo Ministério da Saúde, Portaria 2.914 de 2011 para o
consumo humano (6).
A água tratada que chega às residências pode ser contaminada biologicamente,
modificando assim a sua qualidade sanitária. As alterações podem ser devido ao
abastecimento clandestino de água, que é uma forma propícia para a contaminação.
Geralmente, as ligações clandestinas (captação de água ilegal) são construídas com
materiais de pouca durabilidade e segurança (7-8). Estas por sua vez, estão muitas das
vezes próximas aos canos de esgoto, o que pode contaminar tanto a água que chega a
estes moradores quanto, também, aos moradores que recebem a água pelos
encanamentos legais de água (8).
Outra forma de contaminação pode ser o processo de armazenamento de água
potável em recipientes como piscinas, baldes e caixas d'água. Quando estes são utilizados
750
como reservatórios e, posteriormente, a água não é tratada de forma adequada pode
ocorrer a proliferação de patógenos como, por exemplo, bactérias que causam
gastroenterite. A melhor maneira de conservar a água corretamente é realizando a adição
de cloro na quantidade adequada por ml de água, porém quando parada ou exposta ao
calor por muito tempo, esta pode perder a quantidade do cloro importante para a sua
desinfecção, e por isto deve ser monitorada (9).
Para a promoção da saúde e a garantia de uma água com qualidade sanitária
adequada para a população é muito importante também o acesso à informação em saúde:
“O acesso à informação em saúde é fundamental para reduzir iniquidades e promover
transformações sociais necessárias para a qualidade de vida e o bem-estar mais
democrático das populações. O conceito ampliado de "saúde", tão discutido nos debates
que deram origem ao Sistema Único de Saúde (SUS), está intimamente relacionado à
ideia de cidadania. E uma das bases essenciais ao exercício pleno da cidadania e do
direito à saúde é o direito à comunicação e à informação” (10).
Neste sentido, o projeto teve o objetivo de realizar educação em saúde para a
melhoria e garantia da qualidade sanitária da água para consumo humano nas residências
em comunidades no Território de Manguinhos, RJ.
Metodologia
751
FIOCRUZ, sendo elaborado com uma linguagem simples e ilustrativa para atingir a
população (Figura 1).
Resultados e discussão
752
Figura 2 – Qualidade da água, preparo para a limpeza da caixa d’água e do cloro ativo, e
entrega ao morador do Caderno de Saúde e Ambiente, volume temático Nº 1- “Água
Potável: cuidados e dicas”. Fonte: Soterro-Martins et al. (2014).
753
Figura 3 – Passo a passo da limpeza da caixa d’água, páginas do Caderno de Saúde e
Ambiente, volume temático Nº 1- “Água Potável: cuidados e dicas”. Fonte: Sotero-Martins
et al. (2014).
Posteriormente a personagem elucida Como tratar a água “não confiável”. Uma água
não confiável corresponde uma água que pode estar contaminada por agentes biológicos
(bactérias, vírus e parasitos), e com isto há riscos para saúde relacionados com a sua
ingestão. Neste conteúdo da cartilha é indicado para tratar a água com a utilização de
filtros, ou fervura ou cloração da água, e como tratar com estas formas. Na página seguinte
o tema se trata dos Cuidados com filtro e águas de geladeira, e explica sobre os cuidados
com os filtros de barro e de refil, indicando que o refil do filtro deve ser trocado de 6 em 6
meses. Quando isto não é realizado a função da filtragem perde a sua eficácia, permitindo
a passagem de microrganismos. As garrafas de geladeira também devem ser tratadas
para armazenamento de água com qualidade, e para isto precisam ser limpas até o limite
de 1 semana, com água e sabão, ou com cloro ativo. Finaliza com o alerta de que
mamadeiras e outros utensílios plásticos não devem ser fervidos, pois pode haver
substancias tóxicas no plástico (como o bisfenol A), que se soltam com o calor. Para
desinfetar neste caso é indicado o uso de solução de água sanitária e depois lavar com
água. Junto com o caderno de Saúde e Ambiente, volume temático Nº 1- “Água Potável:
cuidados e dicas” foi oferecido um encarte para ser fixado na geladeira ou atrás da porta
754
da cozinha, para que o morador pudesse registrar as datas de troca ou limpeza do filtro e
as datas de lavagem da caixa de água (Figura 4).
Figura 4 – Tratamento da água “não confiável”; cuidados com filtro e águas de geladeira; e
encarte para lembrar das datas de limpeza - páginas do Caderno de Saúde e Ambiente,
volume temático Nº 1- “Água Potável: cuidados e dicas”. Fonte: Sotero-Martins et al.
(2014).
Conclusões
755
Referências
2. 2 Office of the High Commissioner for Human Rights (OHCHR). General Comment No.
15: The Right to Water (Arts. 11 and 12 of the Covenant). Geneva: OHCHR; 2010.
3. 3 United Nations General Assembly (UNGA). Human Right to Water and Sanitation.
Geneva: UNGA; 2010. UN Document A/RES/64/292.
4. 4 WHO. World Health Organization. UN reveals major gaps in water and sanitation–
especially in rural áreas. 19 de novembro de 2014. Disponível em:
<http://www.who.int/mediacentre/news/releases/2014/water-sanitation/en/>. Acesso
em: 20 nov. 2014.
5. 5 Santos MC, Wilson HME. Qualidade da Água para Consumo Humano no Município
de Honório Serpa: Ênfase ao Uso dos Agrotóxicos; 2008.
11. 11 Sotero-Martins A, Santos, JAA, Moraes Neto, AHA, et al Caderno de Saúde Pública
e Ambiente - No. 1 Água Potável: cuidados e dicas. Acervo Educacional Sobre Água.
Agência Nacional de Águas. 2014. Disponível em:
https://capacitacao.ana.gov.br/conhecerh/handle/ana/317
756
Do Direito à Informação ao Direito a Não Saber
Ferreira Ramos1
Marta Frias Borges2
advogados.com
757
Guerra Mundial. Apesar da preocupação de exigir a recolha de consentimento já se
encontrar regulamentada, pelo menos, desde 1900, data em que o Governo Prussiano
publicou o normativo regulamentador da prática experimentação humana, foi sem dúvida
com este Código que a recolha de consentimento informado assumiu um maior destaque.
Mais tarde, também no Relatório de Belmont destacou o princípio do respeito pelas
pessoas, enquanto dever de reconhecer a autonomia dos indivíduos e proteger as pessoas
com autonomia diminuída.
Do mesmo modo BEAUCHAMP e CHILDRESS dão destaque ao princípio da
autonomia, sendo que para estes autores são necessárias três condições para que as
atuações sejam absolutamente autónomas: (i) intencionalidade; (ii) conhecimento e (iii)
ausência de controlo externo (1). De facto, este exercício da autonomia de cada um não se
basta com uma ausência de influências externas, sendo ainda necessário que o doente
conheça um conjunto de informações que lhe permita prestar o seu consentimento de
forma livre e esclarecida. Associado ao princípio da autonomia do doente está, pois, o
correspondente direito à informação, pois só na posse desses devidos esclarecimentos
poderá o doente manifestar o seu consentimento.
Em suma, o exercício da autonomia pressupõe o esclarecimento sobre o diagnóstico,
o prognóstico, a natureza do tratamento proposto, os riscos e benefícios do tratamento
proposto (em especial riscos frequentes e riscos graves) e alternativas.
Mas e se o doente não quiser ser informado do seu estado de saúde? Se o doente
quiser viver tranquilamente sem conhecimento das doenças de que padece ou de que
pode vir a padecer? Não poderá este direito à autonomia ser exercido também
negativamente?
Com efeito, tem sido reconhecida a existência de duas exceções ao dever de
informação do profissional de saúde: (i) por um lado, o privilégio terapêutico, (ii) por outro
lado, o designado direito a não saber.
Ora, enquanto o privilégio terapêutico pressupõe uma ponderação do profissional de
saúde, que se abstém de comunicar o diagnóstico sempre que o mesmo se revele
suscetível de colocar em perigo a vida do paciente ou causar grave dano à sua saúde
física ou psíquica, o direito a não saber pressupõe uma manifestação do próprio doente
que renuncia à informação.
758
O direito a não saber encontra-se consagrado no artigo 10.º, n.º 2 da Convenção
sobre os Direitos do Homem e da Biomedicina, segundo o qual “qualquer pessoa tem o
direito de conhecer toda a informação recolhida sobre a sua saúde. Todavia, a vontade
expressa por uma pessoa de não ser informada deve ser respeitada”. Do mesmo modo,
esta exceção ao dever de informar tem ainda respaldo no artigo 25.º, n.º 3 do Regulamento
da Deontologia médica, quando dispõe que “a informação não pode ser imposta ao doente,
pelo que não deve ser prestada se este não a desejar”.
Também a Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos,
ressalta que “deve ser respeitado o direito de cada indivíduo a decidir se quer ou não ser
informado dos resultados de um exame genético e suas consequências” (artigo 5.º, alínea
c).
Assim, ultrapassado o paradigma hipocrático e reconhecido o direito à informação e
ao esclarecimento como pressupostos do necessário consentimento informado, deparamo-
nos agora com o reverso: o direito do paciente a não ser informado sobre o seu estado de
saúde.
O exercício deste direito tem sido frequente sobretudo no âmbito da medicina
preditiva, enquanto conjunto de técnicas de investigação médicas e biológicas destinadas
a determinar as predisposições para as doenças, a fim de permitir um tratamento
adequado, antes mesmo do aparecimento dos sintomas e das complicações.
Com os avanços conquistados na medicina, os testes genéticos permitem atualmente
identificar a predisposição genética para vir a padecer de uma doença grave no futuro
(v.g., doença de Parkinson ou Alzheimer). Sucede que, perante a inexistência de cura para
estas doenças, muitas vezes quem se sujeita a este tipo de exames manifesta a intenção
de não ser informado do seu estado de saúde. De facto, em determinados casos, a
consciência de que se poderá vir a padecer de uma doença incurável poderá ser
demasiado perturbador.
Porém, e não obstante o reconhecimento legislativo, o exercício do direito a não
saber continua a levantar algumas dificuldades (2). Será este direito a não saber ainda
uma manifestação do princípio da autonomia? Como se assegura este direito a não saber?
Invocam alguns autores que o exercício da autonomia pressupõe o correto
esclarecimento do paciente, que só desta forma será capaz de tomar uma decisão
absolutamente autónoma, pelo que o reconhecimento do direito a não saber seria um
759
retorno ao paternalismo hipocrático. No entanto, o exercício do direito a não saber é
exatamente a expressão do direito à autonomia do paciente, que livremente opta por não
ter conhecimento do seu estado de saúde.
Aliás, como refere ROBERTO ANDORNO, o reconhecimento do direito a não saber
justifica-se, desde logo, pela obediência ao princípio bioético da não-maleficência, segundo
o qual o profissional de saúde se deve abster de lesar ou de não infligir dano ao individuo.
Ora, na medida em que a informação seja suscetível de perturbar psicologicamente, o
profissional de saúde deve respeitar o direito do paciente a não saber.
Outra das criticas mais frequentemente apontadas ao direito a não saber prende-se
com o facto deste direito não poder ser exercido de forma plena e absoluta, na medida em
que só poderia ser exercido após a referência à possibilidade de vir a apresentar uma
predisposição genética para uma determinada doença. No fundo, quase a contrassenso, a
transmissão da informação acaba por ser um pressuposto do exercício daquele.
De facto, o exercício do direito a não saber pressupõe o conhecimento do risco de vir
a apresentar a uma constituição genética que aponte para uma determinada patologia.
O certo é que quem se sujeita a um teste genético sabe, ainda que abstratamente,
que poderá vir a ter predisposição genética para uma determinada doença (3). Porém, não
poderá desvalorizar-se o acerto desta crítica, e a necessidade de prever mecanismos que
possam assegurar o cabal exercício do direito a não saber, enquanto manifestação do
princípio da autonomia.
Na verdade, como refere ANDRÉ DIAS PEREIRA, “O problema fundamental do
direito a não saber é o conhecimento da possibilidade de conhecimento” (4).
Para ultrapassar este problema, ROBERTO ANDORNO propõe um “registo público”
(5) que assinale previamente a intenção do exercício deste direito a não saber, a exemplo
do que sucede já, entre nós, com o Registo Nacional do Testamento Vital ou com o
Registo Nacional de Não Dadores.
Não vamos tão longe!
No entanto, julgamos que a utilização das potencialidades da Área do Cidadão do
Portal do Serviço Nacional de Saúde permitiria assegurar o cabal exercício do direito a não
saber. A inclusão do “direito a não saber” em «dados pessoais» ou «resumo de saúde»
permitiria aos profissionais de saúde avaliar se aquele concreto doente quer ou não ser
760
informado sobre o seu estado de saúde, tal como já permite hoje o acesso ao testamento
vital nos casos em que existe.
Somos, pois, da opinião de que a correta utilização do Portal do Serviço Nacional de
Saúde permitiria retirar vantagens ainda não aproveitadas, e que muito beneficiariam os
doentes.
Obviamente, o exercício do direito a não saber não poderá ser absoluto,
nomeadamente quando coloque em causa a saúde de terceiros (familiares ou não). No
âmbito dos testes genéticos este problema coloca-se com maior acuidade, na medida em
que os resultados poderão ter importância para outros membros da família que possam
padecer da mesma predisposição genética e que, na posse dessa informação, poderiam
adotar uma série de condutas destinadas a retardar o aparecimento dos sintomas.
Como compatibilizar então o direito à autonomia do doente com o interesse dos
familiares?
Seguindo de perto ROBERTO ANDORNO (6), entendemos que esta informação
apenas deverá ser revelada aos familiares contra a vontade do “doente”, quando se
verifiquem dois pressupostos: (i) a revelação seja necessária para evitar um dano sério aos
familiares; (ii) existe uma forma de cura disponível para a doença.
Tem-se ainda levantado a questão do exercício do direito a não saber em doenças de
doenças infectocontagiosas, como o VIH- SIDA. Todavia, em nossa opinião, nestes casos
não poderá ser exercido o direito a não saber (7), desde logo tendo em atenção o artigo
33.º, n.º 2 do Regulamento da Deontologia Médica, que estabelece o dever de o médico
informar as pessoas em risco sempre que o doente não modifique o seu comportamento.
O direito a não saber poderá também suscitar uma preocupação de racionalização de
recursos, na medida em que não sabendo e, por conseguinte, não adotando cuidados de
medicina preventiva, o paciente vai agravando o seu estado de saúde por uma opção
própria e pelo seu comportamento de risco, o que acarretará, mais cedo ou mais tarde, um
maior encargo para o Serviço Nacional de Saúde.
Referências
761
2. ANDORNO, R, The right not to know: an autonomy based approach, in «J Med Ethics»,
Vol. 30, 2004, p. 435.
3. ANDORNO, R, The right not to know…, cit., p. 437.
4. PEREIRA, ANDRÉ DIAS, Direitos dos Pacientes e Responsabilidade Médica, 1.ª
edição, Coimbra Editora, 1995, p. 516.
5. ANDORNO, R, The right not to know…, cit., p. 438.
6. ANDORNO, R, The right not to know…, cit., p. 437
7. ANDORNO, R, The right not to know does not apply to HIV testing, «J Med Ethics»,
Vol. 42, 2, 2016, p. 104 e 105.
762
Subnotificação de Doenças Diarreicas Agudas em Unidades de Saúde de
Arapiraca: Proposta de Vigilância na Atenção Primária à Saúde - Relato de
Experiência.
Introdução
As doenças diarreicas agudas (DDAs) caracterizam-se pela diminuição da
consistência das fezes, aumento do número de evacuações e em alguns casos, há
presença de muco e sangue (disenteria). Quando tratadas incorretamente ou não tratadas,
podem levar à desidratação grave, podendo ocorrer óbito (1).
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2003, 1,87 milhões de
crianças menores de cinco anos morreram devido à doença diarreica. No Brasil, um total
de 337.232 crianças menores de cinco anos foram hospitalizadas pelo mesmo motivo em
2004 (2). Reconhecida como importante causa de morbimortalidade, mantem relação
763
direta com as precárias condições de vida e saúde dos indivíduos, em consequência da
falta de saneamento básico, de desastres naturais e da desnutrição crônica, entre outros
fatores (1).
A Vigilância Epidemiológica das DDAs é composta pela Monitorização das Doenças
Diarreicas Agudas (MDDA), com o intuito principal de acompanhar a tendência e a
detecção de alterações no padrão local das doenças diarreicas agudas de forma a
identificar, em tempo oportuno, surtos e epidemias (1). Assim, as competências de cada
um dos níveis do sistema de saúde (municipal, estadual e federal) abarcam todo o
espectro das funções de vigilância epidemiológica, porém com graus de especificidade
variáveis. As ações executivas são inerentes ao nível municipal, mas seu exercício
apropriado exige conhecimento analítico da situação de saúde local (3).
Deste modo, para que ações por parte do poder público sejam executadas com
eficácia, voltando-se para os problemas em questão, os dados e as informações precisam
ser consistentes a fim de identificar quais fatores procuram explicar as causas das DDAs e
seu reflexo na sociedade. Partindo desse princípio, notificar adequadamente os casos de
doenças diarreicas se faz necessário para o planejamento das ações em saúde.
Diante disso, este estudo propõe caracterizar a subnotificação de DDAs nas unidades
de saúde do município de Arapiraca e sugerir medidas de Vigilância Epidemiológica para
atenuar essa situação.
Metodologia
Trata-se de um estudo de caso, descritivo, realizado como atividade prática de ensino
do Eixo Integração Ensino-Serviço-Comunidade (IESC) do curso de Medicina da
Universidade Federal de Alagoas – UFAL Campus Arapiraca.
Neste trabalho, definiu-se por análise de notificação de casos de DDAs, a busca ativa
em prontuários clínicos de pacientes das seguintes Unidades Básicas de Saúde (UBS) da
cidade Arapiraca- AL: Dr. Daniel Houly; Francisco Pereira Lima (4º Centro de Saúde) e Dr.
José Barbosa Leão (Planalto). Estas unidades são locais de atuação dos discentes desde
o início do curso, justificando assim, a escolha das mesmas como local de realização do
trabalho.
A população coberta por cada Unidade, que corresponde a 13.800 usuários
(Francisco Pereira Lima - 4º Centro), 13.815 usuários (Dr. José Barbosa Leão) e 6.401 (Dr.
Daniel Houly), que totaliza 34.016 usuários. A partir dessa quantidade, foi utilizada uma
764
amostra aleatória do número de casos, definindo um mínimo de 10% do total de
prontuários, para realização da busca de casos notificados. Quanto ao critério de inclusão,
foram selecionados os prontuários do período de 2015 e 2016.
Como instrumento de coleta de dados, foi utilizado o formulário padrão do Ministério
da Saúde, que contém as seguintes áreas de preenchimento: número de ordem; data do
atendimento/SE; faixa etária; presença de sangue (sim ou não); presença de desidratação
(sim ou não); endereço; zona de residência (rural/urbano); conduta; exame laboratorial; e a
classificação do plano de tratamento em A- Diarreia sem desidratação, paciente atendidos
com cuidados domiciliares, B- Diarreia com desidratação, paciente em observação na sala
de TRO-terapia de reidratação oral ou C- Diarreia grave com desidratação, tratar através
de reidratação venosa.
Após a análise de prontuários e recolhimento de dados criou-se uma tabela no
programa Microsoft Excel para armazenamento e posterior análise.
Resultados e discussão
Foram analisados 4.748 prontuários, encontrando-se 168 casos de diarreia, o que
correspondeu a 3,5 casos para cada 100 prontuários analisados. Embora seja um número
importante, as condições sanitárias dos locais estudados demonstram uma evidente
subnotificação de casos.
O relatório de situação do Ministério da Saúde publicado em 2011 pela Secretaria de
Vigilância em Saúde aponta que, no período de 2007 a 2010, foram notificados 140.732
casos de DDA em Alagoas e que a incidência nesse período variou de 6,9 a 15,9/1000
habitantes (4). Os anos seguintes também apresentaram valores significativos em relação
à presença de surtos de DDA. Rufino e colaboradores (2016) fizeram uma análise sobre a
distribuição espacial e temporal de notícias, internações e óbitos em surtos de diarreia,
identificando que os estados mais atingidos em 2013 foram Alagoas e Pernambuco, tendo
Alagoas apresentado cerca de 103.191 casos, apenas no ano em questão. Ainda segundo
os autores, dos 102 municípios de Alagoas, 25 tiveram surtos notificados, incluindo
Arapiraca, um dos municípios em que a identificação de casos se deu com maior
frequência (5).
