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ABORDAGEM BIOLÓGICA NA EXPLICAÇÃO DO

COMPORTAMENTO DESVIANTE: PERSPETIVAS ATUAIS


AULA 5
COMPORTAMENTO DESVIANTE
OLGA CUNHA
 Noção de imutabilidade
 Determinismo
 Criminoso como alguém com ‘má índole’, com ‘maus instintos’
 Impossibilidade ou quase impossibilidade de ‘cura’
ABORDAGENS ATUAIS
 Fatores genéticos
 Fatores bioquímicos
 Fatores psicofisiológicos
 Fatores neurológicos/neuropsicológicos
FATORES GENÉTICOS
 Estudos com gémeos

 Estudos com sujeitos adotados


ESTUDOS COM GÉMEOS

 2 tipos de gémeos
 Monozigóticos
 Dizigóticos

 Princípio: Se os gémeos monozigóticos revelarem uma maior taxa de concordância de comportamentos


antissociais do que os dizigóticos então obtemos evidência para poder afirmar que a criminalidade tem uma
componente hereditária
ESTUDOS COM GÉMEOS

 Lange (finais da década de 20)


 Concordância elevada nas condutas antissociais dos gémeos monozigóticos por comparação com os
dizigóticos (77% vs 12%)

 Outros estudos encontraram tendências idênticas


 Rosanoff (1934): 68% vs 5%
 Stumpfl (1936): 61% vs 7%
 Maranhão (1983): 75% vs 20%
 Eysenck & Eysenck (1978): 55% vs 13%
 Mednick & Volavka (1980): 67% vs 31%
 Garrido (1984): 64% vs 41%
 Raine (1993): 51.5% vs 20.6%
ESTUDOS COM GÉMEOS

 Dificuldades metodológicas

 Amostras pouco aleatórias (ex., prisões)

Estudos com amostras da população em geral


ESTUDOS COM GÉMEOS

 Amostras da população em geral


 Noruega (Dalgard & Kringlen, 1976)
 Ausência de diferenças significativas entre MZ e DZ
 Tendência de concordância favorece os MZ

 Dinamarca (Christiansen, 1977)


 Maior concordância nos MZ (F e M)

Efeito genético na origem da criminalidade (Cloninger & Gottesman, 1987)


ESTUDOS COM GÉMEOS

 Gêmeos MZ tratados de forma similar


 Gêmeos DZ influenciam-se reciprocamente em termos de atitudes e
comportamentos
 Gémeos podem desenvolver papeis opositores (dominância vs submissão)
 Papel da diferenciação entre os gémeos

Papel dos fatores ambientais?


ESTUDOS COM SUJEITOS ADOTADOS

 Efeitos genéticos vs efeitos ambientais

Filhos de pais criminosos → criminalidade


ESTUDOS COM SUJEITOS ADOTADOS

 Crowe (1972, 1952)


 Aumento na taxa de criminalidade em sujeitos adotados cujas mães biológicas tinham
cadastro

 Cadoret (1978)
 Relação significativa entre sujeitos adotados e o comportamento antissocial dos pais
biológicos

 Bohman et al. (1982) e Cloninger et al. (1982)


 Relação significativa entre o comportamento criminoso dos sujeitos adotados e o dos
seus pais biológicos
ESTUDOS COM SUJEITOS ADOTADOS

 Mednick, Gabrielli, & Hutchings (1984)


 Elevada concordância entre comportamento criminoso dos pais biológicos com
comportamento criminoso dos seus filhos adotados por outras famílias

 Brennan, Mednick, & Mednick (1993)


 Influências genéticas de um pai com distúrbios psiquiátricos
 Fator genético acionado por acontecimentos ambientais no período perinatal →
tipo de lesão particular no sistema nervoso central → comportamento impulsivo
na infância e aumento da probabilidade de comportamentos violentos
ESTUDOS COM SUJEITOS ADOTADOS

