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caso clínico?
Lêda Guimarães
Introdução
A psicanálise é uma clínica que não existe No momento do ato analítico, o analista não
sem a formalização teórica, assim como a pensa (Lacan, 1967-68), pois o ato irrompe
teoria da psicanálise é essencialmente abruptamente. [...], isso não quer dizer que ele
uma teoria da clínica. seja da ordem [...] de uma intuição do analista,
pois não convém que esse ato seja movido pelas
singularidades da subjetividade do analista;
A Psicanálise consiste numa articulação para isso, é indispensável a análise pessoal na
íntima entre o real da experiência e a teoria formação psicanalítica. [...] é fundamental que o
relativa a esse real. analista esteja bem orientado em seu ato. [...]
Aqui entra a articulação do ato analítico com a
teoria da psicanálise.
[...]o analista, para a sua orientação, venha a ler no [...]“vim porque sei que preciso muito fazer análise”,
caso clínico alguns dados essenciais que indiquem o “sempre precisei”. Afirmou ainda que levou muito
estatuto da amarração da neurose, formulando uma tempo para reunir toda a coragem e se decidir a dar
hipótese acerca do modo de gozo que o sujeito esse passo. Justificou esse pedido apoiada numa
mantém na sua parceria sexual com o Outro, fixando posição subjetiva de um certo pavor controlado,
o nó de amarração da estrutura. [...] convém dizendo que há mais de cinco anos havia iniciado
perguntar: como o sujeito se impõe ao Outro na sua uma análise na qual só pôde suportar permanecer
demanda? Como exige que o Outro o receba em torno de quatro ou cinco meses, pois se sentia
enquanto parceiro-sintoma? encurralada com o modo de intervenção do analista
e com o fato de fazer as sessões deitada no divã.
Passou a sofrer de uma doença psicossomática que
precipitou sua saída. Karine chegou a considerar que
a doença teria alguma coisa a ver com essa
experiência de análise.
[...] o modo sintomático da relação dessa Karine diz: “vim porque sei que preciso muito
paciente com o Outro [...] “Peço que você me fazer análise”, “sempre precisei”. [...] a
responda, mas que você responda como eu estabilização da sua estrutura não se mantinha
decido. Você tem que me permitir e aceitar que numa homeostase de gozo bem fixada.
eu domine, quer dizer, que eu possa controlá-la [...] o ponto de desestabilização da sua
para que nada do que você disser ou fizer seja estrutura situava-se no campo do amor.
imprevisível para mim. E, sobretudo, nada de
surpresas”. Em síntese a verificação da demanda dirigida ao
analista permitiu: a) indicadores do seu modo
sintomático de parceria com o Outro; b) se na
[...] é importante também verificar uma
estrutura já houve uma estabilização bem fixada
condição estrutural fundamental: Qual foi o
ou não; c) onde a fenda da estrutura se abre
fator mobilizador da demanda? Em que
para intervenção analítica; d) os indicadores de
circunstâncias esse fator emergiu? Desde
suplência que tentam tamponar o ponto de
quando? Isso consiste em delimitar o ponto de
desestabilização da estrutura; e) como opera a
desestabilização da estrutura.
suplência na estrutura?
(Guimarães, 2007, p. 03)
O modo de suplência presente no nó de amarração da
estrutura opera por meio da estratégia do eu, do eu como
absoluto, não aceitando a falta nem o intervalo no qual
pudesse emergir o enigma do desejo do Outro.
SUPLÊNCIA Ela diz: “Não sei dizer não” nem aos pais, nem aos amigos,
nem aos colegas. Demonstra permanentemente a sua
abnegação, seu zelo, seus dons, todas as virtudes do eu.
Oferece presentes, socorre os amigos emprestando-lhes
dinheiro, é amigável, divertida, agradável. Ela sempre
satisfaz os outros.
O MODO DE
[...] o sujeito situa no analista, em ato na transferência,
SUPLÊNCIA o objeto que ele é para o Outro. [...] na demanda inicial
ao analista, o sujeito situa o Outro em que posição?
Exatamente como objeto da sua demanda massiva,
intransitiva, sem nenhuma negociação, exigindo que o
Outro aceitasse seu controle absoluto.
O IMPERATIVO DO mortificante”.
SUPEREU O dinheiro.
A dívida.
“Como foi introduzida, na direção da cura,
uma leitura para esse seu gozo
“Sujeição extrema aos imperativos de
superegóico?”
gozo” – compulsão alimentar
“Essa estratégia na transferência (“insuportabilidade de esperar qualquer
constituiu-se como fundamental na cura, coisa que tenha a fazer, saber, ou dizer”.
pois só assim o sujeito pôde começar a
aceitar uma surpresa enigmática que
pudesse advir do Outro”. (Guimarães, 2007, p. 07-08)