A subnotificação é um problema recorrente no sistema de informação da saúde no
Brasil. Vários são os fatores que contribuem para essa situação, incluindo-se a própria
natureza passiva do processo de notificação. Concomitantemente, Medronho (2008),
765
afirma a existência de uma evidente falta de percepção da maior parte dos profissionais
em saúde acerca da importância deste tipo de informação para que ações de saúde
pública sejam mais efetivas (6).
Ainda que a falta de percepção dos profissionais seja o fator mais evidente, outros
fatores também são relevantes na contribuição para a subnotificação, como o respeito à
confidencialidade das informações na relação médico-paciente e questões operacionais
como sobrecarga de trabalho, processos burocráticos e longos formulários que requerem
tempo do profissional (7).
Esses problemas também estão presentes nos outros países. Segundo um estudo
publicado na revista Epidemiologia e Serviços de Saúde, 2012, por meio de uma pesquisa
realizada em Taiwan, constatou que médicos alegam falta de tempo para fazer a
notificação e encaminham essa responsabilidade deles para outros profissionais, e em um
hospital privado da África do Sul muitos médicos consideram a notificação complexa e não
possuem estímulo para realizá-la (8).
Diante disso, a notificação que é algo essencial para identificação de surtos,
epidemias, elaboração de hipóteses e análises epidemiológicas gerais. Conhecer a real
situação epidemiológica das doenças e desenvolver ações que busquem seu controle
transformou-se em um grande obstáculo (8).
No caso da análise da subnotificação nas UBSs de Arapiraca, o problema pode estar
vinculado principalmente ao não comparecimento do usuário à unidade básica de saúde ou
a uma possível busca por serviços de saúde mais especializados, como os hospitais da
região. Essa causa de subnotificação também decorre da “normalização” dos casos de
DDAs e de ela ser uma doença autolimitada. Assim, realizar visitas domiciliares e mais
pesquisas de campo ajudaria transpor esse problema, bem como desenvolver novos
mecanismos de conscientização e facilitação para que a população notifique esse
processo (9).
Diante dos aspectos citados, é necessário refletir sobre como a Vigilância em Saúde
é afetada pela subnotificação e desenvolver mecanismos que visem minimizar o problema,
a fim de obter dados mais confiáveis para orientar as ações públicas. A educação
continuada dos profissionais de saúde como um incentivo ao preenchimento dos dados é
uma boa vertente, haja vista que muitos profissionais vigilantes ainda não estão a par do
processo, pois muitos deles não sabem a importância e os procedimentos necessários
766
para a notificação, enquanto outros justificam que há falta de tempo para o preenchimento
da ficha, ou que o processo é muito trabalhoso, fato que prejudica a qualidade e a
quantidade das informações (6).
Além disso, a fragmentação dos processos de trabalho nas unidades de saúde pode
ser citada como um elemento complicador. Por essa razão, deve-se aprimorar a
comunicação desses profissionais para que eles trabalhem de forma articulada, por meio
de treinamentos e capacitação sistemática dos profissionais de saúde acerca dos
protocolos existentes (10).
De modo geral, o estímulo às ações educativas em saúde, direcionada aos
profissionais deve, além de capacitá-los sobre a importância da notificação e
preenchimento de dados, visar à sensibilização da população para que procurem a UBS
em casos de diarreia. Ao mesmo tempo se deve buscar orientar sobre os fatores
determinantes do adoecimento, estimulando a utilização de água potável ou pelo menos
filtrada ou fervida para consumo, preparo dos alimentos e higiene pessoal. Para realização
dessas ações de educação em saúde, a equipe de saúde deve contar com a colaboração
da própria comunidade, num processo de corresponsabilização. Todos os participantes
envolvidos devem divulgar o assunto em questão, realizando palestras e eventos em
espaços coletivos, como escolas, creches e a própria Unidade Básica de Saúde,
garantindo assim, o acesso da população às informações e uma maior abrangência
territorial.
As ações também visam demonstrar que a diarreia é um problema nacional, devendo
ser combatido de maneira eficaz, ressaltando a importância de que a procura a Unidade
Básica é essencial para a notificação dos casos e amenização desse agravo.
Conclusões
A subnotificação de doenças ou agravos é uma realidade nas unidades de saúde
estudadas. A diarreia é uma doença extremamente relacionada às condições de vida da
população e, em Arapiraca, as três comunidades analisadas neste estudo apresentam
elementos que contribuem para números expressivos de casos da doença, tais como
pobreza, falta de saneamento básico e ausência de educação em saúde. Contudo, os
números registrados nos prontuários são incompatíveis com as condições de vida da
população, o que implica na existência de subnotificação dos dados.
767
A subnotificação é concernente a uma diversidade de fatores que remetem tanto à
percepção das comunidades quanto às condições de trabalho nas UBSs, sendo eles a
“banalização” da doença por parte da população mais pobre e sem acesso aos meios de
educação em saúde, a sobrecarga do profissional de saúde (principalmente do profissional
médico) e a ausência de educação continuada dos mesmos para que haja atualização
constante acerca da importância da notificação de doenças para a vigilância.
As possíveis soluções para o problema se relacionam principalmente com medidas
de educação em saúde, tanto direcionadas para a população no que se refere ao
tratamento da água potável, higienização de mãos e alimentos e importância de procurar
atendimento médico nas UBSs em casos de diarreia, quanto para os profissionais médicos
para que estes preencham os prontuários notificando os casos de doenças diarreicas.
Referências
5. RUFINO, R.; GRACIE, R.; SENA, A.; FREITAS, C. M. F.; BARCELLOS, C. Surtos de
diarreia na região Nordeste do Brasil em 2013, segundo a mídia e sistemas de
informação de saúde - Vigilância de situações climáticas de risco e emergências em
saúde. Ciência e Saúde Coletiva, 21 (3): 777-788p, 2016.
8. Revista epidemiologia e serviços de saúde, Vol. 21, N.3, Brasília, setembro de 2012.
768
9. FAÇANHA, M. C.; PINHEIRO, A. C. Comportamento das doenças diarreicas agudas
em serviços de saúde de Fortaleza, Ceará, Brasil, entre 1996 e 2001. Rio de Janeiro:
Cad. Saúde Pública, 21(1):49-54, jan-fev, 2005.
769
Acesso Às Informações Sobre Qualidade Da Água De Recreação
Thiago Almeida1
Maria José Salles
Adriana Sotero Martins
RESUMO: O ambiente aquático apresenta diversas funções para a vida humana, dentre
elas a função recreativa. No Brasil as águas de recreação podem ser classificadas de
acordo com o tipo de contato entre o usuário e a mesma – primário ou secundário, sendo
sua qualidade estabelecida pela Resolução CONAMA nº274/2000. A contaminação das
águas recreativas representa um grave problema para a saúde pública, sendo responsável
por diversas doenças associadas a bactérias, vírus protozoários e parasitas,
principalmente em regiões com baixos índices de infraestrutura sanitária. Esse cenário
evidencia a importância do acesso a dados e a divulgação de informações sobre a
qualidade das aguas recreativas para a população.
Palavras-Chave: Água, recreação, saneamento, contaminação, doenças
A utilização das águas como uma forma de lazer sempre esteve presente na cultura
humana, principalmente nos países com vasta riqueza de recursos hídricos. Tais
condições são propícias para a prática de atividades de recreação que envolvam o contato
primário com as águas do mar, rios, cachoeiras, represas e lagoas (1).
Segundo Von Sperling (2), o uso mais nobre da água é representado pelo
abastecimento de água doméstico, o qual requer a satisfação de diversos critérios de
qualidade. E há uma carência na atenção dedicada ao uso da água para recreação, que
constitui uma das mais antigas formas de apreciação desse recurso.
No Brasil o uso da água para fins de recreação pode ser classificado de acordo com o
tipo de contato entre o usuário e as águas. O contato primário é o contato direto dos
usuários com os corpos de água, que envolvem atividade esportiva ou de lazer, dentre
eles, natação, surfe, windsurf, kitesurf e mergulho. Enquanto que no contato secundário
existe contato indireto com a água, tais como, pesca, usuários de jet-ski e navegação.
A Resolução CONAMA Nº 274 de 29 de novembro de 2000 é um instrumento
específico que estabelece os critérios e limites para análise e avaliação da evolução da
qualidade das águas destinadas à recreação de contato primário, sendo utilizada tanto em
praias litorâneas quanto em águas interiores (lagoas, rios, cachoeiras, bacias e
reservatórios). Por meio dessa resolução as águas são classificadas como próprias ou
770
impróprias, a partir do resultado das análises microbiológicas em águas doces (águas com
salinidade igual ou inferior a 0,50 %o), salobras (águas com salinidade compreendida entre
0,50 %o e 30 %o) e salinas (águas com salinidade igual ou superior a 30 %o), de forma a
prevenir danos à saúde (3). A classificação da qualidade das águas é determinada de
acordo com os níveis de coliformes encontrada na análise realizada (Tabela1).
C. Fecais
Classificação E. coli Enterococos
(Termotolerantes)
Excelente 0 a 250 0 a 200 0 a 25
Muito Boa 250 a 500 200 a 400 25 a 50
Satisfatória 500 a 1000 400 a 800 50 a 100
Imprópria >1000 * >800 ** >100 ***
771
contaminação fecal (4). A resolução recomenda o parâmetro Escherichia coli para
avaliação da qualidade microbiológica de águas doces e salinas, e o parâmetro
Enterococos é usado para avaliar a qualidade apenas das águas marinhas (3).
Os coliformes fecais (termotolerantes) são bactérias pertencentes ao grupo dos
coliformes totais; a Escherichia coli são bactérias que fazem parte da família
Enterobacteriaceae, que não causam danos quando estão presentes na flora intestinal
normal do ser humano, porém, quando encontrada em outras regiões do corpo, pode
causar doenças graves, como infecções do trato urinário, bacteremia e meningite; e o
Enterococcus são bactérias do grupo dos estreptococos fecais, e possuem como
característica principal, a alta resistência às condições adversas de crescimento; em sua
maioria, os indicadores de qualidade biológica são de origem fecal humana e de animais,
sendo encontrados em esgotos, efluentes, águas naturais e solos que tenham recebido
contaminação fecal recente (5)(3)(6).
A contaminação das águas naturais representa um dos principais riscos à saúde
pública, sendo amplamente conhecida a estreita relação entre a qualidade de água e
inúmeras enfermidades que acometem as populações, especialmente aquelas não
atendidas por serviços de saneamento (7). Ainda segundo o autor, a gestão de recursos
hídricos possui uma importante integração com o saneamento ambiental e a saúde pública
(Figura 1).
772
Figura 1 - Relação entre gestão de recursos hídricos, saneamento ambiental e saúde pública.
Fonte: Libânio (2005).
773
Referências Bibliográficas
10. Gerba CP, Rose JB, Haas CN. Sensitive populations: who is at the greatest risk?
International Journal of Food Microbiology, v.30, p. 113-123. 1996.
11. 11 Meyers BR. Infectious diseases in the elderly: an overview. Geriatrics v.44, p.4-6.
1989.
774
Análise do conhecimento sobre as principais zoonoses transmitidas por
gatos.
RESUMO: O objetivo deste trabalho foi avaliar o conhecimento sobre Esporotricose, Raiva
e Esporotricose, seus mecanismos de transmissão e compreender a visão que a
população possui sobre os gatos como potencial hospedeiro de doenças. O estudo foi
realizado com a população frequentadora de uma Policlínica Universitária na região do
Capão Redondo - São Paulo através da aplicação de um questionário. Grande parte da
população mostrou-se desinformada independente do grau de escolaridade ou com um
conhecimento parcial sobre zoonoses, especialmente sobre Esporotricose. Uma
porcentagem relevante não compreende o papel do gato como transmissor de doenças.
Isto aponta a necessidade da criação de novas estratégias em educação em saúde que
levem em conta as características da população
Palavras-chave: Saúde Pública; Zoonoses; Conhecimento; Esporotricose;
Toxoplasmose.
775
realidades, pois entender corretamente o papel do gato como vetor de doenças pode
melhorar a convivência com estes animais.
Material e métodos
Tipo de Estudo
Trata-se de um estudo transversal, quantitativo, com delineamento observacional.
Local da Pesquisa
O estudo foi realizado nas dependências da Policlínica Universitária Adventista
localizada no Capão Redondo, região Sul de São Paulo - SP.
Critérios de Inclusão
Indivíduos de ambos os sexos, com idade superior a 18 anos;
Ser paciente ou acompanhante da Policlínica Universitária;
Aceitar participar da pesquisa.
Análises de Dados
Foram realizadas análises descritivas dos dados através do software Stata 13 e seus
resultados apresentados em gráficos e tabelas.
Aspectos Éticos
A pesquisa foi realizada respeitando as normas que regem a pesquisa em seres
humanos, obedecendo à Resolução n° 466 do Ministério da Saúde e foi submetida ao
776
Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos recebendo o parecer de número
1.773.433.
Resultados
Os resultados deste estudo são referentes à amostra de 80 indivíduos, usuários do
Sistema Único de Saúde (SUS), assistidos pela Policlínica Universitária Adventista
localizada no Capão Redondo, região sul de São Paulo. Entre as principais características
sóciodemográficas dos participantes destaca-se: a idade média dos participantes foi de 46
anos, 76% do sexo feminino e 49% apresentam nível de escolaridade entre ensino médio e
superior incompletos (Tabela 1).
Variáveis do
n (%)
sociodemográficas
Sexo TOTAL
Masculino Feminino
Amostra 19 (24%) 61(76%) 80 (100%)
Faixa Etária
19 – 34 6 (30%) 14 (70%) 20 (25%)
35 – 49 3 (14%) 19 (86%) 22 (27%)
50 – 64 9 (32%) 19 (68%) 28 (35%)
65 – 79 1 (10%) 9 (90%) 10 (13%)
Escolaridade
Analfabeto e Fundamental
7 (25%) 21 (75%) 28 (35%)
incompleto
Fundamental completo e
0 (0%) 11 (100%) 11 (14%)
Médio incompleto
Médio completo e Superior
11 (28%) 28 (72%) 39 (49%)
incompleto
Superior completo 1 (50%) 1 (50%) 2 (2%)
Dos entrevistados, 80% não possuía gatos em casa e, destes, 14% deixou de
criar/adotar por medo de contaminar-se com alguma doença transmitida por eles.
777
Quando perguntados se conheciam a palavra “Zoonose”, 29% dos entrevistados
responderam que sim (Gráfico 1). No entanto, a prevalência dos indivíduos que conheciam
a toxoplasmose foi de 38% e 74% para a raiva. Apenas 1% dos entrevistados referiu
conhecer a Esporotricose, porém não foi capaz de descrever sua forma de transmissão.
778
A tabela 2 descreve o conhecimento sobre as formas de transmissão da
toxoplasmose e raiva. Sobre a Toxoplasmose, 44% dos que afirmaram conhecer a
doenças não souberam responder sobre sua transmissão e 32% respondeu que ocorre
através das fezes do gato. Sobre a Raiva 71% dos entrevistados respondeu que a
transmissão ocorre através de mordidas e arranhões seguido de 21% que não souberam
responder. Ao serem questionados se existe possibilidade de cura para a Raiva, 74%
responderam que sim.
779
Gráfico 5: Percepção sobre relação entre abandono de gatos e zoonoses dos indivíduos de
19 a 79 anos assistidos pela Policlínica Universitária Adventista.
Discussão
780
gato e seus hábitos e, por isso, preferem a criação do cão com a oferta de benefícios como
a proteção do lar e recreação (4).
A minoria das pessoas (29%) respondeu conhecer o termo zoonose e muita dessas
pessoas acreditava que o termo se referia ao Centro de controle de Doenças. Porém
quando perguntados se já ouviram falar sobre a Toxoplasmose ou Raiva o número de
pessoas conhecedoras aumentou, isto favorece ao entendimento de que a população sabe
que os animais, inclusive os gatos, podem transmitir doenças, apenas não reconhecem o
termo técnico zoonose, o que pode dificultar a busca de informações destas pessoas.
A toxoplasmose é uma enfermidade parasitária causada pelo protozoário Toxoplasma
gondii, que pode alcançar um índice de contaminação maior que 60% entre diversos
mamíferos inclusive o homem (5). Um total de 38% dos entrevistados referiu conhecer a
toxoplasmose, sendo esta uma zoonose mais propagada pela mídia. Ainda assim,
aproximadamente 44% dos que afirmaram conhecer a doença, desconheciam informações
sobre grupo de risco e forma de transmissão.
Os casos mais graves associados à toxoplasmose estão ligados a grávidas que
contraíram a doença no momento da gestação, onde no primeiro trimestre estão mais
susceptíveis a sofrer aborto, morte fetal, prematuridade ou doença fetal grave (6). Um
sistema imune comprometido também pode provocar lesões graves e até morte, como
indivíduos portadores da Síndrome de Imunodeficiência Humana (AIDS) (7).
Sobre a transmissão da toxoplasmose a opção mais apontada foi: contato com as
fezes dos gatos (32%), reforçando que as informações que estes possuem sobre a
toxoplasmose são insuficientes. Os gatos infectados podem eliminar nas fezes na fase
aguda o parasita, porém estes têm o hábito de enterra-las e isso minimiza
consideravelmente as chances de transmissão fecal (8). A forma mais frequente de
transmissão do Toxoplasma é através da ingestão de alimentos contaminados,
especialmente carnes cruas e malcozidas, alternativa apontada por apenas 6% dos
participantes.
Dos 80 entrevistados, 99% nunca escutaram falar sobre a Esporotricose, uma micose
causada pelo genero Sporothrix, transmitida como zoonose através de mordidas ou
arranhões de felinos. Este resultado ratifica as informações divulgadas pelos órgãos
oficiais de controle de zoonoses. A Esporotricose é uma doença pouco divulgada pela
mídia e profissionais de saúde, apesar estar tomando proporções epidêmicas no estado do
781
Rio de Janeiro. No futuro, pode representar um problema de saúde pública, resultante da
ausência de um programa ou ações para o controle da infecção em humanos e animais
ainda em prevalências controláveis (9,10).
Dos estudados, 74% conheciam sobre a Raiva e associaram o gato a sua
transmissão, isso porque é uma das zoonoses com um investimento alto em campanhas.
Cerca de 70% citou “mordidas e arranhões” como a forma de contágio da doença, este
número alto de acertos provavelmente está relacionado à subjetividade do nome “Raiva”,
que leva à ideia de agressão ou ataque.
Uma das principais formas de combate a Raiva é através dos programas de
vacinação, porém estes estão alinhados a iniciativa da população de levarem seus animais
para vacinar-se, que só poderá acontecer se os donos tiverem a consciência da gravidade
da doença. 74% dos entrevistados citaram que a Raiva tem cura. Conhecer as
consequências de uma enfermidade leva a atitudes de prevenção, que são de grande
importância na raiva, já que após a doença ser instalada não há tratamento disponível (11).
Apesar das doenças transmitidas por gatos não chegarem ao conhecimento da
grande maioria da população, a mesma acredita que eles transmitem doenças. Dentre os
participantes deste estudo 16%, de forma equivocada, não associa o abandono de gatos
ao aumento na transmissão de zoonoses. Neculqueo e Paola (12) afirmam que muitos dos
animais estão nas ruas por consequência do abandono e no ato da defecação podem
contaminar o solo em que os humanos, principalmente crianças, circulam. Estes animais
também tem o ato de rasgar lixo, poluindo as cidades e atraindo outros vetores de doenças
como ratos e insetos, o que afeta negativamente a saúde humana e animal (13, 14).
Outras pesquisas como a de Nunes e colaboradores (15) corroboram com os
resultados de que as populações têm um conhecimento parcial ou nulo sobre zoonoses,
quando se trata das transmitidas por gatos este saber reduz significantemente. As
informações sobre zoonoses, nem sempre alcançam a todos, sendo necessário programar
ações de educação sanitária principalmente em áreas carentes.
A compreensão sobre práticas de prevenção de zoonoses pode variar de acordo
com os hábitos e costumes de uma população e que é possível ter conhecimento sobre o
tema, mas não utiliza-lo no dia a dia (16). Assim para dar início a uma ação de educação
em saúde devem-se levar em consideração os aspectos sóciodemograficos, tal como
cultura e crenças, para gerar em uma comunidade não só o saber, mas o efetuar (17).
782
É importante esclarecer sobre a relação homem-animal para que os donos e seus
vizinhos se sintam mais seguros e desmistifiquem certas ideias em relação ao gato. A
educação leva ao exercício de atitudes positivas, é uma arma inesgotável e fundamental
para a prevenção de doenças, principalmente as zoonoses onde o homem participa do
ciclo evolutivo de diversos parasitas. Mais da metade (51%) da população estudada tinham
entre ensino médio completo e superior incompleto que inclui também estudantes de
cursos de saúde. Um estudo de Tome et al., (18) mostra a importância de promover a
educação continuada entre professores do ensino infantil. Alguns profissionais de saúde
que trabalhavam no local de estudo demonstraram interesse no estudo e admitiram não
possuir informações suficientes, este poderia ser um grupo prioritário na capacitação em
educação em saúde já que são os mesmos que poderão estar a frente em campanhas
futuramente.