 Pais adotivos de sujeitos criminosos com baixo estatuto socioeconómico

Componente biológica?
Papel do ambiente?
ESTUDOS COM SUJEITOS ADOTADOS

 Cadoret et al. (1990)


 Filhos adotivos de pais pertencentes a meios socioeconomicamente
desfavorecidos apresentavam mais comportamentos criminosos
FATORES BIOQUÍMICOS
 Presença e impacto de certas substâncias na corrente sanguínea
 Metabólico
 Neuro endócrino
 Neuro químico
 Substâncias estupefacientes
 Garrido (1984)
 Relação entre delinquência ou violência e a agressividade em geral e
 Hipoglicemia
 Níveis altos de testosterona ou desequilíbrios hormonais
 Consumo de álcool ou outras drogas
METABÓLICO

 Virkkunen (1987)
 Correlação significativa entre uma baixa taxa de colesterol e o comportamento
criminoso, bem como uma menor quantidade de açúcar
 Consumo de álcool
 A quantidade de açúcar no sangue pode ser influenciada pelo consumo de álcool

 Colesterol
 Sujeitos com níveis mais baixos de colesterol e com consumos de álcool → níveis mais
elevados de violência
METABÓLICO

 Relação álcool-comportamento (criminoso ou não)


 Efeito desinibidor vs efeito supressor
NEURO ENDÓCRINO

 Elevados níveis de testosterona aumentam o potencial agressivo (Olweus,


1987; Queirós, 1997; Rubin, 1987; Schalling, 1987;Virkkunen, 1987)
 Relação controversa

 Síndrome pré-menstrual enquanto desencadeador de comportamentos


violentos e disruptivos nas mulheres (Garrido, 1984; Golden et al., 1996; Queiroz, 1997)
NEURO QUÍMICOS

 Criminosos apresentam baixos níveis de serotonina e altos


níveis de norepinefrina (Queirós, 1997;Virkkunen & Linnoila, 1993)
NEURO QUÍMICOS

 Baixo teor de monoamina-oxidase indicativo de uma maior


vulnerabilidade a psicopatologias desinibitórias

 Associação entre antissocialidade e deficiências no funcionamento desta


enzima (Alm et al., 1996; Ellis, 1987; Lidberg et al., 1985; Schalling, 1993)
NEURO QUÍMICOS

 Relação entre monoaminas e distúrbios do impulso sexual (Kafka, 1997)


NEURO QUÍMICOS

 Estudo das concentrações de adrenalina e noradrenalina na urina de


reclusos que aguardavam julgamento em três situações caracterizadas
por três níveis de stresse diferentes (Lidberg et al., 1978)

Hipossensibilidade dos psicopatas e menor grau de ativação perante


situações normalmente indutoras de stresse
NEURO QUÍMICOS

 Diminuições ou alterações ao nível neuro químico podem resultar de má


nutrição

Predisponente para a atividade criminosa (Raine, 1993)


SUBSTÂNCIAS ESTUPEFACIENTES

 Consumo de álcool e drogas e criminalidade (Garrido, 1984; Pihl & Peterson, 1993)

 Consumo excessivo de álcool e drogas → cometimento de atos antissociais


 Consumo de heroína → estados de êxtase e prostração inibidores da ação
SUBSTÂNCIAS ESTUPEFACIENTES

 Consumo excessivo de álcool aos 18 anos como preditor da persistência


de comportamentos criminosos (Farrington, 1992)

 Indivíduos que cometiam ofensas criminais aos 18 anos eram aqueles que
bebiam mais cerveja e que mais frequentemente se embebedavam
(Farrington & West, 1990)
FATORES PSICOFISIOLÓGICOS
RESPOSTA GALVÂNICA DA PELE