Dos pesquisados 41% priorizam a procura por postos de saúde quando necessitam
obter informações superando até o uso de internet. Lima et al., (4) cita que comparado a
outros meios de comunicação em saúde a internet ainda tem uma influencia menor.
Porém ela não é insignificante e pode alcançar grupos específicos, se bem executada
pode ser uma ferramenta grandiosa.
Conclusão
Diante dos resultados aqui apresentados pode-se concluir que grande parte da
população estudada não possui os conhecimentos básicos sobre zoonoses, em destaque
a Esporotricose onde quase nenhum dos estudados conhecia. Sendo assim, faz-se
necessário a criação de políticas públicas de educação em saúde constantes que ensinem
a população sobre zoonoses e guarda responsável, utilizando meios de comunicação
eficazes e que se adaptem a realidade local. Os profissionais de saúde devem ser
preparados para atuarem como difusores de conhecimento em zoonoses e serem capazes
de trabalhar junto com a comunidade para o desenvolvimento de hábitos que
proporcionem o bem-estar do homem, animal e meio ambiente. É de suma importância
também as campanhas de castração a fim de evitar o aumento da população de animais e
consequentemente o abandono.
783
Referências
2. Santana L. et al. Posse responsável e dignidade dos animais. Anais congresso. 2004;
533–552.
8. Martins, C.S.; Viana, J.A. Toxoplasmose - o que todo profissional de saúde deve saber.
Enciclopédia Biosfera. 2011;15(3):33-37.
10. FIOCRUZ. Doença que afeta principalmente os gatos se torna endêmica no Rio de
Janeiro. Disponível em: <http://portal.fiocruz.br/pt br/content/doen%C3%A7a-que-afeta-
principalmente-os-gatos-se-torna end%C3%AAmica-no-rio-de-janeiro>.
11. Costa, w. A. Profilaxia da raiva humana. Manual técnico do instituto pasteur. São
paulo. 2000; 2:1.
12. Neculqueo C., paola, L. Estudo do programa de esterilização das populações canina
e felina no Município de São Paulo, período 2001 a 2003. Tese de Doutorado.
Universidade de São Paulo.
784
14. Guimarães, A. M. et al. Ovos de Toxocara sp. e larvas de Ancylostoma sp. em praça
pública de Lavras, MG. Revista de Saúde pública. 2005; 39(2): 293-295.
16. Cediel, N. et al. Risk perception about zoonoses in immigrants and Italian workers in
Northwestern Italy Percepção de risco sobre zoonoses em trabalhadores imigrantes e
italianos no Noroeste da Itália. Revista de Saúde Pública. 2012;46(5).
17. SAÚDE, M. DA (ED.). Guidelines for Zoonoses Surveillance, Prevention and Control:
technical and operational standards. Brasília, 2016.
785
Comunicação, informação e conselhos de saúde: um estudo em dois
municípios de Minas Gerais
Introdução
O Brasil viveu uma ditadura militar até pouco tempo, o final da década de 1970 e os
anos 1980 foram marcados pela luta da sociedade civil brasileira exigindo liberdades
democráticas, fim da repressão, eleições diretas e a participação da sociedade na
definição e elaboração das políticas públicas. Nesse contexto, foi promulgada a
Constituição Federal do Brasil em 1988, conhecida como “constituição cidadã”, isso porque
traz em seu arcabouço garantias sociais nunca expressas nas constituições brasileiras
anteriores. Dentre as garantias, está a participação da sociedade na fiscalização e
acompanhamento da implementação das políticas públicas, portanto, a participação da
sociedade é um dos pilares desta Constituição.
No campo da saúde pública organizada no Brasil, por meio do Sistema Único de
Saúde (SUS), as práticas e os mecanismos de participação social constituem referências
para a democracia participativa que se dá formalmente por meio dos conselhos e
conferências de saúde. Nesses espaços de participação há representação de segmentos
de governo, prestadores de serviços, trabalhadores e usuários da saúde.
Os conselhos são órgãos que funcionam permanentemente e tem a função de
fiscalizar, acompanhar, avaliar, e propor ações e políticas de saúde para uma determinada
786
localidade que pode ser de abrangência municipal, estadual ou nacional. A Lei determina
também que as conferências devem acontecer pelo menos a cada quatro anos. As
conferências têm a responsabilidade de avaliar as políticas de saúde e têm caráter
propositivo, além de decidir sobre as diretrizes a serem seguidas pela gestão dos serviços
de saúde por um período (1).
Em 2012, o Conselho Nacional de Saúde aprovou a Resolução n.º 453 em
substituição à Resolução n.º 333 (2). Essa Resolução define as diretrizes para instituição,
reformulação, reestruturação e funcionamento dos Conselhos de Saúde e estabelece
diretrizes gerais para organização dos conselhos de saúde em todo o território nacional, e
traz na sua primeira diretriz a definição do conselho de saúde:
787
‘comunicação e informações’ para o controle social está presente ou ausente nas pautas,
atas, deliberações dos conselhos de saúde e nos relatórios de conferências de saúde
desses municípios.
Partimos do pressuposto de que a organização das discussões que ocorrem nos
conselhos de saúde e a deliberação democrática nesses espaços estão relacionadas
também à informação e à comunicação. A informação de que falamos neste artigo é
aquela que o conselheiro necessita para a tomada de decisão, ou seja, a informação na
forma de relatórios e estudos que irá subsidiar a maneira de atuar no fórum. Já, a
comunicação está relacionada à comunicação dos atos e atuação dos conselhos para fora
desses espaços. A partir disso, consideramos que a informação e a comunicação estão
intrinsecamente ligadas ao exercício do controle social, à prática cotidiana dos
conselheiros, pois esses necessitam cumprir o papel de controle do Estado e também
dialogar permanentemente com a sociedade, cumprindo assim, por meio da democracia
participativa, sua função representativa.
É preciso estabelecer uma agenda política para que seja ampliada a discussão com a
sociedade sobre a informação e comunicação para o exercício do controle social em todo o
país, pois isso vai significar um avanço na melhoria do SUS e a ampliação da democracia
no Brasil. Pactuando desse pensamento, Silva (7) afirma:
788
reflexão, pois, uma questão paradoxal é que os Conselhos de saúde têm informação de
quem irá executar as ações de saúde, cujo objeto de fiscalização será esse mesmo
fornecedor de informações. Essa questão é tão complexa que o Conselho Nacional de
Saúde tem discutido muitas formas para que o controle social seja qualificado para o
exercício das suas funções. A informação e comunicação têm ocupado espaços na arena
de debates no controle social, e isso tem possibilitado a discussão para o desenvolvimento
de políticas voltadas à educação permanente dos conselheiros e sociedade civil
organizada que atuam no campo da saúde.
Para tanto devemos considerar que a comunicação e a informação fazem parte das
formas de relações sociais e de poder da sociedade nas quais são organizados diferentes
e inúmeros feixes simbólicos, cuja principal função é a de demarcar as interações sociais,
os lugares, as falas de cada um como ordem de poder e dentro de uma perspectiva
dialógica e educativa, a comunicação e a informação devem ser entendidas e direcionadas
para que os sujeitos envolvidos transformem-se em sujeitos de argumentação e de opinião
- para buscar esclarecimentos, propor ações e processos de sociabilidade baseados nos
princípios de compartilhamento dos sentidos(13).
É possível exercer e efetivar as atividades relacionadas com o controle social nos
Conselhos de saúde se houver investimento em processos comunicacionais e
informacionais capazes de promover a livre circulação de informação e ideias, tanto dentro
do conselho quanto fora (no diálogo com a sociedade) e para isso, devem ser criadas
estratégias livres e claras, e instrumentos ou meios de comunicação que mantenham
sintonia com a sociedade. Só é possível construir um sujeito social que exerça sua
cidadania e atue na formulação de políticas públicas em saúde com comunicação e
informação (14).
Configuram-se como objeto empírico deste estudo, dois Conselhos Municipais de
Saúde de Minas Gerais, nos municípios de Brumadinho e Sarzedo. Foram analisadas as
atas e pautas das reuniões plenárias dos conselhos de saúde e os relatórios de
conferências de saúde. Esses dois municípios fazem parte da Região Metropolitana de
Belo Horizonte - Minas Gerais (RMBH-MG) que é composta por trinta e quatro municípios
com uma população de 4,8 milhões de habitantes (15). A região tem uma grande
representação econômica para o estado de Minas Gerais. Nesse contexto estão inseridos
789
dentro da RMBH: a metrópole e capital, Belo Horizonte; grandes municípios; e municípios
de médio e pequeno porte como os que nos propormos a estudar.
Esse trabalho é uma parte da dissertação de mestrado que desenvolvemos, intitulada
‘Comunicação, informação e controle social no Sistema Único de Saúde: um estudo em
dois municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte – MG’ e defendida no mês de
abril do ano de 2014.
Metodologia
790
autonomia para definir a periodicidade das suas conferências, podendo ocorrer em um
intervalo menor de tempo.
As atas, pautas e deliberações foram documentos extremamente relevantes para
essa pesquisa, pois serviram como objeto de estudo sobre o que tem sido deliberado nos
conselhos, no período de dezembro 2012 a dezembro de 2013; e para confrontar as
deliberações das conferências.
Resultados e discussão
791
conferência de saúde e que o conselho crie um informativo para comunicar-se com a
sociedade. Podemos dizer que é percebido, mesmo que acanhadamente, a necessidade
de diálogo com a sociedade. Arriscamos dizer, que essas deliberações constam nos
relatórios porque percebeu-se uma ausência desse diálogo entre o conselho e a
sociedade.
De acordo com o Regimento Interno do CMS Sarzedo, a Conferência Municipal de
Saúde deverá ocorrer de dois em dois anos e será convocada, organizada e divulgada
pelo CMS de Sarzedo em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde.
Detectamos apenas uma deliberação sobre comunicação para o controle social na
conferência do ano de 2010, sendo esta a criação de um boletim informativo para o
conselho. Na conferência do ano de 2013, o tema da comunicação e informação foi tratado
em um eixo denominado: informação e comunicação como estratégia para a gestão
participativa no SUS. Nesse eixo, as deliberações foram: criação de programa para
educação continuada nas escolas, igrejas, associações comunitárias; realização de oficina
de controle social para toda a população; realização de capacitação para os conselheiros
de saúde; criação da ouvidoria da saúde; cumprimento das deliberações do controle social;
criação de informativo para esclarecimento da população sobre a saúde no município.
Percebemos que foi apontada a necessidade do conselho dialogar com a sociedade:
seja por meio de criação de informativo, seja por meio de realização de oficinas para a
população conhecer o conselho. Também, pela necessidade do conselheiro ter
informações a partir de capacitações que dão subsídios a sua atuação. E nesse campo há,
ainda, uma deliberação que trata da necessidade da gestão cumprir as deliberações do
conselho.
792
SUS. Cabe ao gestor legalmente constituído em cada esfera de governo homologar as
deliberações dos conselhos, para Silva (2003) essa exigência torna a deliberação do
conselho dependente da vontade política do governo em exercício e dependência dos
conselhos prejudica o seu funcionamento, inclusive, o seu papel de órgão deliberativo (21,
22)
Nos Regimentos Internos dos conselhos pesquisados consta que a gestão deve
acatar as deliberações do conselho e, se não o fizer, cabe rediscussão nos próprios
conselhos e encaminhamentos para outros órgãos como, por exemplo, para o Ministério
Público.
793
Foram analisadas atas, pautas e deliberações de dezoito reuniões: doze reuniões
ordinárias e seis reuniões extraordinárias.
Até o mês de maio/2013 a leitura das atas não constava como ponto de pauta, porém
a partir de junho consta como ponto de pauta a leitura das atas. O documento é lido e
aprovado no início de todas as reuniões.
A prestação de contas foi apresentada e não consta em ata a discussão sobre a
política efetuada no município sobre o tema abordado a políticas e ações de saúde.
Consta em atas a discussão sobre aquisição de materiais para o CMS Sarzedo.
Consta em ata a solicitação de mudança do e-mail institucional do CMS de Sarzedo e
que o conselho tenha sítio na internet, a solicitação foi acatada pelo gestor local para
providenciar informações sobre o conselho no site da prefeitura do município.
Sobre mudança do Regimento Interno, foi aprovado que o assunto seria discutido em
uma próxima reunião extraordinária para que os conselheiros terem mais tempo para ler a
proposta.
A discussão do Regimento Interno não foi realizada em reunião extraordinária para
debater o assunto devido ao número de conselheiros. Embora houvesse quórum, a
plenária decidiu que esse assunto deveria ser debatido com o maior número de
conselheiros possíveis.
É recorrente a solicitação de tempo hábil para que os conselheiros possam analisar
os projetos da Secretaria Municipal de Saúde.
Em reunião do dia 11 de junho de 2013 foi criada a Comissão de Comunicação com o
objetivo de providenciar a confecção de boletim informativo e outras questões pertinentes à
Comissão.
Resultados
Os resultados da pesquisa realizada nos dois conselhos nos mostram que há poucos
investimentos informacionais e comunicacionais nos conselhos de saúde e isso dificulta e
compromete a participação dos conselheiros. A ausência do tema ‘comunicação e
informação” nas deliberações dos conselhos pesquisados demonstra a dificuldade em
realizar o debate a cerca do tema e colocar em prática deliberações sobre ele.
A falta de diálogo do conselho com a sociedade acarreta o desconhecimento sobre
as suas ações e isso atribui um grau de pouca importância dado ao órgão pela população.
794
Observamos que as deliberações das conferências de saúde não cumprem seu papel
de subsidiar as ações dos conselhos de saúde. Os relatórios das conferências
pesquisadas trouxeram deliberações sobre a comunicação e informação, ainda que
tímidas, no entanto, no relatório da conferência consta que o gestor deve cumprir as
deliberações do conselho, isso já está previsto em lei, porém o sentimento dos delegados
da conferência deve ser o de que não são cumpridas as deliberações do conselho de
saúde, por parte da gestão.
No CMS de Brumadinho não foi encontrada nenhuma deliberação que fosse discutida
nas reuniões plenárias, no período após a realização da conferência de saúde, que serviu
de análise dessa pesquisa. No CMS de Sarzedo, observamos a presença da agenda
mínima sendo construída para subsidiar as ações do conselho, também foi possível
detectar a criação da comissão de comunicação para a confecção do boletim informativo
para o conselho. No entanto, nenhum dos dois conselhos possuíam um boletim informativo
para dar publicidade às suas ações.
No CMS de Brumadinho há presença de comissões temáticas que são expressas no
Regimento, no entanto, a comissão de comunicação praticamente não está em
funcionamento e não tem realizado produção e discussão sobre comunicação do conselho.
No CMS de Sarzedo, a mesa diretora cumpre o papel de comissão: quando há
necessidade de criação de comissão para discussão e encaminhamento de um
determinado assunto específico o plenário do conselho tem autonomia de criação dessa
comissão.
A construção da pauta é determinada pelos conselhos, no entanto, observamos na
análise das atas que a pauta é, na maioria das vezes, solicitada pela gestão. Percebemos
que há uma insatisfação dos conselheiros quanto a isso, por esse motivo o CMS de
Sarzedo discutiu e deliberou sobre a realização de uma agenda mínima do órgão, pautada
na necessidade de discussão do conselho, observando as normas legais que devem ser
cumpridas por ele e acrescentando outros itens de ordem mais política para a ação
cotidiana dos conselheiros.
Quanto às estratégias de comunicação, observamos nos dois conselhos que elas não
acontecem como deveriam, praticamente não existem. Internamente, os conselheiros
comunicam-se via reuniões, alguns por e-mails e durante as reuniões das comissões
quando essas acontecem. Externamente, a comunicação com a sociedade é praticamente
795
inexistente: detectamos que alguns conselheiros dialogam com o segmento que
representam, mas isso não é uma prática cotidiana dos conselheiros entrevistados. Os
conselhos não utilizam rádios comerciais, nem rádios comunitárias para dialogarem com a
sociedade, não possuem boletim impresso ou eletrônico para informar a população sobre
as suas ações, não possuem site, blog ou outra forma virtual de comunicação. Partindo
desse pressuposto, podemos dizer que o diálogo com a sociedade é inexistente, o que
prejudica a função que deve ser exercida pelo conselho.
Conclusão
Referências
796
2. ______. Conselho Nacional de Saúde. Ministério da Saúde. Resolução n.º 453, de
10 de maio de 2012. Aprova as diretrizes para criação, reformulação, estruturação e
funcionamento dos conselhos de saúde. Diário Oficial da União [da] República
Federativa do Brasil, Brasília, DF, n. 109, Seção 1, p. 138.
3. AVRITZER, L. Conferências Nacionais: ampliando e redefinindo os padrões de
participação social no Brasil. Texto para discussão. Brasília: Ipea, 2012. Disponível
em:
<http://www.consocial.cgu.gov.br/uploads/biblioteca_arquivos/274/arquivo_f4176c95
63.pdf> Acesso em: 23 de janeiro de 2014.
4. LABRA, Maria Eliana. Conselhos de Saúde: visões “macro” e “micro”. Revista de
Ciências Sociais, v. 6, n. 1, jan-jun., 2006.
5. GOHN, M.G. Conselhos gestores e participação sociopolítica. São Paulo: Cortez,
2003. Coleção Questões da nossa época, v. 84.
6. MORONI, A. J. O direito a participação no governo Lula. In: FELURY, S.; LOBATO,
L.V.C. (Orgs.). Participação, democracia e saúde. Rio de Janeiro: Cebes, 2010. p.
248-269.
7. SILVA, I.G. Democracia e participação na Reforma do Estado. São Paulo Cortez,
2003.
8. ______. Lei n.º 8.080. Lei Orgânica da Saúde, de 19 de setembro de 1990. Dispõe
sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a
organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras
providências. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília,
DF, 20 set. 1990a.
9. ______. Lei n.º 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Dispõe sobre a participação da
comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências
intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras
providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 31 dez.
1990b.
10. ______. Decreto n.º 7.508, de 28 de junho de 2011. Diário Oficial da União [da]
República Federativa do Brasil, Brasília, DF, p. 1.
11. GOHN, M.G. Conselhos gestores e participação sociopolítica. São Paulo: Cortez,
2003. Coleção Questões da nossa época, v. 84. 2003b.
12. ______. Comunicação, informação e participação popular nos conselhos de saúde.
Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 13, n. 2, p.56-69, mai./ago, 2004.
13. ______. Comunicação e Saúde: Desafios práticos e conceituais. In: Caderno Mídia
e Saúde pública: 20 anos do SUS e 60 anos da Declaração Universal dos Direitos
Humanos. Belo Horizonte: ESP MG, 2008. p. 11-22.
14. OLIVEIRA, V. C. Comunicação, informação e controle público ou social nos
conselhos municipais de saúde. 2012. (No prelo)
15. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010: contagem
populacional. Disponívelem:
<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/tabelas_pdf/total_po
pulacao_minas_gerais.pdf.>Acesso: 20 mai. 2013.
797
16. MOREIRA, S.V. Análise documental como método e como técnica. In: DUARTE, J;
BARROS, A. Métodos e Técnicas de Pesquisa em Comunicação. São Paulo: Atlas,
2010. p.269-279.
17. FLICK, U. Introdução à pesquisa qualitativa. 3.ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.
18.
798
Educação em saúde no combate ao câncer da próstata
RESUMO: O câncer de próstata (CP) é uma neoplasia que apresenta, entre suas
características, a multiplicação das células da próstata de forma desordenada
(RODRIGUES et al., 2013).Esta patologia tem como fatores de risco para o seu
desenvolvimento principalmente a idade, raça/etnia, histórico familiar, dieta rica em gordura
animal, tabagismo e etilismo (MEDEIROS et al., 2011).A Sociedade Brasileira de Urologia
preconiza a realização dos exames de toque retal e PSA sérico a partir do 50 anos de
idade, mesmo em paciente assintomático, já que não existe prevenção para CP (EL
BAROUKI, 2012). Estes aspectos foram cruciais para a realização de uma parceria
colaborativa entre o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e o Centro Universitário
Adventista de São Paulo (UNASP), representados pela pós-graduação em Saúde Pública
e Mestrado Profissional em Promoção da Saúde, para a elaboração da pesquisa sobre o
tema “Combate ao câncer da próstata: ouvindo a opinião dos homens”. O estudo
contemplou questões da educação em saúde, a qual foi efetivada, também, com a
elaboração de duas cartilhas. Considerou-se que estas poderiam, dentro das ações
contempladas pela pesquisa, contribuir para melhor compreensão sobre a doença e
diagnóstico precoce.