 Atividade das glândulas sudoríparas responsável por variações na


atividade elétrica da pele – quer do seu potencial quer da sua
condutância – resposta galvânica da pele
 Baixa atividade eletrodérmica nos sujeitos antissociais (Raine, 1993)
 Resposta eletrodérmica de condutância mais baixa em sujeitos psicopatas (Hare,
1978)

 Indivíduos com comportamentos antissociais demonstraram uma condutância da


pele significativamente inferior aos do grupo de controlo (Loeb & Mednick, 1977)
RECUPERAÇÃO ELETRODÉRMICA

 Taxa de recuperação eletrodérmica mais baixa nos delinquentes em geral


e nos psicopatas em particular, em condições experimentais de
ocorrência de estímulos sem aviso prévio, enquanto que naquelas
situações em que os estímulos aversivos eram previamente anunciados,
os resultados foram contraditórios (Torrubia, 1987;Venables, 1987)
RITMO CARDÍACO

 Paradigma do gradiente temporal do medo (Hare, 1978)


 Psicopatas apresentam uma aceleração do ritmo cardíaco no período que
antecedia o ruído significativamente superior aos sujeitos não-psicopatas
RITMO CARDÍACO

 Sujeitos antissociais em situações de repouso evidenciavam sempre


ritmo cardíaco significativamente mais baixos (Raine, 1993)
ELETROENCEFALOGRAFIA

 Criminalidade violenta associada a traçados anormais do


eletroencefalograma (EEG)
 Resultados contraditórios
ELETROENCEFALOGRAFIA

 Psicopatia - resultados contraditórios


 Metade dos psicopatas apresentou anormalidades no EEG; contudo,
80% dos esquizofrénicos e 56% dos homossexuais também
apresentavam EEGs anormais (Meyer, 1992)
FATORES NEUROLÓGICOS
 Disfunções neuro psicológicas relacionadas com o
comportamento violento parecem estar presentes no lobo
frontal e nos lobos temporais
 Sujeitos com lesões frontais – cometimento de erros de perseverança
ESPECIALIZAÇÃO DOS HEMISFÉRIOS CEREBRAIS

 Funcionamento cerebral e crime (Yeudall et al., anos 70 e 80)


 Psicopatia relacionada com uma disfunção do hemisfério cerebral
esquerdo

 Resultados criticados por Hare (1978)


ESPECIALIZAÇÃO DOS HEMISFÉRIOS CEREBRAIS

 Psicopatas exibiam mais erros de evocação quando era estimulado o campo visual
direito e menos erros quando era estimulado o campo visual esquerdo →
disfuncionalidade do hemisfério esquerdo (Hare & Connolly, 1987; Hare & Jutai, 1988)

 Psicopatas apresentavam, significativamente, um índice de memorização e evocação


mais baixo aos estímulos que eram apresentados pelo ouvido direito e mais alto
quando eram apresentados pelo ouvido esquerdo do que não psicopatas (Hare &
McPherson, 1984)
ESPECIALIZAÇÃO DOS HEMISFÉRIOS CEREBRAIS

 Existência de uma organização diferente ao nível de certos


processos cognitivos e percetivos em psicopatas (Hare e
colaboradores)
DESEMPENHO DOS LOBOS PARIETAL, TEMPORAL E FRONTAL

 Resultados globais inferiores nos delinquentes por oposto aos não-


delinquentes em várias dimensões

Disfunções localizadas em determinadas regiões do córtex cerebral


DESEMPENHO DOS LOBOS PARIETAL, TEMPORAL E FRONTAL

 Córtex frontal
 Responsável pela tomada de decisões e por planear ações, prever e
avaliar os seus resultados e modificar o seu curso sempre que os
dados disponíveis indiciem que o objetivo anteriormente pensado
corre riscos de não vir a ser alcançado
 Lesões nesta área
COMPROMETIMENTO DE REGIÃO ÓRBITO-FRONTAL (BASAL)