Palavras-chave: câncer de próstata, fatores de risco, sinais e sintomas, diagnóstico
precoce e preconceito.
Introdução
O câncer de próstata (CP) é uma neoplasia que apresenta, entre suas características,
a multiplicação das células da próstata de forma desordenada (RODRIGUES et al., 2013).
Este câncer é o sexto tipo mais comum no mundo e prevalente entre homens, perdendo
apenas para o câncer de pele não melanoma (MEDEIROS et al., 2011).
Segundo o Instituto Nacional de Câncer, no Brasil, estimam cerca de 61.200 casos
novos de CP, para o ano 2016 (INCA, 2016). Apesar da alta incidência, a mortalidade por
CP é relativamente baixa, cerca de 10% do total de canceres no mundo (MEDEIROS et al,
2011).
Diversos fatores têm sido apontados como determinantes para o aumento da
incidência de CP, dentre eles destacam-se: aumento da expectativa de vida, maior
799
conhecimento das doenças da próstata e as campanhas de identificação (PAIVA et al,
2011).
Este tipo de câncer é assintomático em um alto percentual de indivíduo, sendo
imprevisível sua evolução, mas com avanço da doença podem apresentar sintomas como
dor óssea, dificuldade ao urinar, jato urinário fraco e sensação de não esvaziar totalmente
a bexiga (RODRIGUES et al., 2013) (MAIA, 2012).
Esta patologia tem como fatores de risco para o seu desenvolvimento principalmente
a idade, raça/etnia, histórico familiar, dieta rica em gordura animal, tabagismo e etilismo
(MEDEIROS et al., 2011).
Não existe prevenção para CP, porque ainda não são perfeitamente conhecidos os
mecanismos que transformam células normais da próstata em malignas, tornando
imprescindível o diagnóstico precoce (RODRIGUES et al., 2013).
A Sociedade Brasileira de Urologia preconiza a realização dos exames de toque retal
e dosagem antígeno prostático especifica (PSA) sérico a partir do 50 anos de idade,
mesmo em paciente assintomático. O prognóstico é melhor quando o câncer é detectado
prematuramente (EL BAROUKI, 2012).
Torna-se necessário superar o preconceito, o medo e as barreiras impostas para a
não realização do exame preventivo do toque retal. Estes são aspectos significativos da
realidade masculina (MAIA, 2012).
O exame de toque retal possui fortes implicações no simbolismo masculino, o que
contribui para que muitos homens não o realizem (MAIA, op.cit).
Estes aspectos foram cruciais para a realização de uma parceria colaborativa entre o
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e o Centro Universitário Adventista de São
Paulo (UNASP), representados pela pós-graduação em Saúde Pública e Mestrado
Profissional em Promoção da Saúde, para a elaboração da pesquisa sobre o tema
“Combate ao câncer da próstata: ouvindo a opinião dos homens”. O estudo contemplou
questões da educação em saúde, a qual foi efetivada, também, com a elaboração de duas
cartilhas. As duas cartilhas seriam complementos da pesquisa, funcionando como material
de educação e informação. Considerou-se que estas poderiam, dentro das ações
contempladas pela pesquisa, contribuir para melhor compreensão sobre a doença e
diagnóstico precoce.
800
Objetivos:
Desenvolver um instrumento de informação (cartilha) para ser distribuído entre
servidores do Tribunal de Justiça do estado de São Paulo; trabalhar com educação em
saúde.
Material e Métodos
As cartilhas foram fruto de reflexões coletivas e, desenvolvidas a partir das reuniões
do grupo de estudos “Papo de saúde: construindo o discurso a partir do diálogo”. A
elaboração das cartilhas esteve sob a responsabilidade de uma pós-graduanda do curso
de Saúde Pública.
Os artigos utilizados como base para a confecção das cartilhas foram escolhidos a
partir das questões consideradas relevantes no tocante ao tema. Para tal foi necessário
definir o objetivo da cartilha, para que não se tornasse apenas uma ilustração. Na
concepção e construção da mesma foi observado rigor metodológico, simultaneamente
trabalhou-se com uma linguagem simples e compreensível.
As cartilhas foram elaboradas por meio de estudo bibliográfico, a partir da seleção de
sete artigos nacionais disponíveis online, publicados entre os anos de 2011 e 2015. As
palavras chaves para busca foram: homem, câncer de próstata, saúde masculina. . A
busca de ilustrações foi feita por meio de pesquisa no Google Acadêmico com imagens
relacionadas ao tema câncer de próstata. Foram selecionados os manuscritos que
respondiam as questões discutidas no grupo de pesquisa.
Os desenhos e os dizeres se aproximaram dos dados de realidade da população que
receberiam o material: servidores do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
As duas cartilhas foram distribuídas em momentos diferentes do projeto, uma quando
do início da investigação e, outra em evento que finalizava o trabalho.
Resultados
O trabalho foi desenvolvido na equipe de pesquisa “Papo de saúde: construindo o
discurso a partir do diálogo” e, coordenado por uma pós-graduanda em Saúde Pública Os
artigos selecionados pontuaram aspectos importantes sobre o câncer da próstata, riscos,
801
detecção precoce, sintomas, exames, sequelas, tratamento e preconceitos comum relação
ao exame de toque retal.
A primeira cartilha foi distribuída para os servidores do Tribunal de Justiça de São
Paulo, quando da entrega de um questionário que investigava suas opiniões sobre o
exame de detecção do câncer de próstata.
802
Conclusões
803
abertas possibilidades para futuros projetos em serviços, objetivando ações de educação
em saúde e acolhimento no âmbito da população masculina.
Destaca-se, também, que projetos como este trazem novas formas de aprendizado.
Com a elaboração destes dispositivos os pós-graduandos de Saúde Pública, deixam sua
marca no intuito de informar e assistir à população, ou seja, inserção social.
É possível que a cartilha faça a diferença na vida de alguns homens, que a partir
dela possam escolher a saúde no lugar do preconceito. Espera-se que ela transite além do
grupo alvo: ande pelas famílias e vizinhanças, ou, simplesmente circule até o colega do
trabalho.
Referências
804
Sexualidade na Adolescência e as Mídias Digitais: riscos, benefícios e
desafios para a enfermagem no século XXI
Murilo Lopes1
Fábio Corrêa
Diego Araújo
Introdução
A sociedade contemporânea torna-se cada vez mais tecnológica e, diante dessa
realidade, entende-se que, principalmente, o público adolescente-jovem, convive com as
tecnologias digitais de comunicação e informação antes mesmo de alcançarem sua
especifica faixa-etária. É fato, que as mídias digitais, possuem forte influência sobre o
comportamento deste público, inclusive sobre sua sexualidade, tornando-se assim, essa
realidade, um desafio para a enfermagem no século XXI.
Atualmente, “os adolescentes não vivem mais no “mundo da lua”, mas no “espaço
das nuvens” do mundo digital” (1). Um mundo global, que oferece todos os tipos de
aventuras com detalhes audiovisuais, porém, também apresenta novos riscos à saúde que
acontecem numa época especial do desenvolvimento cerebral, mental e corporal da
adolescência.
Assim, entende-se que “para compreender o comportamento das novas gerações,
principalmente em relação a sexualidade, é preciso conhecer e apropriar-se das mídias
utilizadas, pois estas promovem diferentes relações entre adolescentes” (2). O contexto em
805
que vive esta geração, “é imerso no uso do celular e do computador, utilizando-se das
mídias digitais, como uma de suas principais formas de comunicação no século XXI” (1).
Pode-se dizer que mídia é o “conjunto dos meios de comunicação, ou seja, designa
os meios, ou conjunto de meios de comunicação” (3). “É a grafia aportuguesada da palavra
media, conforme pronunciada no inglês. Media é o plural de medium, palavra latina que
significa meio” (4).
No sentido técnico,
806
retorno traduz-se em variáveis quantidades de manifestações, além de
observar uma busca por experiências sexuais, que alguns sociólogos
denominam de pansexualidade, onde tudo é possível na mídia digital (10).
Metodologia
Trata-se de uma revisão sistemática de literatura. Este tipo de estudo produz um
resumo de todos os estudos sobre determinada intervenção ou tema: mediante a aplicação
de métodos explícitos e sistematizados de busca com apreciação crítica (11).
Esta pesquisa segue os esforços de outras no sentindo de ajudar e recolher,
organizar, sintetizar e compartilhar conhecimento sobre a temática. Tal esforço se justifica
para que cada vez mais haja profissionais competentes para lidar com situações onde
sejam requeridos conhecimentos dos riscos da utilização das mídias digitais durante o
desenvolvimento da sexualidade de adolescentes, tão como, os benefícios que essa
realidade pode proporcionar no que tange a educação sexual.
Nesta pesquisa para elaborar a questão foi utilizada a estratégia mnemônica PICo,
onde “P” (14), refere-se à população do estudo, “I” ao fenômeno de interesse e o “Co” ao
contexto, e chegou a seguinte estrutura:
P = Adolescência (sexualidade; comportamentos; atitudes)
I = Riscos; Benefícios; Desafios para a enfermagem
Co = Era digital (Mídias digitais)
Assim, a questão norteadora definida foi: Quais os riscos, benefícios e desafios para
a enfermagem relacionados ao uso das mídias digitais durante o desenvolvimento da
sexualidade de adolescentes?
As buscas foram feitas no Portal da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e em três
bases de dados: LILACS, MEDLINE e BDENF. Todas acessadas mediante VPN FAMA. Os
trabalhos pesquisados referem-se aos últimos 10 anos (2007-2016). Em idioma português.
As evidências reunidas referem-se as produções realizadas no país (BRASIL), afim de
807
priorizar conhecer a realidade brasileira, sem desconsiderar a importância do tema
mundialmente.
Como estratégia de busca dos estudos, utilizou-se os Descritores em Ciências da
Saúde (DECs-Bireme): promoção da saúde AND/OR sexualidade AND adolescência AND
WEB 2.0 AND/OR internet AND enfermagem. Deste modo, ficou definido como critério de
inclusão e exclusão:
- Incluídos: artigos indexados em revistas cientificas; em idioma português e que
estivessem de acordo com a temática proposta neste estudo.
- Excluídos: capítulos de livros; artigos incompletos; normas técnicas.
A coleta de dados ocorreu entre os meses de Maio e setembro de 2017 e foi
realizada em quatro etapas: 1) Busca dos documentos; 2) seleção pela leitura dos títulos;
3) Seleção pela leitura dos resumos e 4) Seleção pela leitura do artigo na integra. Estas
etapas colaboram para produção de tabelas e quadros apresentados e discutidos nos
resultados desta pesquisa.
Resultados e discussão
Todas as publicações identificadas foram obtidas a partir das bases de dados
eletrônicas. A busca das referências bibliográficas das publicações selecionadas não foi
necessária, pois as referências de interesse já haviam sido identificadas pelas bases
eletrônicas. Na figura abaixo, verifica-se o processo percorrido nesta revisão sistemática.
Os resultados deste estudo foram divididos em três etapas para melhor compreensão
do leitor e discussão sobre a temática: I – Processo de seleção dos estudos encontrados
na busca; II – Caracterização dos estudos incluídos para revisão sistemática; III – Riscos e
benefícios da utilização das mídias digitais durante o desenvolvimento da sexualidade de
adolescentes.
808
I - Processo de seleção dos estudos encontrados na busca
A partir dos descritores utilizados foram encontrados (35) estudos, distribuídos nas
bases de dados: LILACS, BDENF e MEDLINE. A base de dados que apresentou o maior
número de estudos foi a BDENF (18), seguindo-se da LILACS (14), MEDLINE (03). Do
total de estudos selecionados, após avaliação dos seus títulos e resumos e leitura
completa daqueles potencialmente relevantes, foram (10) artigos indexados nas bases de
dados referentes.
A base de dados que apresentou maior número de estudos selecionados foi a
BDENF (5), LILACS (3) e MEDLINE (2). Não foi encontrada revisão sistemática sobre o
tema da presente investigação dentre (4) revisões sistemáticas encontradas com o uso dos
descritores utilizados.
809
II – Caracterização dos estudos incluídos para revisão sistemática
Base de dados
Ano de
Estudo Título Autores onde foi
publicação
publicado
Desenvolvimento da Eisenstein,
E1 MEDLINE 2013
sexualidade da geração digital. E.
Adolescentes na sociedade do Figueiredo,
E2 LILACS 2015
espetáculo e o sexting. CDS.
Uso do celular por Correr, R.
E3 adolescentes: impactos nos MEDLINE 2016
relacionamentos Faidiga, M.
Educação sexual na escola: Santos,
E4 BDENF 2011
uma ação necessária RAS.
Vojivoda,
E5 Adolescência na era digital BDENF 2012
DC
Influência da mídia no
E6 processo de desenvolvimento Paulo, MMD LILACS 2008
do adolescente
O adolescente e a internet:
E7 laços e embaraços no mundo Prioste, CD BDENF 2013
virtual
“Clica já” – Educação sexual Coimbra,
E8 LILACS 2012
em meio escolar J.A.J
Estefenon,
Geração digital: Riscos das
S.B
E9 novas tecnologias para BDENF 2011
Eisenstein,
crianças e adolescentes
E.
A influência da mídia na Maia, R.F;
E10 BDENF 2007
sexualidade do adolescente Silva, C.P
É possível verificar pelo quadro que nos últimos 10 anos as discussões acerca da
utilização das mídias, sua influência, riscos, benefícios e desafios para os profissionais da
saúde, como a categoria dos profissionais de enfermagem, intensificaram-se. Observou-se
também, que nos últimos 05 anos as produções foram mais frequentes sobre a temática.
Dentre os estudos incluídos, foi possível observar distintos riscos relacionados ao uso
das mídias digitais durante o desenvolvimento da sexualidade de adolescentes, no
810
entanto, também são identificados benefícios no que tange ao uso das TIC, seja para o
próprio adolescente, quanto para os profissionais enfermeiros que trabalham na educação
sexual desta faixa-etária.
Desde que começou a se popularizar no final dos anos 1990, “as mídias digitais, em
especial a internet, criou novos conceitos que foram incorporados ao cotidiano das
pessoas” (12). De todos os grupos de usuários da rede mundial de computadores, “são os
adolescentes e jovens que lidam mais confortavelmente com as ferramentas e novidades
desse novo meio de comunicação” (13).
Assim, para entender o que os adolescentes fazem, como se comunicam, criam laços
de amizades, descobrem sua sexualidade, faz-se necessário identificar os riscos da
realidade digital, que envolvem o público-alvo em questão, tão como, conhecer esta nova
realidade que engloba a sexualidade de adolescentes e as mídias digitais.
RISCOS DEFINIÇÕES/CARACTERISTICAS
- Fuga do mundo real para o virtual. As redes sociais
Redes sociais desempenham, cada vez mais, o papel de “ponte de
digitais comunicação” nas “salas-de-bate-papo”, fóruns e jogos
interativos.
(Facebook;
- Busca de “apoio emocional” de “qualquer relacionamento”
Instagram; Twitter;
em momentos de desespero, solidão, ansiedade, ou
WhatsApp, entre
dificuldades psicossociais.
outras)
- Compartilhamento de textos simples, curtos, diretos com
Sexting ou sem imagens de teor sexual, geralmente via telefones
celulares.
- A dor emocional que causa pode ser enorme tanto para
o/a adolescente na foto como para o/a adolescente que
(Nude selfie)
envia ou recebe a mensagem, podendo ter implicações
legais e criminais.
- Produção de comportamento de bullying assistido pela
tecnologia digital. Qualquer atitude que comunica
repetitivamente mensagens hostis, agressivas, cheias de
Cyberbullying
ódio ou ameaçadoras, com conteúdos sexuais ou não, e
realizadas por adolescentes ou grupos de pessoas com a
intenção de prejudicar ou causar desconforto.
811
- As repercussões na saúde e no comportamento imediato,
e mesmo fora da escola e ao longo da vida adulta para
sempre, e é considerado crime digital.
- São considerados comportamentos de perversão e
criminosos que precedem uma atividade de abuso ou
exploração comercial sexual ou ato de pornografia, no
mundo real ou no mundo digital.
Grooming - Refere-se a atos de sedução e manipulação psicológica
que são realizados com o objetivo de se ganhar uma
relação de confiança e se “tornar amigo” diminuindo a
inibição para se estabelecer uma dependência emocional e
assim um relacionamento de cunho sexual com o
adolescente.
- Violação de um direito humano fundamental,
especialmente o direito ao desenvolvimento de uma
Abuso/exploração sexualidade saudável e uma ameaça a integridade física e
sexual psicossocial de qualquer adolescente.
- As formas de exploração sexual comercial são:
prostituição, pornografia, trafico com fins sexuais.
812
- Através de sua conta pessoal
- As informações
nas redes sociais, o adolescente
compartilhadas nas redes
pode ter um contato maior com os
sociais podem ser acessadas
conteúdos voltados para a
inúmeras vezes e de qualquer
prevenção de doenças nesta fase
lugar do mundo.
da vida.
- Contribui na interatividade
entre o profissional e o - Pode ser utilizado em qualquer
adolescente, ajudando a lugar e hora do dia, em casa, na
interagir diferenciadamente com escola, no parque, entre outros.
o público-alvo.
- A mobilização dos
adolescentes nestes espaços, - Permiti ao adolescente continuar
3. Aplicativos para contribui para que a o aprendizado ou esclarecimento
dispositivos móveis enfermagem possa utiliza-lo à sobre suas dúvidas, mesmo
favor da educação sexual do distante de um profissional.
adolescente.
- O aplicativo permite encontrar
informações dos serviços de
saúde qualificados para o
atendimento do mesmo em
qualquer circunstância.
Conclusão
813
Referências
814
Análise da importância da construção do vínculo em uma comunidade de
extrema vulnerabilidade social: limitações e relato de experiência.
Introdução
A partir da década de 80, por meio da divulgação da Carta de Ottawa, o foco da
saúde mundial passou por mudanças e o papel da família nesse contexto sofreu uma
ressignificação. Esta instituição social tornou-se o centro das ações em saúde, visto a
variedade de elementos que influenciam sua estrutura, como a religião, o ambiente de
moradia, a relação com a comunidade e os hábitos familiares. Dessa forma, é possível
verificar como diversos fatores podem contribuir para a formação da saúde dos indivíduos
e do ambiente ao seu redor, tendo como ponto de partida sua própria família. Logo, vê-se
que o contexto da saúde deve ser encarado de forma descentralizada, holística, buscando
evidenciar todos os fatores que perpassam a sua construção. Assim, deixando de lado
uma visão hospitalocêntrica e estagnada apenas no fator biológico que possa causar
determinada patologia, assumindo o contexto do processo saúde-doença, o qual busca
abarcar todas as variáveis que cercam a saúde da população. [2,3,5,6,7]
É nessa conjuntura mais ampla que se faz necessária uma maior aproximação
perante os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS). Para o seu êxito, o vínculo com a
comunidade deve ser fortalecido, o que pode ser alcançado por meio de um simples ato, o
815
diálogo. Uma ferramenta que, apesar de ser utilizada cotidianamente, assume um papel de
importante na comunidade por ser a única capaz de atravessar as barreiras sociais tão
evidentes e que dificultam o fornecimento de um serviço de qualidade. [1,2]
Dessa maneira, o diálogo, juntamente do convívio na comunidade, permite o êxito
para uma saúde de qualidade pois permitem perceber o que aflige as pessoas, construindo
uma política de saúde mais próxima da realidade. O que busca concretizar o conhecimento
por meio de uma interação mútua, na qual todos os indivíduos contribuem de algum modo
para a saúde local, sem uma hierarquização do conhecimento. Tanto a população quanto
os profissionais de saúde, por meio do diálogo, estabelecem um conhecimento
compartilhado, integrando o saber científico e o saber popular. Assim, a educação popular
e a saúde apresentam-se como um campo de reflexão e ação, compondo um cenário de
equidade e justiça na saúde. [1,2,3,4]
OBJETIVOS
• Apresentar reflexões e limitações sobre a construção do vínculo com uma
comunidade em situação de vulnerabilidade social.
Metodologia
Trata-se de um estudo descritivo, do tipo relato de experiência, elaborado pelos
acadêmicos participantes do projeto de extensão intitulado “Saberes e Práticas de Saúde
no Contexto de uma Comunidade em Vulnerabilidade Social”, aprovado por intermédio do
edital 2016/2017 do Programa de Círculos Comunitários de Atividades Extensionistas
(ProCCAExt), vinculado à Universidade Federal de Alagoas – UFAL – Campus Arapiraca.
As atividades foram desenvolvidas na comunidade Mangabeiras, no Bairro Senador
Arnon de Melo, na cidade de Arapiraca/AL, Brasil, no período de julho de 2016 a agosto de
2017. Houve participação de quadro acadêmicos de Medicina, um de Enfermagem e um
de Serviço Social. Os locais de realização das ações extensionistas o espaço da Cáritas
presente na comunidade, além da Escola de Ensino Fundamental em Tempo Integral Dom
Constantino Lüers, também na comunidade.
O presente trabalho é resultado das ações realizadas com a comunidade, com temas
inseridos no contexto da prevenção e promoção de saúde, com o intuito de integrar o
público-alvo e suas instituições sociais. Os temas abordados foram elencados tanto pela
demanda dos moradores, como também pela necessidade de construção de conhecimento
sobre saúde.
816
Todas as ações foram documentadas através de áudios gravados e fotografias
registradas das ações praticadas, salvando os momentos de fala e escuta do público
presente. Esses materiais foram analisados posteriormente, permitindo reflexão acerca das
atividades desenvolvidas. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido antes de iniciar as respectivas atividades.
Resultados e discussão
Durante o período de realização do projeto foram abordados os seguintes temas:
Conceito de saúde segundo a OMS; Doenças Sexualmente Transmissíveis; Ciclo
Menstrual; Gravidez na adolescência; Métodos Contraceptivos; Prevenção do Câncer de
Mama; Prevenção de Acidentes por fogos de artifício; Acidentes provocados por animais
peçonhentos e desenvolvimento de Habilidades em Primeiros socorros em situações do
cotidiano. As ações aconteciam quinzenalmente, existindo uma semana de planejamento
para a atividade posterior, tomando-se como base as demandas fornecidas pelos
moradores.
“[...] O que eu tenho a dizer é que eu achei muito boa reunião, e para mim é
mais uma satisfação que eu tenho para dar. A bebida eu parei, o cigarro eu
estou mais diminuindo, eu estou me sentindo mais melhor.” (M1).
817
pingos de água sanitária em 1 litro de água para tratar. Quero vir mais
vezes, vocês são muito legais e ensinam sobre saúde” (M2).
818
moradores ficavam mais acomodados devido às condições de tempo chuvoso nos dias de
algumas ações, o que fez com que houvesse menos público nesses dias.
Outro aspecto limitante foi o frágil contato com os profissionais da rede de saúde da
comunidade. A mudança de gestão de 2016 para 2017 contribuiu com a saída de alguns
profissionais que já estavam familiarizados com as atividades já desenvolvidas pela
academia na comunidade. A chegada de novos profissionais com perspectivas reduzidas
no tocante à importância contato entre acadêmicos e comunidade impediu que novas
potencialidades pudessem ser desenvolvidas na comunidade. Além disso, houve greve
dos funcionários da saúde vinculados à prefeitura, o que reduziu o apoio em relação ao
projeto e contribuiu para que um maior de pessoas desconhecesse o caráter das reuniões
e o quanto essas poderiam contribuir para toda a comunidade.
Todavia, apesar dessas limitações, foi perceptível que ao avançar do projeto a
população tornou-se mais participativa e acessível durante as ações. Esse fato evidencia a
construção do vínculo com a comunidade, na qual a troca mútua de conhecimento teve
seu êxito, pois tanto os moradores quanto os participantes do projeto decidiram
abertamente as temáticas trabalhadas. Dessa maneira, mesmo com tantos fatores
limitantes, é possível inferir que o trabalho em questão conseguiu atingir seus objetivos.
Conclusão
As atividades do projeto proporcionaram descentralização do saber e de sua atuação,
a partir do estímulo da parceria entre o conhecimento científico e o saber popular, o que
inclui a articulação com sociedade e a rede de serviços. Este tipo de relação horizontal
entre os envolvidos favorece ao aumento do vínculo com a comunidade, ao possibilitar a
troca de informações, esclarecimento das dúvidas e aproximação das relações afetivas,
além de criar um espaço de acolhimento.
Considera-se essencial ressaltar as limitações encontradas pelos acadêmicos
durante a execução do planejado, tais como: baixas adesão e assiduidade da comunidade
nas ações; precário acesso à comunidade; dificuldade de estabelecimento de contato com
profissionais de outras instituições para articulação das ações. Essas dificuldades
traduzem potencialidades que precisam ser trabalhadas para efetuar melhoras na
realização das atividades na comunidade.
O presente estudo possibilitou conhecer as concepções dos moradores da
comunidade em relação às práticas e saberes em saúde, e reconhecer o papel do
819
intercâmbio de conhecimento. O vínculo é entendido como uma relação de confiança,
compromisso e amizade. As limitações fornecem subsídios para melhor elaboração de
próximas atividades na comunidade. Assim, é preciso valorizar os elementos envolvidos
nessa construção de conhecimento, que, em momentos coletivos, produziu saberes e
ações que se sustentam entre si.
Referências
1. OLIVEIRA, Maria Walderez de. Educação popular e saúde. Rev. Ed. Popular, v.6,
Jan/Dez, Uberlândia, 2007, p.73-83.
2. SILVA, Cristiane M. da C.; MENEGHIM, Marcelo de C.; PEREIRA, Antônio C. e
MIALHE, Fábio L. Educação em saúde: uma reflexão histórica de suas práticas.
Ciência & Saúde Coletiva. 15(5): 2539-2550, 2010
3. SANTOS, Luciane de Medeiros dos et al . Grupos de promoção à saúde no
desenvolvimento da autonomia, condições de vida e saúde. Rev. Saúde Pública, São
Paulo , v. 40, n. 2, p. 346-352, Apr. 2006
4. SOUZA, A. C.; Colomé, I SC ; COSTA, L. E. D. ; OLIVEIRA, D. L. L. C. . A educação
em saúde com grupos na comunidade: uma estratégia facilitadora da promoção da
saúde. Revista Gaúcha de Enfermagem, Porto Alegre, v. 26, p. 147-153, 2005.
5. BARROS, José Augusto C.. Pensando o processo saúde doença: a que responde o
modelo biomédico?. Saude soc., São Paulo , v. 11, n. 1, p. 67-84, July 2002 .
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6. HEIDMANN, Ivonete T.S. Buss et al . Promoção à saúde: trajetória histórica de suas
concepções. Texto contexto - enferm., Florianópolis , v. 15, n. 2, p. 352-358, June
2006 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-
07072006000200021&lng=en&nrm=iso>. access on 14 Oct. 2017.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-07072006000200021.
7. World Health Organization. The Ottawa charter for health promotion. Geneve: WHO;
1986
820
O uso da internet como ferramenta de comunicação dos direitos à saúde
Introdução
No Brasil, a proteção dos direitos à saúde tem como objetivos, a redução dos riscos
de doenças e outros agravos, bem como a garantia do acesso universal e igualitário aos
serviços e ações de saúde pública. Para alcançar esses objetivos, a saúde foi reconhecida
como um direito fundamental pela Constituição Federal (CF) promulgada em 1988. A
saúde é vista também como um direito social (art.6°) garantido a todos pelo Estado
mediante ações de políticas sociais e econômicas que atendam as necessidades da
sociedade brasileira assegurando a promoção, proteção e recuperação da saúde (art.196)
(1).
Ressaltamos que o ordenamento jurídico brasileiro prevê a competência da União
para estabelecer meios legais a fim de proteger a sociedade com relação a serviços de
821
comunicação que possam ser nocivos à saúde. Para efetivar a proteção retratada no artigo
220, II da CF (1988), o marco civil da internet foi oficializado no país, através da Lei nº
12.965/15 e prevê a determinação de diretrizes para a atuação do Estado. No artigo 2º, a
lei deixa claro que a liberdade de expressão é um fundamento assegurado e para impedir
a censura, os provedores de internet somente serão responsabilizados civilmente por
danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros, após ordem judicial específica.
Entretanto, destaca-se que o marco civil da internet não pode ser conflitante com outras
normas, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, Direitos do Consumidor e outras
legislações pertinentes (2).
A internet é um meio de comunicação e informação para jovens e adultos em todo o
mundo e se transformou numa das principais fontes de informação sobre saúde tanto para
profissionais quanto para pacientes. Os usuários da internet utilizam os dados móveis seja
para acessar as principais redes sociais (Facebook, Twitter, Flickr e Youtube) ou os
motores de busca (Google) para pesquisas diversas. Estima-se que nos Estados Unidos
cerca de 52 milhões de pessoas consultaram a web a fim de buscar informações sobre
saúde. No Brasil, o uso comercial da internet iniciou em 1995 e o número de usuários da
internet está crescendo significativamente, estudos revelam que aproximadamente 10
milhões de pessoas acessam sites sobre saúde regularmente. No entanto, apesar dos
avanços, a exclusão digital, particularmente entre as pessoas de baixa renda é uma
realidade a ser modificada, pois no mundo globalizado, o acesso à internet está se
tornando fundamental para o exercício da cidadania e da garantia aos direitos sociais (3).
Pesquisa recente apontou que os usuários da web realizam desde buscas
relacionadas às doenças e seus tratamentos, até a prevenção de patologias, promoção do
bem-estar, nutrição, higiene e serviços associados à área da saúde. Esses achados
reforçam a magnitude que a internet vem alcançando nos últimos anos favorecendo a
abertura de debates públicos envolvendo a sociedade civil, o Estado e os especialistas em
saúde (4).
A rede mundial de computadores representa uma importante ferramenta que pode
disseminar informações, contribuir para a transparência do governo e permitir a
participação popular por meio do controle social. Assim, a sociedade pode exercer a
cidadania como um meio de interagir com os governos e com os Estados utilizando a
822
internet para participar da definição das políticas públicas e reivindicando a materialização
dos direitos à saúde (4).
É importante destacar que os impactos gerados pela internet na sociedade
contemporânea e dinâmica não se restringem apenas ao campo do comportamento
humano e da comunicação. Esse impacto vai, além disso, influenciando e dinamizando as
formas de participação social. Dessa maneira, a internet quebra barreiras geográficas e
favorece as mobilizações sociais em escalas inimagináveis promovendo a mobilização em
escala global e em tempo real. Os usuários da internet podem se juntar uns aos outros
para exercerem seu poder de pressão social a fim de aprovar, modificar ou vetar projetos
de lei (5).
Neste sentido, o Ministério da Saúde disponibiliza aos usuários do Sistema Único de
Saúde (SUS), opções de comunicação com o órgão através do Disque-Saúde e também
da Ouvidoria que recebe reclamações, denúncias e dúvidas sobre saúde por meio de um
link na página do órgão. Da mesma maneira, a Defensoria Pública da União atua na área
da saúde prestando auxílio gratuito às pessoas de baixa renda, particularmente quando
ocorre omissão ou falha do Estado na prestação de serviços à saúde como no caso de
medicamentos e insumos não fornecidos pelo SUS, pedidos de cirurgias e procedimentos
negados, dentre outras demandas. Contudo, a disponibilidade destes serviços pela internet
deve ser divulgada para a população, além de desenvolver uma interface amigável e de
fácil navegação para que as pessoas possam ter acesso a esse tipo de serviço.
Metodologia
823
Resultados e Discussão
Figura 1 – Comparação dos termos de busca (doenças, atenção a saúde e saúde pública)
utilizados pelos internautas no Brasil nos últimos 5 anos.
824
Por outro lado, quando utilizamos a busca pelas palavras “saúde pública”,
“informação em saúde”, “plano de saúde” e “legislação em saúde” (Figura 2), observamos
a média de interesse foi igual a 70 para o termo “plano de saúde”. Os termos menos
pesquisados foram “saúde pública” (média de interesse = 29) e “informação em saúde”
(média de interesse = 3). A palavra “legislação em saúde” obteve pontuação zero (0)
refletindo a baixa popularidade do termo.
Figura 2 – Comparação dos termos de busca (saúde pública, informação em saúde, plano
de saúde e legislação em saúde) utilizados pelos internautas no Brasil, nos últimos 5 anos.
Figura 3- Comparação dos termos de busca (direito à saúde, saúde pública e Ministério da
Saúde) utilizados pelos internautas no Brasil, nos últimos 5 anos.
825
Entretanto, ao utilizarmos as palavras “direito à saúde”, “saúde pública” e “ministério
da saúde”, observamos média de interesse = 58 para a palavra “ministério da saúde”, e
médias menores para “saúde pública” (média de interesse = 30) e “direito à saúde” (média
de interesse = 3).
O interesse por um tema ao longo do tempo pode variar e os números representam o
interesse de pesquisa relativo ao ponto mais alto no gráfico de uma determinada região em
um dado período. Então, um valor de 100 é o pico de popularidade de um termo. Um valor
de 50 significa que o termo teve metade da popularidade. Da mesma forma, uma
pontuação zero (0) significa que o termo teve menos de 1% da popularidade.
De acordo com a Pesquisa sobre uso das tecnologias de informação e comunicação
nos domicílios brasileiros (8), apesar da exclusão digital causada pelo custo do acesso à
internet, falta de cobertura dos serviços e dificuldades de habilidade do usuário da internet,
47% dos brasileiros usam a internet pelo celular, o que corresponde a 81,5 milhões de
pessoas, e o celular é o dispositivo preferido (76%) para acesso dos usuários os quais
acessam a internet diariamente (84%). No período de 5 anos, o percentual de buscas
sobre serviços públicos de saúde variou de 20% em 2008 a 30% em 2013, para consultas
médicas o percentual variou de 9% a 14%. Observou-se que no mesmo período, a busca
por chats, fóruns, votações e etc. relacionados ao governo, a variação foi negativa, uma
vez que em 2008, 13% das pessoas acessavam esses sites, enquanto em 2013 o número
826
caiu para 11% refletindo a baixa procura das pessoas com relação ao atendimento online
por parte dos serviços públicos brasileiros.
Essa mesma pesquisa revelou que entre as atividades de busca de informações, a
mais citada é a procura de informações sobre produtos e serviços (63%) seguidos por
informações sobre saúde (38%).
Embora os resultados comparativos dos termos aplicados no Google Trends revelem
uma tendência de interesse ao longo do tempo, os dados permitem compreender o
comportamento e o interesse da população brasileira sobre o tema saúde. Por se tratar de
um termo associado a produtos e serviços, a maior busca foi para “plano de saúde”, o que
demonstra a preocupação das pessoas em procurar algum tipo de assistência à saúde. Da
mesma maneira, a busca pela palavra “doenças” reflete o interesse do brasileiro com a
própria saúde buscando as informações disponíveis nos sites de busca.
Conclusão
Referências
827
3. Neto AP, Barbosa L, Muci S. Internet, geração Y e saúde: um estudo nas comunidades
de Manguinhos (RJ). Comunicação & Informação. 2016;19:20-36.
4. Delduque MC. Observar para participar: a world wide web como instrumento para
acompanhar a produção legislativa em saúde no Brasil. In: Estudos de Direito Sanitário
– a produção normativa em saúde. Brasília, Senado Federal. 2011.
5. Vasconcelos, W. Observatório da Saúde no legislativo: informação e comunicação a
serviço da participação social em saúde. In: Estudos de Direito Sanitário – a produção
normativa em saúde. Brasília, Senado Federal. 2011.
6. Ettredge M, Gerdes J, Karuga G. Using web based search data to predict
macroeconomic statistics. Communications of ACM. 2005:48:87-92.
7. Goel S, Hofman JM, Lahaie S, Pennock DM, Watts DJ. Predicting consumer behaviour
with web search. PNAS, 2010 https://doi.org/10.1073/PNAS.1005962107 Acesso em
06 out.2017.
8. TIC Domicílios 2014. Pesquisa sobre uso das tecnologias de informação e
comunicação nos domicílios brasileiros. São Paulo: Comitê Gestor da Internet no
Brasil. Disponível em <
http://www.cgi.br/media/docs/publicacoes/2/TIC_Domicilios_2014_livro_eletronico.pdf>.
Acesso em 04 out.2017.
828
Assistência Farmacêutica na internet: comunicação e informação na
promoção do acesso
RESUMO: O objeto de estudo desse trabalho foi a comunicação pública mediada por
computador, por meio da disponibilização das informações para a política de acesso a
medicamentos de elevado custo e complexidade no âmbito do Sistema Único de Saúde
(SUS). Assim, objetivou-se analisar a política pública de acesso a medicamentos
especializados pela dimensão da informação, a partir das páginas eletrônicas das
Secretarias Estaduais de Saúde (SES) e de forma complementar pela análise da rede
social facebook de um grupo de associações de pacientes. Buscou-se identificar a
disponibilização, ou não, das informações no site oficial da SES, priorizando a Doença de
Gaucher. A busca nos websites das informações foi realizada de forma simplificada, i.e.
como procede qualquer usuário comum, sem a utilização de métodos de busca boleana.
Foram selecionados um ou dois estados de cada região, com o objetivo de
representatividade nas desigualdades regionais, identificando aqueles mais e menos
populosos (dados IBGE), como medida indireta da maior probabilidade de acesso às
informações. Para tanto, utilizou-se o campo de “busca” da página principal da SES com
termos previamente definidos. Para análise do facebook, selecionou-se o grupo da
associação de pacientes da doença de Gaucher com maior número de seguidores. Assim,
foram realizadas 3 pesquisas exploratórias: (1) investigação geral da política, com análise
de 10 websites; (2) investigação específica para a política da doença de Gaucher, com
análise de 6 websites; e (3) exploração da página do facebook de grupo de associação de
pacientes da referida doença. Em ambas pesquisas nas páginas de governo, de forma
geral, não há padrão de busca nas páginas dos estados. Na página do facebook observou-
se que os posts do último ano tiveram como temas mais recorrentes: frases motivacionais,
dicas nutricionais, comentários sobre políticas públicas específicas e liberação de
medicamentos. Constata-se o quanto a natureza heterogênea das informações
relacionadas a medicamentos torna, de modo geral, pouco efetiva a busca por orientações
de acesso a demandas específicas e, que a análise das políticas públicas pode ser
complementada pela observação das redes sociais de grupos organizados de pacientes
uma vez que informações sobre as políticas reverberam nas redes sociais.
Palavras-chave: acesso, internet, política de medicamentos, e-Gov, medicamentos
especializados.
Introdução
829
De acordo com Gowler Jr (2010), à medida que cada vez mais pessoas utilizam a
internet, parte delas a utiliza como “dispositivo de comunicação altamente sofisticado” que
possibilita e capacita a formação de comunidades virtuais (1). No campo da saúde-doença,
encontramos inúmeros grupos organizados por temáticas como: doença, comportamento,
qualidade de vida, tratamento medicamentoso, superação, etc.
Emergem das relações novos atores, influenciadores que modelam as relações
sociais. Podemos citar, por exemplo, um novo movimento conforme relatado por Garbin et
al (2008), no qual tem emergido um “novo ator na área da saúde”, o “paciente expert” que
é aquele paciente, independente do segmento social, que por meio da internet, busca
informações relacionadas à saúde e doença, como diagnósticos, medicamentos,
tratamentos e custos (2). Desse modo, é possível ter acesso a informações atualizadas e
complementares, que extrapolam a relação médico-paciente, possibilitando também a
interação e o compartilhamento entre indivíduos e grupos para que ampliem seus
conhecimentos sobre direitos, acesso e políticas.
Nesse contexto, deve-se estar atendo às fontes de informações para que se tenha
acesso a informações confiáveis. Desse modo, os sites oficiais de governo devem tornar-
se um meio de oferta de informações seguras, os quais devem disponibilizar os serviços
públicos aos cidadãos por meio eletrônico, o chamado e-GOV. A comunicação efetiva dos
órgãos públicos, especialmente da saúde, responsáveis por tais políticas, constitui-se em
fundamental instrumento para a disponibilização de informações técnico-científicas
orientadoras para o acesso às políticas de saúde.
Atualmente, o acesso à saúde é percebido como um dos grandes problemas
enfrentados pela população brasileira, especialmente para o SUS. Sanchez e Ciconelli
(2012) dispõe o acesso como “um atributo dos usuários dos serviços” tendo seu conceito
passado por modificações, não se limitando apenas aos aspectos tangíveis do sistema e
da população usuária (3). Para Soares (2013),
(...) as dificuldades de acesso são, frequentemente, expressas em termos
de barreiras e de problemas de disponibilidade de serviços (integrados por
instituições, profissionais, bens de saúde e rotinas), que parecem ter
relação com a burocracia institucional e as marcadas diferenças entre os
que necessitam e aqueles que provêm cuidados de saúde (4).
830
da informação, corresponde ao grau de assimetria entre o conhecimento do paciente e do
profissional de saúde, que corresponde à diferença de informações entre quem oferta e
quem recebe os serviços. Essa relação de assimetria se constitui num dos desafios para a
promoção da saúde, na qual se busca o “estabelecimento de uma relação simétrica entre
os profissionais e os grupos sociais que fomentem a participação social em saúde” (5).
Contudo, para que se tenha a compreensão de cada uma das dimensões do acesso, é
imprescindível que se disponha da informação, que se dá pelo processo de comunicação
entre o sistema de saúde e o indivíduo (3).