 Desinibição social, labilidade emocional, falta de julgamento, alegria inapropriada e


estado de euforia exagerada
 O decréscimo de inibição ao impulso pode estar associado a comportamento sexual
inadequado (promiscuidade)
 Distúrbio de atenção, como distração, e aumento da atividade motora e
impulsividade, também podem ser observados
 A capacidade afetiva para direcionar o comportamento e motivação alterados
COMPROMETIMENTO DE REGIÃO ORBITO-FRONTAL (BASAL)

 Lesões orbito-frontais bilaterais → alterações de personalidade

 Prejuízo na região orbito-frontal esquerda → mudanças de


personalidade caracterizadas por desinibição, julgamento pobre
e irresponsabilidade
COMPROMETIMENTO DE REGIÃO DORSOLATERAL

 Défices principalmente no controle, regulação e integração de atividades


cognitivas
 Dificuldade para focar e sustentar a atenção
 Dificuldade de motivação, respostas tardias, memória de trabalho
(operacional), flexibilidade mental
 Distúrbios na programação motora, redução de fluência verbal
 Défices de raciocínio e funções executivas
COMPROMETIMENTO DA REGIÃO VENTROMEDIAL

 Mobilidade corporal (hipocinesia/lentificação psicomotora)


 Apatia/desmotivação
 Falta de consciência do défice
EMOÇÕES E REGULAÇÃO DO COMPORTAMENTO

 Sistema límbico e emoções


 Tálamo
 Epitálamo
 Hipocampo
 Hipotálamo
 Amigdala
 Cíngulo
 Septo

 Implicado nas emoções primárias


EMOÇÕES E REGULAÇÃO DO COMPORTAMENTO

 Emoções primárias

 Emoções secundárias ou sociais


EMOÇÕES VS SENTIMENTOS

 Emoções
 Fazem parte de um sistema integrado de dispositivos inatos e
automáticos

 Contribuem para a regulação homeostática de um organismo


EMOÇÕES VS SENTIMENTOS

 Sentimentos
 É uma representação mental do corpo a funcionar de determinada maneira e tem
por referência imediata os mapas cerebrais

 O sentimento é uma perceção que dá a conhecer à consciência o conteúdo dos


padrões neurais relativos aos estados particulares do corpo
EMOÇÕES VS SENTIMENTOS

 Acontecimento indutor (causa) ---> Emoção ---> Reações Fisiopsicológicas --->


Sentimento -----> Sentimento do Sentimento ---> Sentimento Tornado Consciente

Ou seja;

Urso --> Medo --> Fugimos e Pensamos que podemos morrer --> Sentimo-nos em
pânico (p. ex) --> tomamos consciência daquilo que estamos a sentir e a viver
TEORIA DO MARCADOR SOMÁTICO (ANTÓNIO DAMÁSIO, 1996)

 Marcadores somáticos
 “Os marcadores-somáticos são, portanto, adquiridos através da
experiência, sob o controle de um sistema interno de preferências e
sob a influência de um conjunto externo de circunstâncias que incluem
não só entidades e fenómenos com os quais o organismo tem de
interagir, mas também convenções sociais e regras éticas”
TEORIA DO MARCADOR SOMÁTICO (ANTÓNIO DAMÁSIO, 1996)

 Os marcadores-somáticos são um caso especial do uso de sentimentos


gerados a partir de emoções secundárias

 De acordo com Damásio (1996), pessoas com lesões no lobo frontal


têm muita dificuldade ou são mesmo incapazes de ativar estes
marcadores somáticos
TEORIA DO MARCADOR SOMÁTICO (ANTÓNIO DAMÁSIO, 1996)

 “Isto privaria o indivíduo de um dispositivo automático para sinalizar


consequências deletérias relativas a respostas que poderiam trazer a
recompensa imediata”

 Explica também porque os psicopatas e pacientes com danos no lobo


pré-frontal mostram poucas respostas autónomas a palavras
condicionadas socialmente e imagens com conteúdo emocional, mas têm
respostas normais a estímulos incondicionados

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