Cabe especialmente aos órgãos públicos, adequar a informação sobre seus serviços,
disponibilizados pela internet, ou outros meios, para que tenha abrangência à população
geral do país, a fim de superar as falhas de saúde pública (problemas de fluxo,
burocratização, (des)informação e planejamento) que levam ao negligenciamento dos
direitos constitucionais estabelecidos.
A política de medicamentos no SUS
O acesso a medicamentos tem efeitos importantes sobre a situação de saúde
individual e sobre a qualidade de vida da população, considerando, sobretudo o valor dos
medicamentos envolvidos. Contudo, é sabido que um contingente importante da população
que necessita desses serviços não os conseguem no sistema público brasileiro de saúde –
o SUS, ou tem seu acesso retardado pelas dificuldades de acesso, expressos em barreira
burocrática e ausência ou inadequação das informações (incompletas, linguagem
imprópria, ou de difícil acesso).
O sistema público de saúde brasileiro apresenta dentre suas diversas estratégias,
uma específica para atender as necessidades de medicamentos da população – a
Assistência Farmacêutica. O Componente Especializado reúne o tratamento para um
grupo de doenças, geralmente graves, crônicas, algumas raras, e de importante impacto
financeiro. Por contemplar agravos mais sérios (média e alta complexidade), diversidade
de doenças (79 doenças de diferentes especialidades médicas) e o elevado custo do
tratamento medicamentoso, há regras específicas para que a população consiga os
medicamentos prescritos pelo médico, este do sistema público ou privado. Esta política é
de definição nacional pelo Ministério da Saúde (MS), porém a gestão está nos estados,
que acaba por apresentar variações estaduais de fluxos de acesso.
831
Diferentemente dos outros componentes da AF, o CEAF apresenta especificidade
operacional de acesso e manutenção dos usuários no recebimento dos medicamentos e
acompanhamento farmacoterapêutico. O fornecimento destes medicamentos deve
obedecer aos critérios de diagnóstico, indicação de tratamento, inclusão e exclusão de
pacientes, esquemas terapêuticos, acompanhamento e demais parâmetros contidos nos
Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDTs) estabelecidos pelo MS, de
abrangência nacional. O fornecimento se dá por processo individual de solicitação às SES
pelo próprio paciente ou seu representante, que deverão apresentar diversos documentos
e exames médicos.
Busca-se reduzir a assimetria de informação existente entre os atores envolvidos:
gestores, profissionais de saúde, e usuários, e desse modo, prover a equidade em saúde.
Nesse processo, as práticas de governo eletrônico, aqui entendidas como a
disponibilização de serviços de governo por meio da internet, podem descomplicar o
contato da administração pública com a população brasileira, que deve ser uma fonte
confiável de informação.
Não é possível, enfrentar os problemas de acesso à informação e à saúde, com
ações isoladas. “A comunicação e a informação são respostas funcionais aos problemas
de implementação e funcionamento do sistema de saúde, perspectiva esta que irá incidir
também nas variáveis da participação popular” (6). De acordo com Araújo e Cardoso
(2007) “as políticas públicas só se constituem quando saem do papel e ganham visibilidade
e são apropriadas, ou seja, convertidas em saberes e práticas pela população a que se
destinam, sendo a comunicação inseparável deste processo” (7).
A melhoria dos fluxos de informação favorece as relações sociais, podendo-se
sugerir que essa difusão de informação vem permitindo a ampliação do acesso no terreno
da informação/conhecimento.
832
Sob o aspecto do direito à saúde para o acesso a serviços públicos de saúde, nos permite
traçar um paralelo da relação entre comunicação, negligenciamento na saúde e doenças
negligenciadas. A comunicação negligenciada e a invisibilidade de práticas e políticas
acentuam desigualdades sociais tanto na saúde coletiva quanto no próprio SUS (9).
Informações estas que deveriam estar claramente apresentadas à população para que
possa se apropriar e se empoderar.
(...) constatamos que a visibilidade da área de acesso a medicamentos tem
crescido enormemente nos últimos anos e não mais se apresenta como um
problema de países pobres ou de populações pobres, mas hoje é
identificado como um problema global que sufoca mesmo os sistemas de
saúde privados de países do Norte (10).
Metodologia
No presente trabalho optou-se por fazer estudos exploratórios a fim de observar como
as informações sobre a política de medicamentos do CEAF está sendo disponibilizadas
pelas SES e o nível de dificuldade para acessá-las. Nesse primeiro momento não
buscamos aprofundar as análises do conteúdo, quando disponibilizado (pesquisa 1 e 2).
A definição de escolha das SES se deve por esses órgãos serem os gestores
responsáveis pela gestão do Componente nos estados. A seleção dos estados buscou-se
manter a representatividade regional do país, e identificar potenciais características
destoantes. Desse modo, com base nas características populacionais, a partir de dados do
último Censo Demográfico do IBGE disponível - 2007, selecionamos os estados menos e
mais populosos por região geográfica, e utilizou-se o domínio oficial da World Wide Web
de cada SES (www.saude.ESTADO.gov.br).
Na primeira pesquisa, utilizou-se a metodologia de análise de forma ampla, ou seja, a
busca das informações ocorreu de forma geral para a política de medicamentos
especializados, sem direcionar para um tratamento específico (medicamento ou doença).
No website procurou-se utilizar da navegação de forma intuitiva, como usuário comum,
procurando identificar na página principal campos com as palavras-chave que pudessem
direcionar ao conteúdo desejado. Definiu-se os termos: “medicamentos”, “serviços”,
“assistência farmacêutica”. Considerou-se o estado mais populoso e o menos populoso por
região. As páginas foram categorizadas de acordo com a disponibilização das informações
como: Não encontrada, parcial ou total.
Nessa segunda pesquisa, a busca das informações foi realizada de forma direcionada
para o tratamento da Doença de Gaucher que configura uma doença rara e de elevado
833
custo, contemplada no CEAF. Sua escolha justifica-se pela importância para a Fiocruz, a
qual através do laboratório oficial Bio-Manguinhos/Fiocruz atualmente está em processo de
transferência de tecnologia para a internacionalização da alfataliglucerase usada no
tratamento desta doença. Desse modo, possibilita-se a sustentabilidade na distribuição
deste medicamento para o SUS, e ampliação do seu acesso. A busca procedeu de forma
simplificada, isto é, como procede qualquer usuário comum, sem a utilização de métodos
de busca boleana. Foi selecionado apenas o estado mais populoso de cada região, visto
se tratar de doença rara, além do estado do Rio de Janeiro, no qual está presente o
laboratório. Objetivou-se assim, obter representatividade nas desigualdades regionais e
como medida indireta da maior probabilidade de acesso às informações. Para tanto,
utilizou-se o campo de “busca” da página principal da SES com 5 termos: taliglicerase,
taliglucerase, alfataliglicerase, alfataliglucerase, doença de gaucher.
Por fim, na pesquisa 3 foi realizada análise da página do facebook de um grupo de
associação de pacientes da referida doença. A extração de dados foi realizada por meio da
ferramenta Netvizz, considerando os posts do último ano.
Resultados e discussão
Pesquisa 1
Resultados: Dentre os estados mais populosos, 4 de 5 disponibilizaram
informações sobre medicamentos especializados na página principal da SES, sendo
classificados como TOTAL (Bahia, Goiás, São Paulo e Rio Grande do Sul). Dentre os
estados menos populosos, três de cinco (Espírito Santo, Mato Grosso do Sul e Santa
Catarina) disponibilizaram informações na página principal da SES. Contudo, as
informações não estavam facilmente disponíveis, sendo necessário busca por diversos
links, sendo classificados como PARCIAL. Nenhum estado dentre os mais ou menos
populosos retornou informações através do campo de busca, a partir dos termos
selecionados. Dois dos 10 estados, não tinham campo de busca (Amazonas e Santa
Catarina).
De forma geral, os estados mais populosos apresentaram melhores resultados na
disponibilização de informações para acesso à política. Alguns estados apresentaram as
informações de forma estruturada e organizada por patologia, facilitando o acesso e
compreensão das mesmas.
834
Pesquisa 2
Resultados: Foram analisados os sites de 6 estados (Amazonas, Bahia, Goiás, Rio
de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo). Destes, dois não apresentavam campo de
busca ou outro mecanismo de busca rápida (Amazonas e Rio Grande do Sul), um estado
não retornou a busca com nenhum dos termos, porém apresenta atendente virtual como
forma de busca rápida que se mostrou bastante efetiva (Goiás). Dos estados que
retornaram com informações de acesso, tem-se Rio de Janeiro (doença de Gaucher:
retorna matérias, mas não orientações; Taliglicerase e taliglucerase: retornam links para
lista de medicamentos e página intuitiva; Alfataliglicerase ou alfataliglucerase: sem
retorno), São Paulo (doença de gaucher: retorna link com informações; Alfataliglucerase:
sem retorno; Alfataliglicerase: retorna outros links; Taliglucerase: retorna link com
informações) e Bahia (doença de Gaucher: retorno com links com orientações. As buscas
pelos termos dos medicamentos não retornam informação).
De forma geral, não há padrão de busca nas páginas dos estados. Em alguns casos
não é possível seque obter qualquer tipo de informação para acesso à política de
medicamentos.
Pesquisa 3
O grupo do facebook que representa o grupo com o maior número de seguidores da
referida doença no país possui 5.417 inscritos. No último ano, período analisado, foram
realizados 124 posts. O post que mais teve curtidas (167) foi uma frase de efeito
motivacional, sobre valorizar cada momento da vida, que deve estar relacionada à
gravidade da doença e o risco dela decorrente. Contudo, o mesmo post teve apenas 12
compartilhamentos e três comentários, totalizando 168 reações (o maior dele). De forma
geral, os posts quase não apresentam comentários, sendo o que mais teve foram de seis
comentários, também sobre frase de efeito motivacional. O maior número de
compartilhamentos (17) também está relacionado à frase motivacional e de apoio. Os
temas mais recorrentes dos posts são frases motivacionais, dicas nutricionais, políticas
públicas específicas para doenças raras ou Gaucher e liberação de medicamentos. Os
temas de políticas e medicamentos apresentaram circulação de comunicação, variando de
20 a 50 manifestações cada. Esse conteúdo pode ser uma medida de como as
835
informações sobre as políticas são apresentadas e apropriadas pelos interessados, uma
vez que a circulação ocorre de forma direcionada. Cabe chamar atenção que os
medicamentos para essa doença não são comercializados individualmente no Brasil,
sendo de distribuição exclusiva pelo SUS devido seu alto custo e a baixa incidência de
casos.
Conclusões
O cumprimento do papel do Estado na formulação e implementação de políticas
públicas faz-se necessário, especialmente na superação dos agravos à saúde, tornando-se
mais crítico ainda quando estes possuem custos proibitivos à maioria da população, e os
problemas de fluxos e planejamento. Como objeto desse estudo, os websites das SES
necessitam ser trabalhados para que o indivíduo possa dispor de meios para que seja
fortalecida sua habilidade e capacidade para identificar, acessar e fazer a melhor utilização
da informação disponível para a satisfação das suas necessidades, ou seja, condições
necessárias para seu empoderamento e para o exercício do direito ao acesso à informação
e comunicação.
Em ambas pesquisas exploratórias nas páginas de governo, constata-se o quanto a
natureza heterogênea das informações relacionadas a medicamentos torna, de modo
geral, pouco efetiva a busca por orientações de acesso a demandas específicas. Conclui-
se que as SES devem adaptar suas ferramentas de busca, principalmente ao público leigo,
promovendo assim maior acesso a informação e consequentemente aos medicamentos.
As análises das políticas de saúde e de medicamentos podem ser complementadas e
enriquecidas com a observação das redes sociais e dos grupos de interesse. Dessa forma,
a monitorização do grupo nas redes sociais pode servir como termômetro da aceitação ou
não das mesmas, sendo um importante recurso para pesquisadores como também para
gestores.
Em um país tão diverso e desigual como o Brasil, a qualidade e a forma de
comunicação da informação relacionada à serviços públicos de saúde, como a Assistência
Farmacêutica, é uma condição sine quai non para a realização do direito à saúde
constitucionalmente instituído em 1988, e, portanto, necessita ser objeto de pesquisa.
Referências
836
1. G. M., Jr. (2010). Netnography: A method specifically designed to study cultures and
communities online. The Qualitative Report, 15(5), 1270-1275. Retrieved.
837
Eixo 7 – Erro Médico e relação médico-paciente
Talita Gomes1
Sara Amorim
Stephanie Cesar
Luana Claudino
Introdução
Erros relacionado às técnicas e procedimentos médicos podem resultar em tragédia
para pacientes e suas famílias, prolongar o tempo de internação e aumentar
consideravelmente os custos hospitalares. Para o médico canadense, ícone da medicina
moderna, Sir William Osler Medicine is a science of uncertainty and an art of probability 2 as
atividades médicas implicam em interação entre pessoas, logo, assume-se que a boa
prática médica se caracteriza pelo equilíbrio entre o conhecimento científico, a tecnologia
disponível e o relacionamento entre médico e paciente. Porém, nem sempre o insucesso
terapêutico está ligado à conduta do médico, devendo-se buscar o nexo de causalidade
entre os eventos e identificar as possíveis causas associadas (1).
838
Os erros mais frequentes são os erros de prescrição e os de administração, sendo
que as drogas mais relacionadas a esses erros são: analgésicos, antibióticos, sedativos,
quimioterápicos, drogas de ação cardiovascular e anticoagulantes (2)(3).
Explica-se o número de erros observados na prática médica pela ausência de
mecanismos que diminuam a sua ocorrência, ou que interceptem o erro antes de chegar
ao consumidor final – o paciente. Infelizmente, no país, trabalha-se com a premissa de que
o profissional de saúde não comete erros e, portanto, não se criam mecanismos de
prevenção e correção.
Segundo Carvalho et. al. (4) fatores ambientais, psicológicos e fisiológicos
combinados que propiciam o erro na prática da medicina. O erro, seja qual for, consiste em
um agir ou em um não-agir, ou seja, uma ação ou uma omissão. Esses estão envoltos na
noção clássica de imperícia, negligência ou imprudência, elementos da culpa. A conduta
culposa é um conceito dos mais controversos no campo jurídico, porque se refere ao
resultado danoso advindo de uma ação ou omissão, havendo nexo causal entre a ação e o
resultado, porém o agente não teve a intenção de produzir o resultado. Diferentemente, o
dolo é a intenção de produzir um ato danoso ao sujeito destinatário da ação.
Assim, se o médico, em sua atividade profissional, determina a morte do paciente ou
o comprometimento de sua integridade física ou de sua saúde, por conduta culposa –
negligência, imperícia ou imprudência – responderá pelo seu ato.
Esses atos podem gerar ações de responsabilidade civil ao profissional da Medicina,
fazendo-o ressarcir os danos produzidos no paciente, e ações de responsabilidade penal,
trazendo consequências criminais ao médico. Tais ações são julgadas pelo Poder
Judiciário, locus de resolução de conflitos intersubjetivos. São nos tribunais que o erro
médico se torna visível aos olhos da sociedade, tratando-se no processo judicial as causas
produzidas pelo ato comissivo ou omissivo do profissional, os danos produzidos, o nexo
causal e a consequente sentença de reparação.
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios – TJDFT processa e julga ações
cíveis e criminais para a reparação de erros médicos ocorridos sob sua jurisdição, por isso,
este estudo privilegiou essa instância judiciária da Capital da República, a fim de conhecer
as decisões judiciais de 2ª instância sobre o erro médico.
As vítimas podem recorrer ao Poder Judiciário com ações em âmbito penal, cível e
via ação disciplinar junto ao conselho profissional em busca de medidas disciplinares
839
contra o prestador de cuidados de saúde. Antes, porém, é possível a solução do litígio por
meio da conciliação onde as partes, vítima e médico, venham a acordar a eventual
reparação dos danos havidos, com a consequente homologação pelo juiz. A conciliação
implica na renúncia ao direito de queixa ou representação (8).
Os Juizados Especiais são um importante meio de acesso à justiça, pois permitem
que cidadãos busquem soluções para seus conflitos cotidianos de forma rápida, eficiente e
gratuita. Eles são órgãos do Poder Judiciário, disciplinados pela Lei 9.099/95 (8). Os
Juizados Especiais Cíveis servem para conciliar, julgar e executar causas de menor
complexidade, que não exceda 40 salários mínimos e os criminais conciliam, julgam e
executam infrações penais de menor potencial ofensivo.
Metodologia
Tratou-se de uma investigação retrospectiva de caráter documental baseada nas
decisões judiciais proferidas em sede de Apelação cível ou Apelação criminal, no TJDFT,
durante o ano de 2016.
Foi feito um levantamento de dados online dos acórdãos em segunda instância,
através de pesquisa jurisprudencial disponível no site do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e Territórios (TJDFT) no período de 01/01/2016 e 31/12/2016, utilizando os termos
“erro médico” juntos no campo disponibilizado para pesquisa específica.
Com o intuito de dar embasamento científico para a discussão, foi realizado
levantamento bibliográfico nas bases de dados Pubmed/Medline e Biblioteca Virtual da
Saúde utilizando os descritores Erro médico/Medical errors/Mala praxis. Foram incluídos
no estudo os acórdãos em segunda instância em que o autor ou reclamante era o paciente
e os casos em que o réu era o médico assistente e/ou a instituição médica pública ou
privada em que o paciente havia sido atendido (clínica, hospital ou plano de saúde).
Tratou-se de uma pesquisa essencialmente quantitativa, em que os dados numéricos
foram analisados a partir da inserção das informações em planilha eletrônica Excel versão
2013.
Por se tratar de pesquisa documental em base pública, com acesso livre e
desembaraçado aos dados, o projeto de pesquisa não foi submetido ao Conselho de Ética
em Pesquisa.
840
Resultados e discussão
Foram coletados um total de 285 processos no lapso temporal determinado para a
pesquisa, sendo que 198 não cumpriram com os critérios de inclusão, apresentando-se
ações em segredo de justiça e outras ações que não versavam sobre o erro médico que
foram desconsideradas na pesquisa. A amostra final resultou em 87 processos cíveis e
criminais sobre erro médico durante o ano de 2016, no TJDFT.
Em 2015, o jornal o Estado de São Paulo (5) publicou extensa matéria sobre o erro
médico no Superior Tribunal de Justiça-STJ, chamando a atenção para o acréscimo de
160% do número de ações em relação aos anos anteriores. E em Curitiba, o jornal A
Tribuna (6), trouxe a informação de que no Brasil, nos 10 anos anteriores houve um
aumento de 1600% de ações judiciais por erro médico e que as condenações de
profissionais da medicina estavam em 180% aumentados em relação aos anos anteriores.
Em um estudo recente, erros médicos são apontados como a terceira maior causa de
morte nos Estados Unidos num estudo que analisa os dados de mortalidade no país por
oito anos, onde constataram que mais de 250 mil mortes por ano são atribuídas a erros (7).
Fujita e Santos (1), em sua investigação junto ao Conselho de Medicina de Goiás,
igualmente verificou um aumento de processos por erro médico entre 2000 e 2006,
confirmando-se que o número de ações demandadas por pacientes tem aumentado,
significativamente.
Do total de processos coletados e analisados, incluindo-se a esfera cível e criminal,
verificou-se, que nenhuma ação foi proposta junto aos Juizados Especiais e a totalidade
das ações foram propostas junto à Justiça Comum, esse dado demonstra que, sendo mais
volumoso os processos da justiça comum, as ações indenizatórias foram superiores a 40
salários mínimos.
Tabela 1 – Tipo de Danos reclamados nos processos judiciais em 2016 sobre erro médico
no TJDFT
Dano material 4 5%
Dano moral 45 52%
Dano moral e material 37 43%
Fonte: TJDFT
841
ou estéticos produzidos no paciente, enquanto que o dano moral alcança o psicológico
e/ou a honra subjetiva do paciente. Verifica-se que a quantidade de processos por dano
material foram muito reduzidos, prevalecendo o pedido de indenização associando o dano
material e moral.
Os danos morais não são reparáveis, mas sim compensáveis, a indenização por dano
moral tem como origem o “caráter punitivo“ para que o causador do dano, pelo fato da
condenação, se veja castigado pela ofensa que praticou; “caráter compensatório” para a
vítima que receberá uma soma que lhe proporcione prazeres como contrapartida do mal
sofrido, ante o ato gravoso praticado pelo autor.
As especialidades médicas objeto das ações judiciais analisadas envolvem erros
decorrentes de procedimentos de exames de diagnósticos como: sangue, biópsias,
ecografias, videolaparoscopias, entre outros. As especialidades com maior número de
processos por erro médico neste estudo foram: gineco-obstetrícia, ortopedia, cirurgia
plástica e cirurgia geral.
Na investigação empreendida por Jena et. al. (9) que decreve em seu estudo 46,7%
para reclamações contra anestesiologistas a 62,6% para reclamações contra obstetras e
ginecologistas e aos achados de Koeche et.al. (10) que cita a ginecologia/obstetrícia como
a especialidade com maior número de médicos denunciados junto ao Conselho Regional
de Medicina do Estado de Santa Catarina, seguida pela anestesiologia,
ortopedia/traumatologia e outras especialidades. Esta modalidade também teve
participação relevante nos resultados encontrados seja atuando em partos ou cirurgias
como histerectomias.
Gineco-Obstetrícia 12 14%
Cirurgia Geral 11 13%
Cirurgia Plástica 8 9%
Ortopedia 7 8%
Fonte: TJDFT
842
O TJDFT trata como erro médico atos praticados indistintamente da especialidade
clínica propriamente dita como casos provenientes de tratamento odontológico ou cirurgia
odontológica, não diferenciando o médico do dentista.
Tabela 3 – Identificação do polo passivo das ações judiciais sobre erro médico no TJDFT
em 2016
O setor público teve o maior aporte de processos por erro médico no Distrito Federal
durante o ano de 2016 enquanto o setor privado representou 44% dos processos
analisados. Tais ações foram movidas contra a pessoa jurídica, seja clínica ou hospital. A
opção por processar a pessoa jurídica empregadora do profissional da medicina é uma
forma de garantir uma indenização mais robusta, visto que as empresas de saúde detêm
um ganho bem maior que a do profissional, isoladamente.
Os processos por erro médico movidos contra pessoas jurídicas de direito público, o
Sistema Único de Saúde-SUS, do Distrito Federal somam 56%. Nestes casos, responde o
processo a Fazenda Pública que pode ser a União ou o próprio Distrito Federal, posto que
os hospitais são vinculados à Secretaria de Saúde. A jurisprudência brasileira tem
entendido que a União não poderá responder por erros médicos cometidos em nosocômios
pertencentes ao SUS, nos estados e municípios. Nesse particular, os tribunais não
reconhecem a solidariedade tão propalada na prestação de serviços de saúde para a
indenização por erro médico.
Sendo o Estado sujeito de direito, e pessoa jurídica de direito público, também deve
se submeter aos ditames legais, ainda que por ele impostos. Ademais, a responsabilidade
do Estado está implícita na própria noção de Estado de Direito, “a responsabilidade estatal
é simples corolário da submissão do Poder Público ao Direito” (11).
843
Tabela 4 – Resultado das decisões nas ações sobre erro médico analisadas no TJDFT em
2016.
Improcedente 45 52%
Parcialmente procedente 25 29%
Procedente 16 19%
Fonte: TJDFT
A maioria dos processos analisados foram negados (52%) o que demonstra uma
certa dificuldade em comprovar o evento adverso como dano ou o fato das indenizações
serem desproporcionais a gravidade do fato. Apenas 19% das ações analisadas tiveram
decisão final procedente, dando-se o ganho de causa ao paciente-autor. As ações
parcialmente procedentes tiveram 29% do total analisado.
Contrariando os achados de Svider et. al. (12) que analisou vereditos de processos
referentes a eventos adversos em procedimento cirúrgico de carótida onde os desfechos
dos casos foram resolvidos a favor do arguido em 67,5% dos casos e resultaram em
pagamento de indenizações 32,4% dos casos e 8,1% de acordos extrajudiciais.
Conclusão
A responsabilidade médica é um fenômeno inseparável do cuidado em saúde.
Percebemos que os cidadãos tendem a buscar soluções extrajudiciais com a finalidade de
ressarcimento dos danos sofridos nos sistemas de saúde enquanto os legisladores tendem
a reconhecer os pleitos como forma de melhorar o sistema e aumentar a segurança dos
pacientes.
Os conselhos de classe costumam tratar o erro médico como falta ética e os
processos tramitam sob sigilo fazendo a sociedade desconhecer o alcance do problema,
ao contrário do que é percebido nos tribunais onde os erros médicos costumam ser
traduzidos em processos judiciais que tramitam pela justiça comum ou juizados especiais.
A pressão legal da prática médica vem a moldar as atitudes e as práticas de saúde nos
serviços, motivado pelas repercussões legais e pelas consequências econômicas da
gestão. Isto é o reflexo de uma sociedade em que a afirmação de direitos e a ideia de ter
sofrido uma lesão compensável é interpretada como a responsabilidade de um bom
profissional ou de um bom serviço de saúde seja ele público ou privado.
844
O médico não deve ser interpretado como o único responsável e causador do dano, é
necessário que todas as partes envolvidas estejam conscientes das mudanças que
merecem ser implementadas e que já foram discutidas pela Organização Mundial de
Saúde como a melhoria nos mecanismos de comunicação médico-paciente, sistema de
notificação de eventos adversos rápido e eficaz e a criação de protocolos de
procedimentos, com a implantação dessas pequenas melhorias muitos dos processos não
chegariam a justiça.
Espera-se que este trabalho venha a demonstrar a real dimensão do problema e
venha a auxiliar na tomada de decisões no enfrentamento da questão do erro médico.
Erros são inerentes a condição humana mesmo em profissionais extremamente
capacitados, porém reconhecer o problema talvez seja o primeiro passo a ser tomado para
o enfrentamento da questão e isto não depende de um parecer de colegiado ou da
sentença de um juiz.
Referência
845
Jun 11 [cited 2017 Jan 12];172(11):3291–7. Available from:
http://archinte.jamanetwork.com/article.aspx?doi=10.1001/archinternmed.2012.1416
10. Koeche LG, Censi I, Bortoluzzi MC B EL. Prevalência do erro médico entre as
especialidades médicas nos processos julgados pelo Conselho Regional de Medicina
do Estado de Santa Catarina. Arq Catarinenses Med [Internet]. 2013;42(4):45–53.
Available from: http://www.acm.org.br/revista/pdf/artigos/1257.pdf
11. Mello, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo:
Forense, 1979. 2° ed. 1150p.
12. Svider PF, Vidal G-P, Zumba O, Mauro AC, Haser PB, Graham A, et al. Adverse
events in carotid endarterectomy from a medicolegal perspective. Vasc Endovascular
Surg. 2014;48(5-6):425–9.
846
Erro de diagnóstico e de terapêutica: a importância da relação médico-
paciente
RESUMO: Este trabalho tem como escopo contribuir para uma visão mais ampla sobre os
problemas recorrentes que dizem respeito ao erro de diagnóstico e de terapêutica,
consequentes dos chamados erros médicos, que podem levar a danos irreparáveis ao
paciente e até a sua morte. A relação médico-paciente, dada sua relevância para a
prevenção e a diminuição do erro médico e de diagnóstico, exigiu pesquisa específica.
Pesquisaram-se a legislação nacional, os pactos e tratados internacionais sobre o tema.
Foi colacionada jurisprudência referente a erro médico e danos físicos e morais
decorrentes.
Palavras-chave: erro médico; erro de terapêutica; erro de diagnóstico; relação médico-
paciente.
Introdução.
O erro médico é uma das ocorrências que, causando danos que a ele estejam
ligados, causalmente, enseja responsabilidade civil e criminal do agente, com direito a
indenização e reparação do dano à vítima. No entanto, não é tão simples identificar o erro
médico, que pode levar ao erro de diagnóstico e de tratamento, com desfechos e
prognósticos inesperados. Ainda que culposo ou escusável, o erro médico pode causar
danos irreversíveis e até a morte do paciente. O Brasil mantém uma publicação destinada
aos profissionais da saúde para esclarecer, divulgar, orientar, com o objetivo de controlar e
diminuir, o máximo possível, os erros médicos. Nesse sentido, há, também, no País, vasta
legislação e jurisprudência, que caminham na direção de minimizar os danos causados
pelo erro médico, assim como preveni-los, também pactos e tratados internacionais que
garantem o direito à saúde e a responsabilização civil pelo erro médico.A relação médico-
paciente mostra-se de relevante importância para minimizarem-se os erros de diagnóstico
e de terapêutica.O objetivo dessa pesquisa é o de investigar legislação e jurisprudência,
firmar conceitos, para prevenir e diminuir a incidência do erro médico e suas
consequências danosas e fatais.
1 Universidade Santa Cecília. E-mail: rosilmaroldan@gmail.com. Instituição financiadora: CAPES (autora principal)
847
Metodologia.
A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, com consulta a autores
especializados no tema e a legislação nacional e internacional (pactos e tratados), como a
jurisprudência nacional, para fundamentar os referenciais bibliográficos sobre a matéria.
Resultados e discussão
O erro médico “é a falha, no exercício da profissão, com resultado diverso do
pretendido, decorrente de ação ou omissão do médico, ou dos demais profissionais de sua
equipe” (1). Schaefer (2012) completa que o erro médico pode se configurar como erro
culposo, quando o profissional da saúde dá causa ao resultado danoso por imprudência,
negligência ou imperícia, e erro doloso, quando quer o resultado danoso, ou assume o
risco de produzi-lo. O erro grosseiro é um tipo de erro médico que enseja a
responsabilização do profissional, por ser uma conduta que fere os mais elementares
conhecimentos da matéria, aferível pelo homem comum, e condenável sob a forma da
negligência, em sua forma mais exacerbada (1). Destaca a autora:
848
diagnóstico, se não for grotesco, não pode ser considerado culpa médica. Ruy Rosado de
Aguiar Junior destaca:
“o diagnóstico consiste na determinação da doença do paciente, seus
caracteres e suas causas. O erro no diagnóstico não gera responsabilidade,
salvo se tomada sem atenção e precauções, conforme o estado da ciência,
apresentando-se como erro manifesto e grosseiro” (3).
849
d. que a terapia clínica e/ou cirúrgica seja a habitualmente utilizada para o
diagnóstico formulado; que a evolução do caso se tenha processado dentro
das expectativas (4).
Quanto à alta relevância da relação médico-paciente, para prevenir ou diminuir a
incidência do erro médico, e os danos decorrentes, muitos irreparáveis, é importante fazer
algumas considerações. Na relação médico-paciente, existe a responsabilidade civil
contratual, e também a extracontratual, que se estabelece entre o profissional e o cliente,
como uma obrigação de meio, e não de resultado, salvo em situações específicas (4).
Segundo entende o autor, deve o profissional da saúde comprometer-se a atender o
paciente com desvelo, atenção, paciência, calma e diligência adequada, adverti-lo ou
esclarecer-lhe sobre os riscos da terapia ou da intervenção cirúrgica propostas e sobre a
natureza de certos exames prescritos, e ainda decidir, junto com o paciente, se, o que e
como quer proceder. Exames invasivos e cirurgias, ainda que deles dependam a
sobrevivência do cliente, devem ser decididos por este, desde que o profissional lhe tenha
esclarecido todos os riscos inerentes à decisão.
Lopes (2017) destaca que:
A tecnologia, cada vez mais avançada, não deve ser motivo para o afastamento ou
para a impessoalidade da relação médico-paciente, pelo contrário, deve contribuir para sua
valorização e humanização. Como Lopes (2017) alerta, “o médico precisa focar menos na
doença, nos exames, e mais no doente, que é a razão de sua existência profissional, nada
substitui o tratamento humanizado, nada é mais importante do que a Medicina à beira do
leito” (5).
Segundo dados do Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), nos
últimos 10 anos, houve um aumento de 302% no número de processos ético-profissionais
contra médicos naquele órgão, relacionados a má prática, a erro médico ou a algumas
infrações ao Código de Ética Médica. Esse número aumentou de 1.022 processos, em
2001, para 3.089, em 2011. Uma das causas apontadas foi a má formação profissional,
850
decorrente do aumento dos cursos de medicina, no Brasil, nos últimos anos. Outros fatores
seriam o aumento do número de médicos, a má conduta desses profissionais e o aumento
do número de pacientes, conhecedores de seus direitos, e dispostos a denunciar os
supostos erros médicos (2).
Segundo o Presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica – SBCM, Antonio
Carlos Lopes (2017):
A Medicina não é apenas ciência. É também arte. Frequentemente o
paciente chega ao consultório do médico e não consegue dimensionar o
quanto aquele momento é importante na sua vida. Sai do escritório
correndo, muitas vezes esquece o que precisa dizer ao médico, chega
nervoso porque precisa voltar ao trabalho. Isso é bastante comum,
principalmente no Sistema Único de Saúde. Aí o problema se torna mais
complicado ainda, porque cada consulta não passa de 15 minutos. Às vezes
não há sequer cadeira para o doente sentar (5).
851
de extirpar a tuba direita (TJSP – AC 246.225-4/6-00-São Paulo
– Quarta Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Ênio Zuliani – j.
29.09.2005).
A Assistência Segura: Uma Reflexão Teórica Aplicada à Prática - Anvisa (6) é uma
publicação destinada aos profissionais da saúde para esclarecer, divulgar, orientar, com o
objetivo de controlar e diminuir, o máximo possível, os erros médicos.
A legislação nacional e os pactos e tratados internacionais garantem o direito à saúde
e protegem dos erros de diagnóstico e de terapêutica, decorrentes dos erros médicos.
852
Lei nº 12.466, de 24 de agosto de 2011
Acrescenta arts. 14-A e 14-B à Lei 8.080, que “dispõe sobre as condições para a
promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos
serviços correspondentes e dá outras providências”, para dispor sobre as comissões
intergestores do Sistema Único de Saúde (SUS), o Conselho Nacional de Secretários de
Saúde (Conass), o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) e
suas respectivas composições, e dar outras providências.
853
Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas – PCDT. Isso vale para tecnologias que são
aplicadas em qualquer serviço de saúde, seja público seja privado.
Por fim, vale a máxima de que “o cuidado à saúde, que antes era simples, menos
efetivo e relativamente seguro, passou a ser mais complexo, mais efetivo, porém
potencialmente perigoso” (7), o que retrata a importância no cumprimento da Lei da Saúde,
a fim de minimizar o risco sobre três aspectos: busca ativa de eventos adversos,
notificação de eventos adversos e uso racional das tecnologias em saúde, focando na
qualidade da saúde e bem-estar do usuário.
Conclusões
Esse trabalho se propôs a conceituar o erro médico, seja doloso, seja culposo, e
ainda o erro escusável, que ensejam diferentes níveis de responsabilidade civil, com dever
de indenizar e reparar o dano, desde que exista nexo causal entre ele e a ação ou a
omissão do agente. Em algumas situações, prevalece a responsabilidade sem culpa, a
responsabilidade civil objetiva.
Quanto à relação médico-paciente, conclui-se com a citação de Lopes (2017):
Para ser médico, é preciso gostar de gente. Saber que não existem
doenças e sim, doentes. Exercer essa profissão é colocar em prática o amor
ao próximo. O doente deve morrer de mãos dadas com o seu médico e
este necessita de tranquilidade e ferramentas ideais para um atendimento
no qual possa oferecer o melhor do seu conhecimento, toda a sua atenção
e, principalmente, todo o seu respeito. Ele precisa de tempo suficiente para
conhecer o paciente, descobrir suas queixas, averiguar seu passado, seus
anseios e angústias, e fazer com que saia aliviado, com perspectiva de ter
seu problema solucionado. Dar e receber assistência médica de qualidade e
universal, mais do que um anseio, é um direito de todos (5).
Referências
854
5. LOPES, A.C. A importância da Relação Médico-Paciente. Disponível em
sbcm@sbcm.org.br Acesso em 01.10.2017 15:07h
6. BRASIL.2013.Disponível em:
https://www20.anvisa.gov.br/segurancadopaciente/images/documentos/livros/Livro1-
Assistencia_Segura.pdf Acesso em 01.10.2017 16:49h
7. CHANTLER, C. The role and education of doctors in the delivery of healthcare. The
Lancet. 1999; 353:1178-1181.
855
A responsabilidade civil médica no erro de diagnóstico médico
Introdução
Este estudo tem como objeto de pesquisa a responsabilidade civil do médico
decorrente de erro de diagnóstico, embasando-se no fato de que nesse contexto se
discutem as teorias objetiva e subjetiva, a respeito de sua responsabilidade, colocando em
relevo o aspecto da culpa. Esta mostrar-se-á como essencial ou não para sua
caracterização, gerando dificuldade quanto á sua comprovação. Outro aspecto é o
aferimento da conduta prejudicial médica, pois vezes há em que não se sabe ao certo se o
resultado ocorreu por conta da conduta médica ou por si só, como decorrência da própria
patologia. Dificuldades há nos tribunais para resolver questões dessa natureza, dada a
complexidade do tema. O envolvimento do direito tentando normatizar uma relação na qual
a área se faz tão presente é tema para longos estudos e busca de proposituras de
soluções.
A Responsabilidade Civil
Desde quando os homens começaram a viver em sociedade, os grupamentos
humanos começaram a assimilar meios naturais para curar seus males. Com a evolução
dessas sociedades, técnicas de cura e diagnósticos foram sendo apuradas, por médicos
que passaram a ser visto como o ser capaz de livrar os enfermos de todos os males que
os afligiam, restituindo-lhes a saúde perdida, assim surge também a obrigação de
responsabilidade civil para com o paciente também, visto que tem sido ao longo dos
856
séculos, a mais importante forma de defesa do patrimônio à disposição de toda a
sociedade, pois, através da ação de reparação de danos, autor e réu, encontram em juízo
a recomposição dos prejuízos causados e sofridos2
Nascimento cita que:
2 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 3. Ed. São Paulo: RT, 2001.p.78.
3 NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do. Responsabilidade Civil no Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Aide,
2008.p.44
4 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência – 7°. Edição revista, atualizada e ampliada.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. P.112
5 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. Obrigações – Teoria Geral. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p.107.
6 NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do. Responsabilidade Civil no Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Aide,
2008. p.56
857
que quatro são os elementos essenciais da responsabilidade civil, a saber: i) ação ou
omissão; ii) culpa ou dolo do agente; iii) relação de causalidade; e iv) a ocorrência do dano
experimentado pela vítima7
7 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2007, p.37.
858
por um nexo de causalidade. A responsabilidade pelo risco teria o seu suporte em um risco
específico, de perigo geral, produzido pela atividade do homem, de tal sorte que incidiriam
a em seu campo de ação tão somente os riscos imprevisíveis ou excepcionais.
No Código brasileiro instalou-se, regra geral, a responsabilidade subjetiva – pela
culpa - mas havendo legislações especiais com uso, na responsabilização do agente, da
responsabilidade objetiva. Um bom exemplo é o Código de Defesa do Consumidor, que
admite a responsabilização subjetiva, exigindo a averiguação da culpa dos profissionais
liberais, vigendo, integralmente, porém, em relação aos demais fornecedores de produtos
e serviços a responsabilidade objetiva nas relações de consumo.
859
somente a utilizar toda a sua potencialidade física e mental, de todos os cuidados, de toda
a aparelhagem disponível para atingir o melhor resultado para o seu paciente 8.
Diniz segue no mesmo entendimento, ao afirmar que o médico que atende a um
chamado determina, desde logo, o nascimento de um contrato com o doente ou com a
pessoa que o solicitou. De modo que há um contrato entre o profissional da medicina e o
seu cliente, que se representa como obrigação de meio e não de resultado, por não
comportar o dever d curar o, paciente, mas sim, o de prestar-lhe os cuidados, como ela o
diz, conscienciosos e atentos conforme os progressos da medicina9
Em razão deste elevado corporativismo os juízes acabam por lastrear suas decisões
em indícios e evidências lógicas. Veja-se por exemplo trecho de acórdão proferido no
TJRS pelo Des. Ruy Rosado de Aguiar Júnior ao julgar a apelação n. 589.069.996 da 5ª
Câmara:
8 GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Responsabilidade Médica – As obrigações de meio e resultado: avaliação, uso e
adequação. Curitiba: Juruá, 2006
9 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. V.7, 16. ed. São Paulo: Saraiva,2011.p.76.
860
Mais uma vez, como é de praxe, não teve êxito na colheita de informes
esclarecedores; daí a necessidade de uma renovada tentativa, igualmente
frustrada, ... (...) O que existe, porém, já é bastante para um juízo de
procedência da ação10
No direito processual brasileiro, via de regra, o ônus da prova incumbe a quem alega.
Vale dizer, portanto, que a prova caberia sempre ao paciente ou vítima, que muitas vezes
é uma pessoa simples e de pouco estudo. Na área jurídica, o vocábulo presunção possui o
sentido de convencimento antecipado da verdade provável, a respeito de um fato
desconhecido, obtida mediante fato conhecido e conexo11 Também enfoca que o direito,
todavia, não se presume. O que é presumível, ao menos em princípio, é o conhecimento
do direito, tal qual ele se apresenta, e este sempre diz respeito a um fato.
Lobo (1988) concebe que são duas as principais razões de ser da presunção:
1ª) a dificuldade de provar certos fatos por via direta; e 2ª) a estabilidade e a
economia na aplicação do direito.
Admite-se que sem o instituto da presunção, o direito seria ainda mais complexo e
difícil de integrar-se na realidade fática. No entanto, não deixa ele de enfocar que uma
razão de ser social da presunção, em virtude da dificuldade de obter uma prova direta em
determinados casos; para, depois, concluir que a presunção é uma necessidade social, e
não um mero acidente dentro da ciência do direito12
No decorrer da evolução do mundo, apenas a clássica teoria subjetiva, fundada na
culpa, tornou-se insuficiente para solucionar os problemas da responsabilidade civil que,
ao adaptar-se, deu nascimento à teoria objetiva, fundada no dano.
Primeiramente, esta apontava para uma culpa presumida do agente causador do
dano. Dar-se-ia no caso, a inversão do ônus da prova, cabendo ao réu provar a sua não-
culpa, ou seja, uma situação inserida na presunção júris tantum, já que poderia ser
vencida. Entende Lobo, que na responsabilidade com culpa, a culpa é necessária para a
ligação entre o fato e o sujeito imputável. Nessa hipótese, o fato (ou ato) é contrário ao
direito, assim a responsabilidade somente imputa-se ao sujeito se houver vontade ou se
houver procedido sem o cuidado necessário13.
10 Ibidem.
11 GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Responsabilidade Médica – As obrigações de meio e resultado: avaliação, uso e
adequação. Curitiba: Juruá, 2006.
12 GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Responsabilidade Médica – As obrigações de meio e resultado: avaliação, uso e
adequação. Curitiba: Juruá, 2006
13 Ibidem.
861
...a culpa médica há que ser cabalmente provada, não cabendo aqui
nenhum tipo de presunção. De acordo com Santos, é necessário que
resulte provado de modo concludente que o evento necessário que resulte
provado de modo concludente que o evento danoso se deu em razão da
negligência, imprudência imperícia ou erro grosseiro de sua parte.14
O que se conclui que, mesmo sendo considerada uma responsabilidade subjetiva
pode, contudo, ocorrer uma invasão do ônus da prova e isso se dera em situações
específicas, tais quais:
O erro de diagnóstico
14 Idem
15 GHERSI, Carlos Alberto. Responsabilidad professional. Vol 1. Buenos Aires: Astrea, 1995. p. 327
862
Assim sendo, aduz-se que o diagnóstico etiológico costuma ser o mais difícil, embora
com todo progresso da biotecnologia, pois, de quase mil doenças oficialmente catalogadas
pelas organizações internacionais, apenas se conhece a causa de um terço delas.
O erro e a culpa são coisas diferentes. O erro profissional trata-se da conduta médica
correta, mas a técnica empregada é incorreta. A culpa (imperícia) trata-se da técnica
correta, mas a conduta sendo inapropriada (na maioria das vezes pelo desconhecimento
da técnica). A culpa médica pressupõe uma falta de diligência ou de prudência em relação
ao que se espera de um profissional padrão. O erro é inelutável da falibilidade humana,
não se pode falar em “direito de errar”, mas ele é escusável quando invencível à mediana
cultura médica, tendo em vista circunstâncias do caso. O erro deve ser notório e manifesto
consistente em erro grosseiro, capaz de comprometer a reputação do profissional. O erro
de diagnóstico – exceção ao reconhecimento da culpa médica.
Gonçalves elenca que o erro profissional,
... se tem afirmado que o erro de diagnóstico, que consiste na determinação
da doença do paciente e de suas causas, não gera responsabilidade, desde
que escusável em face do estado atual da ciência médica e não lhe tenha
acarretado danos. Porém, diante do avanço médico-tecnológico de hoje,
que permite ao médico apoiar-se em exames de laboratório, ultrassom,
ressonância magnética, tomografia computadorizada e outros, maior rigor
deve existir na análise da responsabilidade dos referidos profissionais
quando não atacaram o verdadeiro mal e o paciente, em razão de
diagnóstico equivocado, submeteu-se a tratamento inócuo e teve a sua
situação agravada, principalmente se se verificar que deveriam e poderiam
ter submetido o seu cliente a esses exames e não o fizeram, optando por
um diagnóstico precipitado e impreciso16
O médico deve possuir uma suficiente preparação ético, técnico e cultural, para, no
mínimo reconhecer suas limitações e direcionar o paciente a um especialista. Esse erro
denota falta de normas comuns de semiologia, ou falta de conhecimentos elementares de
patologia e clínica. Erros de diagnóstico (desde que grosseiro), erros na medicação ou
tratamento prescrito, injustificável omissão na assistência e nos cuidados indispensáveis
ao paciente são reconhecidamente situações que responsabilizam os médicos.
Para Cavalieri:
...não cabe ao Judiciário avaliar questões de alta indagação científica, nem
se pronunciar sobre qual o tratamento mais indicado para a cura do doente.
Só lhe está afeto o exame da conduta profissional, para verificar, à vista das
16 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p.437.
863
provas, se houve ou não falha humana consequente de erro profissional
crasso.17
Incumbe ao juiz estabelecer quais são os cuidados possíveis que ao profissional
cabia dispensar ao doente, de acordo com os padrões determinados pelos usos e pela
ciência, e confrontar essa norma concreta, fixada para o caso, com o comportamento
efetivamente adotado pelo médico.
17CAVALIERI FILHO, Sérgio. A responsabilidade médico-hospitalar à luz do Código de Defesa do Consumidor. Revista
da EMERJ, v. 2, n. 5, p. 87-99, 1999.
864
Sendo provada a má prestação do serviço, são devidos danos morais ao
prejudicado. Citamos como exemplo o homem que, após ter sido
diagnosticado como portador do vírus HIV, passou 02 meses em tratamento
equivocado e desnecessário para a doença, eis que, ao final, descobriu-se
que o mesmo não era soropositivo, mas apenas tuberculoso. A condenação
foi fixada pelo TJRS na monta de R$ 12 mil. (Apelação Cível n.º
70027166735).
Analisando tais situações, elenca o Código Civil de 2002 no artigo 927 que em casos
de erro médico, a responsabilidade é subjetiva, ou seja, será verificada no caso concreto,
através da apuração de culpa em uma de suas modalidades: imprudência, imperícia ou
negligência. Disposição semelhante encontra-se no artigo 14, § 4.º, do Código de Defesa
do Consumidor.
A ética médica centrada no paciente esteve e está sempre implícita em todas as
atitudes médicas, a partir do momento em que o médico assume a responsabilidade de
atender este paciente. O mais profundo desejo do médico, servido por interesses
puramente humanitários ou mesmo por interesses puramente profissionais, ou por uma
combinação destes interesses, é o bem-estar do paciente.
Gomes aborda que:
18 GOMES, Júlio Cezar Meirelles. Erro Médico. Montes Claros: Unimontes, 1999.p.156
865
No direito pátrio a culpabilidade dos ilícitos culposos tem como fundamento
dogmático a condição pessoal do autor de poder observar o dever de
cuidado necessário para a possível evitação do fato típico. Outrossim, a
medida de cuidado requerida nunca poderá ser fixada em caráter geral,
embora existam princípios básicos que possam servir como balizamentos
orientadores do exigível. O dever objetivo de cuidado considerada a
extensão inclui os seguintes vetores, a saber:
a) o valor social;
b) a habitualidade especial do risco em geral;
c) o grau de necessidade de realização arriscada em particular.
Dentro do contexto da vida moderna, o dever objetivo de cuidado obriga cada vez
mais ao cidadão à aplicação de toda a sua potencialidade, observando com mais
vigilância, o controle de obrar rotineiro para se acautelar dos riscos com uma atuação
prudente em situações perigosas. Para o grau de atenção se absorve o perigo advertido
pelo nível ou prática médica, subdivididos em:
a) proximidade do perigo e b) valor do bem afetado.
O homem cauteloso, consciente do setor a que pertence, dificilmente cometerá tal
tipo de ilicitude penal19.
Todo esse contexto jurídico ordenador da responsabilidade penal, até agora visto,
encontrará relação com o ato médico (podendo ser conceituado, de forma genérica, como
procedimento técnico-científico, objetivando a conservação da vida e saúde do homem),
nele considerados o atendimento inicial do paciente, o diagnóstico, o tratamento, a
utilização de substâncias medicamentosas, também compreendidos os procedimentos
cirúrgicos, devendo o profissional médico, por isso, cercar-se de todas as cautelas
possíveis.
A anamnese e a elaboração do diagnóstico, que devem se apoiar em dados obtidos
através de exames clínicos e laboratoriais, são fatores fundamentais para a conclusão da
patologia e a consequente adequação do tratamento, trazendo segurança ao profissional
na sua atividade. Por outro lado, é importante a avaliação do tratamento, observadas as
condições pessoais do paciente, verificada a relação risco/benefício, a sua eficácia, bem
como prestados os devidos esclarecimentos. Nesse aspecto, é de se observar que o
19LUZ, Newton Wiethorn Da; OLIVEIRA NETO, Francisco José Rodrigues; THOMAZ, João Batista. O Ato Médico -
Aspectos Éticos e Legais. Rio de janeiro: Rubio, 2002. p.78.
866
paciente, encontrando-se na sua plena capacidade de entendimento, pode, por meio de
manifestação de vontade, não seguir o tratamento indicado pelo profissional.
Veja-se que em países desenvolvidos, como os Estados Unidos da América, é
rotineiro o preenchimento de questionário pelo paciente, consistente em documento
recheado de perguntas, as mais diversas, buscando atingir a um universo bastante amplo
da vida do paciente e de seus familiares, sendo ele respondido e firmado por ele, como
forma de salvaguardar o médico por eventuais problemas que vierem a ocorrer, e tenham
relação com informações errôneas.20
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entende-se com este estudo que o processo de diagnóstico consiste em identificar e
determinar a moléstia que acomete o paciente, pois dele depende a escolha do tratamento
adequado. O diagnóstico, entretanto, não é uma operação matemática.
Frisa-se assim que as vezes, para se chegar ao diagnóstico correto, torna-se
necessária uma agudeza de observação de que nem todo médico é dotado. Por isso, a
doutrina, de modo geral, analisa detidamente tal questão.
Ao que concerne à relação médico-paciente, ressalte-se a importância da boa relação
médico-paciente e da necessidade de este último estar informado da melhor e da mais
ampla maneira possível sobre os prognósticos de sua patologia, independentemente dos
diferentes níveis de sua capacidade de entendimento frente aos esclarecimentos
fornecidos por seu médico.
REFERENCIAS
20LUZ, Newton Wiethorn Da; OLIVEIRA NETO, Francisco José Rodrigues; THOMAZ, João Batista. O Ato Médico -
Aspectos Éticos e Legais. Rio de janeiro: Rubio, 2002. p.79.
867
6. GHERSI, Carlos Alberto. Responsabilidad professional. Vol 1. Buenos Aires: Astrea,
1995.
7. GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Erro médico à luz da jurisprudência comentada. 1. ed.
Curitiba: Juruá, 1998.
8. ___________________. Responsabilidade Médica – As obrigações de meio e
resultado: avaliação, uso e adequação. Curitiba: Juruá, 2006
9. GOMES, Júlio Cezar Meirelles. Erro Médico. Montes Claros: Unimontes, 1999.
10. GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 12. ed. São Paulo: Saraiva,
2010.
11. KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 3. Ed. São Paulo: RT,
2001.
12. LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Fundamentos de Metodologia
Científica.5.ed. São Paulo: Atlas, 2008.
13. LUZ, Newton Wiethorn Da; OLIVEIRA NETO, Francisco José Rodrigues; THOMAZ,
João Batista. O Ato Médico - Aspectos Éticos e Legais. Rio de janeiro: Rubio, 2002.
14. MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. Direito das obrigações.
22.ed São Paulo: Saraiva, 2017.
15. NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do. Responsabilidade Civil no Código do
Consumidor. Rio de Janeiro: Aide, 2008.
16. PEREIRA,Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
17. SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de Direito Civil. V.5 Rio de Janeiro: Livraria
Freitas Bastos S.A, 2005.
18. STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência . 7. Edição
revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
19. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. Obrigações – Teoria Geral. 3 ed. São Paulo:
Atlas, 2016.
868
A Perda de Chance na Responsabilidade Civil Médica: mudança de paradigma
Filomena Girão1
Marta Frias Borges2
1 Ferreira Ramos, Filomena Girão & Associados, Sociedade de Advogados, SP, RL. E-mail: Filomena.girao@faf-
advogados.com
2 Ferreira Ramos, Filomena Girão & Associados, Sociedade de Advogados, SP, RL. E-mail: Marta.frias.borges@faf-
advogados.com
869
A jurisprudência tem assentado esta distinção na inexistência de uma relação
contratual entre o hospital público e o utente que recorre aos seus serviços. Assim,
enquanto no âmbito da medicina privada, o doente celebra um contrato de prestação de
serviços médicos, quando recorre ao Serviço Nacional de Saúde fá-lo ao abrigo de uma
relação administrativa de utente, não se estabelecendo qualquer relação contratual.
Por isso, e porque o atendimento no âmbito do Serviço Nacional de Saúde é efetuado
em cumprimento de uma obrigação do Estado em garantir a todos os cidadãos o acesso e
a proteção da saúde, nos termos do artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa,
a responsabilidade no âmbito da medicina pública é extracontratual.
Nestes termos, o regime de responsabilidade aplicável a este tipo de relações entre
hospitais públicos e os utentes é o Regime de Responsabilidade Extracontratual do Estado
e Pessoas Coletivas de direito público (Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro). De entre
outros aspetos relevantes deste regime de responsabilidade do Estado – não sendo este o
momento ou o lugar certo para o aprofundamento do tema – destaca-se o facto de o
hospital público ser exclusivamente responsável pelos danos que resultem de ações ou
omissões cometidas com culpa leve, apenas tendo direito de regresso em caso de dolo ou
culpa grave dos agentes.
Feita esta distinção inicial, importa agora analisar os pressupostos de ambos os tipos
de responsabilidade.
Tanto a responsabilidade contratual como a responsabilidade extracontratual
pressupõem a verificação de quatro requisitos, que carecem de ser demonstrados em
juízo: ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade.
Com efeito, ao médico (como a qualquer outro profissional de saúde) exige-se que
atue em cumprimento das leges artis, com a diligência de um médico médio, normalmente
diligente e cuidadoso. Assim, quando a sua atuação não se pauta pelo cumprimento das
leges artis comete um facto ilícito.
A culpa, por seu turno, pressupõe que ao profissional de saúde seja exigível outro
comportamento, sendo esta diligência avaliada nos termos do artigo 487.º, n.º 2, ou seja,
pela “diligência do bom pai de família, em face das circunstâncias do caso”.
Ora, de acordo com a regra geral contida no artigo 342.º do Código Civil, “àquele que
invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado” –
870
cabendo, por isso, ao doente que demanda um profissional de saúde, com fundamento
num qualquer erro médico, a prova dos pressupostos da responsabilidade civil médica.
De facto, com exceção de determinadas presunções – nomeadamente, a presunção
de culpa aplicável em sede de responsabilidade contratual (artigo 799.º, n.º 1 do Código
Civil) – é ao doente que cumpre provar a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade
entre facto e dano.
Todavia, este encargo probatório que recai sobre o doente revela-se muito pesado,
dada a ausência de conhecimentos técnicos, o corporativismo entre os profissionais de
saúde, o elevado custo do recurso à prova pericial, agravados pelo estado de
vulnerabilidade em que necessariamente se encontra.
Esta natural dificuldade da prova faz-se sentir sobretudo na prova da culpa (na
responsabilidade extracontratual), e no nexo de causalidade entre a violação das leges
artis e o dano.
É exatamente esta dificuldade de prova dos pressupostos da responsabilidade
médica que justifica que, apesar do grande aumento da litigância em negligência médica, o
número de sentenças favoráveis aos pacientes seja ainda muito reduzido.
Com efeito, a prova do nexo de causalidade entre o comportamento do profissional
de saúde e os danos que resultam para o doente é particularmente complexo, devido
muitas vezes à pluralidade de causas que concorrem para um mesmo dano. Ou seja,
apesar de muitas vezes o comportamento do profissional de saúde se afigurar adequado à
produção de um determinado dano, com esse comportamento concorrem muitas outras
causas, alheias ao comportamento daquele profissional, que dificultam sobremaneira a
prova do nexo causal.
A prova do nexo causal agrava-se mais ainda quando o ilícito se traduz num
comportamento por omissão. Tomemos o seguinte exemplo: a demora na realização de
um exame complementar de diagnóstico essencial para submeter o paciente a uma
cirurgia destinada a salvar a vida, acaba por atrasar a realização do procedimento
cirúrgico, vindo a paciente a falecer após a realização da cirurgia. Neste caso, embora se
possa provar que o atraso na prescrição do exame atrasou a cirurgia, não se consegue
provar, com elevado grau de certeza, que a o paciente teria sobrevivido caso a cirurgia
tivesse sido realizada mais cedo.
871
Tendo em consideração esta normal dificuldade de prova, a perda de chance
assume-se como um instituto que permite, nas palavras de Rute Pedro, “a repartição do
risco probatório entre doente e médico, de acordo com a distribuição da álea inerente ao
acto médico consentido” (1).
De facto, tal como refere RUTE PEDRO, a obrigação assumida pelo profissional de
saúde traduz-se numa obrigação de atuação cuidadosa, atenta e conforme às leges artis
com vista à cura do paciente (obrigação de meios), mas também numa obrigação de não
desperdiçar as oportunidades (chances) de um resultado positivo para o paciente
(assumindo-se sempre esta obrigação como de resultado) (2).
Esta decomposição da obrigação do profissional de saúde permite uma maior tutela
dos interesses do paciente lesado, que não conseguindo (muitas vezes) fazer prova cabal
da causalidade entre a violação das leges artis (v.g., atraso na prescrição do exame
complementar de diagnóstico essencial) e o dano final (v.g., morte), logra fazer prova de
que aquela conduta causou um dano intermédio que se traduz na perda da possibilidade
de sobrevivência ou de cura.
A perda de chance (enquanto ato ou omissão que levou à diminuição da
oportunidade de obtenção de um resultado positivo, que não era certo) será assim
indemnizável como dano intermédio e autónomo do dano final, desde que se verifiquem
todos os pressupostos de responsabilidade civil: ilicitude, culpa, dano e nexo de
causalidade entre o ato ou a omissão e a perda da oportunidade3.
A consagração da obrigação de não desperdiçar oportunidades, e o direito ao
ressarcimento do dano da perda de chance, aliviam o encargo probatório a cargo do
doente que passa a ter que provar apenas o nexo de causalidade entre a conduta do
médico e a perda de oportunidade – o que representa um avanço capaz de compensar o
desnível de conhecimentos técnicos e científicos entre médico e paciente, contribuindo
para uma adequada tutela do doente lesado.
Apesar disso, a aplicação da perda de chance no âmbito da responsabilidade civil
médica é ainda muito recente na jurisprudência dos tribunais portugueses, destacando-se
a sentença proferida a 23 de Julho de 2015, pela 1.ª Secção Cível da Instância Central do
Tribunal da Comarca de Lisboa (Proc. n.º 1573/10.5TJLSB) (3).
3 A admissibilidade da figura não é líquida havendo, entre nós, quem a conteste, argumentando que a admissibilidade do
dano de perda de chance implicaria admitir um dano punitivo, atribuindo à responsabilidade civil uma função punitiva e
não reparatória.
872
Nesta sentença, o Tribunal da Comarca de Lisboa considerou provado o erro de
diagnóstico – fruto da não realização de exames complementares ao dispor do médico – e
ainda que aquele atrasou o tratamento da paciente. Com base nisso, entendeu (a nosso
ver, acertadamente) que, embora não fosse certa a sobrevivência da paciente caso o
tratamento tivesse sido realizado atempadamente, aquele erro de diagnóstico prejudicou a
percentagem de oportunidade de sobrevivência ao seu dispor.
Obviamente, a indemnização devida pela perda de chance será inferior à
indemnização devida caso se lograsse provar o dano final. Com efeito, a não
demonstração do dano final terá que se refletir necessariamente no montante
indemnizatório concedido.
Importará, pois, “avaliar, primeiro, qual o valor económico do resultado em
expectativa e, de seguida, a probabilidade que existiria de o alcançar, não fora a
ocorrência do facto antijurídico. Este segundo valor, calculado numa percentagem –
traduzindo a consistência e seriedade das «chances» -, terá que ser por fim aplicado ao
primeiro, para que se possa finalmente obter o valor pecuniário da «perda de chance” (4).
Julgamos, apesar disso, que a aplicação do instituto da perda de chance no âmbito
da responsabilidade médica será favorável ao doente lesado, sendo suscetível de facilitar
a “diabolica probatio” que sob si geralmente recai.
Referências
873